Ano: 2006 Vol. 72 Ed. 5 - Setembro - Outubro - (16º)
Seção: Artigo Original
Páginas: 683 a 690
Fatores associados ao equilíbrio funcional em idosos com disfunção vestibular crônica
Functional balance associated factors in the elderly with chronic vestibular disorder
Autor(es): Juliana Maria Gazzola1, Monica Rodrigues Perracini2, Maurício Malavasi Ganança3, Fernando Freitas Ganança4
Palavras-chave: doença vestibular, equilíbrio, idoso, reabilitação, tontura.
Keywords: vestibular disease, balance, elderly, rehabilitation, dizziness.
Resumo:
Tarefas do dia-a-dia podem ser muito desafiadoras para o equilíbrio do idoso. Objetivo: Verificar a associação entre equilíbrio funcional, avaliado pela Berg Balance Scale (BBS) e os dados sociodemográficos, clínicos e de mobilidade (Timed up and go test - TUGT, Dynamic Gait Index - DGI) em idosos vestibulopatas crônicos. Material e Método: Estudo de casos com 120 idosos com diagnóstico de disfunção vestibular crônica. Foram utilizados os testes de Mann-Whitney, Kruskal-Wallis seguido do teste de Dunn e Coeficiente de Correlação de Spearman. Resultados: Ocorreram associações =-0,354; e correlações significantes entre a pontuação total da BBS e idade (p<0,001), faixa etária (p<0,001), número de doenças (p=0,030), número de =-0,287; p=0,001), número de medicamentos (p=0,014), número de doenças (=-0,274; p=0,002), quedas recorrentes (p=0,010), tendência a medicamentos (quedas (p=0,002), diagnóstico topográfico de vestibulopatia central (p<0,001) =-0,709; periodicidade da tontura (p=0,039), TUGT (<0,001) e DGI =-0,748; p(<0,001). Conclusões: O equilíbrio funcional de idosos vestibulopatas crônicos avaliados à BBS é mais comprometido quando associado ao avançar da idade, faixa etária mais idosa (80 anos ou mais), aumento do número de doenças, presença de cinco ou mais doenças, polifarmacoterapia, quedas recorrentes, tendência a quedas, vestibulopatia central, tontura diária, comprometimento da mobilidade e marcha.
Abstract:
Daily activities can be challenging for the elderly. Aim: To study the association between functional balance, evaluated by the Berg Balance Scale (BBS), sociodemographics, clinical and mobilility (Timed up and go test - TUGT, Dynamic Gait Index - DGI) variables in the elderly with chronic vestibular disorder. Materials and Methods: A series study with one hundred and twenty elderly with chronic vestibular disorder. We performed the Mann-Whitney test, the Kruskal-Wallis test followed by Dunn test and the Spearman Coefficient (). Results: Statistically significant associations and correlations were observed between total BBS score and age (=-0.354; p<0.001), age group (p<0.001), number off illnesses (p=0.030), number of illnesses (=-0.287; p=0.001), number of medications (p=0.014), number of medications (=-0.274; p=0.002), recurrent falls (p=0.010), tendency to fall (p=0.002), topographic diagnosis of central vestibular disorder (p<0.001) and periodicity of dizziness (p=0.039), TUGT (=-0.709; p<0.001) and DGI (=-0.748; p<0.001). Conclusions: Functional balance in the elderly with chronic vestibular disorders evaluated by the BBS is worse when associated with aging, with a more advanced age group (80 years or more), increasing number of illnesses, presence of five or more illnesses, use of multiple medications, recurrent falls, tendency to fall, central vestibular syndromes, daily dizziness, mobility and gait impairments.
INTRODUÇÃO
O envelhecimento populacional no Brasil está ocorrendo de modo acelerado, com aumento relevante na prevalência de doenças crônico-degenerativas1. Esta população de idosos tende a apresentar múltiplas comorbidades que potencializam grandes síndromes geriátricas como queda, iatrogenia, demência, imobilismo, que comprometem a independência e a autonomia destes pacientes, gerando incapacidades, fragilidade, institucionalização e morte1-3.
A disfunção vestibular assume particular importância, pois o aumento da idade é diretamente proporcional à presença de múltiplos sintomas otoneurológicos associados, tais como vertigem e outras tonturas, perda auditiva, zumbido, alterações do equilíbrio corporal, distúrbios da marcha e quedas ocasionais, entre outros4. Tinetti et al.5 têm considerado a tontura como uma síndrome geriátrica, condição de saúde multifatorial que ocorre do efeito acumulativo dos déficits nos múltiplos sistemas, imputando aos idosos maior vulnerabilidade aos desafios circunstanciais. O controle postural pode sofrer influências decorrentes das alterações fisiológicas do envelhecimento, de doenças crônicas, de interações farmacológicas ou disfunções específicas. O processo de envelhecimento afeta todos os componentes do controle postural - sensorial (visual, somatossensorial e vestibular), efetor (força, amplitude de movimento, alinhamento biomecânico, flexibilidade) e processamento central6. A integração dos vários sistemas corporais sob o comando central é fundamental para o controle do equilíbrio corporal. O desempenho desses sistemas reflete diretamente nas habilidades do indivíduo em realizar tarefas cotidianas, ou seja, na capacidade funcional7.
Uma das formas mais simples de se verificar o acometimento desses sistemas, cuja integridade é fundamental para o desempenho normal de tarefas motoras, é a avaliação funcional que simula, justamente, as demandas envolvidas na habilidade em controlar o equilíbrio, podendo ser útil para gerar hipóteses quanto aos determinantes da limitação funcional observada8. A Berg Balance Scale (BBS) é um instrumento de avaliação funcional do equilíbrio bastante utilizado em ambientes clínicos e de pesquisa, validado por Berg et al.9 e adaptado transculturalmente para sua aplicação no Brasil10,11. O teste consiste de 14 tarefas, cada uma categorizada em uma escala ordinal de cinco pontos, que varia de zero (incapaz de realizar a tarefa) a cinco (realiza a tarefa independente), baseada na qualidade do desempenho, necessidade de assistência e no tempo de completar a tarefa. As pontuações das 14 tarefas são somadas em uma pontuação total que varia entre 0 a 56 pontos, sendo a maior pontuação relacionada a um melhor desempenho. É fácil de ser administrado e seguro para pacientes idosos submetidos à avaliação. Atende a várias propostas como descrição quantitativa da habilidade do equilíbrio, acompanhamento da evolução clínica dos pacientes e avaliação da efetividade das intervenções terapêuticas12. Medeiros13 encontrou a pontuação de corte 48 da BBS para predição de quedas, avaliando 76 idosos vestibulopatas com queixa de tontura crônica. Verificou especificidade de 58,0%, sensibilidade de 78,0%, valor preditivo positivo de 72,9%, valor preditivo negativo de 57,5% e acurácia de 69,7%. O ponto de corte 48 na BBS foi de maior relevância clínica e tem maior precisão em relação a outros pontos de corte para a identificação dos que caem entre a população idosa vestibulopata.
O conhecimento das características funcionais do equilíbrio em idosos com disfunção vestibular crônica e a identificação de variáveis associadas ao déficit do equilíbrio nestes indivíduos podem promover o desenvolvimento de estratégias específicas de prevenção, assistência e reabilitação, com vistas à manutenção da autonomia e preservação da independência do idoso, o maior tempo possível. Não foram encontrados na literatura científica estudos sobre a avaliação funcional do equilíbrio em idosos com disfunção vestibular crônica que tenham sido avaliados por meio da BBS, para identificar os fatores associados ao equilíbrio funcional nesta população. Embora seja consenso que a avaliação da integração sensorial e o controle dinâmico, pelos protocolos de posturografia, sejam mais minuciosos para a detecção dos componentes do equilíbrio mais comprometidos, a compreensão do desempenho funcional dos ajustes posturais pode evidenciar, de forma simples e com baixo custo, alterações que impliquem na prática em uma intervenção terapêutica direcionada à capacidade da melhora funcional8. O objetivo deste estudo é verificar a associação entre o equilíbrio funcional, avaliado pela Berg Balance Scale (BBS), e os dados sociodemográficos, clínicos, de mobilidade (Timed Up and Go Test - TUGT) e de marcha (Dynamic Gait Index - DGI) de idosos com disfunção vestibular crônica.
MÉTODO
Trata-se de estudo transversal analítico, previamente aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de São Paulo - Escola Paulista de Medicina (UNIFESP - EPM), protocolo número 0371/03. Todos os pacientes incluídos na pesquisa fizeram a leitura da Carta de Informação e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Trata-se de parte de um estudo financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), processo número 03/10119-3.
A amostra foi constituída por pacientes provenientes do Ambulatório de Otoneurologia UNIFESP - EPM, com 65 anos ou mais, dos gêneros masculino ou feminino, com disfunção vestibular crônica, caracterizada pela queixa de tontura e/ou desequilíbrio, atordoamento e/ou outras sensações inespecíficas de tontura, há pelo menos três meses. Foram excluídos do estudo os idosos que apresentaram limitações físicas, cognitivas e sensoriais que impedissem a realização dos testes de equilíbrio, como incapacidade de compreender e atender a comando verbal simples e/ou imitar movimentos; aqueles que apresentaram acuidades visual e auditiva gravemente diminuídas e absolutamente incapacitantes às atividades de vida diária, mesmo com uso de lentes corretivas e/ou aparelhos de amplificação sonora; os que tinham amputações de membros inferiores e de membros superiores; os impossibilitados de deambular independentemente e com locomoção exclusivamente por cadeira de rodas. Também foram excluídos os pacientes que haviam realizado alguma forma de reabilitação do equilíbrio corporal nos últimos seis meses anteriores à avaliação. A avaliação não foi realizada durante a crise vertiginosa.
Os idosos foram inicialmente submetidos à avaliação clínica otoneurológica, que incluiu anamnese e exame físico otorrinolaringológico, audiometria, imitanciometria e exame vestibular, realizado por intermédio da vectoelectronistagmografia, de acordo com os critérios propostos por Ganança et al.14 e Ganança et al.15. Os dados foram coletados em consultórios médicos, amplos corredores e escadas localizadas no serviço, no período compreendido entre abril de 2003 a novembro de 2004. Os dados sociodemográficos avaliados foram gênero, idade (anos completos) e faixa etária. Os dados clínicos avaliados foram número de doenças, número de medicamentos, ocorrência de tendência a quedas, ocorrência de quedas e de quedas recorrentes no último ano, diagnóstico sindrômico e topográfico da disfunção vestibular, número de afecções vestibulares associadas, tempo de início da tontura, tipo de tontura, duração da tontura e periodicidade da tontura. A avaliação clínica do equilíbrio foi determinada pela utilização de escalas funcionais do equilíbrio: BBS11,12 e Timed Up and Go Test16. Para avaliação do equilíbrio durante a marcha também foi utilizado o instrumento Dynamic Gait Index17.
Para a BBS11,12 adotou-se o valor de corte 48 pontos, como preditor de quedas para pacientes vestibulopatas, de acordo com Medeiros13. Uma pontuação de 19 ou menos no DGI está associada a quedas em idosos18. Foi encontrada correlação significante entre a pontuação deste instrumento com a pontuação da BBS (r=0,71; p<0,01), ou seja, quanto maior a pontuação do DGI, maior a pontuação da BBS19. O TUGT apresenta forte associação com a pontuação da BBS e é sensível a mudanças ao longo do tempo. Podsiadlo e Richardson16 admitiram como desempenho normal para adultos saudáveis um tempo até 10 segundos; entre 11 e 20 segundos considera-se esperado para idosos frágeis ou com deficiência, os quais tendem a ser independentes na maioria das atividades de vida diária; no entanto, acima de 20 segundos gastos para a realização da tarefa sugere prejuízo importante da mobilidade, tornando necessária avaliação mais detalhada. Os materiais utilizados foram uma cadeira com apoio para braços, uma cadeira sem apoio para braços, degrau de 20,5cm, fita métrica, cronômetro (CasioÒ), um obstáculo (caixa de sapato) e dois cones de sinalização de trânsito.
Para as análises estatísticas inferencionais, do atual estudo, a pontuação total da BBS foi comparada entre as variáveis por meio do teste de Mann-Whitney, do teste de Kruskal-Wallis, seguido pelo teste de Dunn e pelo coeficiente de correlação de Spearman (r). Foram utilizados os testes não-paramétricos devido à assimetria e variabilidade da pontuação da BBS e à ausência de distribuição normal (p < 0,01). O nível de significância adotado para os testes estatísticos foi de 5% (a=0,05). As análises foram realizadas pelo programa computacional The SAS System for Windows (Statistical Analysis System, versão 6.1220.
RESULTADOS
A amostra deste estudo foi constituída por 120 idosos com diagnóstico médico de síndrome vestibular crônica em acompanhamento ambulatorial, sendo 68,3% do gênero feminino e 31,7% do masculino, com média etária de 73,40 anos e desvio-padrão (DP) de 5,77. A caracterização sociodemográfica, clínico-funcional e otoneurológica completa da amostra está descrita em outra publicação21.
Verificou-se correlação negativa fraca estatisticamente significante entre a pontuação da BBS e a idade do paciente (r= -0,354; p<0,001). Também foi verificada a associação entre a pontuação da BBS e faixas etárias (p<0,001). As principais diferenças ocorreram entre as medianas das faixas etárias "65 a 69 anos" e "80 anos ou mais" e entre "70 a 74 anos" e "80 anos ou mais" (Figura 1), sendo que os valores das medianas da pontuação total da BBS encontrados foram menores na faixa etária mais idosa, ou seja, 80 anos ou mais. Não foram encontradas associações significantes entre a pontuação total da BBS e o gênero.
Figura 1. Representação gráfica da variável Berg Balance Scale em função das categorias da variável "faixa etária" de idosos com disfunção vestibular crônica (n=120).
Verificou-se correlação negativa fraca estatisticamente significante entre a pontuação total da BBS e número de doenças (r= -0,287; p= 0,001) e também associação significante entre a pontuação total da BBS e a variável categórica "número de doenças" (p=0,030). A principal diferença ocorreu entre as medianas da pontuação total da BBS das categorias "1 ou 2 doenças" e "5 ou mais doenças" (Figura 2), sendo menor nos idosos com maior número de doenças associadas.
Figura 2. Representação gráfica da variável Berg Balance Scale em função das categorias da variável "número de doenças" de idosos com disfunção vestibular crônica (n=120).
A pontuação total da BBS apresentou correlação fraca estatisticamente significante com número de medicamentos utilizados (r= -0,274; p= 0,002). Também foi verificada associação entre a pontuação total da BBS e número de medicamentos (p=0,014). As principais diferenças ocorreram entre as medianas das categorias de "não faz uso" e "3 ou 4 medicamentos" e "não faz uso" e "5 ou mais medicamentos" (Figura 3). Notou-se que os idosos que utilizavam maior número de medicamentos apresentaram pior desempenho do equilíbrio em relação aos idosos que não utilizavam medicamentos.
Figura 3. Representação gráfica da variável Berg Balance Scale em função das categorias da variável.
Em se tratando das quedas referidas no último ano, não foi encontrada diferença estatisticamente significante entre a pontuação da BBS de idosos vestibulopatas que apresentaram quedas daqueles que não as apresentaram. A pontuação da BBS associou-se ao "número de quedas" da variável contendo três categorias (nenhuma/ 1 queda /duas ou mais quedas), com nível descritivo significante igual a 0,010. As maiores diferenças foram encontradas entre as medianas das categorias "nenhuma queda" e "duas ou mais quedas" e também entre "uma queda" e "duas ou mais quedas" (Figura 4). Os valores das medianas da BBS foram iguais nas categorias "nenhuma queda" e "uma queda" e menor na categoria "duas ou mais quedas".
Figura 4. Representação gráfica da variável Berg Balance Scale em função das categorias da variável.
A pontuação total da BBS foi significativamente menor nos idosos com síndrome vestibular crônica que referiram a ocorrência de tendência a quedas (p=0,002), em relação aos idosos que não referiram (Figura 5). Na análise da variável categórica "Diagnóstico Sindrômico e Topográfico da Disfunção Vestibular" em relação à pontuação total da BBS, obteve-se diferença estatisticamente significante (p<0,001). As principais diferenças ocorreram entre as categorias "normal" e "central", "periférica deficitária" e "central" e também entre "periférica irritativa" e "central" (Figura 6). Os idosos com diagnóstico topográfico de síndrome vestibular central, dado pelo exame vestibular, apresentaram pior desempenho na avaliação do equilíbrio funcional pela BBS. Observou-se que o número de afecções vestibulares concomitantes não obteve associação com a pontuação total da BBS.
Figura 5. Representação gráfica da variável Berg Balance Scale em função das categorias da variável "tendência a quedas" de idosos com disfunção vestibular crônica (n=120).
Figura 6. Representação gráfica da variável Berg Balance Scale em função das categorias da variável "diagnóstico sindrômico e topográfico da disfunção vestibular" de idosos com disfunção vestibular crônica (n=120).
A pontuação total da BBS não se associou com as variáveis "tempo de início da tontura", "tipo de tontura" e "duração da tontura". Porém, a BBS apontou associação com "periodicidade da tontura" (p=0,039), em que a principal diferença ocorreu entre as categorias "diária" e "esporádica". Os idosos que referiram tontura com periodicidade diária obtiveram menor valor da mediana na BBS (Figura 7).
Figura 7. Representação gráfica da variável Berg Balance Scale em função das categorias da variável "periodicidade da tontura" de idosos com disfunção vestibular crônica (n=120).
O escore total do TUGT e a pontuação total da BBS apresentaram correlação negativa moderada estatisticamente significante (r=- 0,709; p<0,001). Também encontrou-se associação quando a análise foi realizada considerando a pontuação total da BBS e as três categorias de tempo definidas (p<0,001). Foram encontradas as diferenças entre as medianas das três categorias de tempo de execução do TUGT e a pontuação obtida na BBS entre as categorias "até 10,0 segundos" e "10,01 a 20,0 segundos" e entre a categoria "20,01 segundos e mais" e as outras duas categorias de tempo (Figura 8). Observou-se que quanto maior a pontuação da BBS, menor o tempo cronometrado para a realização do TUGT. Na avaliação do equilíbrio durante a marcha, pelo DGI, o escore total deste instrumento apresentou correlação moderada estatisticamente significante com a pontuação total da BBS (r= -0,748; p=0,001). A pontuação total da BBS também apresentou diferença significante entre as medianas das categorias "0 a 19 pontos" e "20 a 24 pontos" (Figura 9), sendo menor a pontuação da BBS na categoria "0 a 19 pontos" (p<0,001).
Figura 8. Representação gráfica da variável Berg Balance Scale em função das categorias da variável "Timed Up and Go Test" de idosos com disfunção vestibular crônica (n=120).
Figura 9. Representação gráfica da variável Berg Balance Scale em função das categorias da variável "Dynamic Gait Index" de idosos com disfunção vestibular crônica (n=120).
DISCUSSÃO
O desenvolvimento de um estudo voltado para o entendimento do equilíbrio funcional de idosos com disfunção vestibular crônica pode tornar o especialista mais atento a um número maior de associações entre deficiências e limitações funcionais ou incapacidades, permitindo um diagnóstico funcional mais preciso em reabilitação e um melhor monitoramento da evolução do quadro clínico.
Observou-se no estudo atual que a mediana da pontuação da BBS foi significativamente menor no grupo de idosos com faixa etária mais avançada, ou seja, com 80 anos ou mais, provavelmente porque o acometimento dos sistemas envolvidos com o equilíbrio corporal é proporcional ao aumento da idade22,23. Também se verificou uma correlação significante entre a idade do paciente e a pontuação total da BBS, sendo que esta diminuiu com o aumento da idade. Miyamoto10 também encontrou correlação significante (r= -0,353 p<0,05) em uma amostra de 36 pacientes com 65 anos ou mais, que apresentava, entretanto, maior prevalência de doenças reumatológicas, doenças cardiovasculares e osteoporose. Não foi encontrada diferença estatística significante entre a pontuação da BBS e o gênero, concordando com Miyamoto10.
Verificou-se pior desempenho do equilíbrio funcional em idosos acometidos por cinco ou mais doenças e também que quanto maior o número de doenças, menor foi a capacidade do desempenho do equilíbrio funcional nos idosos que apresentam alteração do sistema vestibular. A pontuação da BBS não se associou ao número de doenças no estudo de Gazzola et al.24, que avaliou idosos de um serviço de reabilitação gerontológica, cujas doenças mais prevalentes foram as osteoarticulares e cardiovasculares e as doenças otoneurológicas corresponderam a apenas 21,5%. Tal achado permite inferir que a presença das afecções vestibulares nos indivíduos idosos afeta o equilíbrio e aumenta o risco de quedas25 principalmente em idosos com maior número de doenças. Como esperado, os idosos com vestibulopatias centrais no presente estudo apresentaram pior desempenho do equilíbrio à BBS, pela maior possibilidade de acometimento de outras áreas no sistema nervoso central, relacionadas ao equilíbrio corporal, como, por exemplo, na fossa posterior (tronco cerebral e cerebelo) ou em nível cortical cerebral26.
Verificou-se correlação estatística significante entre menor pontuação total da BBS e maior utilização de medicamentos. Houve associação estatística significante entre a pontuação total da BBS e os grupos de idosos que ingeriram "3 ou 4 medicamentos" e "5 ou mais medicamentos" em comparação aos que não os fizeram. Estes resultados são concordantes com Sloane et al.27 e Ganança et al.28 que salientaram que a polifarmacoterapia pode aumentar o risco de interações medicamentosas e de eventos adversos e costuma piorar os sintomas labirínticos e, também, com Tinetti et al.5 que mostraram que a utilização de cinco ou mais medicamentos concomitantes está associada ao maior risco para tontura em idosos.
Associação significante foi encontrada na atual pesquisa entre a pontuação da BBS e quedas recorrentes, em que os idosos com história de duas ou mais quedas apresentaram maior comprometimento do equilíbrio funcional. No estudo de Berg et al..29, a BBS mostrou-se relevante como preditor de múltiplas quedas, em até 2,7 vezes para o ponto de corte 45. Entretanto, Miyamoto10 não obteve correlação significante com a pontuação da BBS e o número de quedas em idosos. No presente estudo observou-se que as medianas da pontuação da BBS dos idosos que sofreram uma queda foi igual aos idosos que não sofreram quedas. Isto permitiu afirmar que a BBS não pode diferenciar pacientes que sofreram quedas e os que não sofreram e que esta escala diferenciou apenas pacientes quando a incapacidade funcional foi mais acentuada, como, por exemplo, aqueles com história de quedas recorrentes. No presente estudo, o medo de quedas e a tendência a quedas foram referidos pela maioria dos pacientes, 72,5% e 79,2%, respectivamente. Também foi encontrada associação entre o pior desempenho do equilíbrio funcional e tendência a quedas. Tais achados corroboram com os estudos de Tinetti et al.30 e Lachman et al.31, que observaram que o medo de cair leva conseqüentemente à diminuição da mobilidade, comprometendo o desempenho do equilíbrio corporal dos idosos vestibulopatas, com maior tendência a quedas.
Os idosos que referiram tontura de periodicidade diária apresentaram pior desempenho do equilíbrio, quando comparados àqueles que referiram tontura de periodicidade esporádica, provavelmente devido à maior limitação imposta pela tontura que é mais freqüente.
Como esperado, verificou-se moderada correlação entre a piora do desempenho no TUGT e a piora no desempenho na BBS, já demonstrado por Podsiadlo e Richardson16 e Berg et al.9 em idosos da comunidade, por Cordeiro8 em idosos com diabetes mellitus em acompanhamento ambulatorial e por Gazzola et al.24 em pacientes de um serviço de reabilitação gerontológica. É importante ressaltar que a BBS não avalia aspectos considerados importantes para o equilíbrio, como equilíbrio dinâmico na marcha, aspectos atencionais, respostas posturais em superfícies de suporte instáveis e resposta postural a perturbações externas, como as estratégias reativas de tornozelo, quadril, tronco e passo atrás. Sabe-se que a avaliação do idoso que já tenha queixa referente ao equilíbrio corporal deve ser realizada de maneira mais completa possível, utilizando-se de vários instrumentos8,10,12,24,32.
Uma das limitações do presente estudo foi não ter avaliado alguns componentes sensoriais do controle postural como acuidade visual, sensibilidade proprioceptiva cinético-postural, sensibilidade cutâneo-protetora, sensibilidade vibratória e testes de interação sensorial, e componentes efetores como força muscular, flexibilidade muscular e do tecido conjuntivo e amplitude de movimento. Pesquisas envolvendo tais informações em idosos vestibulopatas também deverão ser realizadas com o intuito de ampliar o conhecimento sobre o equilíbrio corporal nestes pacientes. Ressalta-se, finalmente, a importância da realização de estudos com acompanhamento longitudinal de idosos com disfunção vestibular crônica submetidos às diversas opções terapêuticas, para que se possa estabelecer os meios de tratamento mais eficientes, evitar o escalonamento das limitações funcionais, amenizar ou retardar processos degenerativos progressivos e melhorar a qualidade de vida destes pacientes.
CONCLUSÕES
O equilíbrio funcional de idosos com disfunção vestibular crônica, avaliado pela BBS, é mais comprometido quando associado ao avançar da idade, faixa etária mais idosa (80 anos ou mais), aumento do número de doenças, presença de cinco ou mais doenças associadas ao quadro vestibular, polifarmacoterapia, quedas recorrentes, tendência a quedas, síndrome vestibular central, tontura diária, comprometimento da mobilidade e distúrbio da marcha.
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1 Fisioterapeuta. Especialista em Gerontologia pela UNIFESP - EPM. Mestre em Ciências pelo Curso de Pós-Graduação em Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço da UNIFESP - EPM. Bolsista da FAPESP.
2 Fisioterapeuta. Doutora em Ciências da Reabilitação pela UNIFESP - EPM. Professora Coordenadora do Curso de Mestrado em Fisioterapia da Universidade Cidade de São Paulo - UNICID.
3 Professor Titular de Otorrinolaringologia da UNIFESP - EPM. Pesquisador Sênior do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu (Mestrado) em Ciências da Reabilitação Neuro-Motora da UNIBAN. Responsável pela Área de Equilibriometria do Setor de Otorrinolaringologia do Centro de Medicina Diagnóstica Fleury - São Paulo (SP).
4 Médico Otorrinolaringologista Doutor em Medicina pela UNIFESP - EPM (Professor Afiliado da Disciplina de Otoneurologia da UNIFESP - EPM. Docente do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu (Mestrado) em Ciências da Reabilitação Neuro-Motora da UNIBAN. Responsável pelo Setor de Reabilitação Vestibular da Disciplina de Otoneurologia da UNIFESP - EPM.)
Endereço para correspondência: Disciplina de Otoneurologia da UNIFESP - EPM / Setor de Reabilitação Vestibular - Rua dos Otonis 700 Piso Superior Vila Clementino 04025-002 São Paulo SP.
Tel (0xx11) 5575-2552 - E-mail: otoneuro@unifesp.epm.br
Fapesp.
Este artigo foi submetido no SGP (Sistema de Gestão de Publicações) da RBORL em 2 de novembro de 2005. Cod. 1600.
Artigo aceito em 07 de agosto de 2006.