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Ano:  2005  Vol. 71   Ed. 4  - Julho - Agosto - ()

Seção: Editorial

Páginas: 400 a 404

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Muito prazer, Lei de Inovação...

Nice to meet you, Law of Innovation...

Autor(es): Henrique Olival Costa

Em toda empreitada de nossas vidas, nos deparamos com momentos em que as encruzilhadas no caminho nos forçam a tomar uma trilha, abandonando outras alternativas que não nos pareceram as melhores. No geral, apesar de doloroso, este processo representa uma abertura no leque de possibilidades da empreitada e, no mais das vezes, um ponto de ampliação das perspectivas potenciais de nosso projeto. A comunidade científica brasileira parece estar vivendo um desses momentos. Criado há meio século, o sistema de pós-graduação nacional teve em Newton Sucupira, articulista de políticas educacionais do regime militar, não exatamente um idealizador, mas um conceituador. Seguido fielmente pelos formuladores de políticas de fomento à formação de recursos humanos e pesquisa, em suas palavras, encontramos as bases do formato da PG até hoje e percebemos que a finalidade principal do sistema era fazer o país alcançar maioridade na produção de saber, dando-nos independência intelectual e livrando-nos da dependência externa nos itens de ciência e tecnologia.

A pós-graduação adquire seu grande impulso no mundo todo, com a fundação da Universidade Johns Hopkins em 1.876, criada especialmente para desenvolver estudos pós-graduados e inspirada na idéia da creative scholarship. Isto é, uma universidade destinada não somente à transmissão do saber já constituído, mas voltada para a elaboração de novos conhecimentos mediante a atividade de pesquisa criadora (Infocapes99).

Com efeito, no Brasil, o exame dos estatutos e regimentos nos tem mostrado que, de modo geral, falta às escolas uma concepção exata da natureza e fins da pós-graduação, confundindo-se freqüentemente seus cursos com os de simples especialização.

A pós-graduação teve períodos de altos e baixos, mas os últimos 5 anos mostraram que uma política de interferência pró-ativa nos desígnios dos programas sob a tutela da CAPES, favorecendo e estimulando os programas e pesquisadores com maior produtividade científica, especificamente na publicação em veículos de maior visibilidade e credibilidade, foi extremamente positiva (Fig. 1), levando a um enorme incremento em todos os aspectos da pós-graduação.


Figura 1. Brasil: Artigos publicados em periódicos científicos internacionais indexados no Institute for Scientific Information (ISI) e percentual em relação ao mundo, 1981-2002



Atualmente, o país vem formando um número elevadíssimo de doutores, cerca de 8000 em 2004, e a produção científica vem crescento assustadoramente. Esta tendência é mais nítida nos programas da área da saúde que ultrapassaram todas as outras áreas do conhecimento em produtividade científica no último ano (Fig. 2).


Fonte: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - Diretório dos Grupos de Pesquisa no Brasil, Censos 2002 e 2004. Elaboração: Coordenação-Geral de Indicadores - Ministério da Ciência e Tecnologia. Nota: (1) Há dupla contagem no número de orientações, tendo em vista que um orientador pode participar de mais de um grupo de pesquisa; (2) Orientações do Diretório dos Grupos de Pesquisa, referentes ao Censo de 2002, na data de referência 15/07/2002; (3) Orientações do Diretório dos Grupos de Pesquisa, referentes ao Censo de 2004, na data de referência 11/12/2004.


Ao final, parece que o sistema está conseguindo preparar, pelo menos teóricamente um soldado de técnicos em pesquisa. Resta saber se há lugar e procura para seus serviços.

Aparentemente, esta leva de profissionais ainda não achou seu lugar na sociedade produtiva e, mesmo as teses e artigos publicados tem se prestado mais ao consumo acadêmico do que propriamente levado a maiores impactos na geração de produtos para melhoria da qualidade de vida.

Uma das maneiras de se avaliar este impacto é o número de patentes geradas em uma sociedade (Fig. 3). Como podemos ver a quantidade de patentes registradas no país é infinitamente inferior ao número de professores formados, teses concluídas e artigos publicados. Além disso, não há qualquer indicação de aumento substancial ou mesmo de incremento no número absoluto de solicitação de patentes na área da saúde nos últimos anos.


Figura 3. Brasil: Produção técnica no diretório dos grupos de pesquisa do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), 1998-2001


Se o intuito inicial da pós-graduação era dar autonomia científica ao país, gerando riqueza tecnológica, em suma, propriedade intelectual, podemos entender que ainda falta o último passo da trajetória.

É ai que encontramos a nossa encruzilhada atual. A implantação de programas de pós-graduação chegou a um status conceitual e gerencial bastante profissionalizado, os recursos humanso estão sendo gerados, a produção se intensifica, entretanto, a finalidade precícua do sistema ainda padece de falta de instrumentos, seja operacionais seja financeiros.

Os problemas operacionais têm como condição inicial o fato da pós-graduação estar na universidade, com todas as suas amarras acadêmicas e rigidez sistemática, enquanto que a produção de riquezas em ciência e tecnologia ronda o setor produtivo, de fins comerciais e lucrativos.

Este binômio Universidade-Empresa tem sido razão de uma lei que transita no Senado da República como Projeto de Lei nº 3.476/04, e deveria ser conhecido por todos os que militam na área de ensino e pesquisa. É chamada de Lei da Inovação e trata das parcerias entre empresas, universidades e institutos científicos e tecnológicos e enseja que esta relação ganhe força e estimule o processo de inovação. A necessidade de melhorar a relação entre produção do conhecimento e setor empresarial poderia ser, pelo menos em grande parte, atendida com esse projeto. Ainda hoje, dada a dificuldade de diálogo entre universidade e empresa, o empresário brasileiro acaba optando por importar tecnologia pronta do exterior.

Pela lei que tramitou no Senado podemos ter novidades que devem ser refletidas e se bem utilizadas podem determinar grandes modificações na cadeia de transmissão de conhecimentos da acadêmia para a população.

Os artigos citados abaixo parecem trazer situações que devem ser reconhecidas pelas Instituições de ensino e pesquisadores por conterem em seu bojo situações inusitadas e que poderão modificar substancialmente a rotina de pesquisa das mesmas:

Art. 4º As Instituições Científicas e Tecnológicas (ICT) poderão, mediante remuneração e por prazo determinado:

I - compartilhar seus laboratórios, equipamentos, instrumentos, materiais e demais instalações com microempresas e empresas de pequeno porte em atividades voltadas à inovação tecnológica, para a consecução de atividades de incubação, e sem prejuízo de sua atividade finalística;

II - permitir a utilização de seus laboratórios, equipamentos, instrumentos, materiais e demais instalações existentes em suas próprias dependências por empresas nacionais e organizações de direito privado sem fins lucrativos voltadas para atividades de pesquisa, desde que tal permissão não interfira diretamente na sua atividade fim, nem com ela conflite.

Parágrafo único. A permissão e o compartilhamento de que tratam os incisos I e II do caput obedecerão às prioridades, critérios e requisitos estabelecidos em edital aprovados pelo órgão máximo da ICT, observadas as respectivas disponibilidades e assegurada a igualdade de oportunidades às empresas e organizações interessadas.

Art. 5º Ficam a União e suas entidades autorizadas a participar minoritariamente do capital de empresa privada de propósito específico que vise o desenvolvimento de projetos científicos ou tecnológicos para obtenção de produto ou processo inovadores.

Parágrafo único. A propriedade intelectual sobre os resultados obtidos pertencerá às instituições detentoras do capital social, na proporção da respectiva participação.

Art. 9o É facultado à ICT celebrar acordos de parceria para realização de atividades conjuntas de pesquisa científica e tecnológica, desenvolvimento de tecnologia, produto ou processo com instituições públicas e privadas.

§ 1º O servidor, militar ou empregado público da ICT envolvido na execução das atividades previstas no caput poderá receber bolsa de estímulo à inovação, diretamente de instituição de apoio ou agência de fomento.

Art. 10. Os acordos e contratos firmados entre as ICT, as instituições de apoio, agências de fomento e as entidades nacionais de direito privado sem fins lucrativos voltadas para atividades de pesquisa, cujo objeto seja compatível com a finalidade desta Lei, poderão prever recursos para cobertura de despesas operacionais e administrativas incorridas, observado o limite máximo fixado em regulamento.

Art. 13. É assegurada ao criador, limitada a um terço do total, participação nos ganhos econômicos auferidos pela ICT, resultantes de contratos de transferência de tecnologia ou de exploração de criação protegida, da qual tenha sido o inventor, obtentor ou autor, aplicando-se, no que couber, o disposto no parágrafo único do art. 93 da Lei nº 9.279, de 14 de maio de 1996.

Art. 14. Para a execução do disposto nesta Lei, ao pesquisador público é facultado o afastamento para prestar colaboração a outra ICT, nos termos do inciso II do art. 93 da Lei no 8.112, de 11 de dezembro de 1990, observada a conveniência da ICT de origem.

§ 2º Durante o período de afastamento de que trata o caput, são assegurados ao pesquisador público o vencimento do cargo efetivo, o soldo do cargo militar ou o salário do emprego público da instituição de origem, acrescido das vantagens pecuniárias permanentes estabelecidas em lei, bem como progressão funcional e os benefícios do plano de seguridade social ao qual estiver vinculado.

Art. 15. A critério da administração pública, poderá ser concedida ao pesquisador público, desde que não esteja em estágio probatório, licença sem remuneração para constituir empresa com a finalidade de desenvolver atividade empresarial relativa à inovação.

CAPÍTULO IV

DO ESTÍMULO À INOVAÇÃO NAS EMPRESAS

Art. 19. A União, as ICT e as agências de fomento promoverão e incentivarão o desenvolvimento de produtos e processos inovadores em empresas nacionais e nas entidades nacionais de direito privado sem fins lucrativos voltadas para atividades de pesquisa, mediante a concessão de recursos financeiros, humanos, materiais ou de infra-estrutura, a serem ajustados em convênios ou contratos específicos, destinados a apoiar atividades de pesquisa e desenvolvimento.

§ 1º A concessão de recursos financeiros, sob a forma de subvenção econômica, financiamento ou participação societária, visando ao desenvolvimento de produtos ou processos inovadores, será precedida de aprovação de projeto pelo órgão ou entidade concedente.

CAPÍTULO V

DO ESTÍMULO AO INVENTOR INDEPENDENTE

Art. 22. Ao inventor independente, que comprove depósito de pedido de patente, é facultado solicitar a adoção de sua criação por ICT, que decidirá livremente quanto à conveniência e oportunidade da solicitação, visando à elaboração de projeto voltado a sua avaliação para futuro desenvolvimento, incubação, utilização e industrialização pelo setor produtivo.

CAPÍTULO VI

DOS FUNDOS DE INVESTIMENTO

Art. 23. Fica autorizada a instituição de fundos mútuos de investimento em empresas cuja atividade principal seja a inovação, caracterizados pela comunhão de recursos captados por meio do sistema de distribuição de valores mobiliários, na forma da Lei nº 6.385, de 7 de dezembro de 1976, destinados à aplicação em carteira diversificada de valores mobiliários de emissão dessas empresas.

A realidade é que a sorte está lançada. Pela lei há mecanismos que favorecem a entrada de financiamento para a academia seja na prestação de serviços, seja na melhoria de remuneração, seja na possibilidade de alcançar ganhos reais com a produção de conhecimento. Há prós e contras, a maioria diz respeito à suposta história falta de disposição da indústria e setor de negócios investir em P&D, entretanto já há dados que começam a contradizer esta crença. Segundo a FAPESP, "os gastos públicos em pesquisa e desenvolvimento (P&D) no Estado no período de 1998 a 2002 ficaram sempre acima de R$ 2,3 bilhões. Nesse cenário, São Paulo é também o único Estado onde os gastos estaduais superaram os do governo federal: 60% ante 40%, respectivamente, ou R$ 1,47 bilhão ante R$ 982 milhões nos quatro anos pesquisados. Outra particularidade paulista refere-se à participação do setor empresarial nos investimentos em P&D. Em 2000, essa participação chegou a 54%, ou R$ 2,2 bilhões.

Os dados estão ai e a PL já tramitou e falta ser regulamentada, cabe a todos interessados em pesquisa saber fazer o melhor uso de suas prerrogativas.

Saudações

Henrique Olival Costa

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