Versão Inglês

Ano:  1974  Vol. 40   Ed. 2  - Maio - Dezembro - (38º)

Seção: Artigos Originais

Páginas: 269 a 271

 

Ruptura Traumática de Brônquio-Fonte* Aspectos cirúrgicos e endoscópicos em um caso com sobrevida

Autor(es): Pedro A. Martins** e
José M. Orso***

As lesões traumáticas de laringe, traquéia e brônquios provocadas por agentes externos vêm apresentando significante aumento em sua incidência. Tal fato parece manter relação com o correspondente incremento em acidentes de tráfego4. Estima-se que cerca de 25%a dos óbitos ocorridos em tais circunstâncias sejam devidos a traumas torácicos4. Contusões de tórax podem determinar lacerações traqueobrônquicas; a secção completa de brônquio-fonte reveste-se de excepcional gravidade em geral ocorrendo êxito letal caso não sejam executadas medidas diagnósticas e terapêuticas urgentes1. O caso a ser relatado apresenta características que demonstram as possibilidades cirúrgicas e endoscópicas em seu tratamento.

Apresentação do caso. Paciente (B. L), com 21 anos de idade, sexo masculino, solteiro, natural de São Paulo, foi atendido no Pronto Socorro do Hospital São Lucas de Diadema em 10 de abril de 1973, 30 minutos após sofrer atropelamento por caminhão. O paciente apresentava quadro de dispnéia intensa, cianose de extremidades, palidez, PA 12x7, P:100 rítmico, com escoriações na face posterior do HTD e sinais de contusão da cintura escapular-umeral. Exame radiográfico do tórax feito na ocasião revelou pneumotorax hipertensivo à D, presença de nível líquido na base do pulmão D e enfizema subcutâneo. Diante deste quadro tomou-se como conduta a drenagem torácica no 2.° EICD e 6.° EICD, com saída de 500m1 de sangue e drenagem contínua de ar, fazendo-se o diagnóstico de rutura brônquica. Adotou-se a conduta cirúrgica diante do quadro estabelecido.

Cirurgia - Após venodissecção houve o posicionamento do doente na mesa cirúrgica em decúbito semi lateral esquerdo para melhores condições de acesso à árvore brônqutca D e drenagem aérea (pneumotorax hipertensivo). Após a incisão no 4° EICD encontrou-se: hemotorax e secção completa de bronquio-fonte D próximo à carina, com desinserção do mesmo, e rutura longitudinal de mais ou menos 5 cm na porção membranosa. Encontrou-se também parênquima pulmonar totalmente atelectasiado, vasos íntegros, escoriações na face posterior do hemitorax D, acometendo pleura e músculos, com dissociação do lobo superior em 2 porções. Os ostios do LSD e LM e LID eram visíveis e estavam perfeitamente permeáveis. Foi praticada a lavagem com soro fisiológico seguida de aspiração dos brônquios visualizados. A seguir insuflou-se com sonda de Folley os diversos segmentos pulmonares os quais mostraram boa vitalidade. OS tecidos peribrônquicos estavam íntegros. Preconizou-se portanto, a sutura da porção membranosa cuja rutura era longitudinal com pontos separados de Mononylon 5-0.

Finalmente a sutura término terminal da secção do bronquio-fonte D, com pontos separados de algodão 10 e reconstrução do parênquima pulmonar com pontos separados de Mersilene 00 (fig. 1). Suturou-se a cicatriz incisional deixando-se as drenagens que antecederam a cirurgia. A duração do ato cirúrgico foi de 3 horas e no 1.° PO o paciente permaneceu sob respiração controlada. A drenagem coletou 500m1 de sangue pelo dreno localizado no 6 ° EICD, o qual foi retirado após 7 dias e para prevenção de uma provável fístula e consequente pneumotorax hipertensivo o dreno do 2 ° EICD foi deixado até o 15 ° PO (foto 1). No 20 ° dia foi dada alta hospitalar com o paciente em bom estado geral, eupneico, sem nenhuma sintomatologia. Em 14 de junho de 1973, 2 meses após a alta hospitalar foi praticada a 1ª intervençao endoscópica sob anestesia geral com as seguintes observações: carina alargada com hiperemia da mucosa.





Brônquio fonte E sem alterações patológicas. BFD; junto à emergência do BLS, foi visualizada tumoração pediculada, de 0,5cm de comprimento por 0,2 de largura, revestido de mucosa lisa inserido na parede látero superior externa. A peça foi removida com pinça especial e pôde-se notar a seguir a linha de sutura com 2 pontos de fio preto de algodão. O AP revelou "fragmentos de mucosa brônquica com ulceração do epitélio de revestimento, proliferação de tecido de granulação exuberante, e-reação inflamatória crônica não específica no córion". Em 02-7-73 foi realizado exame planigráfico de tórax, que revelou: campos pleuropulmonares de transparência normal em todos os planos estudados. Não se observam imagens anormais no mediastino. Conclusão: não há evidência radiológica de pneumopatia. A segunda intervenção endoscópica realizada em 12-7-73 revelou tumoração volumosa ocupando 2/3 da luz do BFD; remoção do granuloma e retirada de 1 ponto de fio de mononylon. Foi praticada dilatação ao nível da anastomose. Uma terceira intervenção endoscópica foi realizada também sob anestesia geral em 19-12-73 com os seguintes dados: presença de pequena granulação ao nível da parede anterior do BFD, próximo à carina principal, o qual apresenta discreta redução de calibre ao nível da anastomose, que foi ultrapassada com facilidade com tubo de 9mm de calibre. Decorridos 15 meses do acidente, o paciente encontra-se assintomático, comparecendo periódicamente nos controles ambulatoriais.

Discussão

Sabe-se, hoje em dia que a causa mais comum de rutura de brônquios é o acidente automobilístico2,5. Entretanto, o exato mecanismo da patologia não é claro, e é provavelmente a combinação da compressão súbita do ar na árvore traqueobrÔnquica contra a glote fechada e a ação da coluna vertebral contra o brônquio2. E bem possível também que a desaceleração súbita possa causar rutura de brônquio da mesma forma que causa, como reportaram Katz e Briggs, rutura de aorta torácica. Os acidentes que envolvem os brônquios, na sua maior parte, são fatais, porém o diagnóstico precoce poderá levar o paciente à sobrevivência, com bom êxito cirúrgico. O presente caso mostra que a pronta intervenção desde que se chegue ao diagnóstico precoce e o uso de manobras adequadas para a árvore traqueobrônquica, pode trazer a solução para as ruturas traqueobrônquicas desse gênero. Ao mesmo tempo, a evolução do caso revela a importância decisiva da contribuição do broncoesofagologista que através exame endoscópico permite o diagnóstico e controle das possíveis seqüelas do ato cirúrgico, evitando complicações pulmonares tardias irreversíveis.

Resumo

Os AA. relatam caso de secção traumática completa de brônquio-fonte D, submetido a reimplante imediato, com sobrevida. O tratamento endoscópico da seqüela cirúrgica foi executado com sucesso, estando o paciente assintomático há 15 meses.

Summary

The AA. related a case of traumatic section of right main bronchus, submeted to immediate reimplant, with survive. The endoscopic treatment of the cirurgic sequelae was done with successful. A follow up examination 15 months later revealed a satisfactory result.

Bibliografia

1. Lucian, L. L. - Bronchial avulsion. J. Thorax Cardiovasc. Surg., 62:470, sept., 1971.
2. Bertelsen, S., Howitz, P. - Injuries of the trachea and bronchi. Thorax, 27:188, 1972.
3. Roy Cohn - Nonpenetrating wounds of the lungs and bronchi. Surgical Clinics of North Amer., 52:585, june, 1972.
4. Myers, W. O., Leape, L. L., Holder, T. M. Bronchial rupture in a child, with subsequent stenosis, resection and anastomosis. Ann. Thoracic Surg., 12: 442, 1971.
5. Lynn, R. B., Iyengar, K. - Traumatic rupture of the bronchus. Chest, 61: 81, jan., 1972.




* Trabalho realizado no Hosp. São Lucas de Diadema.
** Médico Assistente do Hosp. Clin. Fac. Med. U. S. P.
*** Médico do Hosp. São Lucas de Diadema. Membro assoc. do Dept. Cir. Cardio-Vasc. da Soc. Brás. Cardiol.

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