Versão Inglês

Ano:  1935  Vol. 3   Ed. 4  - Julho - Agosto - ()

Seção: -

Páginas: 346 a 356

 

SOBRE A QUESTÃO DA CURA CIRURGICA DAS SINUSITES FRONTAIS CRONICAS. COMO EVITAR OS RESULTADOS DECEPCIONANTES (1)

Autor(es): DR. MÁRIO OTTONI DE REZENDE (1.º Adjunto da Clinica).

Não ha especialista que não tenha travado conhecimento com as dificuldades decorrentes ao proceder a uma cura radical de uma sinusite frontal cronica.

Não acredito que a qualquer deles, que não desconheça o assunto, em todas as minucias, cause satisfação o ser obrigado a intervir em semelhante caso. Operações praticadas, com maestria diferenciada, com cuidados rebuscados, com minucias de tecnica e completadas com a satisfação de a ter feito bem e com a esperança, quasi certa, da obtenção de uma cura radical, trazem, dias ou meses depois, o desgosto imenso de uma recediva, desta vez com tendencia a exteriorisação da afecção, devido mesmo á resistencia diminuida da barreira que o osso anteriormente opunha, a seu caminho.

O dissabor de uma reoperação será ainda maior para o cirurgião, sob espectativa de que nova recediva poderá ter lugar, fazendo-o perder por completo o repouso espiritual.

Haverá cirurgião, bastante feliz, que em todo seu tirocinio não tenha tido ocasião de observar fato identico a este? Não creio; as estatisticas mundiais estão cheias deles, e bom seria que, mesmo após uma serie desesperadora de recedivas, todos os casos se curassem e que outras complicações, como a osteomielite do osso frontal, os abcessos do cerebro e as meningites consécutivas, não viessem, em muitos, sombrear, ainda mais, o quadro descrito.

Não quero dizer com isto que a norma das intervenções cirurgicas, sobre os seios frontais pela via externa seja, invariavelmente, a que ficou dita. Felizmente não é assim, pois que grande, grandissimo mesmo, é o numero dos casos que se curam com uma só intervenção e que, estes sim, compensam, em parte, os desgostos causados por alguns. Esta compensação, porém, não satisfaz ao espirito do especialista, consciente de sua relativa fraqueza no combate da afecção, pois que o prazer causado por um resultado brilhante, vem ás vezes juntar-se o esmorecimento produzido por uma serie má.

A cirurgia radical das sinusites frontais cronicas causa, pois, decepções, entre mãos as mais amestradas e, ainda maiores, quando não fôr correntío o habito de manejar uma tecnica que exige destreza e conhecimento profundo de seus detalhes. A' esta cirurgia insidiosa, em seus resultados, muitos dos quais desconhecidos por terminar em outras mãos, vamos dedicar um pouco de atenção, no desenvolver da palestra que, agora, iniciamos.

Falando á especialistas, cada qual mais dedicado aos problemas magnos do ramo da cirurgia que professam, julgo-me dispensado de entrar em descrições anatomicas exaustivas dos seios frontais e de suas relações com as outras cavidades vizinhas: celulas etmoidais, seios esfenodais, orbita e seu conteúdo, o globo ocular e anexos, fossa craneana anterior e os lobos cerebrais nela contidos, cavidade nasal, etc. Contento-me em dizer da variabilidade, em tamanho, em todos os sentidos, destas cavidades para-nasais, podendo ir de sua completa ausencia, até extensões anormais, alcançando mesmo todo o osso frontal e, mais ainda, os ossos parietais; anomalias em profundidade tambem podem existir, penetrando os diverticulos dos seios frontais, pelas paredes superior e externa da orbita até transpôr, mesmo, a crista orbitaria externa. Diverticulos de todos os formatos, tamanhos e grandezas, poderão ser observados em todas as direções. Só por este ligeiro esboço anatomico, já se deduz das dificuldades existentes na remoção cirurgica de afecções cronicamente assestadas nestas cavidades.

Aos dados anatomicos, apenas esboçados, tendo em mira a cirurgia propria dos seios frontais, não se póde deixar de mencionar que cada uma das cavidades do frontal tem a forma, aproximada, de uma piramide de três faces: externa, recoberta dos tegumentos que revestem a fronte, interna, que recobre as meningeas e o cerebro e a inferior que a separa da orbita, de que constitue o técto. Esta cavidade, normalmente, está inclusa no interior do osso frontal. Os seios frontais comunicam-se com o exterior, pela cavidade nasal, por intermedio do canal naso-frontal que, em seu caminho para o nariz, apresenta-se, quasi sempre, de fôrma tortuosa e envolvido de celulas etmoidais, em todo seu trajeto, quasi todos do grupo anterior.

O seio frontal direito separa-se do esquerdo por um septo osseo, intermediario, que os isola, por completo, em duas cavidades, ás vezes iguais e quasi sempre desiguais. Um dos seios póde faltar e o outro póde ser grande ou pequeno ou, tambem, não existir. O canal naso-frontal está, quasi sempre, colocado num plano anterior á extremidade mais anterior da lamina crivada, podendo esta, no entanto, raras vezes, projetar-se bem para frente, alcançando o nivel da parte posterior do soalho do seio frontal.

As paredes internas, desses seios, são atapetadas por uma membrana mucosa que reveste todos seus menores diverticulos e continúa, com a do interior do nariz, através do canal naso-frontal.

Esta disgrecão ligeira sobre a anatomia cirurgica dos seios frontais, terá em breve, aplicação util e, mais uma vez o repito, foi feita, tão sómente para focalisar alguns pontos que serão importantes na exposição de alguns processos cirurgicos.

A mucosa que reveste a cavidade nasal e, igualmente, a que recobre o interior das cavidades para-nasais têm, aproximadamente, a mesma constituição histologica. Tratarei "per summa capta", dos elementos assenciais desta membrana muco-periostica, e do como poderão ser vistos numa secção microscopica: "A superficie é composta de epitelio colunar ciliado, emiscuído de numerosas celulas secretorias de muco "globet" e outras não ciliadas. Todos estes elementos repousam sobre uma membrana basal cribriforme, através da qual passam celulas migradoras e tambem ductos glandulares que perfuram o epitelio em seu caminho, para a superficie, vindos da camada de tecido conjuntivo sub-adjacente. Este ultimo, que é denominado "tunica propria" ou "estroma", constitue uma estructura fibro-elastico frouxa, com tendencias a tornar-se denso ao aproximar-se do periosteo, que está intimamente ligado á capsula ossea subjacente.

No estroma, inumeras celulas existem espalhadas: mononucleares, histiocitos, linfocitos, de tecido conectivo e corpusculos de plasma. Nodulos linfaticos sempre existem neste tecido sub-epitelial. É fartamente irrigado, sobretudo ao nivel da membrana basal e do periosteo. É deste ultimo que as camadas internas da capsula ossea, recebem seu suplemento sanguineo e, por estas mesmas vias sanguineas uma infecção, partida da mucosa, poderá penetrar no tecido osseo. A mucosa do nariz difere da que foi descrita, sómente por ter mais espessura, mais vasos, sobretudo "lagos" venosos, controlados por fibras musculares presentes em algumas áreas e, além disto, por receber uma inervação mais rica do 2.º ramo do trigemeo e dos ganglios a ele associados".

No que concerne ás funções da mucosa nasal e, em menor grau, ás mucosas de suas cavidades anexas, já ha muito tempo se reconhece possuirem as propriedades de aquecer, humidecer e filtrar as impurezas do ar inspirado, antes que ele entre no delicado recesso dos alveolos pulmonares.

Em 1905, St. Clair Thomson e Hewlett provaram que as secreções da mucosa nasal normal tinham o poder de destruir ou, pelo menos, inibir o desenvolvimento dos micro-organismos inalados, com a condição de não ser o seu numero exageradamente grande ou de natureza particularmente virulenta.

Até onde alcançam, presentemente, os nossos conhecimentos, as mucosas de um seio anexo do nariz, gozam de três modos de defeza:

1 - De uma camada fina de muco que aprisiona os organismos extranhos, que a hajam invadido, tais como a poeira atmosferica, os micro-organismos, etc.

2 - Os cilios do epitelio que, incançavelmente, empurram o muco para fóra e através do "ostio" para dentro da cavidade nasal, da qual, pelo mesmo mecanismo, carregam a secreção para o naso-Faringe, donde passam para o estomago.

3 - Pelas secreções que se encaminham da superficie para os nodulos glandulares e outras celulas do estroma. Durante os ultimos cinco anos muitos estudos foram realizados sobre a defeza da mucosa", assim os de Ralph Fenton (da Universidade de Oregon), sob o titulo "Descobertas na patologia da mucosa nasal e aural", trabalho este feito em colaboração com o Prof. Larsell, da mesma escola. Menciono, aqui, tambem, o magnifico trabalho de Arthur Proetz (St. Louis) e o de Negus (Londres), que contêm referencia a varios problemas atinentes á sua atividade ciliar. Por duas razões são estes fatos mencionados: primeiro, porque eles explicam às manifestações inflamatorias das cavidades nasais e para-nasais. Segundo, porque me dão oportunidade para chamar a atenção dos colegas, para a atitude conservadora com que devemos atuar, cirurgicamente, sobre um mecanismo, tão delicado, de protecção e que, por sua estrutura e; função, atúa, por contra-choque, em outras regiões do organismo. Não se deve, pela intervenção cirurgica, remover mucosa normal que será substituida por tecido cicatricial, formação de crostas, e desconfortos subjectivos, que tornarão as condições do paciente ainda mais perturbadas que anteriormente.

O conhecimento do modo de agir deste orgão de revestimento poderá, estou certo, nos auxiliar sobremaneira no explicar o porque de certos insucessos operatorios nas cavidades acessorias do nariz e do nariz mesmo.

Quando das intervenções nas cavidades para-nasais, a cicatrização das mesmas se processa nos antros maxilares, nas celulas etmoidais e nos seios esfenodais, por intermedio de novo revestimento mucoso normal, vindo da cavidade nasal ou das cavidades vizinhas.

Os seios frontais, porém, de acôrdo com as experiencias de Anderson, Hilding, praticadas em cães, e confirmadas pela experiencia e observação clinica de Herbert-Tilley, pelas experiencias de Ssmoylenko, Kretschmann, e Uchermann, e dos especialistas que já tenham tido ocasião de reabrir uma cavidade já operada anteriormente, e não são poucos, constituem uma exceção á regra, pois que quando uma mucosa supurada fôr dele retirada, haverá tendencia á formação de faixas fibrosas cicatriciais, de tecido de granulação e de osso, não havendo regeneração completa da mucosa, com formação de nova membrana ciliada, mas sim enchimento da cavidade operada.

Procure cada um tirar a ilação a que nos conduz a observação deste fato, e poderá ter resposta imediata á interrogação que, insistentemente, nos fazemos a nós mesmos. Porque as intervenções cirurgicas praticadas nos seios frontais, muito embora a posição declive do seu "ostio", não apresentam os mesmos brilhantes resultados que as realizadas em outras cavidades para-nasais? A resposta está na fisiologia esdruxula com que cicatriza, diferentes da dos outros seios da face, a mucosa dos seios frontais. A fisiologia da cicatrização das mucosas, até agora inteiramente por fazer, pois que só ha poucos anos, os estudiosos iniciaram trabalhos no sentido de conhecê-la, sobretudo os norte-americanos, irá fornecer a chave da questão. Já os que labutam com os orgãos digestivos estão, como nós, convencidissimos de que, sem conhecimentos mais exátos de como cicatriza, fisiologicamente, uma mucosa, muitas intervenções terão que ser abandonadas e outras já abandonadas, poderão voltar a ser executadas, desde que se venha a conhecer, com exatidão, o modo porque reagem á cicatrização. Uma cavidade, como o seio frontal, que cicatriza por enchimento, só estará bem operada quando o menor resquicio da mucosa doente tiver sido retirado e, todos nós sabemos quais as dificuldades que se nos antolham, na pratica exáta deste conceito. Um nucleo insignificante, de mucosa doente, abandonado, inadvertidamente, em quálquer dos multiplos recessos, de que os frontais estão cheios, ficará, ali, aprisionado, pelo tecido cicatricial, dando a impressão, passageira, de uma cura real, de dias ou meses, até que os microbios, em camara fechada, exaltando sua virulencia, atacarão o tecido envolvente, de pequena resistencia, por cicatricial, e darão lugar á reações de defeza com formação concomitante de um abcesso que virá irromper á superficie, ocasionando a desagradavel recediva. E por ser assim é que grande numero de cirurgiões contentam-se com a ampla abertura destas cavidades, seguida de simples exerése do tecido mucoso doente, deixando, no lugar, toda mucosa aparentemente sã. Pensam estes que, assim, hajam diminuido a virulencia e a zona da infecção, e que o auxilio das lavagens fará terminar a supuração conservada pelo revestimento mucosa da cavidade antral, não retirado operatoriamente.

E, ainda, outros satisfazem-se com a drenagem nasal ampla executada, de inicio, com a pratica de uma simples perfuração na parede anterior, do frontal, por onde as lavagens, mais facilmente, serão praticadas.

Outros, não se importando com a estetica, e para evitar o inconveniente, de tecido doente retido, abatem, de vez, cirurgicamente, toda a parede anterior dos seios frontais, pois afirmam "ser melhor feiura sem doença que beleza doente". Outros mais, conservando a estetica facial, prolongam a intervenção para o lado nasal, enucleando o etmoide, afim de diminuir a probabilidade do terrível estreitamento do canal deixado e que os apavora.

Ultimamente novos processos foram lançados á circulação, uns deles não contente com a união das cavidades frontais, mesmo que uma delas seja sã, pela destruição do septo inter-sinusal, rebate, o mais possivel, a parte posterior do septo nasal, em sua lamina perpendicular, depois de removidos os soalhos sinuso-orbitario de ambos os lados. E tudo porque?

Pelo favor da oclusão rapida do enorme ducto, que a intervenção deixára, para garantia de uma bôa drenagem. Outro, evitando toda e qualquer deformação externa, mesmo cicatricial, pratica a operação sobre o seio frontal pela via externa, mas transvestibulo-subperiostal, isto é, pela via do vestibulo, onde a incisão inicial será feita, mas caminhando pela face externa do nariz subperiostalmente.

É o novo processo de Mathis, e o processo anterior é o de Lothrop modificado por Sebileau e de que mais tarde falarei. Este processo de Lothrop-Sebileau, não tem qualquer vizo de relação com o atual processo de resecção do estomago, nas ulceras da pequena curvatura e duodenais? Não é o pavor do desconhecido, quanto á fisiologia da cicatrização das mucosas, que obriga ao cirurgião á amplitude das resecções atuais? Dois fatos resaltam dessas considerações e são:

l.º - Uma limpeza perfeita do interior da cavidade sinusal deveria bastar, por si só, á cura da sinusite frontal cronica, sabido como está, que a fisiologia cicatricial desta cavidade se processa por enchimento, e não por revestimento com nova mucosa, como acontece ás outras cavidades anexas do nariz. Para que drenagem ampla, se o seio frontal vae se obturar com tecido fibroso?

2.º - A inutilidade da preoccupação de se praticar esta mesma drenagem, desde que uma garantia possa ser dada, pela perfeita limpeza cavitaria. E qual de nós poderá garantir que haja retirado todo o material infectado, que revestia a cavidade operatoria?

Nos antros pequenos, ainda seria possivel responder pela afirmativa, mas naqueles em que os prolongamentos se dirijam á todos os lados e em que pela sua largura, tamanho e profundidade não sejam acessiveis ao instrumental utilizado, como afirmar? Digo mesmo como deliberar? A drenagem terá que ser feita para desencargo de consciencía do cirurgião, que não poderá arriscar a possibilidade de uma anomalia de cicatrização, em que a natureza, justo naquele caso, se resolva a curá-lo pelo revestimento com nova mucosa, e não pelo enchimento com tecido fibroso conjuntivo que é regra. Aqui, como em tudo mais, o meio termo dos que só retiram a mucosa quando doente, e deram mesmo, as partes em que esta se apresentar macroscopicamente sã, parece ter sua aplicação. (Barany, Wagener).

Como se vê, neste assunto, só se pôde ter a ultima palavra; com experiencias em serie, em cada um dos sentidos: a) - operar sem drenagem, mas com limpeza cuidadosa do seio; b) - operar com drenagem a mais ampla possivel, mesmo depois de limpeza identica da cavidade antral; c)- operar procurando deixar, em seu lugar, a maior quantidade possivel de mucosa que se apresente sã, a olhos desarmados, intervenção esta seguida de tratamento conservador prolongado até secar, por completo, a secreção purulenta. No sentido do primeiro destes itens, os estudos de Ssamoylenko, Paulow (Zeitschr. f. Hals-, Nasen- u. Ohrenheilk., n.° 4 - Pag. 108), e Lange, praticados em gatos, são muito interessantes. "Praticaram uma janela na parede anterior do seio frontal, e por ela, retiraram, por completo, a mucosa. Em seguida as partes moles foram suturadas sobre a ferida ossea. Os animais em experiencia foram mortos, em épocas diferentes (de duas semanas até varios meses) e os preparados foram examinados macro e microscopicamente. Todos os autores chegaram ao mesmo resultado, e é que os seios operados cicatrizaram pelo enchimento das cavidades com tecido conjuntivo e osseo, sendo que Lange diz que as néo-formações provinham na parede interna e tinham origem no endosteo, ao passo que Ssamoylenko atribue-as ao tecido conjuntivo periostal.

Estas experiencias permitem concluir-se que, tambem para os homens, quando se retira, inteiramente, a mucosa do seio frontal, mesmo com a conservação de sua parede anterior, este se encherá, pelo menos em parte, com tecido conjuntivo endostal e tecido osseo. Baseado neste fato Ssamoylenko "não dá importancia alguma á ligação ampla do seio com a cavidade nasal, ao contrario pensa, de acôrdo com seus estudos, que a sinusite frontal supurada, tambem para o homem, póde curar-se, abertura e curetagem do antro, por preenchimento da Kretschmann já teve ocasião de aplicar este metodo, com felicidade.

Kretschmann e depois dele Uchermann baseados riencias de Ssamoylenko, sobre animais, instituiram um metodo operatorio que tem o mesmo principio da velha operação de

Ogston. Estes autores procuram curar a supuração do seio frontal, por meio de uma curetagem, minuciosa, da cavidade, praticada através de uma perfuração em sua parede anterior, deixando, em seguida, que ela se preencha com tecidos de néo-formação. Mas, para que este enchimento não seja perturbado, Kretschmann e Uchermann procuram fechar, o mais possivel, o ductus nasofrontalis.

Kretschmann apresenta resultados bons em oito casos operados, sendo que em dois outros casos teve abcessos orbitarios. Estes resultados, em casos tão poucos numerosos, é bem de ver, não modificam a orientação, até agora seguida, e que a prudencia nos aconselha, de se procurar manter a cavidade frontal o mais amplamente aberta para a cavidade nasal. Si as experiencias de Ssamoylenko e mesmo os resultados de Kretschmann e Uchermann representam um esforço, elas e eles, não deixam de contrariar a natureza, procurando isolar do exterior uma cavidade que para ele deve ser normalmente aberta.

Todos os outros processos operatorios preenchem o segundo item: "operar com drenagem, a mais ampla possivel, após limpeza minuciosa da cavidade sinusal". Jansen-Ritter, Killian, Kuhnt, Kuhnt-Taptas, etc. e mesmo os metodos endonasais de Halle, Schaeffer, Ingals, etc. e, ainda, o metodo de Lothrop, modificado por Sebileau que, de todos eles, como já tive ocasião de dizer, é o que mais amplamente comunica as cavidades frontais com a cavidade nasal. Da grandeza desta comunicação posso dar testemunho, com o resultados obtidos nos quatro casos que operei, ha tempos, por este metodo, e de que, com mais vagar, terei ocasião de falar nesta casa.

Assim sendo, cada qual fará o que a experiencia melhor lhe aconselhar e aplicará o metodo de sua simpatia, tendo sempre em mira, porém, que não raramente, uma lesão propriamente ossea poderá existir e ser a causa real das recedivas. Herbett Tilley, chama, com insistencia, a atenção dos especialistas para estes fócos de infecção, que podem dar origem a tantos desgostos, e que serão caracterizados por uma dôr local. A curetagem minuciosa, ou mesmo a extirpação total, até alcançar tecido são, será a norma a seguir quando, ao levantar-se a mucosa, uma gota de pús, ou, pús abundante, apareça, vindo do proprio tecido osseo. Diz este autor: "Se nenhuma evidencia de uma osteite sub-periostal puder ser descoberta durante a primeira intervenção e haja recidiva, uma infecção ossea deve existir e medidas cirurgicas deverão ser empregadas para removê-la, pois que as lavagens, as aplicações locais, as vacinas autogenas, terão tão pouco valor, que o dito popular tão conhecido "depois de uma operação de sinusite, sempre uma operação de sinusite", passará a ser uma verdade".

Ao lado das intervenções basicas pela via externa, Ogston, Luc, Kuhnt, Jansen-Ritter, para as cavidades pequenas, JansenRitter para os seios grandes, Riedel e Killian, vieram enxertar-se modificações, maiores ou menores, ou denominações diversas do mesmo metodo, atribuído a autor diferente, sobretudo em paizes diversos, o que constitue uma confusão insanavel e que cança, exageradamente, o espirito de quem deseja inteirar-se de todos os processos. Como já tive ocasião de dizer, o metodo cirurgião só terá valor de acôrdo com a maior ou menor habilidade com que o manejar o cirurgião, que o tenha que empregar. Não importa este ou aquele, o que se quer é que, bem executado, traga os beneficios esperados, tanto pelo cirurgião, quanto pelo paciente. Muito maior importancia tem a indicação operatoria dos seios frontais, pela via externa e neste ponto, a nossa especialidade prima pela diversidade de opiniões. Muito bem disse Hajeck, quando da conferencia no Congresso de Laringologia, em 1923: "Não existe uma indicação clara, de objetivo determinado, que reúna a maioria dos autores. Neste capitulo tudo é, ainda, confusão, nele estamos peior do que stavamos".Quando Killian lançou sua operação, pareceu, por algum tempo, que estava tudo resolvido, no referente á cura radical, pela via externa, das sinusites frontais; mais tarde, porém, verificou-se que, tambem, a operação de Killian, se por um lado apresentava vantagens, por outro tinha desvantagens e não podia constituir uma intervenção, como parecia, indicada para todas as inflamações cronicas dos seios frontais.

E já conhecida a conclusão, a que chegaram as discussões deste têma, no Congresso de Bad Kissingen, em 1923, e é que não se possue uma operação ideal, para todos os casos de sinusites frontais cronicas, mas que cada caso deverá ser tratado individualmente. Muitas causas orientarão o cirurgião de determinada modo, assim: as condições anatomicas, a anamnése, a posição social, o sexo, etc. de cada paciente e, deste modo, esta ou aquela intervenção será a escolhida. Killian, Jansen-Ritter, Lothrop-Sebileau, e mesmo as intervenções por via endonasal, tipo Halle, cada uma á sua vez terá a preferencia.

Um fáto, porém, é admitido por todos os autores e, nisto, fazem unidade, e é que, até agora, não existe operação. alguma, que, com certeza absoluta, cure toda e qualquer inflamação cronica dos seios frontais". Basta a preoccupação pelo resultado cosmetico da intervenção, para que a escolha de um metodo mais radical, e que poderia produzir cura positiva, não seja feita, e a consequencia, já sabida, será, provavelmente, a recediva do mal.

Nestes casos a parte cosmetica será salva, mas a doença permanecerá.

Se Hajeck, em 1907 com "um material aproximado de 7 a 8.000 casos, só encontrou necessitados de uma intenvenção nos seios frontais, pela via externa, 5 ou 7 casos, outros autores, com numero muito menor, quasi que com a terça parte de sinusites frontais cronicas, praticaram duas ou três vezes mais operações radicais".

Hoje continúa-se na mesma, muito embora o tratamento cirurgico não pareça contentar, completamente, a todos os especialistas, e que estes só se resolvem a operar quando um tratamento conservador intenso não tenha produzido melhora alguma ao paciente. A indicação da intervenção radical, estará "ipso facto", feita quando de uma complicação, tal como a ruptura de um empiema na orbita, uma complicação intra-craneana, fistula na parede externa, e quando, depois do tratamento conservador, por varias semanas, não se conseguiu melhorar e o paciente continuar a sofrer. Estes são aqueles casos em que se tentou, pela via nasal interna, todos os meios para a manutenção de bôa drenagem, e mesmo assim, as dôres de cabeça, o mal estar e o máo cheiro permaneceram, mesmo com o emprego de lavagens da cavidade. Tambem nos casos em que o pús permaneça abundante, sem sinal algum de modificações; e o paciente esteja grandemente incomodado com a deficiencia da respiração nasal, ou manifeste desejo de ser operado pela via externa, a operação deverá ser feita.

Para que se possa obter um bom resultado terapeutico com a cirurgia dos seios frontais, pela via externa, a parte cosemtica deverá, sempre, ser considerada. Um resultado completo e seguro só se terá quando da ampla abertura da cavidade sinusal e limpeza meticulosa de todas suas anfractuosidades, com a retirada cuidadosa de toda sua mucosa de revestimento, trazendo, como consequencia, sua cicatrização por enchimento, isto é, obliterando-a.

Só a operação de Riedel preenche estes requisitos, mas, infelizmente, a parte cosmetica é desastrosa, a menos que as cavidades dos seios sejam extraordinariamente pequenas.

Com o fito de se minorar este desastre da estetica, outros metodos, tais como o de Jansen-Ritter, que se contenta com a retirada do soalho do seio frontal e de toda a parede orbitaria, facilitando, igualmente, a abertura das cavidades etmoidais, o metodo de Killian, que só conserva uma parte restrita da parede anterior, "a ponte", que ficará situada justamente no lugar em que a depressão poderia perturbar mais a estetica facial, o metodo de Halle, pela via endónasal, ao qual sómente nos referimos por não se tratar -do nosso têma, o de Lothrop-Sebileau, que mais parece uma modificação do de Jansen-Ritter que ao envez de ser praticado de um só lado, o será de ambos, juntando-se a isto a destruição do tabique inter-sinusal, já praticado, tambem, por outros, e a resecção da parte superior da lamina perpendicular, adeante da lamina crivada e que melhorará, grandemente, o escoamento dos seios frontais, favorecendo a cura rapida destas cavidades.

A luta tem sido grande, numerosos os soldados nela empenhados, muita vitoria tem sido obtida sem sacrificio da estetica, muita vida tem sido salva, mesmo com a perda da beleza, e a batalha continúa para obtenção do ideal que, com certeza, a fisiologia e a bioquimica nos mostrarão, em breve, com a luz intensa que virá de seus laboratorios.

Até lá a consciencia de cada um de nós, como apostolos do bem, deverá guiar as nossas mãos e os nossos átos, na solução dos casos que se nos deparem. "Primo non nocere".


(1) Conferencia feita na S-cção de Oto-rino-laringología da Associação Paulista de Medicina,em 17 de Maio de 1935.

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