Versão Inglês

Ano:  1981  Vol. 47   Ed. 2  - Maio - Agosto - ()

Seção: Artigos Originais

Páginas: 122 a 126

 

ACTINOMICOSE DAS AMIGDALAS PALATINAS VALOR DO EXAME HISTOPATOLÓGICO DE ROTINA

Autor(es): * Luiza H. Endo
** Mirian A. S. Trevisan
*** Levi S. Horn

Resumo:
Os autores apresentam três casos de actinomicose amigdaliana que foram achados de exames anátomo-patológicos realizados de rotina. É salientada a importância desse diagnóstico e a necessidade do exame microscópico de todas as amígdalas retiradas cirurgicamente.

Ano após ano, milhares de amigdalectomias são realizadas e destas, apenas uma ínfima parcela é estudada histologicamente.

É de consenso geral que, quando um tecido se apresenta suficientemente alterado para ter indicada sua remoção, tal conduta deve ser seguida de um exame anátomo-patológico (9). Infelizmente, não é o que acontece com a maioria das amígdalas extirpadas, resultando uma deficiência no conhecimento da estrutura microscópica normal e patológica do órgão (5) e na sua avaliação funcional; o diagnóstico clínico que serviu de base para a avaliação cirúrgica não é confirmado; processos específicos e mesmo patologias assintomáticas não são detectados.

Em 1965, Weibel (11) publicou um bom artigo sobre achados patológicos de valor clínico nas amígdalas e adenóides, fazendo inclusive uma atualização bibliográfica. Dentre os trabalhos mais importantes citados, temos: Urbantschitsch (1936) encontrou em 446 amígdalas palatinas examinadas 5 com granulomas de células epitelióides interpretados como sendo de origem tuberculosa; Starry (1939) relatou 7 casos de tuberculose, 5 de lues, 1 de linfossarcoma e 1 de carcinoma dentre 8.538 amígdalas estudadas microscopicamente; Kjolhede (1944) e Mathiesen (1948) salientaram a importância do exame desse tecido linfóide para o diagnóstico de tuberculose em pacientes assintomáticos bem como para a eventual detecção de tumores malignos. 0 próprio Weibel teve 3 casos compatíveis com tuberculose dentre as amigdalectomias feitas em 4680 pacientes.

A finalidade deste trabalho é apresentar 3 casos de actinomicose cujo diagnóstico foi apenas um achado histológico em 50 amigdalectomias consecutivas e analisar o valor desse resultado.

MATERIAL E MÉTODOS:

Cinquenta pacientes de ambos os sexos foram submetidos a amigdalectomias no Departamento de ORL da Faculdade de Ciências Médicas da UNICAMP. Suas idades variaram de 2 a 30 anos. A indicação de cirurgia se baseou na história clínica de surtos de amigdalites freqüentes e na hipertrofia do órgão causando obstrução mecânica.

As peças cirúrgicas foram colocadas em formol a 10% e enviadas para estudo do Departamento de Anatomia Patológica da Faculdade de Ciências Médicas da UNICAMP. Aqui, fragmentos representativos foram incluídos em parafina e os cortes dos mesmos foram corados por hematoxilina eosina. Os casos contendo material semelhante a grãos actinomicóticos nas criptas foram também corados pela técnica de Grocott e pelo Gram.

Os critérios histológicos para o diagnóstico dos processos inflamatórios na amígdala foram os seguintes (4):

- Amigdalite aguda: epitélio das criptas muito irregular, invadido por leucócitos neutrófilos, erosado e recoberto por fibrina em áreas, hiperemia dífusa.

- Amigdalite crónica: infiltração sub-epitelial por plasmócitos, invasão do epitélio no fundo das criptas por plasmócitos e linfócitos, acúmulo de células descamadas nas criptas, hiperplasia do tecido linfóide e ocasional fibrose.

- Amigdalite crônica em surto agudo: tem as características da crónica porém observam-se no epitélio das criptas e sobre ele vários leucócitos neutrófilos, ocasional erosão.

- Amigdalite crônica com surto agudo em remissão: observam-se pequenas áreas com vários leucócitos neutrófilos dentro de criptas, o epitélio das mesmas estando pouco alterado. As características de atividade inflamatória atual são bem menos marcadas que no tipo anterior.

TABELA I

Diagnóstico Histopatológico / n.º

Amigdalite aguda - 2
Amigdalite crónica - 15
Amigdalite crônica em surto agudo - 21
Amigdalite crônica com surto agudo em remissão - 13
Total - 50


RESULTADOS:

Nossos resultados podem ser resumidos na tabela 1, onde temos os diagnósticos histopatológicos encontrados. A distribuição desses diagnósticos por faixas etárias encontra-se no gráfico I.







Constatamos três casos de actinomicose dentre as amigdalites crônicas em surto agudo (Gráfico I). Um deles está representado na fig. 1, em coloração pela hematoxilina-eosina. Na fig. 2, após a impregnação argêntica do corte, evidencia-se o micélio ne margem do grânulo.

Mais dois casos apresentaram ao HE material nas criptas semelhante ao grânulo actinomicótico, mas as colorações especiais não confirmaram esse diagnóstico.

DISCUSSÃO:

Foi com surpresa que observamos que quase metade das 50 amigdalectomias se apresentavam num surto agudo de inflamação ao exame microscópico. Este foi um resultado interessante porque a cirurgia só é feita quando o paciente não apresenta sinais clínicos de inflamação atual.

Por isso, num próximo trabalho, iremos reavaliar a conceituação dos processos inflamatórios da amígdala, estipulando critérios mais adequados para o exame microscópico do órgão. Também tentaremos graduar o estado funcional dos centros germinativos.

Outro resultado importante foi a detecção de 3 casos de actinomicose, todos encontrados dentre as amigdalites crônicas em surto agudo. É de se notar que, embora o grânulo actinomicótico seja considerado saprófita na amígdala, não é habitual o encontro do mesmo. Em nosso material sua freqüência foi de 6%. 6%.

A distribuição dos casos por faixas etárias não mostrou característica especial.

A maioria dos autores concorda que os casos humanos de actinomicose são causados pelo A. israelli (2,10). Este é um fungo anaeróbio, gram positivo, não ácido-resistente e que adquire cor castanho-escura ao ser impregnado pela prata. Os grânulos aparecem como corpos lobulados compostos de hifas delicadas entrelaçadas que se irradiam em direção à periferia; a porção central é amorfa (2). Podem ser isolados da flora normal da cavidade oral e das criptas amigdalianas (2).



Fig. 1: (B. 1848176) - Grânulo actinomicótico em cripta amigdaliana. Inset: detalhe do aspecto irradiado dos filamentos na margem do grânulo (seta). (HE, x 40; inset: HE, x 160).



Fig. 2: (B. 3024179) - Impregnação argéntica de um grânulo actinomicótico. Ao redor observam-se restos celulares e acima pequeno trecho do epitélio de revestimento. (Grocott, x 40).



A actinomicose humana pode se apresentar sob três formas: cérvico-facial, torácica e abdominal (2,3,6,7,8). Mais da metade dos casos publicados são-da forma - cérvico-facial, que pode ter sua origem em focos dentários ou de lesões da cavidade oral, incluindo as amígdalas (2,7). Garlopeaux (1) descreveu um caso de faringo-amigdalite aguda que evoluiu para actinomicose cérvico-facial. Entretanto, se o referido fungo pode ser o causador de algumas amigdalites ainda não está estabelecido.

Pelo acima exposto achamos importante o exame anátomo-patológico de todas as amígdalas extirpadas, o que vai permitir uma avaliação funcional do órgão e a detecção de processos benignos ou malignos não suspeitados clinicamente. É também importante o diagnóstico da actinomicose, pois a amígdala retirada pode ter sido um foco disseminador da doença.

Cabe salientar que não sabemos se a actinomicose amigdaliana tem alguma característica clínica especial. Para Romitan (6) ela apresentaria um quadro clínico de angina simples.

BIBLIOGRAFIA

1. Garlopeaux, F. Progress de Ia microbiologie, de Ia clinique et de Ia therapeutique des syndromes actinomycosques bucco-faciaux. Rev. Fr. Odontostomatol. (Paris) 4: 509-524, 1968.

2. Guidry, D. J. Actinomycosis, in: Baker, R.D., The pathologic anatomy of mycoses, Berlin Heidelberg, Springer-Verlag, 1971, pg. 1019.

3. Jawetz, E.; Melnick, J. L. and Adelberg, E. A. Micologia médica, in: Microbiologia Médica, 10' ed. (tradá, Rio de Janeiro, GuanabaraKoogan, 1974, pg. 242.

4. de Faria, J. Lopes. Anatomia Patológica, vol. II, Rio de Janeiro, Guanabara-Koogan, 1975, pg. 240.

5. Lotter, A. M. and Allen, G. W. Bacteriological study of the excised tonsils. Surg. Forum 23.: 487488, 1972.

6. Robbins, S. L. Patologia Estrutural e funcional, Rio de Janeiro, Interamericana, 1975, pg. 400.

7. Romitan, E.; Romitan, R. et Bacleng, S. Actinomycose cervico-faciale d'origene amydaliene. Ann. Oto laryngol. (Paris) 87.- 481482, 1970.

8. Stenhouse, B.D.S.; McDonald, D.G. et al. Cervico-facial and intraoral actinomycosis. A 5 year retrospective study. Br. J. Oral Surg. 13: 172-182, 1975.

9. Yarington, C.T.; Smith, G.S. and Benzmiller, J. A. Value of histological examination of tonsils Arch. Otolaryngol. 85: 124125, 1967.

10. Weed, L. A. and Bagenstoss, A. H. Actinomycosis: a pathological and bacteriological study of 21 fatal cases. Am. J. Clin Path 19: 201-216,1949.

11. Weibel, E. Pathological findings of clinical value in tonsils and adenoid Acta Otolaryngol 60: 331-338, 1965.




* Prof. Assist. do Depto. GRL da Faculdade de Ciências Médicas da UNICAMP.
** Prof. Assist. do Depto. de Anatomia Patológica da Faculdade de Ciências Médicas da UNICAMP.
**" Residente do Depto. de ORL da Faculdade de Ciências Médicas da UNICAMP.

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