Versão Inglês

Ano:  2001  Vol. 67   Ed. 2  - Março - Abril - ()

Seção: Artigos Originais

Páginas: 142 a 146

 

Eficácia do Tratamento Cirúrgico da Otite Média Crônica Colesteatomatosa.

Efficacy of Surgical Treatment of the Chronic Otitis Media with Cholesteatoma.

Autor(es): Oswaldo L. M. Cruz*,
Cristiane A. Kasse**,
Fernando D. Leonhardt***.

Palavras-chave: otite média crônica, colesteatoma, mastoidectomia aberta, mastoidectomia fechada

Keywords: chronic otitis media, cholesteatoma, mastoidectomy, canal wall down technique, canal wall up technique

Resumo:
Objetivo: Avaliação dos resultados da mastoidectomia, em técnica fechada e técnica aberta, na otite média crônica colesteatomatosa (OMCC). Formado estudo: avaliação retrospectiva de prontuários. Material e método: Foram avaliados dados clínicos e audiométricos de 36 pacientes (39 orelhas) submetidos a tratamento cirúrgico para OMCC, divididos em dois grupos: mastoidectomia técnica fechada, com timpanoplastia em 16 casos (41,02%), e técnica aberta, com reconstrução funcional, em 23 (58,98%), com um acompanhamento mínimo de 18 meses. Resultados: A taxa de recidiva do colesteatoma ficou em 6,25% (N=1) na técnica fechada; e em 4,34% (N=1), na técnica aberta. A taxa de orelhas secas foi de 75,0% (N=12) na técnica fechada; e de 78,26% (N=18) na técnica aberta. O resultado funcional da audição apresentou pequenas diferenças entre os dois grupos. O nível do SRT pré-operatório manteve-se preservado nos pacientes submetidos à técnica fechada, enquanto que houve uma discreta piora (4 dB) da média do SRT pós-operatório nos pacientes submetidos à técnica aberta. Conclusão: As mastoidectomias, técnica aberta e fechada, conseguem alcançar uma taxa satisfatória de orelhas secas, desde que a indicação cirúrgica esteja adequada para cada técnica. O grupo em técnica fechada apresentou maior recorrência do colesteatoma (12,5%), quando em comparação com o grupo em técnica aberta (4,34%). Obteve-se resultado funcional discretamente melhor nos casos submetidos à técnica fechada.

Abstract:
Objective: Evaluate the results of surgical treatment for chronic otitis media with cholesteatoma. Canal wall down and intac canal wall procedure with tympanoplasty was performed. Study design: Retrospective chart review. Material and method: Data were analyzed from 36 patients (39 ears) available for clinical and audiometric studies with a minimum follow-up of 18 months. Sixteen cases (41,02%) underwent intact canal wall surgery with tympanoplasty, and 58,98% (N=23) underwent canal wall down surgery with reconstruction of the conductive system. Results: The recurrence rate of cholesteatoma was 12,5% (N=2) on intact canal wall procedure and 4,34% (N=1) on canal wall down. A safe and dry middle ear was achieved in 75,0% (N=12) of intact canal wall procedure and in 78,26% (N=18) of canal wall procedure. Regarding the functional hearing results, the intact canal wall group maintained the same level of pre-operative SRT. A slight increase on post-operative SRT level was observed on the canal wall down group (4 dB). Conclusion: For patients with cholesteatomatous chronic otitis media either intact canal wall mastoidectomy with tympanoplasty or canal wall down with reconstruction of conductive system showed satisfactory results regarding the control of the cholesteatoma, once observing strict criteria for the indication of each technique. Better functional results could be expected with intact canal wall procedures.

INTRODUÇÃO

Colesteatoma foi o termo inicialmente utilizado pelo anatomista alemão Johannes Müller, em 1838, para descrever um tumor perolado, lamelado e formado por gordura, contendo cristais de colesterol dispersos entre células poliédricas. Posteriormente, Friedmann8 definiu-o como uma alteração de estrutura cística, revestida por epitélio escamoso estratificado, repousando sobre um estroma fibroso de espessura variável, que poderia conter elementos do forro mucoso original. Schuknecht14 descreveu-o como um acúmulo de queratina esfoliada dentro da orelha média, ou de qualquer área pneumatizada do osso temporal, nascendo a partir de um epitélio escamoso queratinizado.

O melhor conhecimento de sua estrutura histopatológica fez com que a nomenclatura do colesteatoma fosse questionada do ponto de vista etimológico: não apresenta, verdadeiramente, cristais de colesterol (cole-) na sua intimidade, não contém gordura (-stea-) e sua natureza tumoral é discutível (-oma). O nome menos contestado, mas raramente utilizado, é o de queratoma introduzido por Schuknecht14. Ainda do ponto de vista histopatológico, o colesteatoma associado à otite crônica pode ser definido como uma lesão destrutiva, contendo fibroblastos, queratinócitos e células inflamatórias, acometendo a caixa do tímpano, processo mastoídeo ou ambos6.

Em relação à sua origem, os çolesteatomas podem ser classificados em duas categorias: congênitos e adquiridos. Os colesteatomas congênitos são definidos, segundo Derlacki e Clemis5, como restos de tecidos epiteliais atrás de uma membrana timpânica intacta e sem história de infecções pregressas. Levenson e colaboradores10 alteraram essa definição ao admitir a origem congênita em alguns casos selecionados com história positiva para a presença de otites. De qualquer forma, são formados a partir de restos epiteliais deixados na fenda auditiva por alterações do desenvolvimento embrionário. Outras regiões do osso temporal também podem abrigar os colesteatomas congênitos.

Os colesteatomas adquiridos costumam ser divididos em dois subgrupos: os primários, desenvolvendo-se a partir de retrações da membrana timpânica,sem associação obrigatória com infecções de repetição, mas com eventuais surtos infecciosos do próprio saco colesteatomatoso; e os secundários, formados a partir da migração do epitélio do conduto auditivo externo, através de perfurações marginais da membrana timpânica causadas por infecção crônica da orelha média, ou a partir de metaplasia escamosa do epitélio respiratório da fenda auditiva induzida por inflamação crônica.

O quadro clínico da otite média crônica colesteatomatosa depende da extensão e do aspecto etiológico da doença. Nos casos de lesão oriunda de retração timpânica,podem permanecer despercebidas por longo período de tempo, até se tornarem mais extensas e sintomáticas. Nos colesteatomas secundários, os surtos infecciosos repetidos são preponderantes. Uma vez estabelecidos, promovem com freqüência perda auditiva e otorréia. Eventualmente, complicações intratemporais ou intracranianas podem ocorrer e se associam a otalgia, vertigem, perda auditiva neurossensorial e cefaléia.

A otorréia, geralmente, não é abundante, mas fétida e refratária ao tratamento. A perda auditiva está quase sempre presente ao diagnóstico, sendo diretamente relacionada com o grau de destruição da cadeia timpanossicular e acometimento labiríntico. Entretanto, a própria massa colesteatomatosa pode servir como elemento de condução sonora, mascarando a destruição ossicular. O sangramento, sintoma relativamente comum, pode ocorrer a partir de tecidos de granulação que preenchem a orelha média ou se exteriorizam no conduto auditivo externo (CAE), na forma de pólipos. A otalgia não é muito freqüente; mas, quando presente, pode representar reativação de um colesteatoma estável, infecção da pele do ÇAE ou presença de complicações como mastoidite e abscesso extradural. A vertigem e perda neurossensorial podem se originar de uma fístula labiríntica por erosão do labirinto ósseo, ou por passagem de toxinas da orelha média à orelha interna, proporcionando labirintite serosa. A cefaléia súbita em paciente com otite média crônica colesteatomatosa em atividade pode revelar complicações intracranianas.

O tratamento mais eficiente da otite média colesteatomatosa (OMCC) é cirúrgico, através da mastoidectomia. Desde há dois séculos, esse procedimento vinha tendo o objetivo de erradicar a doença, sem se preocupar com a parte funcional da orelha média. A mastoidectomia radical, termo introduzido por Von Bergman20 em 1889, tinha como preceito a limpeza total da mastóide, incluindo a derrubada das paredes ósseas posterior e superior do CAE, sempre com a preocupação de erradicar a doença e exteriorizar a cavidade timpânica e mastoídeo, permitindo o controle visual direto de eventuais recorrências e manipulação da cavidade. A padronização desta técnica foi proposta por Zaufa122 e Stacke16. A preocupação com a audição surgiu no final do século 19 e início do século 20, e fez com que surgissem modificações na mastoidectoinia radical clássica. Inicialmente propostas por Jansen em 18932, consolidaram-se em 1910, após a publicação de Bondy1 descrevendo a preservação da parte tensa da membrana timpânica e da cadeia ossicular, permitindo resultado funcional satisfatório. No início da década de 50 surge, com Wüllstein21 e Zöllner23, a introdução da timpanoplastia para reconstrução do sistema timpanossicular, mesmo em casos de otites crônicas. No final da década de 50, a House Ear Clinic, em Los Angeles, começa a empregar a mastoidectomia com preservação da parede posterior do CAE, técnica fechada, no tratamento da OMCC, iniciando uma discussão quanto à eficiência da técnica aberta e fechada que se mantém até hoje. Acreditamos que isto se deva ao fato de que a escolha da técnica cirúrgica para o tratamento da OMCC baseia-se em critérios complexos. Não existe, na verdade, um consenso quanto à melhor técnica operatória. Leva-se em consideração a extensão do colesteatoma, as condições da mucosa da orelha média, da membrana timpânica, da cadeia ossicular, a função da tuba auditiva e o estado funcional da orelha interna.

Por todas essas razões, achamos sempre oportuna a revisão de resultados por aqueles que se dedicam ao tratamento desta complexa entidade, com o intuito de contribuir para a definição da melhor estratégia terapêutica.

O objetivo foi avaliar os resultados da mastoidectomia técnica fechada e aberta em 39 casos de OMCC, através de análise retrospectiva.

MATERIAL E MÉTODO

Foram utilizadas, nesse estudo, 39 orelhas (36 pacientes) submetidas a mastoidectomia técnica aberta e fechada, durante o período de 1990 a 99. As cirurgias foram realizadas pelo mesmo cirurgião, obedecendo sempre a mesma padronização e os mesmos critérios de seleção para uma ou outra técnica. A indicação para técnica fechada foi feita nos casos de colesteatoma restritos ao ático e aditus ad atrum, preferencialmente encapsulados, com boas condições do restante da mucosa da orelha média e do óstio timpânico da tuba auditiva. Nos colesteatomas que se estendiam para além do aditus, com envolvimento do recesso supra tubáreo, extenso acometimento do recesso do facial e seio timpânico, associados à má condição do restante da mucosa da orelha média com importante quantidade de tecido de granulação e ou granuloma de colesterol, e tuba auditiva não funcional, optou-se sempre pela técnica aberta. Todos os pacientes já operados anteriormente em outros Serviços, com recidiva do colesteatoma ou complicações, foram selecionados para técnica aberta. As técnicas cirúrgicas empregadas foram detalhadamente apresentadas anteriormente4. Em todos os casos optou-se por realizar o tempo funcional, tanto na técnica aberta quanto na fechada, sempre que indicado, na primeira cirurgia.
Dos 39 casos incluídos, 35,89% (N=14) eram do sexo feminino; e 64,11%,(N=25), do sexo masculino. A faixa etária variou de 2,5 a 67 anos, sendo constituída de 41,02% de crianças (idade até 12 anos; N=16); e 58,98% (N=23), de adultos, com a idade média de 24,8 anos. O tempo decorrido entre o diagnóstico clínico e a cirurgia variou de um mês a 30 anos, com a média de 6,16 anos.

Desses casos, 30,76% (N=12) haviam sido operados previamente em outros Serviços, sendo: 8,33% (N=1) com tubos de ventilação de curta duração, 8,33% (N=1) com timpanoplastias e 83,33% (N=10) com mastoidectomias. Desses, 40% (N=4) haviam sido operados mais de uma vez - um caso com quatro cirurgias prévias, o restante com duas cirurgias anteriores.

Os pacientes foram separados em dois grupos distintos - um, submetido à mastoidectomia técnica fechada, com 41,02% (N=16) dos casos; e outro, submetido à mastoidectomia técnica aberta, com 58,98% (N=23) dos casos. O acompanhamento ocorreu por um período mínimo de 18 meses e até 10 anos. Observou-se a recorrência da doença, recidiva do colesteatoma, complicações, resultado funcional, o limiar de percepção de fala (SRT), pré e pós-operatório, e necessidade de novas intervenções cirúrgicas para um e outro grupo.

RESULTADOS

Quando analisados independentemente da técnica utilizada, os 39 casos operados não apresentaram alteração significativa quanto ao resultado funcional, comparando-se os SRTs pré e pós-operatório. Os níveis do SRT pré-operatório variaram entre 15 e 70 dB, com média de 41,36 dB; e, no pós-operatório, entre 5 e 85 dB, com média de 45,69 dB. O SRT pós-operatório foi menor ou igual a 30 dBs em 25,64% (N=10) e maior que 30 dBs em 74,36% (N=29) dos casos.

Quando analisados separadamente: o grupo de pacientes submetidos a técnica aberta apresentou média do SRT pré-operatório de 50,41 dB; e pós-operatória, de 54,47 dB, enquanto que no grupo submetido a técnica fechada esta média foi de 30,5 dB e 29 dB, respectivamente.

No total, as complicações pós-operatórias mais comuns foram: tecido de granulação em 23,07% (N=9) dos casos, com resolução espontânea ou necessitando de cauterização realizada ambulatorialmente; retração do enxerto da membrana timpânica em 12,82% (N=5); perfuração final em membrana timpânica com orelha seca em 5,12% (N=2); deiscência do tegmen timpânico em 2,56% (N=1); estenose discreta do terço externo do CAE em 2,56% (N=1); abscesso mastoídeo em 2,56%(N=1); trauma acústico, com perda neurossensorial principalmente em agudos (4,6 e 8 kHz) em 5,12% (N=2) dos casos.

As complicações mais freqüentes nos pacientes com a técnica aberta foram: tecido de granulação em 30,4% (N=7), controlados clinicamente em 21,7% (N=5) e 8,69% (N=2), necessitando revisão por granulação relacionada a granuloma de corpo estranho a hidroxiapatita; retração do enxerto em 8,69% (N=2); perda neurossensorial em agudos em 8,69% (N=2); deiscência do tegumento timpânico em 4,34% (N=1); estreitamento da contra abertura em 4,34% (N=1); perfuração do retalho de membrana timpânica em 4,34% (N=1).

Na técnica fechada foram: retração do enxerto em 18,75% (N=3); recidiva do colesteatoma em 12,5% (N=2), sendo um após nove anos da cirurgia e apresentando-se como abcesso mastoídeo; eczema de conduto externo em 6,25% (N=1); tecido de granulação em 6,25% (N=1), controlado ambulatorialmente; perfuração timpânica em 6,25% (N=1); estreitamento do 1/3 externo do CAE em 6,25% (N=1).

Necessitaram de uma nova cirurgia 26,08% dos casos submetidos à técnica aberta (N=6) e 37,5% (N=6) dos casos submetidos à técnica fechada. Os achados cirúrgicos dessas reintervenções foram, no primeiro grupo, granuloma por hidroxiapatita em dois casos, deiscência do tegmen timpânico em um caso, recidivado colesteatoma em um caso, estreitamento da contra abertura em um caso, perfuração do enxerto em um caso. Na técnica fechada foram processo inflamatório crônico não colesteatomatoso em um caso, granuloma por hidroxiapatita em um caso, recidiva do colesteatoma em dois casos, sendo um caso com abscesso mastoídeo com recidiva da doença após nove anos de controle, perfuração timpânica em um caso e revisão por rolha cicatricial no 1/3 externo do CAE após um ano da cirurgia.

Em relação à erradicação da doença, ela foi conseguida em 95,65% (N=22) dos casos submetidos à técnica aberta e em 87,5%(N=14) dos casos submetidos à técnica fechada, na primeira intervenção. A doença foi erradicada em todos os casos após a reintervenção.

DISCUSSÃO

O tratamento das otites médias crônicas colesteatomatosas é primariamente cirúrgico e tem como objetivo a erradicação de todo o tecido doente, promovendo uma orelha média seca e segura, isto é: livre de infecções e complicações. Entretanto, é sempre descrita a necessidade de um acompanhamento atento e prolongado pós-operatório, devido à taxa significante de recidiva da doença. A manutenção ou restauração da audição são consideradas metas secundárias; mas, obrigatoriamente, ponderadas sempre na escolha da técnica cirúrgica. Com o refinamento dos resultados quanto à erradicação do colesteatoma, a recuperação da audição passou a ocupar lugar de destaque na avaliação final dos resultados cirúrgicos.

Assim, as abordagens cirúrgicas da otite média colesteatomatosa sofreram grande evolução desde a mastoidectomia radical clássica, considerada a única forma de tratamento para o colesteatoma no século passado, com o sacrifício auditivo inerente à técnica. Desde a década de 50, com as técnicas introduzidas por Wüllstein e Zöllner21, 23, passou a se enfatizar a restauração do sistema timpanossicular, surgindo as timpanomastoidectomias. A timpanomastoidectomia aberta, com rebaixamento da parede posterior, passou a ser largamente utilizada, mas a dificuldade do manejo pós-operatório decorrente das amplas cavidades resultantes, associada à descrição da timpanotomia posterior por Jansen em 1978, proporcionou o desenvolvimento das timpanomastoidectomias fechadas (parede posterior intacta com abertura do recesso do facial). A possibilidade de preservação da anatomia da orelha média e melhores ganhos auditivos, seduziram otologistas. Desde então, a discussão sobre ó emprego de uma ou outra forma de timpanomastoidectomia obriga a ocupação de importante espaço dentro da Otologia, sem se chegar a um consenso entre os autores. Recentemente, a reconstrução do sistema columelar e a redução da cavidade cirúrgica na mastoidectomia aberta possibilitaram resultados funcionais bastante satisfatórios, fazendo com que o sacrifício auditivo não fosse mais um fator limitante do emprego desta técnica.

Ao nosso ver, a mastoidectomia técnica fechada pode ser empregada na OMCC, principalmente nos colesteatomas adquiridos secundários à retração da parte flácida da membrana timpânica, restritos ao ático e com boas condições do restante da mucosa da orelha média e mastóide, sendo fundamental um acompanhamento pós-operatório rigoroso. Nos casos estáveis, mantendo-se a orelha sem infecção e com bom aspecto da otoscopia, não achamos necessária a realização obrigatória do segundo tempo cirúrgico (second look), como preconizado por outros autores. A observação clínica, associada a controle por imagem, deve orientar quanto à possibilidade de recorrência e a necessidade de uma eventual reintervenção.

Nos colesteatomas que se estendem para além dos limites do ático, atingindo o antro ou a região do ático anterior e recesso supra tubário, ou quando associados a alterações importantes da mucosa residual, como tecido de granulação, granulomas de colesterol e hiperplasia, é preferível a realização da mastoidectomia aberta com reconstrução do sistema condutor sonoro e redução da cavidade cirúrgica, quando necessário. A diminuição da cavidade, com a oclusão da ponta da mastóide e ângulo sinodural com hidroxiapatita, reduz a necessidade de manutenção pós-operatória, com melhor resultado estético e técnico na meatoplastia. A reconstrução funcional do sistema tímpano-ossicular deve ser realizada sempre que houver reserva coclear compatível com melhora da audição.

Neste estudo, o resultado funcional foi considerado razoável em ambas as técnicas. No geral, mantiveram-se os níveis médios do SRT pré-operatório, com 25,64% (N=10) dos casos apresentando SRT ? 30 dB, é 74,36% (N=29) apresentando SRT > 30dB. Na técnica fechada, obteve-se uma melhora da média do SRT pós-operatório. Deve se observar que os casos selecionados para técnica aberta apresentavam audição pré-operatória nitidamente pior, o que pode sugerir maior grau de dificuldade na reconstrução da orelha média, justificando em parte os resultados menos satisfatórios. De acordo com a literatura, o índice mais empregado para a comparação de resultados é a diferença aéreo-óssea, que deve situar-se abaixo de 30 dBs, para se considerar o resultado funcional como satisfatório13, 15, 19. Entretanto, o fechamento do GAP pode não expressar a realidade do resultado funcional, uma vez que o fechamento pode ocorrer por perda neurossensorial (queda da curva óssea). Desta forma, preferimos o SRT que, ao nosso ver, reflete melhor a capacidade auditiva social.

A taxa de recidiva do colesteatoma foi considerada bastante satisfatória, ficando em 12,5% (N=2) na técnica fechada e em 4,34% (N=1) na técnica aberta, sendo que a mesma taxa variou na literatura entre 5% a 40% para a técnica fechada11, 15, 17, 19 e entre 2% a 21% na técnica aberta11, 12, 15, 17, 19.

A taxa de orelhas secas obtidas após a primeira intervenção foi de 75,0% (N=12) na técnica fechada e de 78,26% (N=18) na técnica aberta, com resolução em todos os casos de necessidade de reintervenção, sendo que essa taxa variou na literatura entre 90 e 96% na técnica fechada7, 9, 18, 19 e entre 79 e 95% na técnica aberta7, 9, 19. Para a obtenção de uma orelha seca é fundamental um acompanhamento pós-operatório imediato bastante cuidadoso. O controle da formação de tecidos de granulação e de eventuais estenoses cicatriciais pode ser conseguido com intervenções ambulatoriais nessa fase.

CONCLUSÃO

O tratamento cirúrgico da otite média crônica colesteatomatosa, através das mastoidectomias, consegue proporcionar taxas eficientes de controle da doença e orelhas secas, desde que obedecendo a critérios rigorosos de indicação para uma e outra técnica. A mastoidectomia fechada apresentou um resultado funcional melhor, embora com maior recorrência do colesteatoma (12,5%), em comparação com a técnica aberta (4,25%).

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* Docente da Disciplina de Otorrinolaringologia Pediátrica da Universidade Federal de São Paulo- Escola Paulista de Medicina (UNIFESP - EPM). Professor Livre-Docente pela FMUSP.
** Médico Pós-Graduando (Mestrado) da Disciplina de Otorrinolaringologia da Universidade Federal de São Paulo - Escola Paulista de Medicina (UNIFESP - EPM).
*** Médico Residente da Disciplina de Otorrinolaringologia dá Universidade Federal de São Paulo - Escola Paulista de Medicina (UNIFESP - EPM).

Trabalho realizado na Disciplina de Otorrinolaringologia, Setor de Otologia da Universidade Federal de São Paulo - Escola Paulista de Medicina.
Trabalho apresentado no 35° Congresso Brasileiro de Otorrinolaringologia. Recebendo Menção Honrosa.
Endereço: Fernando Danelon Leonhardt - Rua Bandeira Paulista, 142 - Apto. 22 - 04532-000 São Paulo/SP - Telefone: (0xx11) 3068-0103. E-mail: fernandodanelon@uol.com.br
Artigo recebido em 15 de agosto de 2000. Artigo aceito em 20 de outubro de 2000.

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