Versão Inglês

Ano:  1935  Vol. 3   Ed. 2  - Março - Abril - ()

Seção: -

Páginas: 123 a 134

 

O que o clinico deve saber sobre o esofago? (1) (Continuação).

Autor(es): PROF. DR. HUGO STARCK

Não trata Starck, tanto neste como no artigo publicado anteriormente, de uma exposição sobre a clinica do esofago, mas sim das molestias deste orgão que tenham verdadeira importancia para os praticos.

Dentre estas a esofagite corrosiva goza de significativo papel. Ela é ocasionada pelas queimaduras por substancias quimicas (soda, cal, sublimado, acido sulfurico, acido cloridrico, acido oxalico, sal de azedas, etc.), tomadas ocasionalmente ou com o fim de suicidio.

Os sintomas variam com o grau de sua concentração e o tempo de ação, indo desde as crostas superficiais até ás lesões profundas e mesmo ulcerações perfurantes. Como lugares de predileção da queimadura mencionamos os estreitamentos fisiologicos; assim encontram-se estas lesões mais comumente na boca do esofago, no estreitamento de passagem pelo diafragma e ao nivel do cruzamento aortico. Na parte inferior encontram-se, mais vezes, as inflamações em faixas longas ou tubuliformes. Os sintomas dependem da ação caustica. Assim, os acidos, mais empregados para o suicidio, têm decurso tempestuoso. Assim, já ha muito tempo, costumo pensar, já ao entrar no hospital, que a substancia causadora da queimadura tenha sido um acido, sómente pelos gritos emittidos pelo paciente, audiveis mesmo do jardim. Os doentes gemem e gritam, caindo logo num estado de colapso que, repentinamente, será entrecortado pelos gritos. Pulso pequeno, pupilas dilatadas e sem reação. Aos poucos profundo estado inconsciente. Quasi sempre vomitos mucosos e sanguineos.

O envenenamento pela soda decorre tranquilo e quieto, não causando, frequentemente, nenhuma dôr.

Nos casos acidentais geralmente alguma coisa mais foi bebida dissolvendo e diminuindo, assim, a ação do caustico. De uma rapida intervenção, com tratamento apropriado, nas primeiras semanas, dependerá o futuro do paciente. Este tratamento está, na maioria das vezes, nas mãos do clinico. Não o conhecendo, o clinico tornará o paciente um estropiado por toda a vida, sofrendo interminaveis anos de complicações e tratamentos dolorosos. Depois de um envenamento pelos acidos se deverá fazer, devido ao shock, uma injeção de canfora; em seguida pegaremos o tubo para lavagens do estomago, que será bem untado e introduzido na boca do esofago, fazendo, através dele, penetrar neste orgão, oleo de oliva. Durante a injeção oleosa, faremos penetrar, cuidadosamente, o tubo até que atinja a entrada do estomago. Então injetaremos, através dele, agua ou leite, mais ou menos ¼ de litro, em seguida abaixaremos o punil do tubo e faremos sair, nas mais das vezes, muco, crostas e grande massa de mucosa sanguinolenta, esvasiando o estomago.

Si a lavagem não fôr conseguida deste modo, então deveremos fazer penetrar o tubo mais alguns centimetros no estomago. O perigo de uma perfuração não deverá ser temido. De uma neutralização do meio se deve esperar muito; o principal é dissolver o agente nocivo e lavar o estomago. Muitas vezes, encontra-se na agua de lavagem, pedaços de pastilha de sublimado.

Quando não existe um tubo, faremos então beber, primeiramente, oleo de olivas, e depois leite. O conteúdo gastrico poderá ser, desta forma, eliminado pelo vomito. Vomitivos não devem, no entanto, ser empregados. Como mistura de revestimento Starck emprega a seguinte:

Rp. Bismutose - 20,0
Glicerina - 10,0
Agua distilada, ad. - 200,0
Agitar - 2 colherinhas, das de café, por hora.

Si deixarmos as cousas correrem livremente, e nos limitarmos aos primeiros socorros, deixando o paciente, desde que os sintomas inflamatorios agúdos iniciais tenham desaparecido, então instalar-se-ão, já na seguida semana, sintomas de estenose, que aumentarão pouco a pouco até o sofrimento tormentoso e incuravel. E' imperioso que a sondagem se proceda precocemente. Starck já a inicia no fim da primeira semana, por meio de tubo gastrico bem untado, fazendo penetrar, por meio de injeções de oleo de olivas, até o cardia. Estas sondagens serão repetidas duas vezes por semana.

Em geral o esofago tem grande tendencia a curar-se, conforme o autor já notára pelo esofagoscopio. Atuou, porém, o caustico, profundamente, então a cura se fará com formação de cicatrizes, que possuem grande tendencia a se contrairem, nos casos concentricamente, mas quasi sempre, porém, com grande perda de seu lume. Esta contração cicatricial deverá ser evitada, enquanto a cicatriz fôr mole e elastica. Encontrando o tubo um impedimento, então nos utilisaremos de sondas abotoadas, grossas e conicas; eventualmente as sondagens serão diarias deixando-se permanecer as sondas, no lugar, durante muito tempo. Devemos explicar ao paciente o grande perigo que ele corre, si abandonar o tratamento. Mesmo assim, ele, achando que já engole bem, desaparece e só voltará si a cicatriz voltar a estreitar-se, a ponto de não deixar passar nem mesmo os alimentos liquidos.

Uma garntia de que a cicatriz não mais se retrairá, só a teremos depois de 2 anos. Até então as sondagens deverão ser continuadas. Si estas, no entanto, não forem conseguidas, então só um especialista poderá resolver o caso, que agora só por meios complicados: drenagem segundo Hacker, tratamento de Senator, sondagem sem fim, sondagem retrogada após gastrostomia, tubagem do esofago por meio da esofagoscopia, etc., será resolvido. Starck, diz que ha muito tempo não observa tais complicações em seus casos. Alguns vieram a falecer durante o periodo agúdo do envenenamento, outros por colite hemorragica, por nefrites com anuria etc. Não perdeu nenhum caso de envenenamento pela soda.

Todas as outras fórmas de inflamações: esofagites catarrais, fibrinosas, diftericas e flegmonosas, praticamente têm importancia secundaria. Casos graves de esofagite foram observados na escarlatina, difteria, septicemia, no tifo, etc., terapeuticamente pouco ha a fazer-se, limitando-se á dieta semi-liquida e oleosa, evitando-se, nesta dieta, as irritações mecanicas, termicas e quimicas. Pode-se injetar no esofago, com a seringa de Rosenhein eucaina, cocaina, nitrato de prata, etc.

É necessario ter-se grande cuidado com o sapinho (oidium albicans) que poderá obturar, por completo, o esofago. Raramente ele se localisa exclusivamente neste orgão. Neste caso o diagnostico será dificil, caso as membranas não sejam vomitadas ou encontradas na ponta do tubo de lavagem. Geralmente ele tem inicio na garganta e descerá, então, em seguida. E' preciso reconhecer-se e não se deve esquecer, no entanto, que o oidium é uma complicação grave. Os clinicos observam-no nas doenças que conduzem á inanição: tifo, septicemía, etc.

Como profilaxia a limpeza cuidadosa da boca.

Como terapeutica retirar mecanicamente as membranas, pincelar com uma solução de acido lactico a 8%, tomar 2 colheres, das de sopa, por dia, de uma solução de Borax a 3 %.

Ulcerações

Não são diagnosticaveis, com certeza, sem esofagoscopia; podém, porém, ser despistadas, com certa presunção, baseado em alguns sintomas. Ulcerações de decubito causadas por corpos estranhos, aneurismas, tumores extra-esofageanos, e observadas, não raramente nos individuos marasmaticos, na septicemía, no tifo, etc., situadas, então, em regra, contra a cricoide.

Ulcerações sifilíticas causadas pela necrose gomosa e tambem nos estados secundarios da sifilis. Sua importancia está na tendencia á cicatrizar e formar estenoses. Situam-se na maioria dos casos, no terço superior do esofago e ocasionam, no periodo de ulceração, dôres ao deglutir. O diagnostico será facilitado pela sifilis manifesta e será confirmado ex-juvantibus. No periodo de estenose se nos apresentam dificuldades apenas soluveis.

A tuberculose do esofago, de observação rara, tem origem, por continuidade, de uma afecção da faringe, ganglios bronquiais, carie das vertebras do pulmão, raramente devido a uma infecção hematogena. Um diagnostico de presunção poderá ser feito nos casos de tuberculose manifesta; ele será garantido pela biopsia através do esofagoscopio. O prognostico dependerá da molestia fundamental. Contra as dôres de deglutição, pincelagens com substancias anestesicas (cocaina).

A ulceração peptica encontra-se no quarto inferior do esofago e tem a mesma origem que o ulcus rotundum do estomago, certamente tambem causada pelo suco gastrico. Sobre se se trata, aqui, de ilhas de mucosa gastrica, não se póde afirmar. A ulceração é redonda, oval e tende a perfuração (mediastinite, pleurite, peri-cardite, piopneumotorax, perfuração da aorta), assim tambem tem sido observada sua transformação em carcinoma.

O primeiro sintoma póde consistir numa hemorragia; geralmente queixa-se o paciente, de forte cardialgia, azia, vomitos e dôres no deglutir. A alimentação torna-se deficiente pelo medo da dôr no engulir e sua consequencia será um grande emagrecimento. As dôres na parte mais inferior do esofago, o espasmo reflexo na entrada do estomago e na boca do esofago, uma hemorragia eventual, o exame pela sonda de diverticulo e, sobretudo, a esofagoscopia confirmam o diagnostico.

A terapeutica deverá ser dirigida no sentido de impedir-se toda e qualquer irritação da ulcera e a mais eficaz será a gastrostomia, ou então alimentação exclusiva pelo recto. Si ambas não forem possiveis, então se instituirá uma dieta que não irrite quer mecanica, quer termica, quer quimicamente. Para revestir-se a ulcera emprega-se a mistura protetora Bismutose. A tendencia á cicatrização e a formação de estenose é grande. O tratamento desta estenose, nesta profundidade, constitue uma grande dificuldade. Nesta região são observadas, tambem, as varizes do esofago., que, na maioria, não são diagnosticadas e que só são conhecidas, geralmente, por uma hemorragia profusa, não raramente mortal. Dôres profundas da deglutição em pacientes com cirose hepatica, sifilis hepatica, trombose da veia porta e compressão desta, fazem pensar em varizes. Nestes casos grande cuidado deve haver no exame pelas sondagens. Sómente a esofagoscopia fará o diagnostico certo; atualmente também a radiografia poderá fazê-lo quando praticada por radiologista experimentado.

Tumores

Os tumores benignos, fibromas, miomas, lipomas, são geralmente pediculados e são, quasi sempre, denominados de polipos. São raros, não dão sintomas, podendo, no entanto, causar perturbações na deglutinação, sensação de pressão no torax e dispnéa. Situados muito alto, podem penetrar no laringe e causar ataques de sufocação. Quando situados muito alto, só o espelho de laringe já os pôde descobrir, quando profundos só a esofagoscopia. A moléstia mais comum do esofago é o carcinoma. Em 80% dos casos observam-se os carcinomas no homem entre 40 e 70 anos. O alcool e a nicotina parecem gozar um papel predominante em sua genese. O comer apressado, as comidas muito quentes, as comidas muito condimentadas, podem favorecer sua aparição. Os lugares em que a irritação commumente se processa, ou são atacados de preferencia, estão, nos estreitamentos fisiologicos; mais frequentes no cardia, ao nivel da bifurcação bronquica e mais raramente na boca do esofago. Na maioria dos casos o carcinoma do esofago é primario; raramente de propagação pela visinhança, ainda mais raro como metastase. Sua estrutura é a do carcinoma plano celular, com tendecia rapida á necrose e invasão á visinhança com todas as possiveis complicações (aorta, pleura, traquéa, pulmões, pericardio), que dela decorrem. A sintomatologia nos carcinomas não complicados é muito uniforme e constitue frequentemente desde começo até a morte em dôres á deglutição. Os carcinomas adiantados são quasi sempre diagnosticados, mas os iniciais passam geralmente desapercebidos. O primeiro sintoma consiste, quasi sempre, em uma leve pressão no engulir que aparece, sobretudo, quando da deglutição dos alimentos solidos. Neste estadio a sondagem nada demonstra de particular, no ponto de vista patologico. O doente é considerado como um nervoso. Provavelmente, neste momento, só existe uma infiltração da parede, que não causa nenhuma diminuição do lume do orgão. Starck aconselha nestes casos a se pensar, sempre, no carcinoma em inicio. As dificuldades na deglutição vão sempre aumentando até que o paciente apenas possa tomar alimentos bem mastigados e semi-liquidos, e, mais tarde, nem mingáos podem ser deglutidos, aparecendo sinais de deficiencia alimentar, vindo o doente a falecer de inanição, no fim de 1 á 1 ano e meio. O inicio póde, no entanto, ser rapido; certo dia, ao comer, em plena saúde, o bolo alimentar pára em seu trajeo; com deglutição sucessivas e pressão consegue fazê-lo chegar ao estomago e expeli-lo de novo. O fato repete-se algum tempo depois e finalmente se instalará a perturbação na deglutição.

O doente pensa localisar o ponto do impedimento, mas frequentemente engana-se e isto tem por causa que o impecilho, no inicio, não está localisado no lugar da lesão, mas na boca do esofago ou no cardia. Trata-se, aqui, de um espasmo reflexo que é precursor do estreitamento organico. Starck ha anos já o descrevera como sintoma precoce do carcinoma. Os carcinomas ulcerados trazem fortes perturbações na deglutição que nos fazem pensar certo. Melhoras poderão sobrevir com a eliminação de massas tumorais esfaceladas. Quando o tumor invade a visinhança sobrevem dôres (pleura), que são sentidas, de lado, nas costas e no peito. A paralisia dos recurrentes (rouquidão, afonia), a cooparticipação do simpatico (complexo de Horner, sudação), compressão da traquéa, a pericardite, a pleurite, a compressão da medula (paraplegia) a tendencia á perfuração (fistula traquéo-esofageana, hemorragia da aorta, gangrena pulmonar), são sintomas de marcha dos carcinomas do esofago. Adenites lateralisadas na axila e na fossa supra-clavicular. A esofagoscopia é o metodo melhor para o diagnostico (biopsia). Para o clinico a sondagem constitue o metodo de escolha, iniciando-se com o tubo gastrico (examinar seu conteúdo), seguindo-se as sondas finas enquanto o lume permitir. A terapeutica é sintomatica exclusivamente. Não ha tratamento que cure o carcinoma do esofago, quer o feito pelas irradiações (radium e raios X), quer pelo emprego de medicamentos e ainda pela intervenção cirurgica. Só os tumores cervicais oferecem alguma chance operatoria (Glück). Tambem o metodo operatorio transpleural não dá resultado. O carcinoma do esofago pertence aos dos mais malignos na especie, que matam entre 10 e 18 meses. A vida poderá ser prolongada pela gastrostomia precoce. A sondagem pode, tambem, afastar, relativamente, a morte pela fome; Starck só a aconselha quando nem mesmo as papas não passem mais. Só os tumores concentricos podem ser dilatados; si situados nas paredes do esofago a sondagem não terá razão de ser. As hemorragias contraindicam as sondagens. Os tumores em necrose são dos que não devem, tambem, ser sondados, especialmente quando situados ao nivel da Grossa da aorta. O perigo de perfuração, neste caso, é enorme. Como tratamento sintomatico: assim a excessiva secreação mucosa poderá ser fluidificada pela sucção de assucar candido; do mesmo modo atúa uma solução de bicarbonato de sodio (1:100); para tornar a ferida lisa e facilitar a passagem, pode-se empregar a seguinte mistura:

Rp. Oleo de ricino - 50,0
Glicirina - 25,0
Oleo menth. piperita - III gotas
Agua q. s. p. - 200,0
Tomar ás colheres.

A anestesia local facilita a deglutição. Aplicações locais de nitrato de prata (1-3 % ). Muito bem atuam as lavagens do esofago, afim de se eliminar as particular alimentares ou outras, que contenham; como agua de lavagem, solução morna cloreto de sodio, agua de Ems, Vichy.

A atropina diminuirá a secreção mucosa.

Dieta não irritante: mingáos ou liquidos. Carne é contraindicada por poder parar ao nivel do tumor. Ao contrario gelea de carne, pó de carne, mingáos, cerebro, etc. que podem ser usados. Ovos crús, manteiga aquecida. O leite não deverá ser usado puro porque coagula e impede a deglutição; poderá ser tomado com agua alcalina ou chá.

Quando os alimentos não forem suficientes, utilisa-se dos preparados alimentares: somatose, sanatogen, plasmon, tropon, etc. assim as gorduras e oleos. Como controle exames de urinas
e tomada de peso. Abaixam ambos a alimentação pelos clisteres como auxiliar. A gastrostomia será, logo, indicada nestas circunstancias. Nos casos extremos, porém, ela apressará a morte.

Dilatações

Diferenciam-se as dilatações naquelas que compreendam toda a periferia do tubo esofageano e as limitadas a uma parte de sua parede. Ás primeiras denomina-se ectasia e ás ultimas diverticulos.

a)- Diverticulos.

Tracção e pulsão.

Tracção são pequenas depressões celulares da parede esofageana causadas pelos repuchamentos produzidos pelos processos inflamatorios peri-esofageanos (ganglios, tumores, etc.). Em sua extremidade encontram-se cicatrizes que os ligam aos ganglios doentes.

De acôrdo com a situação dos ganglios, estes diverticulos nunca são posteriores, mas na parede anterior ou nas laterais. Frequentemente são multiplos. Geralmente têm curso sem sintomas ou produzem ligeiras perturbações da deglutição. Eles significam, para o doente, um grande perigo que é o da perfuração para o mediastino, podendo ocasionar empiema, gangrena pulmonar, piopneumotorax, pneumopericardio, etc. Podem, ser, frequentemente, a base de um carcinoma.

Antigamente, constituiam achado de autopsia, hoje, com a sondagem, os diverticulos, podem ser, facilmente diagnosticados, sobretudo com o auxilio do esofagoscopio. Tambem a radiografia é meio importante de diagnostico. Os pequenos diverticulos poderão tomar grandes proporções, pela ação da presão interna, dos alimentos, sobre eles, transformando-os em diverticulos de tracção e pulsão que, ao contrario do diverticulo de pulsão de Zenker, que provem da parede posterior da parte alta do esofago se formam em qualquer das paredes do esofago, que não seja a posterior. E' claro que não exista um tratamento de escolha para esta especie de diverticulo.

Diverticulos de Pulsão, ou de Zenker, são formações sacciformes, causadas pelo empurramento continuo da parede do esofago de dentro para fóra. Situam-se, sem excepção, na parede posterior e nos limites da faringe e do esofago (daí sua denominação de diverticulo faringo-esofageal ou diverticulo limitrofe). A fraqueza muscular do triangulo muscular de Laimer e o excesso de pressão sofrida neste ponto da boca esofageana, ocasionam a paralisação alimentar que sob a ação de fortes espasmos fazem abaular para traz a parede do esofago, formando o diverticulo de pulsão. Algumas causas favorecem sua formação: cicatrizes, bocio, lesões causadas por corpos estranhos encravados, assim tambem a rapidez no comer. Este diverticulo é uma molestia de velhos, sobretudo dos homens. Podem tornar-se do tamanho de um punho, são pediculados, herniados; casos ha em que constituem como que o seguimento do pipo-faringe. Em começo situam-se entre o esofago e a coluna vertebral; com o crescimento torcem para fóra, colocando-se lateralmente ao esofago (na maioria dos casos á esquerda), na fossa supra-hioidéa.

Seu quadro clinico é característico. A' principio sintomas de um catarro faringeano e como tal é tratado durante anos, até que, com a formação do saco, os sintomas diverticulares tornam-se evidentes. Característica é a regorgitação dos alimentos, não raramente com as primeiras refeições. Durante dias fica em socego até que tudo volta, como dantes, a incomodar o paciente. Grandes incomodos de deglutição; os primeiros alimentos param, causam pressão, sensação de asfixia; com esforços eles são expelidos; outras vezes enche-se o diverticulo primeiro, em seguida o resto dos alimentos passam facilmente. Os alimentos retidos putrefazem-se e dão máo halito intenso. O diverticulo contém, comumente, ar, ocasionando, ao comer, ruídos de gargarejo audíveis á distancia. Como aumento do saco diverticular a alimentação do paciente poderá ser impedida por completo. O estado geral, assim como a alimentação poderão ser bons, durante anos. Só com o aumento da estenose ha perigo de morte pela fome. Quem conhece a molestia fará facilmente o diagnostico. A situação típica, o inicio, as perturbações variaveis de deglutição no lugar característico, o regurgimento dos alimentos velhos, o mau halito, os ruídos de pescoço, o tumor externo do pescoço, não enganam a ninguem que tenha noção da existencia da molestia. O tubo gastrico e a sonda para diverticulos facilitarão o diagnostico. A radiografia é mais que característica.

O prognostico é mau; quando não tratados matam o doente pela fome, podendo durar 30, 40 anos. Cura operatoria é completa. A tecnica operatoria é bastante conhecida e, em grande variedade, anda descrita em todos os livros e tratados que cuidam do assunto.

b) - Ectasias - Trata-se, aqui, de dilatações do esofago desde a boca até o cardia. Quando, como causa, pensamos num cardioespasmo, então denomina-la-emos assim. Interessantes são sua genese, modo e decurso. Como sinonimia: dilatação fusiforme, dilatação sem estenose anatomica, dilatação atonica, espasmogena, cardioespastica (mal de engasgo). Starck denomina-a de dilatação cardiotonica do esofago, pois que, a seu ver, a dilatação depende de uma perturbação no tonus do cardia. A forma é de fuso, lisa ou em fôrma de pera, ou cilindrica. A musculatura é quasi sempre espessada, raramente fina e atrofica, a mucosa é inflamada. A molestia póde aparecer desde a infancia até a idade mais avançada. V. Mikulicz atribue a molestia a um cardioespasmo primario e a dilatação á ectasia consequente; Rosenheim e Netter pensam numa atonia primaria da musculatura do esofago, Fr. Krause julga que a molestia é uma afecção do vagus, que paralisa de um lado a musculatura e de outro lado diminue ou anula o impulso para o cardia. Meltzer, Rieder e outros encontram a causa na ausencia do reflexo de abertura do cardia pelo ato da deglutição. Starck, baseado em experimentações, chegou á conclusão de que o cardia não se contráe espasmodicamente. Deixa-se vencer, facilmente, pela sonda e aos raios X vê-se que o contraste passa; no esofagoscopio observa-se um fechamento, que, apenas, afasta-se do normal. Muitos doentes não têm, durante anos, nem dôres nem contraturas, neste territorio. No entanto, o cardioespasmo póde ser o precursor da molestia, póde, tambem, instalar-se com intermitencias, mas sem durar muito, pois levaria o doente á fome. Sobre a natureza e patogenese da molestia pode-se dizer: O cardia permanece fechado durante o repouso. Seu tonus é o meio termo entre a contractura e o relachamento. Regula-se por meio do vago (simpatico), que conduz feixes atuando sobre a contracção e sobre o relachamento, assim como pelo plexo intramural, que recebe seu impulso do vago, mas que, quando da paralisia deste, continúa a funccionar automaticamente. No ato da deglutição normal o cardia abre-se, reflexamente, por uma excitação, que caminha da mucosa ao bulbo, por meio do vago e, posteriormente, pela excitação produzida pelos alimentos sobre a parede esofageana. Por uma causa anatomica (molestia do vago ou dos nucleos), ou nervosa funcional (cardioespasmo), produz-se a neutralisação do componente relachador. A influencia reguladora necessaria do vago sobre o cardia ficará, então, a cargo do sistema intramural. O componente contractil sobrepuja e o cardia ficará fechado ao bolo alimentar devido á ausencia do reflexo de abertura. O fechamento corresponderá ao do estado de repouso ou será hipertonico. A principio o fechamento será vencido pela onda peristaltica das paredes do esofago; aos poucos diminuirão as forças pelo aumento da dilatação e, então, o cardia só se abrirá pela pressão da massa alimentar que o comprime. Neste estado, que se póde denominar de avagal, o cardia tende a contrair-se, mas é de grande sensibilidade, reagindo a qualquer ação mecanica, psiquica ou endogena. Tenderá, sobretudo, a diminuição do tonus, que encontramos ao sondar á radioscopia e á esofagoscopia. Nestas condições a tendencia ao espasmo será, tambem, acentuada. O espasmo goza, no quadro da molestia, um papel importante e duplo. Deve-se deixar claro que o cardioespasmo no homem predispõe áquelas perturbações de inervação, que consistem na perda do reflexo de abertura do cardia.

O espasmo é, porém, tambem, a expressão da irritabilidade do cardia descoordenado e aparece, no decurso da molestia, como sintoma.

A dilatação pode ser tida como ectasia de estase e a hipertrofia, como hipertrofia de trabalho, nos casos de paralisia do vago, a dilatação póde ser a causa primaria da paralisia das paredes e a hipertrofia, como hipertrofia de trabalho do plexo esofageano intramural.

No que se refere ao aparecimento dos primeiros sintomas, distingue-se dois tipos. O bolo alimentar pára na boca do esofago ou no cardia com ou sem contracturas dolorosas. Este estado de cousas repete-se varias vezes. Aos poucos acumulam-se alimentos sobre o cardia, que impede a continuação da alimentação e são regorgitados. Num segundo tipo o sofrimento tem inicio lentamente, e desapercebidamente, sob sintomas que lembram a dispepsia ou um catarro gastrico. Aos poucos aparecem, em destaque, os sintomas de deglutição que levam ao diagnostico. Dôres podem não existir durante anos.

Mais tarde o quadro clinico, na diversidade de individuos, toma um carater unitario.

Os alimentos acumulados sobre o estomago causam sensação de pressão, de cheio, que podem ir até á sensação de angina de peito, com taquicardia, asfixia, suores. Então o paciente póde repentinamente ter a sensação de levantamento de um ferrolho e o alimento cáe no estomago com grande alivio para elle. Sintoma frequente é o regorgitamento; geralmente um esvasiamento facil, sem nauseas. Com frequencia o esofago move-se, á noite, com a posição horizontal, produzindo violenta tosse, que o paciente procura aliviar, de todos os modos, pelo esvasiamento do conteúdo esofageano, ou para baixo ou para cima. As dôres existem em não raros casos. Elas aparecem em fórma de caimbra do cardia e podem, não raro, deixar de existir. O estado geral póde permanecer bom, durante muito tempo. Para outros, porém, a vida é um tormento: temem comer qualquer coisa, não vão mais á mesa com outras pessôas, emagrecem, tornam-se cançadas, esquivos. O curso da molestia póde durar anos, e é sempre progressivo. O diagnostico é orientado pela anamnese.

Examina-se com o tubo gastrico grosso e com uma sonda do mesmo calibre. Pelo tubo sairá muco de mistura com o conteúdo esofageano e, sem pressão, o instrumento caminhará através do cardia. As sondas finas não são indicadas para o exame. Encontra-se um cardioespasmo, então deve-se evitar toda pressão com o tubo; depois de espera paciente, e movimentos leves de tacteação, abre-se o cardia, na maioria das vezes.

Ainda uma palavra sobre a causa da molestia. Trata-se de molestia funccional, tendo fundamento uma neurose geral. Não raro existem sintomas que demonstram uma desharmonia entre o sistema nervoso autonomo e o simpatico (dermografismo, hiperhidrosis, arritmia, bradicardia). Uma hipercloridria póde ser, não raro, observada. Num certo numero de casos encontra-se uma ulcera ventricular, o que leva a pensar se se trata de uma reação vagotonica coordenada ou de uma excitação reflexa causada pela ulcera. Em outro grupo de casos tem-se que ver com uma neurose organica monocular. Não se póde demonstrar a existencia de uma causa exogena, mas no entanto, não raro, uma alteração psiquica de carater grave acompanha a molestia. Finalmente, deve-se pensar no fator hereditario constitucional, baseado numa neurose. A questão endocrinica não pode deixar de ter influencia na patogenia da dilatação do esofago.

Terapeutica - Mikulicz foi o primeiro que obteve a cura pela super-dilatação do cardia. Ele dilatava pelo estomago por meio de uma pinça. Desde então, tentou-se praticar a dilatação do cardia pela via alta. Mais seguros provaram as dilatações metalicas rigidas.

O cardiodilatador de Starck tem a vantagem de gozar da maleabilidade de uma sonda e de possuir 4 gráos de dilatação. Sua introdução no esofago é facil, o problema importante é a passagem pelo cardia, que deve ser dilatado. Sobretudo nos casos velhos o esofago aumenta de comprimeito e torna-se serpeante, cheio de sacos e saliencias, com excressencias da mucosa em cordões, ao nivel da passagem pelo diafragma, faixas cicatriciais, o que dificulta a passagem do cardia.

Starck liga, por isto, a extremidade de seu dilatador, um conductor de goma, ou um saco cheio de mercurio metalico, que servirão como guias. A parte dilatavel está no cardia, então, com uma pressão forte e rapida será feita sobre o cabo do aparelho, de fórma a abri-lo no maximo. Desejavel será que o anel do cardia deixe-se vencer, de repente, como um balão de borracha que rebenta. Isto significa cura como que por encanto. Pressão lenta e aos poucos, torna mau o prognostico, o que obrigará a novas dilatações. O tempo total da operação, não é senão de alguns segundos. O metodo não é facil, necessita de grande aprendizagem, particularmente nos casos complicados. Nas mãos de um experimentado, é verdadeira maravilha. O homem, que durante anos e anos com tristeza vae á mesa, para quem todas as alegrias da vida desapareceram, que caiu em profunda melancolia, fica curado, num relampago; assenta-se á mesa e come como nos dias de saúde. Nenhum agradecimento é tão grande como o dos doentes de esofago curados de seus males. Aos que temem o metodo como perigoso aos doentes, pôde Starck dizer que de 341 casos, por ele tratados, nenhum morreu e nenhum sofreu qualquer mal pelo tratamento. É necessario, porém, ter em mente, que as paredes podem ser finas como papel e que podem ser facilmente perfuradas. A morte muito citada por Maydl não foi causada pela dilatação. Trata-se de perfuração por sonda, acima do cardia, como é facilmente vizivel na figura. Casos de recedivas são raros; se isto se der, nova dilatação poderá ser feita.

Corpos estranhos - Devem ser retirados pela esofagoscopia. Ao clinico, Starck aconselha, de coração, não empregar a sonda nos corpos estranhos, deglutidos. Consegue-se levar para o estomago, os corpos estranhos de bordos lisos (moedas, botões, pedaço de carne, sementes, etc.). Ao contrario, poderá acontecer de que ele assim não seja (dentaduras, espinhos, ossos, etc.) e se encravem, nas paredes do esofago, pelas manobras intempestivas, dificultando, enormemente, a extração pelo esofagoscopio.

Além disto, podem causar perfurações e hemorragias consequentes que, ainda, mais dificultarão a extração. A bôa regra é enviar estes doentes, em jejum, isto é, sem deixa-los comer qualquer cousa com o fito de facilitar sua passagem para o estomago, sem utilizar-se de qualquer sondagem, á um especialista que conheça a esofagoscopia.

M. O. R.

(1) In Münch. med. Wschr. Num. 48 - Ano 81 - 29 Nov. - 1934).

Imprimir:

BJORL

 

 

 

 

Voltar Voltar      Topo Topo

 

GN1
All rights reserved - 1933 / 2024 © - Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico Facial