Versão Inglês

Ano:  1965  Vol. 33   Ed. 4  - Outubro - Dezembro - ()

Seção: -

Páginas: 183 a 186

 

A MARGEM DA ABOLIÇÃO DO NISTAGMO ROTATÓRIO PROVOCADO COMO ÚNICO ACHADO (*)

Autor(es): Dr. Nelson Alvares Cruz (**)

Resumo:
O A. discute o valor da abolição do nistagmo rotatório como único achado do exame labiríntico. Admite, baseado em sua experiência, que o sinal de Aubry é digno de confiança para o diagnóstico topográfico de lesões do tronco cerebral.

Data de muito tempo o conhecimento da abolição do nistagmo rotatório provocado, como dado que se adiciona ao contexto otoneurológico e que vem reforçar diagnóstico de síndrome vestibular central. Costuma ser observada, sobretudo, em tumores do ângulo ponto-cerebelar, em tumores do IV ventrículo, em tumores cerebelares que atinjam a área vestibular bulbo-protuberancial, e em lesões de topografia intra-troncular. Neste último caso, duas eventualidades ocorrem: a) a abolição se soma a outros sinais de grande evidência de acometimento do tronco cerebral; b) a abolição se exibe isoladamente, dentro do quadro de um exame labiríntico absolutamente normal, ou, então, há discretos sinais vestibulares de valor discutível e incerto. Nos casos dêste segundo grupo, a abolição do nistagmo rotatório provocado adquire valor preeminente, pois se trata do único sinal ou do sinal de realce, que nos leva ao diagnóstico de localização, desideratum primacial do exame otoneurológico.

Como se trata de nistagmo dependente da excitação do aparelho vertical, compreende-se que se possa afirmar que o sinal não merece crédito, por ser difícil a interpretação da excitação daquêle sistema de canais. Êste ponto de vista, porém, me parece inconsistente, na investigação em aprêço. Na realidade, a prova da experiência clínica deve ser respeitada, e ela tem evidenciado que, como sinal que figura entre outros elementos de síndrome vestibular central patente, a sua observação é vulgar.

Na forma pura, isolada, contudo, aparece com menos frequência. Para ter valor é mister que o nistagmo rotatório esteja abolido tanto na prova calórica (inclusive com aumento da excitação pelo uso de água com temperatura baixa e em tempo prolongado), quanto na prova rotatória. Ainda mais, a abolição deve ser notada dos dois lados à prova calórica e para ambos os sentidos de rotação da prova rotatória. Não cabe neste particular, abrir-se novamente a polêmica sôbre o que representa a prova rotatória como meio de excitação labiríntica; pois o que se pretende pesquisar é um dado grosseiro, isto é, a franca abolição bilateral do nistagmo.

Acreditava-se inicialmente que só em casos onde houvesse hipertensão infra-craniana se pudesse observar o sinal. AUBRY mostrou que êle é também visto em afecções não acompanhadas de hipertensão infra-craniana, denunciando o acometimento do tronco cerebral.

O valor do sinal parece-me positivo. Em casos de lesões neurológicas, onde o exame vestibular se apresenta normal, ou com sinais discretos, que pouco contribuem para o laudo otoneurológico,
o achado traz-nos fortíssima possibilidade de estarmos em face de acometimento do tronco cerebral. Se não fôra o fato de ter sido observado, muita excepcionalmente e de forma incompleta, em lesões supra-tentoriais, não titubearíamos em dizer que entre os sinais que as provas labirínticas nos oferecem êste se nos afigura como dos mais dignos de confiança para o diagnóstico topográfico de lesões tronculares.

AUBRY e PIALOUX assinalam, entre sua abundante casuística de cêrca de 652 casos de lesões infra ou supra-tentoriais com sinais otoneurológicos, 32 observações em que a abolição do nistagmo rotatório provocado se exibiu, como forma isolada, sendo que, em 20 delas, em lugar do nistagmo rotatório, obtiveram um nistagmo horizontal. Isto quer dizer que em 12 casos, apenas, havia abolição realmente pura, sem esta espécie de contrafacção da perversão do nistagmo, que sobreveio nos 20 casos restantes. Esta substituição do nistagmo rotatório pelo horizontal é, porém, considerada por aqueles mestres de Paris como comparável à abolição pura e simples.

Os números que aí estão deixam entrever que só esporádicamente nos defrontaremos com casos em que se observa o sinal, embora sua pesquisa seja feita regularmente, quando se impõe. Raridade que, é obvio, não lhe retira o valor.

A rotina dos exames labirínticos em nosso meio parece-me se efetuar de molde a que nunca, ou quase nunca, se avance em busca do sinal de AUBRY, por razões diversas, em que parece prevaTecer a generalização da sistemática da prova de Hallpike e o descredito imposto à prova rotatória. Somos de parecer que, pelo fato de nos alinharmos como seguidores desta ou daquela doutrina, não devemos sacrificar sinais que, à falta de outros, têm interêsse no subsídio que o exame otoneurológico pode prestar ao neurologista ou ao neuro-cirurgião.

Como eu tivesse sempre me preocupado em averiguar a ocorrência do sinal, consegui reunir 10 casos, que esteiam êste trabalho. Embora estatisticamente não me sinta autorizado a tirar deduções definitivas, não posso deixar de afirmar minha crença na validade do sinal de AUBRY, fundamentando-me, inclusive, no achado neuro-cirúrgico de dois dos casos aqui estudados.

OBSERVAÇÕES

Procedência do material: Clínica Neurológica da Escola Paulista de. Medicina (Prof.: Dr. Paulino Watt Longo) e Serviço de neuro-Cirurgia da mesma Escola. (Chefe.: Dr. Aloisio Mattos Pimenta).

Diagnóstico neurológica ou neuro-cirúrgico
2 casos de Moléstia degenerativa espinho-cerebelar.
2 casos de Moléstia de Friedreich .
1 caso de Heredo-ataxia espinho-cerebelar de Pierre-Marie.
1 caso de aneurisma da comunicante posterior da carotida, comprimindo o mesencéfalo (contrôle por intervenção neuro-cirúrgica).
1 caso de Neoplasia do tronco cerebral.
1 caso de Meduloblastoma do vermis, que invadia o tronco cerebral (contrôle por intervenção neuro-cirúrgica).
1 caso de Polioencefalite.
1 caso de Sequela de afecção inflamatória do tronco cerebral.

Súmula do exame otoneurológico

Audição: normal em todos os casos (audiometria tonal).

Sinais vestibulares espontâneos:

Nistagmo: não havia em 9 casos; em 1 caso havia um nistagmo horizontal, grau 1, em moléstia degenerativa (Pierre-Marie).

Desvio do index: negativo em todos os casos. Sinais vestibulares provocados:

1 - Prova calórica: função horizontal: normal em todos os casos, menos um, onde havia hipoexcitabilidade discreta bilateral (Friedreich); ftmção rotatória: abolida em todos os casos; desvio do index: normal em todos casos.

II - Prova rotatória: função horizontal: normal em todos os casos, menos um, onde havia hipoexcitabilidade discreta bilateral (Friedreich);

função rotatória: - abolição absoluta em todos os casos; função vertical: - pesquisada em 6 casos, foi normal.

Observa-se, nos dados acima, que as moléstias heredo-degenerativas representaram metade das observações. As lesões tronculares, para alguns, seriam mesmo constantes em certas heredo-degenerações espinho-cerebelares (moléstia de Friedreich) e frequentes ou possíveis em outras afeccções heredo-degenerativas.

CONCLUSÃO

A abolição do nistagmo rotatório provocado, em sua forma pura isolada, é sinal que deve merecer maior atenção de quem pratica exames otoneurológicos, pois permite admitir-se, com margem de segurança, o acometimento do tronco cerebral.

O contrôle neuro-crúrgico de dois casos, representando verdadeira observação experimental, reforça nossa convicção da validez do sinal de AUBRY.

SUMMARY

The author discusses the importance of the abolition of the rotatory nystagmus as the only finding of the vestibular examination. He admits, based on bis own experience, that Aubry's sigo is of value for the topographic diagnosis of brain-stem lesions.

REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1) AUBRY, M. - Oto-Neurologie, Masson & Cie., Paris, 1944.
2) AUBRY, M. - Pialoux, P. - Maladies de l'oreille interne et oto-neurologie, Masson & Cie., Paris, 1957.
3) AUBRY, M. - Pialoux, P. - L'examen vestibulaire. Les signes provoqués. Les epréuves vestibulaires. Enc. Med. chirurg, oto-rhinolaryng. 20040 A 30: 1-10, 1960.

(*) Trabalho da Clínica Otorrínolaringológíca da Escola Paulista de Medicina (Prof. Dr. Paulo Mangabeira-Albernaz).
(**) Assistente.

Imprimir:

BJORL

 

 

 

 

Voltar Voltar      Topo Topo

 

GN1
All rights reserved - 1933 / 2024 © - Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico Facial