Versão Inglês

Ano:  1990  Vol. 56   Ed. 2  - Abril - Junho - ()

Seção: Artigos Originais

Páginas: 55 a 59

 

A hipófise na radiografia lateral de seios paranasais

Pituitary gland in lateral paranasals sinuses radiografia.

Autor(es): Dr. Lúcio A. Castagno*
Dra. Maria Lucia Carvalhal**

Palavras-chave:

Keywords: paranasal sinus; radiography; pituitary gland; sena, turcica; pituitary adenoma; empty sella syndrome.

Resumo:
Entre cerca de 4010 radiografias convencionais de seios paranasais foram encontrados 3 casos (menos de 1%) de duplo contorno e aumento de volume de sela túrcica: um secundário a adenoma (prolactinoma) hipofisário e dois por "síndrome da sela vazia-. Enfatiza-se a necessidade de investigar esses achados casuais em radiografias de seios paranasais, tão rotineiras ao otorrinolaringologista.

Introdução

Entre mais de seis mil pacientes atendidos em prática otorrinolaringológica geral nos últimos anos, 113 apresentavam enfermidades naso-sinusais, e cerca de 400 foram submetidos a radiografias convencionais de seios paranasais (Waters, Caldwell e perfil). Em 3 pacientes (menos de 1%) foi encontrado, como achado casual, aumento de volume e duplo contorno de sela túrcica na radiografia de perfil: um secundário a adenoma (prolactinoma) hipofisário e dois por "síndrome da sela vazia". Perdeu-se o acompanhamento de um dos pacientes e, portanto, apenas os exames radiográficos de dois estavam disponíveis.

Quando em uma investigação rotineira de enfermidade naso-sinusal encontra-se alguma alteração a nível de sela túrcica é necessário fazer o estudo com tomografia linear. Persistindo dúvidas, é feito o exame com tomografia computadorizada de sela túrcica, preferencialmente de alta resolução com cortes axiais e coronais, e reconstrução sagital quando possível (1).

A hipófise é responsável pelo controle hormonal do crescimento e maturação ordenados, reprodução, diversos aspectos do metabolismo, e aloja-se na estrutura óssea da sela túrcica. Superiormente apresenta o diafragma da sela e a dura-máter, através do qual o pedúnculo da glândula comunica-se com o hipotálamo. Tumores de hipófise podem determinar alterações radiográficas como aumento de volume da sela, desmineralização, ou deslocamento das margens ósseas. Craniofaringiomas e meningiomas podem apresentar alterações semelhantes e, particularmente, calcificações supra-selares.

Tumores de hipófise

A anatomia microscópica e patologia da hipófise anterior (adenohipófise) é complexa(2,3). As manifestações clínicas dos tumores dessa glândula são diversas (Tabela 1), em geral envolvendo alterações hormonais ou secundárias à compressão de estruturas adjacentes. O conceito clássico de células eosinofílicas, basofílicas, e cromofóbicas não funcionantes tem sido modificado. Parece haver cinco tipos distintos de células, envolvidas na secreção de cada hormônio. Os adenomas de hipófise podem apresentar várias alterações hormonais de acordo com o tipo de célula predominante (figura 1)(2). A maior parte dos casos atualmente diagnosticados são de tumores funcionais, com hipersecreção hormonal, e usualmente microadenomas (menos de 100 mm); tumores não funcionais são em geral microadenomas e com sintomas secundários a compressão e hipopituitarismo (4). O crescimento inferior do tumor leva a possível extensão para o rinofaringe, fístulas liquóricas e meningites recorrentes, e parece ocorrer em apenas 2% dos adenomas de hipófise; o crescimento superior pode levar a compressão do quiasma óptico e alterações do campo visual(1). Também pode haver compressão dos pares cranianos adjacentes, com paralisias motoras do M, IV e VI (figura 2). O exame oftalmológico deve incluir fundoscopia, motilidade ocular (III, IV e VI) e campimetria dos 30° centrais. O adenoma hipofisário representa 75% das lesões infraquiasmáticas que produzem hemianosia bitemporal: os demais incluem craniofaringiomas, meningiomas e lesões vasculares (aneurismas)fs). No caso de lesão são feitos os exames laboratoriais para dosagem dos hormônios hipofisários.

G.B.C., 16 anos, masculino, apresentava rinite alérgica. Na radiografia de seios paranasais constatou-se o duplo contorno de sela túrcica (figura 3a), confirmado na tomografia linear. Os exames laboratoriais de ,função hipofisária foram normais, exceto por hiperprolactinemia (150 ng/ml, normal menos que 20 ng/ml); nesse momento o paciente revelou que tinha galactorréia hd cerca de 9 meses. Excrete oftalmo-neurológico dentro da normalidade. A tomografta computadorizada (em 1984) confirmou a suspeita de adenoma hipofisdrio (prolactinoma) (figura 3 b-c). Foi submetido a ressecção trans-septo-esfenoidal do tumor com sucesso e normalização dos níveis séricos e prolactina.



Figura 1: A hipófise e o controle hormonal - As relações da hipófise na sela túrcica são esquematicamente apresentadas em corte sagital.
II = Nervo óptico; CA = Clinóide anterior; GH = Growth hormone (hormónio do crescimento); P = Prolactina; FSH = Follicie-stimulating hormone (hormônio fol(culo-estimulante); LH = Luteinizing hormone (luteinizante); TSH = Thyroid-stimulating hormone (tireotrópico); ACTH = Adrenocorticotropina; MSH = Mel anocyte-stimulating hormone (hormônio melanócito-estimulante); O = Oxitocina; ADH = Antidiuretic hormone (hormônio antidiurético).



Figura 2: Hipófise e estruturas neuro-vasculares adjacentes - Secção em corte coronal a nível da sela túrcica. III = Nervo óculo-motor, IV = Nervo troclear; CI = Artéria carótida interna; Vt - Ramo oftálmico do nervo trigëmio; VI = Nervo abducente; Vz = Ramo maxilar do nervo trigêmio.



TABELA I - Manifestações clínicas nos tumores de hipófise.

- 90% Alteração hormonal (relacionado ao tipo de tumor)
- 85% Diminuição da acuidade visual
- 75% Cefaléia inespecffica
- 66% Alteração no campo visual: 70-80% hemianopsia bitemporal (15% dessas assintomáticas)
- 50% Atrofia óptica
- 30% Paralisia III, IV e Vi
- Diversos: diplopia, impotência, hipotensão postural, intolerância ao frio

Obs: 2500 novos casos de adenoma hipotisário são diagnosticados a cada ano nos EUA.
Em 1000 autópsias "normais", 25% apresentavam adenomas de hipófise: 50% cromofóbicos,
7.5% eosinofficos e mais de 25% basofólicos. (2)


A síndrome da sela vazia

Nem todos os aumentos de volume da sela túrcica são causados por tumor. Em cerca de 25-33% dos casos pode ocorrer a "sela vazia" (2,7). Nesses pacientes, a cavidade esta repleta com líquido cefalo-raquidiano contido num saco subaracnoideo que possivelmente herniou através de um diafragma da sela defeituoso. A patogenia é discutida, mas pode ocorrer em conseqüência de Síndrome de Sheehan (necrose da glândula), pseudotumor cerebral (hipertensão intracraniana benigna), ou compressão pelas carótidas internas. Usualmente não há alteração endócrina clinicamente identificável e, as vezes, apenas leve hipopituitarismo detectado nas provas laboratoriais (2.8.9).

E.B., 56 anos, feminino, com história de rinite crônica. Na investigação radiográfica de seios para nasais apresentou aumento de volume de sela túrcica, comprovada tu tomografia linear (com erosão da parede inferior) (figura 4 a). Ausência de alterações hormonais e exare oftalmo-neurológico normal. A tomografia computadorizada (em 1989) revelou 1( líquor na sela túrcica caracterizando a "Síndrome da Sela Vazia" (figura 4 b-c).



Figura 3: C.B.C. (n. 144491), 16 anos, adenoma de hipófise. (A) Radiografia lateral de rinofaringe com duplo contorno de sela túrcica (seta). (B) CT-scan axial com prolactinoma hipofisário (setas). (C) CT-scan coronal (seta).






Figura 4 - E.B. (n. 52610GC), 56 anos, Síndrome da Sela Vazia.
(A) Tomografia linear de sela túrcica com erosão do assoalho da sela (setas);
(B) CT-scan axial com densidade de líquor a nível da sela túrcica (asterísco);
(C) CT-scan coronal com líquor na sela túrcica (arterísco).



Discussão

Esses relatos de casos devem chamar a atenção do otorrinolaringologista para a importância de uma análise completa dos exames radiográficos de seios paranasais, tão comumentemente utilizados.

Achados casuais de anormalidades na sela túrcica foram detectados em quase 1% das radiografias laterais de seios paranasais realizadas em nossos pacientes. Aumento de volume ou duplo contorno de sela túrcica pode ocorrer em adenoma de hipófise, craniofaringioma ou meningioma: nesses dois últimos geralmente associados a calcificações paraselares. A tomografia linear e, persistindo dúvidas, a tomografia computadorizada permite o diagnóstico preciso. Recentemente a imagem de Ressonância Magnética (MRI) tem contribuído ainda mais para o diagnóstico dos microadenomas hipofisário (10,11).


Summary

Three cases of double floor or increased volume of the sella turcica were found among 400 routine lateral radiographs of the paranasais sinuses. The first one was due to pituitary adenoma (prolactinoma), and the remaining two secondary to empty cell syndrome. It is emphasized the need to investigate these casual fundings in sinuses films so common to the otorhinolaryngologist.

Referência

1. Williams, R. - In Scott-Brown's Otolaryngology-tome IV, Butterworths, London, 5th edition, p. 348-359,1987.

2. Christy N. - In Cecil Textbook of Medicine, W.B Saunders Co, Philadelphia, 16th edition, p. 1170-1172,1982.

3. Ouaknne, G.; Hardy, J. - Microsurgical anatomy of the pituitary gland and sellar region. Am 5urg 1987, 53(5): 285-297.

4. Goodrich, L; Lee, K. - Pituitary tumors: Diagnosis and treatment in the 1980's. New Dimensions in ORL-HNS vol. 2, Elsevier Science Publishers, Amsterdan, p. 955-956, 1985.

5. Van der Mey, A. et al. - Large pituitary adenomas with extension into the nasopharynx. Ann Otol RhinoI Laryngol 1989, 98(8): 618-624.

6. Harrington, D. - Campos Visuales: Texto y Atlas de Perimetria Clínica. Editora Panamericana, Buenos Aires, p. 219-257, 1979.

7. Fusco, R. et al. - Empty sella syndrome: A case report. Ophthalmologia 1988, 196(2):92-97.

8. Adams, R.; Victor, M. - Principles of Neurology. McGraw-Hi11 Book Co, New York, p. 466, 1981.

9. White, M. et al. - Familial hypopituitarism associated with enlarged pituitary fossa and empty sella. Clin Endocrinol (OXF) 1986, 24(1):63-70.

10. Naheedy, M. et aí. - MRI and CT of sellar and parasellar disorders. Radio Clin North Am 1987, 25(4): 819-847.

11. Glaser, B. et al. - Magnetic Resonance Imaging of the pitutitary gland. Ckn Radiol 1986,37(1):9-14.




(*) Otorrinolaringologista, Clínica Dr. Castagno, Pelotas, RS.
(**) Oftalmologista, Clínica Dra. M.L. Carvalhal, Pelotas, RS.

Endereço para correspondência: Rua General Osório, 1585 -Pelotas -RS - 96020.

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