Versão Inglês

Ano:  1965  Vol. 33   Ed. 3  - Julho - Setembro - ()

Seção: -

Páginas: 123 a 128

 

EVOLUÇÃO DO TRATAMENTO CIRÚRGICO DA OTOESCLEROSE

Autor(es): Gabriel Pôrto

Resumo:
A história da cofo-cirurgia é dividida em três períodos. O primeiro período - primórdios da cirurgia - inicia-se em 1878 e termina em 1938. O segundo período - vulgarização da cirurgia da ato-esclerose - extende-se de 1938 a 1952. O terceiro-período moderno - inicia-se em 1952, e está em plena evolução: Em cada um dêstes períodos são estudadas as contribuições dos autores que promoveram o progresso da cofo-cirurgia.

A história da cirurgia da otoesclerose é das mais curtas, tem apenas 84 anos. Curta no espaço de tempo porém extensa, longa, fascinante e revolucionária em seus últimos dez anos de evolução.

Embora permaneça obscura a patogenia da otoesclerose, os recentes progressos da física e da biologia vêm permitindo aos otologistas de hoje adotarem técnicas cada vez mais audaciosas coroadas de pleno êxito. O admirável trabalho de nossos antepassados está produzindo os frutos que agora estão sendo por nós colhidos. O estudo da história é sempre um estímulo para o trabalho e a pesquisa, e nos ensina o constante valor desta última embora, quase sempre, o curto período da existência humana não permita que se aquilate do mérito e do valor da obra realizada.

Dispondo apenas de dez minutos para sintetizar a evolução da cirurgia da otoesclerose, deixaremos de lado as operações que agiriam sôbre a suposta patogenia da otoesclerose como as de ALONSO e CHIARINO e de WITTMACK e ainda intervenções, como de HUGHSON, que atuariam sobre a janela redonda.

Vamos nos ocupar exclusivamente da velha mobilização do estribo, da qual se originaram as modernas intervenções sôbre a janela oval e da criação da nova janela oval.

Para metodizar o estudo da evolução da cirurgia da otoesclerose, vamos dividí-lo em três períodos.

O primeiro período, primórdios da cirurgia, inicia-se em 1878 quando KESSEL realizou a 1.a mobilização do estribo e termina em 1938, com a fenestração de LEMPERT.

O segundo período, vulgarização da cirurgia da otoesclerose, coincidindo com a descoberta dos antibióticos, inicia-se em 1938 com a fenestração de LEMI'-ElZT e termina em 1952, quando ROSEM iniciou seus trabalhos sôbre a mobilização do estribo.

O terceiro - período moderno - inicia-se em 1952 com os trabalhos de ROSEM e está em plena evolução.

1:° Período - Primórdios da cirurgia

O tratamento cirúrgico da otoesclerose só poude ser tentado depois que os otologistas passaram a conhecer a patologia da doença.

Coube a VALSALVA em 1735 a prioridade de observar em exame post-mortem a ancilose do estribo determinante da surdez. Seguiram-se os trabalhos de TOYNBEE (1857), de TROLTSCH (1881), e, especialmente, os de TOYNEE (1883) que evidenciaram ser a ancilose do estribo na janela oval causa comum de surdez crônica progressiva no adulto.

Só 150 anos depois da descoberta de VALSALVA surgiu a cofo-cirurgia quando KESSEL em 1878 praticou a 1.a mobilização do estribo. Vieram depois os trabalhos de BOUCHERON (1888), FARACI (1890) e MIOT (1890). Merecem especial destaque as 200 mobilizações do estribo realizadas nessa época por MIOT, que ainda se servia do gaz de iluminação como foco de luz refletido no campo operatório.

Os resultados destas intervenções foram encorajadores. Entretanto, em 1900, os grandes lideres da otologia - LIEBENMANN, POLITZER, BOTEM, DENCH, MOURE e outros - passaram a condenar a cofo-cirurgia como perigosa e inútil. As razões desta atitude são pouco claras, possivelmente graves infecções da orelha média e interna abafaram o entusiasmo dois cirurgiões da época.

As mobilizações do estribo foram esquecidas até 1952 quando ROSEM passou a preconizá-las iniciando o período moderno da cofo-cirurgia.

Abandonada a idéia da mobilização do estribo, passaram os otologistas a idealizar a criação de uma nova janela oval. PASSOW, em 1897, foi o primeiro a admitir que os mesmos resultados obtidos com a mobilização poderiam ser alcançados com a criação de uma janela no labirinto. Orientado por esta ordem de idéias, praticou intervenção abrindo nova janela junto a janela oval, que foi revestida de mucosa da caixa. Os resultados imediatos foram muito bons.

Seguiram-se os trabalhos de FLODERUS (1899) fenestrando o canal semi-circular e usando enxêrto cutâneo de Thiersch; os de JENKINS (1913) de FREMEL (1922) relatando casos de PARANY operados em 1910.

Neste período dos primórdios da fenestração, dois nomes merecem especial destaque: HOLMGREN e SOURDILLE.

HOLMGREN, em 1916, iniciaria sua longa série de operações na otoesclerose, dedicando-se pertinazmente ao assunto durante mais de 30 anos.

Afastou o receio da abertura dar labirinto nãor infectado, demonstrando que a técnica cuidadosa da esterilização impedia a infecção. Provou que a audição poderia ser melhorada com a fenestração e demonstrou, com a colaboração de estudos experimentais de EGNSTON e NAGF,R, que o fechamento ósseo da fístula era responsável por muitos insucessos da -fenestração. E, ainda em 1923, HOL'MGREN passou a usar o microscópio em suas operações.

SOURDILLE, em 1924, inspirado em visita que fez a HOLMGREN, iniciou suas fenestrações.

Procurou desenvolver a transmissão das vibrações sonoras timpânicas à fístula do canal semi-circular recoberta de retalho eutático. Realizou a intervenção por êle denominada de timpanolabirintopexia fazendo exatamente em vários estágios, afim de evitar infecção dor labirinto, o que LEMPERT veio mais tarde a realizar em um só tempo. Da mesma maneira que HOLMGREN, SOURDILLE concluía que o fechamento da nova janela era a principal causa do fracasso da fenestração. Aqui terminamos o período que denominamos de primórdios da cofo-cirurgia.

2.º Período - Vulgarização da cirurgia da otoesclerose

Êste período inicia-se em 1938 com a primeira comunicação de LEMPERT feita a Academia de Medicina de New York apresentando 23 casos de fenestração dos quais 18 obtiveram êxito.

É inegável que a LEMPERT cabe posição de destaque na história da cofo-cirurgia. Além de introduzir grande aperfeiçoamento técnico na fenestração, divulgou seu processo operatório através
de cursos eminentemente práticos freqüentados por otologistas de todo mundo. Simplificou a técnica de SOURDILLE, fazendo a mente fixo, observou que a mobilização de per si já determinava melhoria de audição. Em 1953 ROSEN entusiasmado com seus primeiros casos, descreveu o processo de mobilização, relatando os bons resultados obtidos em 211 operações. Um grande número de otologistas passou a usar o processo de ROSEN obtendo resultados idênticos e sugerindo algumas modificações técnicas. A mobilização do estribo entusiasmava pela inocuidade do ato cirúrgico, permitindo rápido restabelecimento do paciente, com o conduto e tímpano em condições normais, sem cavidade mastóidea como acontecia na fenestração. Entretanto, seus resultados eram favoráveis apenas em 35% dos casos e algumas vêzes passageiros, pois a ancilose do estribo se restabelecia com o correr do tempo. Procurando melhorar os resultados da mobilização, passaram os otologistas a atuar diretamente sôbre a platina do estribo. Destas tentativas nasceram as técnicas mais usadas recentemente, como as de MICHEL, PORTMANN e JOHN SCHEA.

PORTMANN (1957) criou o método que denominou de interposição, separando o estribo, parcial ou totalmente, da janela oval e interpondo entre êle e a janela oval um retalho venoso, Restituia a mobilidade dá cadeia ossicular e procurava impedir a evolução do processo da otoesponjose.

Mais ou menos contemporâneamente, JOHN SCHEA (1958) iniciou a prática dá estapedectomia, recobrimento da janela oval com retalho venoso, e substituição do estribo por tubo de polietileno.

Várias modificações têm sido introduzidas na técnica de SCHEA. Assim HOUSE cobre a janela oval com Gelfoam e usa o tubo de polietileno, passando depois ao emprêgo da prótese metálica. KÓS utiliza retalho venoso e prótese metálica; SCHUKNECHT emprega a gordura para obliterar a janela oval e a prótese metálica, entre nós OLAVO EHMKE está usendo prótese de platina e retalho venoso duplo.

Com êstes novos métodos estão os otologistas obtendo excelentes resultados no que se refere a recuperação auditiva. Resultados muito melhores do que os que se obtinham com a fenestração, mesmo em casos em que não havia possibilidade de se obter êxito com a fenestração.

Entretanto, algumas complicações vêm sendo observadas. Delas a mais grave é a morte do labirinto, registrada em percentagem que varia de 2 a 6%. Via de regra manifesta-se esta complicação alguns meses após o ato cirúrgico. Sua gênese está ainda obscura embora publicações recentíssimas, como a de PRATT e WINCHESTES (1962), já estejam desvendando as causas desta misteriosa complicação.

Êstes autores acabam de descrever seis observações em que surgiram os sintomas que precedem a morte do labirinto onde encontraram hiperplasia fibrosa invadindo o labirinto. Estas reações foram encontradas em casos em que foi usado revestimento da janela com Gelfoam ou retalho venoso.

Os resultados imediatos das técnicas usadas atualmente são idênticas.

Qual delas será o melhor? É evidente que só uma longa observação pós-operatória poderá decidir. PORTMANN acha que é pena remover o estribo, uma vez que podemos conservá-lo. ROSEM em 1961 ainda defende a sua mobilização, achando que as estapedectomias devem ser reservadas a casos especiais.

Ainda pairam dúvidas sôbre o material mais indicado para revestir a janela oval e substituir o estribo. Alguns autores recorrem a próteses metálicas para obterem melhor fixação do que a que se consegue com o polietileno.

Estudos experimentais recentes (1962) de GOLDMANN, NALEBEUF e DRUSS sugerem que o teflon talvez seja material mais bem tolerado que o polietileno.

Seja como fôr, a cofo-cirurgia está despertando vivo interêsse e em franco progresso.

SUMMARY

HISTORICAL EVOLUTION OF OTOESCLEROSES SURGERY

This paper divides the history of otoesclerosis surgery, in three periods. The first period begins in 1873 and ends in 1938 and can be call "the beginnings of the surgery". The second one, iniciates in 1938 and it ends in 1952; is the period of surgery's vulgarization. The third period begins in 1952 and goes up just to our days. In each period are registered the most important works about the subject.

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