Versão Inglês

Ano:  1990  Vol. 56   Ed. 1  - Janeiro - Março - ()

Seção: Relato de Casos

Páginas: 31 a 32

 

Síndrome de Gradenigo: relato de caso

Gradenigds syndrome: report of case

Autor(es): Dra. Deise Mara Lima da Costa*
Dra. Vilma Cidade da Silva**
Dr. Simão Piltcher ***

Palavras-chave:

Keywords: otitis media

Resumo:
Em 1904 Gradenigo descreveu a síndrome de otorréia constante, dor de cabeça e diplopia que ele atribuiu à inflamação da porção petrosa 1. O objetivo deste trabalho é apresentar um caso de petrosite e uma revisão na literatura.

Introdução

A porção petrosa do osso temporal é uma estrutura piramidal que tem uma porção nasal e uma apical e três superfícies. O gânglio trigeminal e o VI par craniano são separados do ápice petroso ósseo somente por dura-máter e, assim, são vulneráveis a qualquer processo inflamatório que ocorra nesta região.

Enquanto que 80% dos ossos da mastóide são pneumatizados, apenas 30% dos ossos petrosos têm células aéreas que estendem-se até o ápice. O labirinto ósseo forma uma barreira natural à livre drenagem de secreção purulenta desde o ápice. Assim, a infecção do ápice petroso é potencialmente muito perigosa, devido à propensão a se espalhar medialmente e envolver meninges, seio cavernoso e cérebro 1.3.

Relato de caso

Um jovem de 15 anos foi internado no Hospital de Clínicas de Porto Alegre com quadro de otomastoidite à direita, com drenagem de secreção purulenta por trajeto fistuloso na região da ponta da mastóide, de instalação há algumas semanas. Apresentava também aumento de volume na região retroauricular direita, otalgia, otorréia, com diagnóstico, de otite média crônica colesteatomatosa. O ouvido esquerdo não apresentava alterações visíveis. O paciente era surdo profundo pós-lingüístico de causa desconhecida, tendo linguagem oral e leitura oro-facial razoáveis.

O paciente foi submetido à mastoidectomia radical no ouvido direito. Durante o procedimento houve exposição da dura-máter numa área de aproximadamente 1,5 cm de diâmetro, que foi recoberta com cera de osso. Foi encontrado colesteatoma na região do antro e ático. As estruturas anatômicas encontravam-se bastante alteradas e destruídas. Não havia ossículos. Foram localizadas as janelas redonda e oval e os canais semicirculares, mas não houve manipulação cirúrgica sobre os mesmos.

No 1 dia de pós-operatório (PO) o paciente começou a apresentar tonturas e vômitos. No 6°- PO o quadro persistia, além do aparecimento de cefaléia holocraniana, mais inter sa na região occipital. Mantinha sinais vitais estáveis. No 7 PO foi solicitada consultoria à Neurologia. O paciente não apresentava sinais infecção do sistema nervoso central. O hemograma era normal, estava apirético e sem sinais de irritação meníngea. A fundoscopia apresentava borramento de papilas. No 8. PO começou a queixar-se de dor retrocular direita.

Foi solicitada tomografia computadorizada de encéfalo, que apresentou resultado normal (dura-máter preservada junto à cirurgia; ausência de lesões expansivas ou abscesso cerebral). No 9° PO foi realizada punção lombar, cujo resultado foi normal. O quadro persistia, embora várias drogas tivessem sido usadas para o controle dos vômitos e tonturas (metoclopramida, clorpromazina, dimenidrato). No 12° PO o paciente teve um pico febril (38,52) e começou a apresentar paralisia do VI par craniano à direita, com conseqüente diplopia. Foi iniciada antibioticoterapia com Ampicilina, Cloranfenicol e Oxacilina.

O paciente evoluiu bem e no 22 PO foi suspensa a medicação. Entretanto, o paciente voltou a apresentar vômitos. No 28°- PO ele foi submetido à reintervenção cirúrgica. Foi encontrada grande quantidade de tecido de granulação e cera de osso os quais foram retirados. Não havia secreção purulenta, nem fístula aparente. O paciente evoluiu bem, tendo recebido alta cinco dias depois. À revisão, com seis meses de pós-operatório, o paciente estava assintomático e sem paralisia do VI par craniano.

DISCUSSÃO

As inflamações que se estendem dentro da porção petrosa já mereceram atenção especial em decênios anteriores. Desde 1950, entretanto, começaram a escassear o número de comunicações sobre petrosite, possivelmente pela magnitude da antibioticoterapia no controle desta afecção 3,4.

Petrosite é a inflamação da mucosa das células pneumatizadas da pirâmide que, quando se estendem, seja em forma de destruição óssea, inflamação de espaços medulares ou propagando-se seguindo vias pré-formadas (vasos, prolongações periósticas, etc.), provocará manifestações clínicas 3,4a.

A infecção das células aéreas do vértice do rochedo pode confluir e originar uma secreção persistente através de uma perfuração ou propagar-se e ir tomar a dura-máter suprajacente e penetrar nos espaços virtuais circundantes, originando sintomas específicos. A propagação do processo infeccioso à dura suprajacente irrita o nervo motor ocular externo (VI), que passa entre o ápice do rochedo e o esfenóide, por um conduto formado pela dura-máter e também ao gânglio do nervo trigêmeo (V). Esta propagação origina a clássica tríade sintomática de petrosite apical, descrita por Gradenigo, que consiste em otite média persistente, debilidade do músculo reto externo do mesmo lado com a conseguinte diplopia e dor retroauricular homolateral 5-s. A cefaléia da Síndrome de Gradenigo é devido à infiltração edematosa do Gânglio de Gasser, em presença de infecção das células da ponta do rochedo, formando uma petrite. A dor é intensa e profunda no ouvido, com irradiação para a região temporoparietal, retrocular ou às vezes mandibular 7. O paciente pode apresentar também mal estado geral e febre.

Deve-se suspeitar de petrosite em todo paciente com infecção de ouvido que apresente dor temporal ou retrorbitária que não tenha outra explicação.

As complicações mais comuns da petrosite são meningite, abscesso extradural e labirintite.

O tratamento da petrosite aguda incipiente pode ser clínico e consistir de antibioticoterapia parenteral. O tratamento inicial é feito para os microrganismos mais freqüentes na otite média aguda. Em crianças estes agentes são Streptococcus pneumoniae, Haemophilus influenzae e Streptococcus pyogenes; em adultos, entretanto, a infecção por hemófílio é menos freqüente. Os antibióticos de escolha são Ampicilina, Cloranfenicol, Eritromicina, Lincomicina ou Cefalotinas. Se o paciente melhora, continua-se o tratamento; entretanto, se os sinais clínicos persistem, o tratamento é cirúrgico. Com uma exenteração e drenagem evita-se que a infecção progrida.

SUMMARY

Gradenigo described the syndrome of constam. otorrhea, headache and diplopia which he attributed to inflamation of the petrous apex1.
The purpose of this paper is to present a case of petrositis and a reveiw of the literature.

BIBLIOGRAFIA

1. Gillanders DA: Gradenigo's syndrome revisited J Otolaryngol 1983; 12(3):169-74.
2. Mawson SR: Diseases of the Ear. Edward Annold (Publisher), Londres, p. 349-54 1979.
3. Meissner R. Die intraossale Petrositis, eine vergessene Differential Diagnose. HNO (Berlin) 1982; 30(8):301-303.
4. Berendes-Link-Z611ner. Tratado de Otorrinolaringologia - Tomo H112. Editorial Científico-Médica, Barcelona, p. 1193-1205, 1969.
5. Paparella MM, Shumrick DA. Otorrinolaringologia. Panamericana, Buenos Aires, 2ª. ed, p. 1471-75, 1987.
6. Hungria H. Otorrinolaringologia. Guanabara Koogan, Ria de Janeiro, 5a. ed, p. 336, 1984. 7. Silva WF. Cefaléias: diagnóstico e tratamento. MEDSI, Rio de Janeiro, p.223,1989.




* Médica residente de 3° ano do Serviço de Otorrinolaringologia do Hospital de Clínicas de Porto Alegre.
** Médica- estagiária do Serviço de Otorrinolaringologia do Hospital das Clínicas de Porto Alegre.
*** Professor Adjunto de Otorrinolaringologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

Trabalho realizado no Hospital de Clínicas de Porto Alegre Rua Ramiro Barcelos 2350-Porto Alegre

Autor responsável: Dra. Deise Costa -Rua São Francisco 9941201-Porto Alegre-RS- 90620.

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