Ano: 1996 Vol. 62 Ed. 5 - Setembro - Outubro - (1º)
Seção: Artigos Originais
Páginas: 366 a 374
Rubéola Materno-Fetal: Avaliação da Perda Auditiva por Audiometria de Tronco Cerebral.
Maternal Fetal Rubella: Assesment ofthe Hearing Loss with Brainstem Electric Responses Audiometry.
Autor(es):
Pedro Luiz Cóser*,
Luiz Celso Pereira Vilanova**.
Palavras-chave: Rubéola, surdez, potenciais auditivos evocados
Keywords: Rubella, deafness, evoked auditory potentials
Resumo:
Este estudo mostra a caracterização da perda auditiva decorrente de Rubéola Materno-Fetal encontrada em 100 ouvidos de 50 crianças com idades variando entre 6 meses e 10 anos. Utilizou-se a Audiometria de Tronco Cerebral para avaliar as respostas auditivas aos estímulos com "click" e com "tone pip" de 1000 Hz. O tipo de perda mais freqüente foi o sensorial. O grau de perda mais freqüente foi o profundo. As perdas foram simétricas na maioria das vezes, especialmente quando em um dos lados a perda era de grau profundo. As respostas ao "click" e ao "tonepip "de 1000 Hz foram semelhantes na maior parte das vezes, porém, em alguns casos em que nenhuma resposta foi obtida com o "click", obteve-se resposta com o "tone pip" de 1000Hz.
Abstract:
This work shows the characterization of the hearing loss due to maternal fetal rubella found in 100 ears of 50 children with ages among 6 months and 10 years old. The Brainstem Electric Responses Audiometry was used to check the auditive responses to the stimulus with click and with tone pip of 1000Hz. The most frequent type of hearing loss was the sensorial. The most frequent grade of hearing loss was lhe profound.Most of the time the hearing losses were symmetric, chiefly when one of the sides showed a profound degree of hearing loss. The responses to the click and to the tone pip of 1000 Hz were the same most of the time though in some cases in wich no response was gotten with the click we got a response with the tone pip of 1000 Hz.
INTRODUÇÃO
A rubéola já era conhecida desde o século passado e recebeu o nome pelo qual hoje é chamada em 1866, em um trabalho de VEALE (1), porém apenas em 1941 GREGG (2) atribuiu a ela a capacidade de lesar o feto quando a mãe grávida contraía a doença, sendo a presença de cataratas congênitas atribuída a infecção viral do feto.
Hoje, sabemos que mais de 71% das crianças nascem malformadas se as mães tiverem a infecção antes da décima-sexta semana de gestação (3), e que mais de 50% nascem com perda auditiva neurossensoria (4), ainda sendo possível ocorrerem malformações encefálicas, cardiovasculares, outras alterações oftalmológicas, distúrbios uro-genitais e endócrinológicos, com destaque para o Diabete Mellitus, com ocorrência alarmante de 20 a 40% dos casos, com início na adolescência ou na idade adulta jovem (5).
O ano de 1964 foi marcante na história da rubéola, pois nele foi registrada a maior epidemia da doença nos Estados Unidos, que resultou no nascimento de mais de 1000 crianças com a Síndrome da Rubéola Congênita apenas na cidade de Nova Iorque e, provavelmente, mais de
30 000 em todo os Estados Unidos, desastre incomparável a nada que pudesse ter ocorrido até então no mundo desenvolvido (6).
No mesmo ano, a vacina contra a rubéola passou a estar disponível para a população e foram observadas quedas extraordinárias na incidência da doença nos anos seguintes. Porém, trabalhos epidemio1ógicos feitos nos Estados Unidos (7), detectaram aumento significativo no número de casos nos últimos anos, possivelmente por falhas nos programas de vacinação, que estariam deixando de vacinar muitas pessoas.
A possibilidade de no Brasil ainda termos muitos novos casos de crianças com a Síndrome da Rubéola Congênita fica evidente (6) no trabalho que encontrou 18% das gestantes de 15 a 30 anos de idade sem anticorpos contra a rubéola e em outros que, estudando 7 000 gestantes, observou que 1,8% delas tiveram rubéola, sorologicamente comprovada, durante a gravidez.
A Audiometria de Tronco Cerebral, que surgiu após o trabalho de JEWETT (9) (1970), tem sido empregada em inúmeros centros de diagnóstico em audiologia para determinar a presença, grau e tipo de perda auditiva em adultos e crianças. Este método é considerado particularmente útil na avaliação de crianças pequenas e naquelas com múltiplas deficiências, uma vez que, nestes casos, a Audiometria Tonal Liminar é muitas vezes impossível de ser realizada e a Audiometria de Comportamento pode deixar dúvidas.
A função auditiva das crianças vítimas da Rubéola Materno-Fetal, estudada pela Audiometria de Tronco Cerebral, tem, no entanto, recebido muito pouca atenção na literatura, onde só encontramos os trabalhos de BENTO et al (10) e o de ALMEIDA et a (11) , que apresentaram resultados deste teste em amostras de 35 e 30 crianças, respectivamente.
Com o propósito de caracterizar melhor o padrão de perda auditiva em pacientes com perda auditiva decorrente de Rubéola Materno-Fetal, a partir do estudo com a Audiometria de Tronco Cerebral em resposta ao "click" e ao "tone pip" de 1 000 Hz, realizamos este trabalho.
MATERIAL E MÉTODO
A presente investigação constou da avaliação auditiva através da Audiometria de Tronco Cerebral de indivíduos selecionados de um total de 236 crianças com distúrbios de comunicação por perda auditiva, examinados no período de 1985 a 1993, na Clínica Professor Reinaldo Cóser em Santa Maria.
Foram incluídos neste trabalho 50 indivíduos com perda auditiva, sendo 27 do sexo masculino e 23 do sexo feminino, com idades variando entre 6 meses e 10 anos.
O Gráfico 1 ilustra a porcentagem de casos de deficiência auditiva decorrente de Rubéola Materno-Fetal em relação ao total de deficientes auditivos examinados no mesmo período.
O Gráfico 2 ilustra os porcentuais das diferentes faixas etárias.
Todos os indivíduos foram submetidos à avaliação multiprofissional, que consistiu em exame otorrinolaringo1ógico, neuropediátrico, Audiometria Comportamental e Imitanciometria, além da Audiometria de Tronco Cerebral. Baseado nos dados coletados à anamnese, de forma retrospectiva, e nas conclusões da avaliação multidisciplinar, os 50 indivíduos foram considerados como apresentando perda auditiva congênita, de provável origem por infecção pela Rubéola Materno-Fetal, segundo os critérios descritos pelo "COUNCIL OF STATE AND TERRITORIAL EPIDEM IOLOGISTS" (12) a dos Estados Unidos da América, em 1990.
GRÁFICO 1.
GRÁFICO 2.
Deste modo, o caso deveria ser considerado como de provável etiologia por Rubéola Congênita quando os sinais e sintomas clínicos fossem compatíveis, mesmo sem confirmação laboratorial ou sem ligação epidemiológica, com outro caso com comprovação laboratorial.
Assim sendo, a população estudada neste trabalho teve o diagnóstico baseado na presença de história de rubéola na gravidez. Essa impressão diagnostica era muito mais forte quando havia alterações cardíacas elou oftalmológicas associadas à surdez.
Os exames de Audiometria de Tronco Cerebral foram feitos com equipamento AMPLAID MEDELEC ERA MK III, em sala acusticamente preparada.
Os pacientes foram examinados durante o sono natural, após a alimentação ou, ocasionalmente, induzido por xarope de Hidrato de Cloral a 3%, na dose de 25 mg/kg de peso.
A aplificação da atividade bioelétrica captada dos indivíduos foi filtrada de 32 a 3 200 Hz;
polaridade dos estímulos apresentada foi alternada; a freqüência de apresentação dos estímulos foi de 10 pps na intensidade de 85 dBNA para que fosse feita a análise qualitativa das respostas (latência das ondas I, III e V) para estímulos com "click", e de 20 pps para determinar o nível mínimo de resposta ao "click" (com 100 microssegundos de duração) e ao "tone pip" de
1 000 Hz (com duas sinusóides, sendo meia de "rise e decay time"); a janela estudada foi de 20 mS, sendo o estímulo apresentado no centro da mesma.
Os estímulos foram calibrados psicoacusticamente em dBNA (decibéis referentes ao 0 de população jovem normal obtido psicoacusticamente).
Os graus de perda auditiva foram classificados de acordo com os seguintes critérios adaptados de DAVIS & SILVERMANN (13):
1) perda leve: níveis mínimos de resposta entre 21 e 40 dBNA;
2) perda moderada: níveis mínimos de resposta entre 41 e 70 dBNA;
3) perda severa: níveis mínimos de resposta entre 71 e 90 dBNA;
4) perda profunda: sem resposta aos estímulos empregados (saída máxima de 85 dBNA).
GRÁFICO 3 - Distribuição relativa dos tipos de perda auditiva obtidos na Audiometria de Tronco Cerebral dos 50 indivíduos com perda auditiva decorrente de Rubéola Materno-Fetal.
GRÁFICO 4 - Comparação de ocorrência dos graus de perda auditiva obtidos com a Audiometria de Tronco Cerebral dos 50 indivíduos com Rubéola Materno-Fetal, segundo o estímulo empregado.
GRÁFICO 5 - Ocorrência de simetria ou assimetría do grau de perda auditiva em 50 indivíduos com perda auditiva decorrente de Rubéola Materno-Fetal, conforme o tipo de estímulo empregado.
Nos casos em que não se obteve respostas para os estímulos com "click" e com o "tone pip" de
1 OOOHz até a intensidade máxima do equipamento , optamos por classificar o tipo de perda auditiva como provavelmente coclear, uma vez que, na maioria destes casos, a lesão é mesmo coclear (14) , não sendo possível, entretanto, excluir causas retrococleares (15, 16).
As respostas foram consideradas simétricas quando as perdas auditivas eram classificadas no mesmo grau de perda do lado direito e do lado esquerdo. A assimetria foi considerada de 1 grau quando a classificação do grau de perda de um lado era a classificação imediatamente adjacente em grau de severidade de perda que a do outro lado. A assimetria foi considerada de 2 graus quando as classificações dos lados não eram adjacentes em grau de severidade.
RESULTADOS
O Gráfico 3 mostra a ocorrência dos tipos de perda auditiva decorrente de Rubéola Materno-Fetal, determinados pelas respostas à Audiometria de Tronco Cerebral.
O Gráfico 4 mostra a distribuição da ocorrência dos graus de perda auditiva, de acordo com o nível mínimo de resposta ao "click" e ao "tone pip" de 1000 Hz.
O Gráfico 5 e os Quadros 1 e 2 apresentam a distribuição de ocorrência de simetria ou assimetria dos graus de perda auditiva em 100 ouvidos de 50 indivíduos com deficiência auditiva decorrente de Rubéola Materno-Fetal.
O Gráfico 6 traz a distribuição relativa do número de ouvidos resultantes dos cruzamentos das avaliações com "click" é com "tone pip" de 1 000 Hz, considerando a comparação dos graus de perda auditiva encontrados por um e outro estímulo na mesmo ouvido de cada indivíduo.
DISCUSSÃO
Com relação à proporção de crianças com perda auditiva decorrente de Rubéola Materno-Fetal em relação às demais causas, encontramos 21,18% de casos. Em nossa pesquisa bibliográfica (17, 18, 19, 11, 10), os valores variaram entre 4% e 42%, provavelmente em função do local onde foi realizado o estudo e dos critérios empregados para fazer o diagnóstico.
Observando a distribuição etária dos indivíduos estudados neste trabalho, notamos que 60% tiveram o diagnóstico da perda auditiva entre 1 e 3 anos de idade e apenas 14% antes de 1 ano de idade.
O aspecto favorável destes números é que no mínimo 74% das crianças portadoras de perda auditiva decorrente de Rubéola Materno-Fetal receberam diagnóstico preciso de sua deficiência até os três anos de idade.
O aspecto extremamente desfavorável é que apenas 14% destas crianças tiveram seu diagnóstico antes de 1 ano de idade, quando todas as mães sabiam ter sido atingidas pelo vírus da rubéola durante a gravidez e, portanto, todas as crianças já teriam nascido com a perda auditiva. Isto mostrou falha imperdoável na orientação à gestante e nos serviços de atendimento aos recém-nascidos, pois, com história positiva para rubéola na gravidez, deveria ter sido indicada a avaliação auditiva do lactente tão logo que possível, muito antes da criança ter apresentado o atraso de fala conseqüente à perda auditiva.
A utilização do "click" como estímulo acústico é praticamente comum a todos que utilizam a Audiometria de Tronco Cerebral para diagnóstico e pesquisa audiológica apesar da restrição de avaliar apenas a área de freqüências entre 1 000 e 4 000 Hz (20), ou entre 2 000 e 4 000 Hz (21, 22, 23, 16) . Os "click" tem sido usado de forma exclusiva pela maioria dos autores, quer em estudos de pacientes com problemas neurológicos com ouvidos normais, quer em pesquisa sobre maturação das vias auditivas (24, 25), quer em pesquisa sobre variabilidade de parâmetros de estímulo e análise de respostas 26, e até mesmo no diagnóstico de perdas auditivas (20, 27, 15,10, 11, 19).
A utilização de estímulos visando obter respostas de áreas de frequências mais graves é bem menos comum na literatura. Foi afirmado (22) que as dificuldades em avaliar freqüências abaixo de 1 000 Hz com a Audiometria de Tronco Cerebral seriam decorrentes da pouca sincronização das fibras nervosas procedentes da região da cóclea excitada por este tipo de estímulo auditivo e, também, pela necessidade da utilização de estímulos com curta duração, que acabariam excitando outras regiões da cóclea, diferentes da freqüência nominal do estímulo. Na Audiometria Tonal Liminar os estímulos acústicos durariam no mínimo 200 mS e sua energia cresceria suavemente durante 50 mS, decresceria da mesma forma e permaneceria estável pelo menos por 100 mS, desta forma excitariam áreas cerebrais específicas a cada freqüência. Como na Audiometria de Tronco Cerebral os eventos bioelétricos estudados aconteceriam nos primeiros 10 mS após a apresentação do estímulo, seriam necessários estímulos acústicos bem mais breves, da ordem de microsegundos como o "click", de alguns mS como o "tone pip", ou um pouco maiores, como o "tone burst", que acabariam sendo imprecisos nas áreas cerebrais que iriam excitar. BRACKMANN et a12 (21) empregaram o "tone pip" de 1 000 Hz, para avaliar
freqüências mais graves que as possíveis com o "click" de forma isolada, porém não foram detalhadas diferenças efetivamente encontradas nas respostas obtidas com ele e com o "click". STAPELLS et a1 (28) empregaram "tonebursts" de 500, 1 000, 2 000 e 4 000 Hz, concomitantemente à apresentação de ruído mascarados fendido nas freqüências nominais dos estímulos. Encontraram correlação muito boa entre os limiares tonais e os obtidos com esta técnica. HOOD " empregou o "toneburst" de 500 Hz também sem comprovação detalhada sobre as diferenças entre este estímulo e o "click.
GRÁFICO 6 -Ocorrência dos graus de perda auditiva obtidos através do "tone pip" em 99 ouvidos, de 100 indivíduos com perda auditiva decorrente de Rubéola Materno-Fetal, conforme o grau de perda auditiva obtido através do "click", no mesmo ouvidos.
Concluímos, da leitura destes trabalhos, que a utilização do "click" associada ao "tone pip" de
1 000 Hz seria a maneira mais completa de determinar o topodiagnóstico da perda auditiva e ainda fazer estimativa do nível de audição em freqüências abaixo de 2 000 Hz, tentando estabelecer a inclinação da curva auditiva, uma vez que não dispúnhamos de equipamento gerador de ruído fendido.
Encontramos 37 perdas auditivas do tipo coclear, 1 de tipo retrococlear, 62 do tipo provavelmente coclear (não apresentaram respostas aos estímulos com "click" e com "tone pip" de 1 000 Hz até a saída máxima do equipamento empregado) e nenhuma do tipo de transmissão. Ou seja, 99 cocleares ou provavelmente cocleares e uma retrococlear.
Estes resultados estão apresentados no Gráfico 3.
Na literatura, encontramos apenas perdas auditivas do tipo coclear, tanto nos trabalhos sem avaliação eletrofisiológica (29, 18, 5, 30), como naqueles com Eletrocócleografia e/ou Audíornetria de Tronco cerebral (10, 11).
Os resultados deste trabalho, portanto, coincidem com a literatura consultada, com exceção apenas da perda retrococlear encontrada.
A criança em que a alteração retrococlear foi detectada apresentava microcefalia, encefalopatia grave, catarata bilateral e malformação cardíaca, além da perda auditiva. O seu comportamento mostrou falta completa de qualquer tipo de comunicação e, mesmo sem uso de prótese auditiva, aprendeu a emitir palavras, que usava sem finalidade de comunicação, muitas vezes repetindo inúmeras vezes o que lhe era dito.
É provável que esta seja a primeira vez que se documentou, através da Audiometria de Tronco Cerebral, alteração auditiva retrococlear em decorrência de Rubéola Materna-Fetal.
A possibilidade de que este tipo de alteração possa estar presente em outras crianças portadoras da Síndrome da Rubéola Congênita deveria ser levada em consideração, principalmente naquelas com encefalopatia associada, porém acreditamos que também naquelas em que o comprometimento neurológico não seja tão óbvio.
Encontramos 16,17% de perdas auditivas de grau moderado, 13,13% de grau severo e 70,70% de grau profundo, usando o "click" como estímulo acústico. Quando o estímulo foi o "tone pip" de
1 000 Hz, as perdas auditivas encontradas foram 20,20% de grau moderado, 14,14% de grau severo e 65,66% de grau profundo (Gráfico 4).
Na literatura (29, 5, 17, 30, 10, 11), pudemos verificar que a ocorrência de perdas profundas variou entre 43% e 86%, de perdas severas entre 4,77% e 31,5% e de moderadas entre 0
e 31%, mostrando clara tendência a maior número de perdas profundas e número menor e semelhante entre si para as perdas severas e moderadas.
Encontramos 64% de respostas simétricas e 36% assimétricas, com relação ao grau de perda auditiva obtido em um lado e outro do mesmo indivíduo, quando o estímulo acústico empregado foi o "click" e 60% simétricas e 40% assimétricas, quando o estímulo foi o "tone pip" de
1 000 Hz (Gráfico 5).
Nos casos assimétricos, ficou demonstrado que 50% das vezes a assimetria foi de 1 grau e nos outros 50% de 2 graus (Quadro 1).
A distribuição de ocorrência de simetria e assimetria em função do grau de perda auditiva mostrou que, quando a perda de um lado foi de grau profundo, em 70,97% das vezes o grau de perda do outro lado também era; porém, quando a perda de um lado foi de grau severo e médio, o mesmo resultado s6 ocorreu do outro lado em 35,30% e 40,00% das vezes, respectivamente (Quadro 2). A análise estatística mostrou que a ocorrência de simetria e assimetria esteve significantemente relacionada com o grau de perda auditiva.
Na literatura (29, 30, 11), encontramos ocorrência de assimetria entre 6 e 33%.
A ocorrência de perdas auditivas assimétricas neste trabalho (36% e 40%) foi, portanto, pouco maior do que a encontrada na literatura (de 6,25 a 33%).
A análise dos resultados obtidos, comparando os níveis mínimos de resposta ao "click" com aqueles encontrados com o "tone pip" de 1 000 Hz, em cada uma das orelhas avaliadas mostrou, de maneira geral, que o grau de perda auditiva previsto por cada um dos dois estímulos foi o mesmo em 100% das perdas moderadas, 46,15% das severas e 88,73% das profundas sugerindo curva audiométrica horizontalizada na área de frequências abrangida pelo teste e, nos demais casos, foi possível prever inclinação de curva audiométrica de tipo descendente em 30,76% das perdas severas e em 11,21% das profundas (graus obtidos em resposta ao "click") e ascendente em 23,07% das severas obtidas em resposta ao "click" (a curva audiométrica seria descendente quando o nível mínimo de resposta ao "ciick" ocorresse em intensidade mais forte do que ao "tone pip" de 1 000 Hz, e seria ascendente quando ocorresse o contrário).
Outro fato importante foi que em 11,21% das orelhas em que não obtivermos nenhuma resposta ao "click", o que faria a perda auditiva prevista ser de grau profundo, entre 90
e 120 dBNA, sem possibilidade de estabelecer valor aproximado entre estes extremos da perda do tipo profundo, uma vez que o máximo que se conseguiu produzir no fone do audiômetro foi de 85 dBNA. Nestes mesmos ouvidos, entretanto, obtivemos respostas estimulando com o "tone pip" de 1 000 Hz em nível de 80 a 85 dBNA, o que mudou a classificação do grau de perda de profundo para severo, dando muito mais precisão ao grau de perda previsto.
CONCLUSÕES
1. o tipo de perda auditiva mais freqüentemente encontrado foi o sensorial, em 99% dos casos (provavelmente coclear 62% e coclear 37%); o retrococlear, em apenas 1%;
2. o grau da perda auditiva mais freqüentemente encontrado foi o profundo (62%), o severo (17%) e o moderado (20%);
3. a maioria dos indivíduos testados apresentou o mesmo grau de perda auditiva nos dois lados (respostas simétricas) quando testados usando o "click" (64%) e o "tone pip" (60%);
4. nos indivíduos com perdas auditivas assimétricas, a diferença de um lado para o outro foi de 1 grau (50%) ou de 2 graus (50%);
5. nos indivíduos com grau de perda auditiva profundo em um dos lados, a ocorrência de perda auditiva assimétrica foi, de modo estatisticamente significante, menos freqüente (29%). Nas perdas moderadas, observou-se assimetria em 60% das vezes e, nas severas, em 65%;
6. as respostas obtidas através da estimulação com "click" e aquelas obtidas pela estimulação com "tone pip" de 1 000 Hz na mesma orelha mostraram o mesmo grau de perda em 100% dos indivíduos com perda moderada, 46% com perda severa e 88% com perda profunda;
7. nos indivíduos diagnosticados como portadores de perda auditiva profunda segundo a resposta ao "click", observamos em 11% respostas com o "tone pip" de 1000 Hz que possibilitaram serem diagnosticados, mais adequadamente, como portadores de perda auditiva severa.
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* Professor da Audiologia do Departamento de Otorrino e Fonoaudiologia da Universidade Federal de Santa Maria.
** Professor da Disciplina de Neurologia e Chefe do Setor de Neurologia Infantil da Escola Paulista de Medicina.
Universidade Federal de Santa Maria - Departamento de Otorrino e Fonoaudiologia - Campus Universitário - Camobi - Santa Maria - RS.
Endereço para correspondência: Pedro Luiz Cóser - Rua Duque de Caxias, 1668/304 - CEP 97015-190 - Santa Maria, RS.
Extraído da tese Apresentada a UFSM para obtenção do título de Mestre em Distúrbios da Comunicação Humana em 30/10/1995.
Artigo recebido em 05 de fevereiro de 1996.
Artigo aceito em 11 de março de 1996.