Versão Inglês

Ano:  1996  Vol. 62   Ed. 3  - Maio - Junho - ()

Seção: Relato de Casos

Páginas: 254 a 260

 

Plasmocitoma de Laringe com Apresentação Clínica de Pólipo.

Plasmacytoma Occurring as a Laryngeal Polip.

Autor(es): Luiz Fernando Bleggi Torres*,
Joel Takashi Totsugui**,
Elmar Allen Fugmann***,
Caio Soares***,
Betina Werner*.

Palavras-chave: plasmocitoma, laringe, plasmocitoma extra-medular

Keywords: Plasmacytoma, larynx, extra-medular plasmacytoma

Resumo:
Os autores apresentam um caso de pólipo laríngeo em homem de 70 anos. O paciente foi admitido no hospital com história de disfonia e tosse seca com evolução de 2 anos. A laringoscopia evidenciou um pólipo pediculado em região supra-glótica, quando foi realizada a biópsia excisional. O diagnóstico histopatológico foi de plasmocitoma e a microscopia eletrônica evidenciou células com abundante retículo endoplasmático. Seguiu-se tratamento radioterápico adjuvante de laringe e todos os exames complementares - laboratoriais e de imagem - estavam normais. O paciente apresenta-se livre de doença até o momento.

Abstract:
The authors present a case of a 70-yeard-old man with progressive hoarseness due to a laryngeal polyp. Excisional biopsy proved the mass to be a plasmacytoma. Electron microscopy demonstrated cells with large endoplasmic reticulum characteristic of plasmacytes. Additional examination of the patient did not reveal dissemination of the neoplasia. The patient received adjuvant radiotheropy and is still free of disease.

INTRODUÇÃO

Plasmocitomas extra-medulares (PEM) são tumores de células plasmáticas derivadas dos linfócitos B. Estas células são responsáveis pela síntese de imunoglobulinas, principalmente as de cadeia leve (kappa e lambda). Na maioria dos casos - de 75 a 90% - os PEM localizam-se no trato aerodigestivo superior, onde normalmente há maior quantidade de plasmócitos (1-7). Destes, a grande maioria localiza-se em nariz, nasofaringe e seios paranasais, sendo incomuns em laringe (1, 2, 6-8).

CASO CLÍNICO

Paciente masculino, 70 anos, foi admitido no serviço de Endoscopia Per-oral do Hospital de Clínicas da UFPR em março de 1994. Apresentava disfonia, tosse seca e leve dispnéia há aproximadamente 2 anos, com agravamento do quadro há 4 meses. Relatava astenia, epigastralgia e emagrecimento de 3 kg em 30 dias. O exame físico era normal e não havia linfonodomegalia cervical.

A laringoscopia direta revelou lesão polipóide avermelhada, não ulcerada, em região supraglótica e que ocupava a comissura anterior. A luz de laringe estava parcialmente obstruída pelo tumor, que causava limitação na mobilidade das pregas vocais. A broncoscopia revelou subglote, traquéia e brônquios normais. O paciente foi submetido à microcirurgia de laringe para exérese da lesão.

O exame histopatológico mostrou plasmocitoma composto por lençol de células de citoplasma eosinofilico, com núcleos discretamente pleomórficos, arredondados, excêntricos e com
Cromatina radiada. Notou-se a presença de plasmablastos e focos de depósito amilóide (Figs. 1 e 2). A microscopia eletrônica confirmou a presença de grande quantidade de plasmócitos com complexo de Golgi proeminente (Fig. 3).



Figura 1. - Corte histológico de mucosa laríngea revestido por epitélio respiratório (E), contendo no córion (C) infiltrado plasmocitário neoplásico. HE x100.



Figura 2. - Detalhe do infiltrado neoplásico composto por plasmócitos com núcleo excênrico e citoplasma amplo (seta). Presença de depósito de amilóide (A). HE x400.



Os exames de sangue e de urina foram normais. A proteína de Bence-Jones foi negativa. Radiografia simples de esqueleto e aspirado de medula óssea não apresentaram alterações. A endoscopia digestiva alta evidenciou úlcera duodenal ativa.

Após o tratamento cirúrgico da laringe, o paciente obteve melhora acentuada dos sintomas e foi submetido a radioterapia adjuvante, estando atualmente sob controle ambulatorial e livre de doença.

DISCUSSÃO

As células plasmáticas são distribuídas em todos os tecidos do organismo, mas são encontradas em maior número na medula óssea, linfonodos, amígdalas palatinas, lâmina própria do trato gastrointestinal e na mucosa do nariz e do seios paranasais. A proliferação neoplásica das células plasmáticas resulta numa população imunologicamente homogênea que pode produzir doença disseminada ou localizada. Esta neoplasias representam menos de 1% de todas as neoplasias malignas de cabeça e pescoço (1, 2, 3, 4).

A forma localizada dos plasmocitomas foi descrita pela primeira vez em 1905 por Schridde. Ela pode ser subdividida em dois grupos: plasmocitoma solitário do osso (PSO) e plasmocitoma extra-medular (PEM). O primeiro diz respeito a neoplasia de células plasmáticas restrita a um osso, que pode eventualmente disseminar-se e tornar-se indistingüível do mieloma múltiplo. O PEM, por sua vez, origina-se na submucosa de tecidos fora da medula óssea e com menos freqüência transforma-se na forma disseminada (4-6, 8, 9). Corresponde a menos de 10% de todas as neoplasias de células plasmátícas (7, 8, 10).

A localização mais freqüente do PEM é na cabeça e pescoço. Nestes, os seios paranasais e a mucosa do nariz e nasofarínge são os locais mais acometidos por esta neoplasia. Outras localizações do PEM citadas na literatura são: glândulas salivares e lacrimais, pele, órbita, glândula tiróide, orofaringe, laringe, traquéia, linfonodos cervícaís, mesentéricos e pélvicos, pleura, estômago, pâncreas, rim, baço, mamas, ovários, testículos e cordão espermático (2, 3, 5-9, 11). Os PEM de laringe são mais comuns na epiglote, seguida pelas falsas cordas vocais e pelo ventrículo (1, 3, 4, 6, 9).

A incidência do plasmocitoma de laringe predomina dos 40 aos 70 anos (1, 3-9). Prevalece no sexo masculino, com relação homem/mulher de 2-4:1 (1, 4-6).

A maioria dos pacientes com plasmocitoma de laringe apresenta rouquidão progressiva, por período de vários meses a alguns anos. As apresentações agudas são raras, geralmente surgem em conseqüência de hemorragia ou infecção sobre o tumor. Outros sintomas que podem aparecer são dispnéia e tosse seca. Disfagia, obstrução total da laringe, estridor, dor e destruição óssea são sintomas mais tardios e se relacionam com o avanço local da doença (1, 3, 4, 6, 7).

Hemograma, eletroforese de proteínas, raio-X de esqueleto e aspirado de medula óssea geralmente são normais. A pesquisa de proteínas de Bence-Jones também é negativa na maioria das vezes (1, 6, 9). Maniglia (1983) (3) e Cabrera et al. (1992) (6) sugerem a negatividade e normalidade destes exames corno critério diagnóstico para PEM. Os exames laboratoriais anormais sugerem comprometimento sistêmico da doença.



Figura 3. - Microscopia eletrônica demonstrando plasmócito com núcleo oval (N), cromatina heterogênea e citiplasma rico em complexo de Golgi composto por lamelas paralelas (G). Acetato de uranila/citrato de chumbo x10500.



Os plasmocitomas de laringe apresentam-se com pólipos lobulados ou placas espessadas, sendo geralmente submucosos e com superfície lisa, mas podem ulcerar quando localmente avançados (1, 3, 4, 6, 7). A multiplicidade é observada em 10 a 20% dos casos (1, 5, 6). O padrão microscópico é de coleção de plasmócitos, com maturidade variada, imersos em cstroma esparso, por vezes com depósito amilóide (1, 3-9) Suas características histológicas não refletem o comportamento biológico (1, 5, 6). O diagnóstico diferencial deve ser feito com granuloma de células plasmáticas, neuroblastoma, carcinoma pouco diferenciado, linfoma, melanoma e sarcoma imunoblástico (1, 3-7,9).

O tratamento de escolha para o PEM é a radioterapia. A dose de radiação recomendada é 3000 a 6000 rads por 5 a 7 semanas. A cirurgia deve ser utilizada para fins de biópsia e exérese de lesões residuais. A combinação dos dois, cirurgia e radioterapia, também pode ser utilizada. A quimioterapia é reservada para doença localmente avançada, recorrente ou disseminada (1, 3-8).

A recorrência local aparece em até 10 anos após o diagnóstico inicial do tumor (1, 6) As metástases para linfonodos cervicais estão presentes em 14 a 26% dos casos (1, 4, 6). Não existem critérios prognósticos quando se trata da transformação do PEM em mieloma múltiplo. Acredita-se que isso possa ocorrer em taxa que varia de 8 a 40% (1, 4-6, 8-10). Holland et al. (1991) (8) sugerem o tamanho do tumor, o nível das proteínas plasmáticas e a presença de espícula de proteína monoclonal na eletroforese do plasma como critérios para a identificação das lesões solitárias que se transformarão em mieloma múltiplo.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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3. MANIGLIA, A. J. - Plasmacytoma of thc larynx. Laryngoscope, 93: 741-4, 1983.
4. WEISSMAN, J. L; MYERS, J. N.; KAPADIA, L. B. - Extramedullary plasmacytoma of thc larynx. Am. J. Otolaryngol., 14: 128-31, 1993.
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11. DU PREEZ, J. H.; BRANCA, E. P. - Plasmacytoma of the skull: case reports. Neurosurgery, 29:902-6, 1991.




Seção de Neuropatologia e Microscopia Eletrônica* do Serviço de Anatomia Patológica** e Serviço de Bronco-esofagologia*** do Hospital de Clínicas de Curitiba, Universidade Federal do Paraná.

Endereço para correspondências: Luiz F. Bleggi Torres, M. D-, Ph. D. Seção de Neuropatologia e Microscopia Eletrônica, Serviço de Anatomia Patológica, Departamento de Patologia Médica, Hospital de Clínicas - Rua General Carneiro, 181; CEP 80060-090; Curitiba - PR - Brasil. FAX 55 41 264-5872.

Artigo recebido em 10 de abril de 1995.
Artigo aceito em 05 de fevereiro de 1996.

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