Versão Inglês

Ano:  1982  Vol. 48   Ed. 2  - Abril - Junho - ()

Seção: Artigos Originais

Páginas: 28 a 31

 

CISTOS DERMOIDES E FISTULAS DO DORSO DA PIRÃMIDE NASAL

Autor(es): NELSON ALVARES CRUZ FILHO 1

Resumo:
O autor, baseado na obsersação de quatro (4) casos de cistos dermóides do nariz, fez breve revisão da literatura ocidental perlinente. Cita as duas principais teorias embriogênicas desses cistos, capazes de explicar a sua extensão ao endocrânio. 0 autor discute a questão das di/érentes técnicas cirúrgicas, lembrando a necessidade, em alguns casos raros, do emprego de vias combinadas nasais e cranianas parei exérese completa da afecção.


fig 1 - fistula no dorso da piramide nasal.



Os cistos dermóides nasais são más formações congênitas raras. Podem estar associados a uma fistula, a outros cistos serem isolados ou mesmo haver somente uma fistula.

O diagnóstico é fácil e o achado de cabelos exteriorizando-se por uma pequena depressão no dorso da pirâmide nasal é patognomônico da afecção (Fig. I).

Os cistos superficiais, abaulando a pele, são mais fáceis de diagnosticar-se que os profundos, que muitas vezes não se tornam evidentes, até que produzam uma deformidade ou se tornem infectados. Comumente localizam-se junto ao osso próprio nasal, mas algumas vezes são encontrados no septo nasal, etmóide, esfenóide ou mesmo em plena cavidade craniana em contato com a duramáter.

O diagnóstico diferencial deve ser feito sobretudo com encefaloceles, meningoceles, gliomas nasais e neurofibromas.

No exame radiológico simples a separação dos ossos nasais, desdobramento do repto nasal, presença de tecido mote anômalo dentro do septo, perda de substância do frontal, irregularidade e assimetria das células etmoidais podem ser encontrados. Em alguns casos planigrafias são de grande valor. As fistulografias são extremamente importantes delimitando a direção e extensão das fistulas.

Histologicamente a parede do cisto é constituída internamente por epitélio pavimentoso estratificado, que assenta sobre tecido conjuntivo mais ou menos denso, onde há foliculos pilosos, glândulas sudoríparas e glândulas sebáceas. Sua parede externa é formada por tecido conjuntivo (Figs. 2 e 3).



fig. 2 - Cisto dermoide - imagem macroscópica



Existem duas teorias principais tentando explicar a embriogênese dos cistos dermóides. A reais aceita é a teoria de Luongo (11), mostrando que a origem desses cistos e fístulas se deve à inclusão no tecido ósseo de ilhotas epiteliais cutâneas durante o desenvolvimento do nariz fetal.

Teoricamente um cisto pode difundir-se do espaço pré-nasal em direção ao endocrânio, pela sua extremidade caudal, pelo fundo do forame cego com seu revestimento meníngeo e fontanela nasofrontal, pontos frágeis de propagação de processos expansivos.

No entanto é a teoria craniana que consegue explicar melhor os cistos de topografia mais alta, mais intimamente correlacionados com o endocrânio, onde haveria um defeito de fechamento do neuroporo anterior, com persistência de restos ectodérmicos em uma linha localizada da base do crânio, passando ao nível da porção anterior da sela túrcica, lâmina perpendicular do etmóide, sutura frontonasal, e terminando sobre uma linha mediana ou paramediana do dorso do nariz.

Esses cistos, que podem provocar somente um defeito cosmético, às vezes podem complicar-se. Embora raras, suas complicações podem ser graves, pondo em risco a vida do paciente. Abscessos podem formar-se e drenar para o meio externo ou para dentro da cavidade nasal, sendo possível a ocorrência de osteomielite e meningite.

Entre os trabalhos consultados os três seguintes registraram casos que atingiam o endocrânio ou tiveram complicações endocramanas (meningite):

Plewes e Jacobson (13) observaram complicações neurológicas em três membros de uma mesma família. O pai, com história de epilepsia há 10 anos, tinha se submetido a :



fig. 3 - Cisto dermóide-corte histológico.



remoção de um cisto nasal há alguns anos. Apresentava semiologia neurológica compatível com processo expansivo endocraniano. Através de uma craniotomia frontal direita encontrou-se um extenso cisto dermóide próximo ao quiasma óptico. Um de seus filhos tinha história de episódios recorrentes de obstrução nasal, tendo-se submetido à ressecção da, cartilagem septal, quando um cisto foi notado. Nova cirurgia foi realizada, alguns anos depois, para remoção desse cisto, tendo o paciente evoluído com rinorréia cérebro-espinhal e meningite. A relação de causa-efeito faz supor o estreito relacionamento cisto-espaço subaracnoideu. E: ainda uma filha com história de anosinia, tinha ao exame um alargamento do septo nasal. O exame radiológico revelou pequeno defeito na linha média frontal. Optou-se por via de acesso combinada nasal e intracraniana, tendo-se retirado um cisto derrnóide.



Fig. 4 - (Apud Denecke and Meyer) - Incisão semi-oval próxima à abertura da fístula.



Bourdial e Natali (I) relataram caso de cisto dermóide nasal cujo pedículo inseria-se na duramáter da fossa cerebral anterior.

Littlewood (10) descreveu caso com pedículo estendendo-se à duramáter adjacente à região da hipófise.

Para o tratamento desse tipo de deformidade várias técnicas cirúrgicas têm sido empregadas, sempre com o cuidado de se fazer uma remoção completa da afecção para que não ocorra recidiva.

Uma extensa incisão semi-oval na linha média nasal e nas vertentes, à justa distância da abertura da fistula, pode ser feita (Fig. 4).

A fístula é seguida e dissecada cuidadosamente, assim como o cisto, que deve permanecer intacto, se possível, não deixando escapar a substância semifluida de seu interior. Cuidado deve ser tomado quando o cisto está em contatei com a duramáter para que essa não seja ferida. Após a retirada do cisto uma depressão ocorre no dorso nasal, a qual pode ser preenchida por tecido subcutâneo, enxerto de fáscia de músculo, cartilagem ou osso. Outra medida que pode ser empregada é a de rodar um retalho de tecido subcutâneo e fibras musculares da pars transversa do m. nasalis da vertente lateral do nariz ou do m. prócerus da raiz nasal, com ou sem fáscia ou periósteo.

Uma via de acesso mais ampla pode ser conseguida elevando-se a pele nasal com incisóes em torno das asas nasais e região nasolabial (Figs. 5 e 6).

Em alguns casos de cistos em estreita relação com o endocrânio deve-se optar por uma via de acesso combinada nasal e endocraniana para que sua remoção seja completa.



Fig. 5 - (Apud Wulter, C.) - Isolamento e dissecção de fistula nasal.



Fig. 6 - (Apwd Wulter, C.) - Elevação da pele nasal, pela incisão de Hauberisser, para uma via de acesso mais ampla.



Fig. 7 - Fístula próxima ao canto interno da Órbita.



DISCUSSÃO

Dos nossos quatro casos de cistos dermóides nasais todos eram acompanhados de fístulas nasais. Em três desses pacientes a fístula abria-se na linha mediana e, em uma paciente, próximo ao canto interno da órbita. Essa paciente tinha anteriormente uma fístula no dorso da pirâmide nasal, tendo sido operada por médico dermatologista. Algum tempo depois apareceu fístula junto ao canto interno da órbita (Fig. 7).

Claros y Claros (4) mostram caso de fístula abrindo-se na linha mediana logo abaixo da base do nariz, no sulco subnasal.

CONCLUSÃO

Os cistos dermóides e as fistulas nasais são defeitos embriogênicos raros. Por se relacionarem excepcionalmente com o endocrânio e a possibilidade de complicações graves, torna-se necessário que sejam sempre extensamente estudados, para que a exérese seja realizada com a programação cirúrgica adequada, pois pode ser necessário via de acesso ao endocrânio, em um ou outro caso.

SUMMARY

The author, based on lhe study of four dijferent cases of dermoid cysts of the nose, prepared a review of lhe available publications in several svestern languages. He mentions lhe two rnain embrvonic theories of' those cysts, where intracranial e.rpansion could be explained. The author alço analyses diffèrent surgical techniques, reminding lhe necessity, in some rare cases of applving combined acesss, nasal and cranial, for t{ie complete rernoval of lhe cyst.

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA

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2. BROWNSTEIN, M.H.; HELWING, E.B. -Subcutaneous DermoidCysts-Arch. Derinatol. 107:237-239, 1973.

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4. CLAROS, P.; CLAROS, A. - Los quistes dermóides y fistulas congénitas dez dorso de Ia nariz. Acta. Otorrinolaringologica Espanola. IVA 17-128, 1976.

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1 - Médico residente de ORL, do Hospital da FMUSP.

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