Versão Inglês

Ano:  1978  Vol. 44   Ed. 2  - Maio - Agosto - ()

Seção: Artigos Originais

Páginas: 160 a 166

 

LINFOEPITELIOMA DE RINOFARINGE *

LYMPHOEPITHELIOMA OF NASOPHARYNX

Autor(es): ** Dr. José Antonio Pinto
*** Dr. Carlos Antonio Rodrigues de Faria
*** Dr. Domingos Lamônica Neto
*** Dr. Luiz Antonio Baldivieso Schemy
*** Dr. Ricardo Azevedo Sallum

Resumo:
São apresentados três casos de Linfoepitelioma de rinofaringe com características diferentes: o 1.º teve como sintomatologia principal, epistaxe; o 2.º caracterizou-se por queixas auditivas e o 3.º manifestou-se por nódulos cervicais.

INTRODUÇÃO

Os linfoepiteliomas de rinofaringe são tumores raros que parecem originar-se de órgãos linfoepiteliais da faringe e amídalas, apresentando-se com estrutura histológica idêntica a do epitélio faringiano.

Michaels e Hyamsl propõem a seguinte classificação dos tumores do epitélio nasal e naso faríngeo, de acordo com os tipos de células atingidas:

1) Epitélio colunar pseudo-estratificado
- adenoma papilar
- carcinoma papilar

2) Epitélio escamoso
- papiloma escamoso evertido
- papiloma invertido
- carcinoma escamoso
     - diferenciado
     - indiferenciado

3) Melanocito - melanoma maligno

4) Neuroepitélio olfatório:
- neuroblastoma olfatório (estesio-neuroblastoma)
- estesioneurocitoma

0 epitélio pseudo estratificado colunar é a base celular do epitélio nasal, no epitélio escamoso não é encontrado no nariz da criança ao nascimento. . Após alguns anos, áreas de epitélio escamoso se desenvolvem na rinofaringe. Freqüentemente as células basais do epitélio pseudoestratificado colunar contém tonofibrilas e é dessas células que provavelmente o epitélio escamoso se desenvolve através de metaplasia, sendo que a diferença entre os dois é a existência de síntese de queratina nas células do último. Embora raros, são descritos melanocitos no epitélio nasal ao nível do septo.

ESTATÍSTICA

Os tumores malignos da rinofaringe representam 2% dos cânceres de cabeça e pescoço, e 14% dos cânceres de faringe. São mais freqüentes na raça amarela e no sexo masculino (75%). Moench e Phillips (3) em 146 tumores malignos de nasofaringe, encontraram 25% de línfoepiteliomas.

HISTOPATOLOGIA

Prasad (4), de acordo com as células de origem, descreveu 5 tipos principais de tumores de rinofaringe: carcinoma anaplásico, carcinoma de células escamosas (pouco diferenciado), carcinoma de células transacionais, linfoepitelioma e carcinoma pleomórfico, cujas características microscópicas são:

a) células tumorais irregulares com alteração citoplasmáticas;

b) membranas das células adjacentes acoladas umas às outras e apenas, ocasionalmente, foram vistos espaços intercelulares;

c) membranas juncionais especializadas (desmosomas) são vistos em todos os tipos;

d) tonofilamentos (fibrilas queratinizadas) também aparecem em todos os casos;

e) os núcleos mostravam atividade aumentada notando-se ocasionalmente invaginações da membrana nuclear, sendo a cromatina finamente granular.

Regaud e Schmincke (1921) descreveram histologicamente o linfoepitelioma apresentando linfócitos intimamente relacionados com as células tumorais.

Ewing (5) (1942) afirma "a separação do verdadeiro linfoepitelioma de formas anaplásicas de carcinoma epidermoide, do carcinoma de células transicionais ou do linfossarcoma é muitas vezes difícil e, às vezes, permanece uma decisão arbitrária".

Laing (6) considera o linfoepitelioma variante estrutural do carcinoma epidermoide. Afirma que o número variável de linfócitos encontrados em íntima associação com as células tumorais não são componentes verdadeiros do tumor e sua presença é meramente incidental.

Leroux-Robert () caracteriza os linfoepiteliomas como massas carcinomatosas pouco diferenciadas, perdidas no seio de massas linfocitárias. (fig. 1). Considera, ao contrário de Regaud e Schmincke, que os linfócitos não fazem parte integrante do tumor, mas representariam uma reação ao tumor provavelmente do tecido linfóide da faringe. Às vezes, o estudo das metástases permite encontrar a arquitetura e a morfologia epidecoíde do carcinoma inicial. No entretanto, as metástases comportam sempre um .ontigente linfóide.



Figura 1.



LINFO - EPITELIOMA

A. Aspecto histológico geral da neoplasia.

B.C. Tecido linfóide circundando blocos e faixas de células de aspecto epitelial, com o citoplasma vacuolizado.
Col. H.E. 60X 240X

Rennke e Lennert (8) descrevem 5 casos de necrose caseosa e reação celular epitelioide em linfonodos metastaticos de linfoepiteliomas caracterizando esses processos como exclusivos desses tumores, antes mesmo do tumor primário ser descoberto.

DIAGNÓSTICO

Anamnese cuidadosa principalmente em relação à queixas de obstrução nasal, rinorréias, epistaxes, hipoacusias, massas cervicais, etc.

De um modo geral podemos dividir a sintomatologia em 4 grupos: (11) - Cervicais - freqüente pelo aparecimento de enfartamento ganglionar cervical e de mediastino superior, (60% dos casos). Hinkel e Jager (7) citam um caso na infância de linfoepitelioma cuja primeira manifestação foi metastase cervical, sendo que o reconhecimento da lesão primária da rinofaringe'só foi possível após quinze meses.

- Nasal - ocorre principalmente obstrução nasal podendo vir acompanhada de rinorréia aquosa e às vezes epistaxe.

- Otológica - a infiltração da tuba auditiva pode levar a perda da audição (tipo condutiva): com a presença de otite média serosa ou retração timpânica. Esses sinais indicam sempre,um cuidadoso exame da rinofaringe.

- Neurológico - clinicamente pode haver envolvimento da 2.' divisão do quinto par craniano, antes mesmo do abducente, com dor na região dos seios maxilares, dentes superiores, sensação de parestesia e até anestesia nesta área. Pode ocorrer paralisia do 3.° e 4.0 nervos facilmente detectáveis no exame de rotina. Exame clínico e ORL completo com rinoscopia posterior minuciosa, biopsiando-se os tecidos suspeitos. Wilson (11) em 1957 reportou 5 casos em que a exposição cirúrgica da ripo faringe revelou uma mucosa de aspecto normal e que a biopsia feita em profundidade mostrava a presença de carcinoma.

Radiológico - principalmente radiografia do perfil, tomografia sagitais e incidência de Hirtz, além, de RX de tórax.

Diagnóstico diferencial Cistos e pólipos coanais Condroma e cordoma Angiofibroma juvenil e Hamartoma Granulomatose de Wegener 8ursite de Thornwaldt

Adenoide Prognóstico

Segundo Lederman (1961) a sobrevida média para pacientes com linfoepitelioma ocorre em torno de 20% em 5 anos.

Tratamento

Devido a localização é praticamente impossível a ressecção cirúrgica completa, sendo que o tratamento feito é principalmente com irradiação externa. Pode-se usar a quimioterapia como adjuvante da radioterapia.

Apresentação dos casos

Caso 1 - J.A.G. - 16 anos - Masc. - Abril/77. Q.D. - Sangramento nasal há 1 mês.

Refere o paciente que há 1 mês iniciou sangramento mais intenso pela fossa nasal esquerda. Sofre de obstrução nasal intensa progressiva, que se iniciou aos 10 anos.

Nega alterações auditivas.

Exame físico ORL - ausência de gânglios cervicais. Otoscopia - normal

Oroscopia - Hipertrofia amidaliana.
Rínoscopia anterior- Desvio septal à direita com hipertrofia de cornetos inferiores e sangramento mais acentuado à esquerda.

Rinoscopía posterior - abaulamento de parede posterior da rinofaringe, com mucosa íntegra, lisa e congesta.

Evolução - O tratamento de urgência, consistiu em cauterização e tamponamento antero-posterior, sendo então requisitado estudo radiológico dos seios da face, o qual revelou opacificação dos seios esfenoidais, células etmoidais posteriores e, antros maxilares e das fossas nasais em suas metades póstero-superiores. O estudo tomográfico evidenciou tumoração com densidade de partes moles ao nível da rinofaringe. (Fig. 2).



Fig. 2



Caso 2 - abaulamento da parede posterior da rinofaringe

Suspeitou-se de Fibroma Nasofaríngeo.,

Após exames laboratoriais pré-operatórios normais, foi indicada cirurgia (11.05.77) pela via trans-palatina, quando foi ressecada a tumoração.

O resultado do exame anatomo-patológico revelou um processo inflamatório sub-agudo inespecífico com hiperplasia poliposa do epitélio de revestimento.

A evolução foi satisfatória até o 30° P.O. quando então o paciente apresentou recorrência da epistaxe, associada a uma tumoração cervical à esquerda de aproximadamente 2x3 cm, dura, dolorosa e sem sinais flogísticos.

Foi feita biópsia excisional do mesmo, que revelou tratar-se de Linfoepitelioma.
O paciente foi encaminhado à radioterapia, sendo submetido a dose total de 7.00

0 rads na rinofaringe e 6000 rads na região cervical.

Um ano após, o paciente encontra-se assintomático e sem sinais de recidiva das lesões.

Caso 2

M.TI.V. - 27 anos - branca - fem. - cas. - p. dom. julho/74.

Q.D. - Zumbidos e hipoacusia nos ouvidos há 3 anos, mais acentuado à direita.

H.P.M.A. - Refere a paciente estar apresentando perda da audição progressiva acompanhada de zumbidos e cefaleia à direita.

Há dois anos notou aparecimento de "ganglios" no pescoço, infraauricular direito, acrescido de anorexia e perda de peso (15 Kg).

Há um ano procurou o nosso serviço onde foi solicitado testes audiométricos, os quais evidenciaram uma hipoacusia de condução (otite serosa), a qual não tendo regredido com o tratamento clínico, requereu a colocação de um tubo de ventilação tipo Shepard.

Após 45 dias a sintomatologia mostrou-se inalterada, quando então, após novo exame ORL, evidenciou-se uma tumoração de rinofaringe. Foi submetida então a biópsia, que o anatomopatológico revelou Linfoepitelioma.

Foi indicado tratamento radioterapico que foi realizado em três fases: 1.0) Radioterapia com acelerador linear (8 mV).

2.0) Radioterapia com acelerador linear (8 mV). Telecobaltoterapia

Betaterapia com elétrons (4 mV).

3.0) Radioterapia com acelerador linear (8 mV). Dose total: Rinofaringe 7000 rads.

Pescoço 5000 rads.

Gânglio cervical direito 6000 rads.

Em novembro/77 foi realizada uma planigrafia da rinofaringe que revelou um discreto abaulamento da parede póstero-superior. Realizada nova biópsia que mostrou ser um processo inflamatório crônico inespecífico com hiperplasia linfóide sem indícios de neoplasia.

Atualmente a paciente encontra-se sem sintomatologia.

Caso 3

J.P. - 13 anos - masc. 12/01/76.

Q.D. Tumoração no pescoço há 3 semanas.

H.P.M.A. -Refere o paciente que 4 dias após ter sido adenoamigdalectomizado, apresentou tumoração no pescoço, indolor e sem sinais flogísticos. Foi tratado como Parotidite (sic). Após duas semanas, como não havia melhora, procurou o nosso serviço, aonde após exame específico, evidenciou-se abaulamento da parede posterior da rinofaringe bem como uma massa tumoral em região cervical direita,, mole e indolor à palpação.

Efetuada biópsia da rinofaringe, esta mostrou um processo inflamatório crônico. Após este procedimento houve um rápido crescimento da massa cervical, que após biopsiada revelou tratar-se de Linfoepitelioma.

0 paciente foi encaminhado à radioterapia e não nos procurou mais.

CONCLUSÕES

1) Existem dificuldades quanto a conceituação do linfoepitelioma como uma entidade isolada. Muitos a consideram variante do carcinoma epìdermoide.

2) Observou-se a dificuldade no diagnóstico clínico do linfoepitelioma mesmo na presença de lesão na rinofaringe. Em apenas um caso a biopsia de rinofaringe comprovou a presença de linfoeptelioma; nos outros somente a biópsia cervical comprovou a lesão, esgotados os métodos propedêuticos convencionais.

3) Verificou-se que a lesão, é mais freqüente em adultos jovens.

SUMMARY

The authors report three cases of Lymphoepithelioma of rhinopharnynx emphazising the main clinicai manifestations. They made a revision of classification, patology, diagnosis, treatment and results of this entity.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. Michaels, L. & Hyams, V.J. -Objectivity in the classification of tumors of. the nasal epithelium. Postgraduate Medica[ Joumal 51, 695-707 (October 1975 ).
2. Leroux-Robert, J. et de Brux, J. - Histopathologie ORL et Cervico Faciale. Masson, 1976 pag. 229. Moench, H.C. & Phillips, T.L-Carcinoma of nasopharynx - Réview of 146 patients with emphases on radiation dose and time factors. Am. J. Surg. 124: 515-518 October, 1972. Prasad, U. - Celis of origin of nasopharyngeal carcinoma: An electron microscopic study. J. Laryng. 88: 11(1087-1094)1974.
3. Ward, G.E. & Hendrick, J.W. - Tumors of the head and neck. The Williams and Wilkins Company, U.S.A.,1950 pag.439-440.
4. Laing, D. - Nasopharyngeal Carcinoma. Otolaryngologic Clinics of North America. October, 1969 pag.
5. G. K. & Jager, J. - Uber Lymphoepitheliome in Kindesalter. Arch. Kinderheilk, 174: 3 (331-342) 1966.
6. Rennke, H. & Lennert, K. - Caseous necrosis and Epithelioid Cell Reaction in Lymph Node Metastases of Lymphoepithelial Carcinoma (Schimncke-Tumor). Virchows Arch. ABTA PATH ANAT. 358:3.
7. Rilke, F. et cols. - Le Diagnostic cytologique et [es correlations cytohistologiques des tumeurs épitheliales malignes du rhinopharynx Bulletin du Cancer, 62: 3 (287-294) 1975.
8. Suchato, C. et al. - Pre-irradiation and Postirradiation Nasopharyngography. Arch. Otolaryngol. 98: 2 (9296) 1973.
9. Ballantyne, J. - Diseases of the ear, nose and thoroat 4, 150-162 (1971).




Endereço dos Autores:
Hospital Ibirapuera
Cx. Postal 20.341- São Paulo - SP.

* Trabalho patrocinado pelo Centro de Estudos e Pesquisas do Hospital Ibirapuera.
** Diretor do Hospital Ibirapuera S/A.
*** Médicos Residentes do Hospital Ibirapuera S/A.

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