Versão Inglês

Ano:  1978  Vol. 44   Ed. 2  - Maio - Agosto - ()

Seção: Artigos Originais

Páginas: 116 a 120

 

SINDROME DE LERMOYEZ: Relato de um caso

Autor(es): *Dr. Oscar Maudonnet
*Dra. Ester Nicola

Resumo:
Os autores apresentam um caso típico de Síndrome de Lermoyez e comparam os sinais obtidos no exame otoneurológico com aqueles apresentados na literatura sobre esta síndrome.

Em 1919 Marcel Lermoyez descreveu uma síndrome que se caracterizava pela aparição lenta e progressiva de zumbidos e surdez, geralmente unilateral, seguida de vertigem associada a náuseas e vômitos, após o que, observava-se a melhora da surdez e dos zumbidos, sendo que muitas vezes a audição chegava a retornar a seus níveis normais.

Tendo em vista o grande bem estar que advinha após a crise vertiginosa, Lermoyez deu a esta sucessão de sintomas o nome de "Le verffge qui fait entendre', hoje classicamente conhecida como síndrome de Lermoyez.

Os sintomas dos pacientes acometidos desta enfermidade ocorrem em crises e, de um modo geral, entre as mesmas a saúde desses pacientes é perfeita. Tanto na síndrome de Lérmoyez como na doença de Ménière, encontramos os mesmos sintomas, porém em ordem inversa de aparecimento e quanto ao prognóstico, ambas são inteiramente diferentes. A doença de Ménière causa uma inabilidade mais ou menos permanente, enquanto que a síndrome de Lermoyez produz uma inabilidade apenas temporária (Bailie, 1956).

Quanto a origem, Lermoyez acreditava ser vascular. Segundo ele ocorreria uma vaso-constrição a nível da artéria auditiva interna e como conseqüência, a hipoacusia e os zumbidos. A vertigem seria um sinal de que a circulação fora restabelecida e como resultado o paciente voltaria a se sentir bem. Estes vaso-espasmos poderiam ocorrer tanto na artéria auditiva interna como nos seus ramos terminais: artéria coclear e vestibular, explicando-se assim a variação dos sintomas dentro das crises.

Em 1941 Atkinson observou que á doença de Ménière podia ser devida a mais de uma causa, concluindo daí que alergia e angio-espasmo eram os dois fatores que podiam causar a doença de Ménière. Ele também percebeu que o comprometimento auditivo e os zumbidos eram menos severos e melhoravam ou desapareciam completamente após o ataque de vertigem, quando a doença era devida a alergia. Estas afirmações coincidem exatamente com os registros de Lermoyez e que foram também confirmadas por Kerekes, sem, no entanto, que esse autor citasse a alergia como fator básico.

Eagle e Durhan em 1956 apresentaram um trabalho relacionado a síndrome de Lermoyçz com a alergia, evidenciando o fato desta síndrome coincidir exatamente com a seqüência de eventos descritas por Atkinson e por ele classificados como doença de Ménière de comportamento atípico devido ao componente alérgico. Do trabalho apresentado, os autores chegaram a três importantes conclusões:

a) a relação direta da síndrome de Lermoyez com alergia. Todos os pacientes observados, apresentavam manifestações típicas de alergia, principalmente a urticária.

b) a síndrome de Lermoyez é uma entidade clínica totalmente distinta da doença de Ménière e nela devem se enquadrar os pacientes que após a crise vertiginosa a audição retoma a níveis normais e desaparecem os zumbidos.

c) a síndrome de Lermoyez é de excelente prognóstico em comparação com a doença de Ménière, no tocante a recuperação da função auditiva, sendo portanto fundamental o seu reconhecimento sempre que ela ocorra.

APRESENTAÇÃO DO CASO

M.G.B., 41 anos, feminina, prendas domésticas, consultou pela primeira vez em 19/11/76, queixando-se de hipoacusia esquerda e tonturas. Refere que desde criança apresenta hipoacusia intensa a direita, cujo aparecimento se deu após apresentar um quadro de parotidite epidêmica. Informa a paciente que há alguns anos vem apresentando crises de hipoacusia esquerda com zumbidos, de duração variável, desde uma semana até um mês, seguindo-se de tonturas rotatórias intensas acompanhadas de náuseas e vômitos, sendo que logo a seguir havia uma melhoria da audição e o desaparecimento dos zumbidos. Submeteu-se a vários tratamentos sem melhora e, em todos eles o diagnóstico foi de labirintite.

O estado geral da paciente era ótimo e ao exame otorrinolaringológico só evidenciamos à rinoscopia alterações do tipo rinite alérgica. Indagada sobre os antecedentes alérgicos, a mesma informou apresentar, as vezes, crises de espirros em salva, obstrução nasal e rinorreia aquosa.

Nesta data submetemos a paciente ao exame otoneurológico, obedecendo ao padronizado por Greiner, Conraux e Collard (1969); Collard, Conraux e Walter (1973) e Mangabeira-Albemaz e Ganança, (1976) que revelou:



Fig. 1



Ausência de sinais espontâneas. Ausência de nistagmo de posição. Ausência de nistagmo de origem cervidal. Hiporreflexia esquerda á prova pendular. (Figura 2) Normorreflexia esquerda à prova calórica. Recrutamento objetivo (impedanciometria) presente.



Fig. 2



De posse de tais resultados, formulamos a hipótese diagnostica de Síndrome de Lermoyez. Solicitamos à paciente que retornasse à consulta em uma semana e nesta ocasião fizemos um novo exame audiométrico que revelou um discreto, porém nítido aumento da hipoacusia esquerda. (figura 3). (Fig. 3)



Fig. 3




Fig. 4



Pedimos, então, à paciente que nos procurasse logo após uma crise vertiginosa. Tal retorno se deu 10 dias após e, neste dia a paciente nos informou que tivera uma crise há três dias e que neste momento parecia estar escutando muito bem, pois os zumbidos já haviam desaparecido. Submetemos a paciente a novo exame áudiométrico que revelou níveis audiométricos normais, confirmando-se o diagnóstico de Síndrome de Lermoyez. (figura 4).

Como terapêutica utilizamos a dissensibilização pela histamina e a paciente vem sendo mantida em observação há mais de 6 meses, sem apresentar uma única crise. A audição mantem - se em níveis normais, não havendo mais a tradicional flutuação.

COMENTÁRIOS FINAIS

No caso por nós estudado a paciente enquadrava-se perfeitamente dentro dos sintomas clássicos descritos por Lermoyez, apresentando ainda os antecedentes alérgicos descritos por Eagle e Duhran.

Foi realizado um exame otoneurológico na paciente durante os pródomos de uma vertigem, no qual verificamos ausência de sinais espontâneos, hiporreflexia à prova pendular do lado lesado e normorreflexia à prova calárica. Resultados semelhantes aos nossos foram descritos por Mournier-Kuhn & col. num relato sobre 2 casos de Síndrome de Lermoyez. Os referidos autores realizando o exame otoneurológico logo após a crise vertiginosa, encontraram resultados completamente opostos aos encontrados no período anterior a crise, isto é, presença de sinais espontâneos e hiporreflexia do lado lesado às provas instrumentais, isto, nos dois casos Como não nos foi possível realizar o exame otoneurológico logo após a crise, não pudemos realizar uma comparação com estes autores.

SUMMARY

The autoors related a typícal case of Lermoyez Syndrome and compared theirs results with literature ones'.

BIBLIOGRAFIA

1.ATKINSON, M. - Observations on the HAM, N. - Lermoyez syndrome; an etyology and treatment of Meniere's allergic disease. J. Laryngol, 70: 97, Syndrome. J.A.M.A., 116:1735,1941.' 1956.
2. BAILIE, R.W. - Lermoyez syndrome; 7. LERMOYEZ, M. - La vertige que fait an ivestigation into its ectiollogy and antendre. Press. Med., 27: 575, 1919. actiology of the associated tinnitus. 8. MANGABEIRA-ALBERNAZ, P.L. & J. Laryngol., 70. 97, 1956.' GANANÇA, M. - Vertigem. Ed. Moder
3. COLLARD, M.; CONRAUX, C. & WAR na, 1976. TER, J. - Les syndromes vestibufaíres 9. MOURNIER-Kuhn, P. et col. - À procentraux. Masson & cie, 1973. pós de deux observations du vertige
4. EAGLE, W. & DURHAM, N. - Ler de Lermoyez. J.F.O.R.L., 18: 545, moyez syndrome; an allergic disea 1969. se. J. Laryngol., 70: 97, 1956.
5. GREINER, G.; CONRAUX, C. & COLLARD, M. - Vestibulométrie clinique.Doin Deren et Cie, 1969.
6. KEREKES, J. "in" EAGLE, W. & DUR 13.100




Endereço dos Autores Instituto Penido Burnier
Andrade Neves, 611 - Campinas - SP.

* Otorrinolaringologistas da Clínica de Otorrinolaringologia do Instituto Penido Burnier e professores assistentes da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp - Campinas.

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