Versão Inglês

Ano:  1976  Vol. 42   Ed. 3  - Setembro - Dezembro - ()

Seção: Artigos Originais

Páginas: 215 a 217

 

A DESCOMPRESSÃO DO FACIAL NA PARALISIA DE BELL. UMA REVISÃO DE CONCEITOS?

Autor(es): * Nicanor Letti

Ballance e Duel em 1932 descreveram e introduziram a técnica da descompressão cirúrgica de nervo facial, quando afetado com paralisia de Bell, pela abertura do canal ósseo do temporal por onde ele trajeto.

É a paralisia mais freqüente e mais benigna que atinge os nervos cranianos, entretanto seu tratamento e sua etiopatologia tem oscilado em todas as direções nos últimos 45 anos. Desde os trabalhos de Ballance e Duel os Otorrinolaringologistas tem desalojado gradativamente os Neurologistas deste campo uma vez que tradicionalmente manejam com a patologia do temporal e se adaptaram primeiro e melhor as técnicas da cirurgia com visão ampliada por estereoscópios.

Como o facial percorre o mais longo canal ósseo da economia orgânica e no seu interior se ramificam sistemas arteriais dependentes de duas áreas vasculares diferentes, o tratamento sempre esteve baseado sobre a existência de vasoespasmo seguido de edema e compressão do nervo contra as paredes do canal ósseo. Pouco se conhece sobre o sistema venoso e linfático deste canal.

A descompressão foi defendida e divulgada pelas escolas americanas e européias a partir de 1955, mas como afirma Adour os Otorrinolaringologistas acreditavam que ela deveria ser realizada somente dois meses após o início da paralisia e o segredo da técnica era a abertura do forame estilomastoídeo.

Em 1969 mudaram de opinião e preconizaram a descompressão de toda a porção vertical intramastoídea especialmente a parte justa piramidal, e o tempo ideal para a operação seria duas semanas após o início da paralisia.

Em 1972 Fisch preconiza que sem a descompressão da porção labiríntica, a mais estreita e tortuosa de seu canal ósseo, nada adianta para sua resolução cirúrgica, abrindo uma nova via no tratamento da paralisia de Bell pela abertura da fossa média do crânio, e pondo em cheque o valor dos testes de lacrimejamento. Em 1975 após a introdução de eletroneuronografia e do desenvolvimento dá correlação histo¬elétrica do Facial preconiza-se em certos casos a descompressão imediata e com¬pleta do Facial (até 5 dias após ao início da paralisia).

Diante de tais fatos o interessante é ouvir a opinião de Kedar Karim Adour e seus colaboradores que tem uma Clínica especializada sobre Paralisia Facial em Oakland na California, USA. São autores que se opõem ao tratamento cirúrgico da paralisia de Bell. Alinham uma série de argumentos e em seu último trabalho, fruto de uma revisão de 1000 casos, afirmam que a técnica cirúrgica tem mudado em cada década e o tratamento com corticóides tem ressistido ao tempo lis time de¬pendent). Mostram que a doença afeta todas as idades com a média em 39 anos. A incidência na população geral é de 17 a 19 por 100.000 por ano e aumenta em cada década chegando a 30 a 35 por 100.000 por ano depois da idade de 60 anos. É a mesma no sexo masculino e feminino, mas entre os 10 e 19 anos é duas vezes mais comum em mulheres, enquanto que apos os 50 anos é mais freqüente nos homens.

Esta distribuição sugere uma relação com a menarca e a menopausa. A doença ocorre três vezes mais nas grávidas e é seis vezes maior no primeiro trimestre que nos outros dois. Não é significante a ocorrência de casos no inverno e no verão. Não há provas de incidência epidêmica da moléstia. O lado direito e esquerdo são atingidos em proporções iguais, em 0.4% existe paralisia bilateral, 9.4% tinham paralisias prévias e 8% história familiar positiva. Diabetes esteve presente em 11.4% dos pacientes e em 28,4% naqueles que tiveram paralisia facial recorrente e em 16,8% com idade acima de 30 anos. Calculam estes autores que a paralisia se desenvolve 4,5 vezes mais em diabéticos e que são propensos a degeneração do nervo com facilidade e esta tendência tem relação direta com a idade. Por outro lado tanto os velhos como os jovens têm igualdade de risco em apresentar maus resultados. A hiperacusia, a diminuição do lacrimejamento, idade acima de 60 anos, hipertensão e psiconeurose são fatores que podem ocasionar resultados desencorajadores. A dor auras, radicular trígeminal são também sinais de degeneração precoce.

Conclui Adour dizendo que a maior contribuição de sua clínica é demonstrar a evidência que a paralisia de Bell é uma polineuropatia craniana do que uma doença unilateral isolada do canal do facial.

Safman e Chaco mostraram alteração do tempo de latência na condução nervo-muscular do lado não envolvido pela paralisia em 50 à 75% dos pacientes com paralisia de Bell. Nos casos de Adour 25% tinham hipoestesia em um dos ramos do trigêmio, 3% tinham envolvimento e diminuição de força do masseter e nos pterigoideos e 43% apresentaram ENG com alterações.

Em animais de laboratório foi demonstrado que a descompressão cirúrgica pode causar aumento da fibrose perineural.

Trabalhos recentes de autores japoneses e americanos mostram que a paralisia de Bell seria ocasionada por vírus, mas especificamente o herpez simples e Adour conclui que ela é uma polineurite.

Abandonou a descompressão em 1969 e acha que esta técnica deve ser erradicada do arsenal terapêutico da paralisia facial até ser provada mais convicentemente sua efetividade, sendo sugestivo o título de seu último trabalho: "o dobre de finados na descompressão do nervo fácil?". Afirma que não existem critérios cientificamente aceitáveis para uma cirurgia imediata, o que contraria os adeptos deste procedimento baseados no método excelentes da eletroneuronografia. Termina com duas frases de efeito: ele está convencido que mais nervos serão salvos pela terapêutica medicamentosa do que talvez com uma cirurgia desnecessária. E o próximo passo seria determinar qual o paciente, se algum, estaria sendo tratado desnecessariamente com corticoides. Para terminar esta análise de idéias, que não são minhas, faço algumas perguntas: Se for provado que é uma polineurite e se esta causar edema do nervo não será aconselhado a descompressão para que as fibras não degenerem apertadas contra as paredes do canal ósseo? Voltaríamos a ponto de partida? Não será exagero afirmar, como o faz Adour, que a modificação das técnicas no tempo é um sinal de fracasso e não a evolução natural da terapêutica cirúrgica?

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ENDERECO DO AUTOR:
Lopo Gonçalves, 511
90.000 Porto Alegre - Brasil

* Professor Adjunto da Disciplinado ORL do Departamento de Oftalmologia e Otorrinolaringologia da UFRGS.

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