Versão Inglês

Ano:  1959  Vol. 27   Ed. 3  - Maio - Junho - ()

Seção: -

Páginas: 60 a 63

 

DISLALIAS - AFECÇÃO DA PALAVRA FALADA (1)

Autor(es): EMILIANA CABRITA (2)

(1) Aula do 1.º - Curso de Foniatria (1959) da Clínica O.R.L. da F.M.U.S.P. (Serviço do Prof. Raphael da Nova)
(2) Foniatra da Clínica O.R.L. da F.M.U.S.P.

Por dislalia pode-se subentender a alteração do curso da linguagem falada pela deformação ou ausência de um ou mais fonemas na elaboração das palavras, devido a transtornos de articulação.

A linguagem falada é a representação de um conjunto de sinais fônicos articulados e sistematizados para a expressão do pensamento. Elevada a uma potência de que depende a relacionação social, ela é considerada um reflexo condicionado, neste século do estudo das funções do cérebro.

Pavlov, designou a fala como um estimulo condicionado "relacionado com todos os estímulos externos e internos que chegam aos hemisférios cerebrais". Um reflexo duplo chamemos-lhe portanto, uma vez que o homem somente percebe os objetos exteriores através dos sentidos e a impressão dêstes é que se reflete na linguagem.

Muito ligada à atividade do pensamento, a fala está sujeita ao comando do cérebro, porém ela é executada por determinados órgãos em função. Assim, depende tanto do labor mental do indívíduo e dos seus estados psico-emocionais, como do funcionamento dos órgãos que a executam. Os órgãos que elaboram a palavra falada agrupam-se foniatricamente para facilidade de estudo em sistemas, tais como: sistema respiratório, sistema de emissão, sistema de ressonância, sistema de articulação, sistema nervoso central e periférico. Para que a linguagem oral seja correta é necessário que haja integridade funcional dêstes sistemas; qualquer causa orgânica, qualquer perturbação funcional dos órgãos, de que se compõe êstes sistemas, pode determinar alterações fono-respiratórias, fono-articulares, e psíco-motoras, que afetem a fala.

As dislalias, sendo uma afecção evolutiva do sistema de articulação, podem dividir-se, a grosso modo, em funcionais e orgânicas e ainda em associadas, quando não são puras e aparecem associadas.

Dislalias funcionais: - são aquelas que não advêm de qualquer alteração orgânica, e, consideram-se naturais, as observadas nas crianças quando começam a falar. Estas dislalias naturais são transitórias, resultantes da deficiência e insuficiência articulatória em virtude de imaturidade motora.

Há na criança uma inhabilidade dos órgãos fonadores devido a uma imperfeita motilidade; a musculatura dêstes órgãos ainda não adquiriu o tónus e a coordenação necessária para a agilidade e sincronia motora indispensável à rápida mudança de posição que exige a sucessão de fonemas variados de que se compõe as palavras.

Conforme o tecido nervoso se vai mi-elinizando assim se vai realizando a motricidade, coordenação motora e correlação psicomotora; ao mesmo tempo, vão-se estabelecendo conexões do influxo nervoso aos órgãos da linguagem; a articulação das palavras evolue no aperfeiçoamento e estas dislalias vão desaparecendo.

Quando, porém, esta evolução não se realiza, quando a imaturidade da linguagem persiste numa idade em que a criança já deverá articular corretamente as palavras (4 e 5 anos), então já se não pode considerar uma dislalia natural mas sim uma dislalia patológica.

São diversas as causas que determinam a dislalia patológica. Por exemplo uma deficiência perceptiva ou sensorial dos órgãos de audição ou de visão, uma incoordenação de língua ou dos lábios por desordens do influxo nervoso, podem alterar qualquer fonema, e alterando a articulação de qualquer fonema, dão origem a dislalia.

Outras dislalias são originadas por falta de inteligibilidade para a linguagem, esta ininteligibilidade pode ser conseqüente de uma hipoacusia ou de retardo mental. O paciente hipoacúsico que não distingue as consoantes oclusivas como por exemplo o P-B-M, ou o sôpro dos sibilados como S e Ch, confunde vocábulos e apresenta uma dicção cheia de alterações. No retardo mental em que a atenção é fugas ou há deficiência de memória, a criança não assimila certos fonemas, especialmente em palavras polissilábicas.

As dislalisa orgânicas são aquelas cujas alterações provêm de qualquer causa orgânica. Por exemplo: uma malformação congênita como o lábio leporino, e a fissura palatina, a paralísia facial, a diastemia (má implantação dentária com amplos espaços livres intermediários) o prognatismo ou proginismo (em assimetria das arcadas dentária) o palato ogival, a língua com o freio muito curto ou hipertrófica etc., são possíveis origens destas dislalias.

Conforme a afecção do órgão que emite os fonemas assim as dislalias podem tomar o nome de labiais, dentais, linguais, palatais e nasais.

As dislalias nasais tomam o nome de rinolalias, e são caracterizadas pela fala com sonoridade nasal devido a um aumento ou diminuição de ressonância (os sons harmônicos da ressonância nasal variam entre 200 a 300 ciclos) conforme êste aumento ou diminuição de ressonância assim se denominam por hiperrinolalias ou hiporinolalias. As rinolalias, de uma maneira geral podem resultar, tanto de uma causa orgânica como de uma causa funcional, porque podem ser devidas a obstruções nasais, (vegetações adenoides, tumores rinofaríngeos etc.) e podem ser devidas a alterações do mecanismo expiratório produzindo um desvio da coluna de ar.

De uma maneira geral, se qualquer dislalia é caracterizada pela surpressão de um ou mais fonemas designa-se por mogilalia, se é caracterizada pela troca de fonemas tomam o nome de paralatias. Segundo a alteração do fonema também toma a designação respectiva desta forma; se a alteração fôr no S chama-se de sigmatismo, se fôr do R, rotacismo, se fôr do L, lambdacismo etc.

As dislalias podem então ser classificadas e estudadas quanto à: a) causa; b) localização; c) origem.
a) Quanto à causa dividem-se em:
1) orgânicas; 2) funcionais; 3) associadas.

b) Quanto à localização podem tomar os nomes de:
1) Labiais - por paralisia facial e lábio leporino; 2) Dentais - por diastemias, prognatismo e palato ogival; 3) Linguais - por tumores da língua e freio curto; 4) Palatais - por fissura paaltina e paralisias do véu; 5) Nasais - por obstruções nasais.

c) A origem pode ser:
1) Periférica; 2) Central.

As principais formas de dislalias são:
a) Mogilalias - quando há alteração de som ou supressão de fonemas; b) Paralalias - quando há troca de fonemas; c) Barilalias - desordem de sintaxe; d) Barbarolalias - Acentuação estrangeira; e) Rinolalias - fala nasalada ou analasada; f) Hotentotismo - acumulação de tipos de dislalias.

Conforme o fonema alterado as dislalias podem designar-se por:
a) Sigmatismo (s); b)Gamacismo (g); c) Lambdacismo (l); d) Chiutismo; e) Deltacismo (d); f) Jotacismo (j) etc.

Conforme a troca de fonemas também podem designar-se por: a) Pararotacismo; b) Paralambdacismo; etc.

Segundo o Dr. Quirós, da Argentina, as dislalias de tipo audiológico designam-se por dislalias audiológicas e as de tipo funcional por dislalias fono-articulares.

Como se verifica são vários os aspectos das dislalias e diversas as suas classificações.

Na Secção de Foniatria da Clínica Otorrinolaringológica do Hospital das Clinicas (F. M. U. S. P. ), todos êstes aspectos estão em estudo, porém como a porcentagem de dislalias fono-articulares é maior (no ano de 1958 houve uma porcentagem de 70% de dislalias fono-articulares e 30% de audiológicas) presentemente nós nos dedicamos mais ao estudo destas formas de dislalias.

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