Versão Inglês

Ano:  1983  Vol. 49   Ed. 3  - Julho - Setembro - ()

Seção: Artigos Originais

Páginas: 07 a 12

 

CEFACLOR NO TRATAMENTO DAS OTITES MÉDIAS AGUDAS NA CRIANÇA (ESTUDO COMPARATIVO ENTRE DOSES A CADA OITO E CADA 12 HORAS**)

Autor(es): OTACÍLIO LOPES FILHO 1
IGOR MIMIÇA 2
HELOISA HELENA DE MACEDO 3
M. LEONOR GARCIA DA SILVA 4
LYCIA JENE MIMIÇA 5

Resumo:
Foram estudadas 62 crianças, portadoras de Otite Média Aguda Bacteriana, e tratadas com Cefaclor, em doses de 40 mg/kg/dia. Deste grupo 42 tomaram a medicação a cada oito horas e 20 tomaram a intervalos de 12 horas. Em ambos os grupos a medicação foi bastante eficaz, sendo porém a administração cada 12 horas mais conveniente.

INTRODUÇÃO

A Otite Média Aguda (O.M.A.) é o diagnóstico mais freqüentemente feito pelos médicos Pediatras, de acordo com as conclusões dos trabalhos de Coffee & Morton (1) e de Koch & Dennison (2), recentemente publicados.

Os grupos de maior risco, segundo Bluestone (3), para contrair a Otite Média Aguda são constituídos dos lactentes e das crianças pequenas, sendo a maior prevalência entre o 6º e 36º mês de vida. Num estudo feita com 2.565 crianças, observadas durante os três primeiros anos de vida, Teele e Klein (4) verificaram que apenas 29°% dos lactentes não apresentaram Otite Média Aguda, enquanto que aproximadamente um terço das crianças estudadas tiveram três ou mais episódios.

Garcia Gomes (5), durante o XVII Congresso Pan Americano de ORL realizado no Chile em 1980, relatando os achados de um levantamento epidemiológico, chamou a atenção para a alta incidência da O.M.A. nas crianças em toda a América Latina. Nós, os otorrinolaringologistas, mais que os pediatras e os clínicos, sabemos desta verdade e, ainda mais, que um grande número destas crianças evolui de modo insatisfatório para quadros crônicos de Otite Média Secretora ou mesmo O.M.A. de repetição, seja devido ao tratamento com antibiótico inadequado ou por tempo de administração da droga também inadequado, tornando-se nesses casos necessária a Miringotomia, quando este procedimento não foi ainda realizado. A perda auditiva resultante da evolução para a cronicidade pode provocar em algumas crianças um retardo no processo de aprendizado.

Embora benigna em sua evolução, a O.M.A. freqüentemente nos leva a preocupações principalmente em determinadas épocas do ano, quando o fantasma da desidratação persegue aquelas crianças com deficiências nutritivas e(ou) imunológicas. A investigação da ação de uma nova droga com ampla atividade sobre os microrganismos causadores das O.M.A. é plenamente justificável, ainda mais se levarmos em consideração os inúmeros trabalhos, principalmente a partir de 1974, mostrando a importância cada vez maior do H. influenzae como agente etiológico com freqüência crescente. Além deste incremento em sua freqüência, há a acrescentar a ocorrência de um número progressivamente maior de cepas resistentes à ampicilina até há pouco uma das drogas mais eficazes para seu combate (9, 10, 11). Lopes Filho et al. (12), em trabalho recente evidenciaram a predominância do H. influenzae na etiologia da O.MA., conforme os resultados no Quadro 1.



Quadro 1 - Germes patogênicos encontrados



Os testes de sensibilidade a vários antibióticos destacaram as cefalosporinas como os mais ativos, e entre elas em especial o Cefaclor (Quadro 2).



Quadro 2 - Sensibilidade Comparada em %



Syriopoulou et al.(10) demonstraram que desde 1973 cepas do H. influenzae, resistentes à Ampicilina, vêm sendo isoladas em todas as regiões dos Estados Unidos em proporções cada vez mais elevadas.

Nelson et al. (9) verificando o crescente aumento da população do H. influenzae, produtores de beta-lactamase, nas culturas de OM.A., em sua grande maioria resistentes às Ampicilinas e derivados, ressaltam a necessidade de uma droga que seja mais efetiva e não sofra a ação daquela enzima inativadora. Assim sugerem o uso do Cefaclor, uma nova cefalosporina de uso oral, com amplo espectro de ação bacteriana, incluindo os H. influenzae produtores ou não da beta-lactamase, resistentes à Ampicilina.

A maioria dos autores tem utilizado, com bons resultados, a dose de 40 mg/ kg/ dia no tratamento das Otites Médias Agudas Bacterianas em crianças, dividindo a dose diária em três tomadas a cada 18 horas. Recentemente pesquisas comparativas evidenciaram que o aumento do intervalo entre as doses para 12 horas não alterava a eficácia terapêutica. 0 objetivo de nosso estudo foi o de verificar, em nosso meio, a eficácia do Cefaclor no tratamento da O.M.A. bacteriana bem como comparar a influência do espaçamento entre as doses no resultado terapêutico.

MATERIAL E MÉTODOS

Nosso estudo constou de 62 crianças, com idade variando de dois meses a três anos, com diagnóstico de Otite Média Supurativa, a maioria delas em sua fase exsudativa, a julgar pelo material francamente purulento coletado.

Foram admitidas crianças com sinais e sintomas clínicos de Otite Média e com diagnóstico confirmado por exame otoscópico. Em todos os pacientes foram colhidas amostras de material drenado espontaneamente ou por punção da membrana timpânica, após limpeza e esterilização do conduto auditivo externo. A colheita estéril da secreção após miringotomia foi feita por meio do aspirador Juhn Tym Tap aparelho descartável, que facilitou a obtenção do material submetido a cultura e testes de sensibilidade. Neste estudo este aspirador descartável foi empregado em todos os casos.

O microrganismo identificado nas culturas, e admitido como patogênico, deveria ser sensível ao Cefaclor para que o caso pudesse ser incluído no estudo.

Foram excluídas deste trabalho crianças que eventualmente apresentassem insuficiência renal ou hepática, ou passado de alergia a drogas do grupo das penicilinas ou cefalosporinas.

Afastados também foram os casos de pacientes que haviam tomado algum antibiótico pelo menos até três dias antes do diagnóstico.

Cefaclor foi empregado na dose de 40 mgf kg de peso/dia, segundo dois esquemas de administração, dando origem a dois grupos:

A - composto de 42 crianças, administração a cada oito horas.
B - composto de 20 crianças, administração a cada 12 horas.

Em ambos os grupos a dose máxima diária não poderia exceder a 1.000 mg, independente do peso corporal.

A duração do tratamento variou de cinco a quinze dias, sendo a droga suspensa quando as manifestações clínicas assim a justificaram. Considerou-se que cinco dias seria o tempo mínimo para se ter a avaliação da eficácia terapêutica ou três dias para se evidenciar sua ineficácia.

A medicação seria interrompida nos casos em que o microrganismo isolado se mostrasse resistente in vitro, em casos de falha terapêutica, após 72 horas de observação ou ainda se os investigadores verificassem efeitos colaterais provocados pela droga que justificassem a sua suspensão.

Os critérios de avaliação da efetividade da droga empregada foram

1. Satisfatório desaparecimento ou nítida melhora dos sintomas e sinais.

2. Satisfatório com recorrência os sinais e sintomas desapareceram durante, mas recorreram antes do término do tratamento.

3. Falha nenhuma melhora dos sinais e sintomas.

4. Não avaliável caso em que o paciente não retornou para avaliação ou interrompeu o tratamento antes do período mínimo requerido.

A droga empregada neste estudo foi o Cefaclor. 0 Cefaclor, segundo Gillet et al (13), é uma nova cefalosporina, para administração por via oral, com espectro de ação semelhante à cefalexina e cefradina, porém bem mais, ativa in vitro contra o H. influenzae, N. Gonorrhoae e Enterobacteriaae. Sua toxicidade, segundo Hanasono et al (14) é também semelhante às Cefalosporinas.

RESULTADOS

1. Pacientes com O.M.A. tratados com doses de Cefaclor a cada oito horas

Neste grupo foram observadas 42 crianças, cuja idade variava entre dois meses e 36 meses. As doses de Cefaclor empregadas foram de 40 mg/kg/dia, dividida em três administrações diárias, aproximadamente a cada oito horas.

Empregando o critério de avaliação previamente discutido, nossos resultados foram os seguintes:





Em nenhum paciente deste grupo foi observado qualquer efeito colateral ou reação adversa que determinasse a interrupção do tratamento.

Cerca de dois terços dos pacientes tratados com resultados satisfatórios tiveram sua medicação suspensa ao redor do 59 dia e apenas um terço necessitou de ser medicado por mais de cinco dias.


ÉPOCA DA SUSPENSÃO DA MEDICAÇÃO



Dois pacientes entre 42 tratados tiveram recorrência do quadro clínico com a suspensão da medicação, sendo que o reinicio da administração de Cefaclor na mesma dosagem determinou o desaparecimento dos sintomas recidivados.

2. Pacientes com O.M.A., tratados com dose de Cefaclor a cada 12 horas

Foram incluídas neste grupo 20 crianças, com as mesmas características do grupo anterior, isto é, com idade variando de dois a 36 meses e portadores de Otite Média Aguda Bacteriana.

Empregamos a mesma dose de 40 mg por quilograma de peso por dia, dividida, porém, em duas tomadas com intervalo de 12 horas.

Utilizando os mesmos critérios anteriores, nossos resultados foram:





Como aconteceu no grupo anterior, não foi detectado nenhum efeito colateral da droga empregada, ou a necessidade de sua supressão por qualquer outra razão.

Neste grupo de 20 pacientes observados e com a administração da droga a cada 12 horas, ou seja, a mesma dose de 40 mg/kg/dia, administrada a intervalos maiores, observamos resultados semelhantes aos obtidos no grupo recebendo o Cefaclor a cada oito horas.

O número de pacientes que deixou de usar a droga ao redor do 5º dia, por se achar curado, foi bem maior do que no grupo anterior, diminuindo conseqüentemente o número de casos em que houve necessidade de administrá-la por mais de cinco dias.


ÉPOCA DE SUSPENSÃO DA MEDICAÇÃO




Observamos que, apesar do espaço de tempo maior entre as doses, cada 12 horas, houve uma cura mais precoce num número maior de casos, não tendo havido nenhum caso de falha da medicação.

A comparação dos resultados obtidos nos dois grupos de pacientes observados mostra uma aparente superioridade do esquema terapêutico de duas vezes ao dia.


QUADRO COMPARATIVO DOS RESULTADOS ENTRE OS DOIS GRUPOS



CONCLUSÃO

A análise de nossos resultados permite afirmar que o emprego de Cefaclor, no tratamento das Otites Médias Agudas Bacterianas nas crianças dos grupos etários estudados, foi altamente satisfatório, com resultados mesmo surpreendentes.

Quer na administração a cada oito ou 12 horas, a eficácia terapêutica do Cefaclor na dose de 40 mg/kg/dia foi praticamente igual, podendo-se afirmar ser o seu emprego a cada 12 horas mais adequado, pela maior facilidade de administração das doses recomendadas assegurando, assim, a complementação do tratamento.

SUMMARY

Sixty two children with Acute Otitis Media of bacterial etiology, treated with Cefaclor 40 mglkglday, were divided in two groups.

One group 42 children received Cefaclor at 8 hours intervals and the other group 20 children received cefaclor at 12 hours intervals. Both schedules of administration were effectiveness, bui being thé 12 hours intervals more convenient.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. COFFEE, J.S. e MORTON, A.B.: Otitis Media in the practice of pediatrics. Pediatrics, 38: 25-32, 1958.
2. KOCH, H. e DENNISON, N.J.: Office visits to pediatricians Washington, D.D., National Ambulatory Medical Service, National Center of Health Statistics, 1974.
3. BLUESTONE, C.D.: Recentes progressos na patogenia, no diagnóstico e no tratamento da otite média. Clínicas Pediátricas da América do Norte, págs. 755-785, nov., 1981, Ed. Interamericana, S. Paulo.
4. TEELE, D.W. e KLEIN, J.O.: Epidemiology of otitis media in children. Ann. Otol Rhinol Laryngol, 89 (Suppl. 68):5-6, 1980.
5. GARCIA GOMES: Comunicação ao XVII Congresso Pan Americano de O.R.L. e RE., Chile, setembro, 1980.
6. SCHWARTZ, R. et al. Acute purulent otitis media in children older than 5 years - Incidence of Haemophilus as a causative organism. JAMA, 238 (10): 1032-1033. 1977.
7. BLUESTONE, C.D. e SHURIN, P.A.: Acute Otitis Media Pediatric Clinics of N.A., 21: 379-382,1974.
8. RIFF, L.J.M.: Symposium on Chronic Ear Disease, Chemotherapy in ear disease. ORL Clinics of NA., 5: 3-10,1972.
9. NELSON, J.D. et a?. Treatment of acute otitis media of infancy with Cefaclor. Am. J. Dis. Child, 132: 992-996, 1978.
10 SYRIOPOULOU, V. et al:1ncreasing incidence of AmpiciWn resistance in Haemophilus Influenzae. The Journal of Pediatrics, 92: 889-892, 1978.
11. GRANOFF, D.M. et ai: Ampicillin resistant Haemophilus Influenzae. Thé Western Journal ofMed., 128: 101105,1978.
12. LOPES F. O. et ai: Etiologia Otite Média aguda na criança e sua sensibilidade a antibióticos. Rey. ,os. Rev. Bras. ORL, 47: 15-19, 1981.
13. GILLET, A.P. et ai: Comparative in vitro microbiological activity and stability of Cefaclor. Postgraduated Medical Journal, SS (Supp14): 9-11, 1979.
14. HANASONO et a1: An evaluation of the toxicity of cefaclor in laboratory animale Postgraduated Medical Journal, SS (Suppl 4):17-21, 1979.
15. SIMON, C. e GATZEMEIER, U.: Serum and sputum levels of Cefaclor. Postgraduated Medical Journal, SS (Supp14): 30-34, 1979.
16. RODRIGUEZ, W.J. et ai: Cefaclor in the treatment of susceptible infections in infants and children Postgraduated Med J, SS (Supp14): 35-38, 1979.




* CEFACLOR (Ceclor, Mlly)
* *Trabalho da Clínica de Otorrinolaringologia da Faculdade de Ciências Médicas da Sta. Casa de São Paulo.

1 - Professor Titular de Otorrinolaringologia
2 - Professor Titular de Microbiologia e Imunologia
3 - Residente de 30 ano de Otorrinolaringologia
4 - Residente de 30 ano de Otorrinolaringologia
5 - Professora Instrutora de Microbiologia e Imunologia

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