Versão Inglês

Ano:  1983  Vol. 49   Ed. 1  - Janeiro - Março - ()

Seção: Artigos Originais

Páginas: 29 a 33

 

FISIOLOGIA DA OLFAÇÃO

Autor(es): JOSÈ ANTONIO A. OLIVEIRA 1


Figura 1 - Localização da mucosa olfatória



Receptores Olfatórios

Existem duas cavidades nasais separadas pelo septo nasal e denominadas fossas nasais. Cada fossa nasal é revestida pela mucosa nasal. A parede lateral da fossa nasal apresenta três saliências chamadas de cornetos; o superior, médio e inferior, que se projetam para o interior da cavidade nasal. As células sensoriais ficam nas regiões olfatórias em cada fossa nasal, localizadas junto aos cornetos superiores na sua maior parte e na parte superior da mucosa do septo, estendendo-se em parte para o corneto médio. A área olfatória tem aproximadamente 2,4 cm2 contendo vários milhões de células olfatórias (Figura 1).

Estrutura da mucosa olfatória

É constituída por um epitélio com três tipos de células: as células de sustentação, as células olfatórias e as células basais. Estas últimas são células imaturas que podem se transformar em células sensoriais. As células
olfatórias são células sensoriais primárias, pois são neurônios bipolares que derivam embriologicamente do sistema nervoso central. Estas células têm dois pólos. Os pólos inferiores emitem axônios que atravessam os poros da área cribiforme da lâmina perpendicular do etmóide que forma o teto das fossas nasais. Estes filetes nervosos formam feixes que se encaminham ao bulbo olfatório. Os pólos superiores formam as chamadas vesículas olfatórias com pêlos ou cílios, mergulhados no muco que cobre o epitélio olfatório. Na mucosa olfatória encontramos ainda glândulas e células produtoras de muco como as glândulas de Bowman, as células caliciformes e as células de sustentação (Fig. 2).



Figura 2 - Área e vias olfativas



Muitos pesquisadores tentaram identificar as propriedades comuns de substãncias com cheiros semelhantes. Estas substâncias devem ser voláteis, para a penetração nas fossas nasais com o ar inspirado; devem ser solúveis em água, para ultrapassar o muco atingindo as células olfatórias; devem ser solúveis em lipídios para entrar em contato com os cílios e membranas das células. sensoriais que contêm gorduras. Substâncias que provocam sensações odoríferas semelhantes têm moléculas de forma geométrica semelhantes, daí a mesma teoria estudada, para explicar a estimulação gustativa, a teoria estereoquímica, é a mais promissora para explicar a estimulação olfatória apesar de suas limitações. Nós somos milhares de vezes mais sensíveis aos estímulos olfatórios do que gustativos. Cerca de
2% das moléculas inaladas no ar inspirado podem alcançar o epitélio olfatório. Devido esta pequena quantidade poderíamos dizer que uma célula olfatória pode ser ativada por uma única molécula de substância estimulante.

Com relação aos tipos de substâncias estimulantes, investigadores acham que muitas das sensações olfatórias . dependem de algumas sensações odoríferas primárias básicas como na gustação. Tentativas de classificação de odores primários não tiveram êxito. Todavia, para fins práticos foi feita uma lista de odores primários: floral, canforado, pútrido, almiscarado, etéreo, penetrante, menta. Nos últimos anos vem se evidenciando 50 ou mais sensações primárias do olfato.

Mecanismo de estimulação - Transdução no receptor

Como no caso da gustação, pouco se sabe com relação ao processo primário que é responsável pela recepção olfativa. Baseando-se na teoria estereoquímica, citada anteriormente, existiriam moléculas receptoras nas membranas das células olfatórias que poderiam interagir com moléculas das substâncias odoríferas. O tipo de receptor químico determinaria o tipo de substância estimulante capaz de provocar resposta na célula olfatória. Como existem grande número de substâncias estimulantes é pouco provável que exista uma molécula receptora especial para cada substância estimulante. Neste caso, diversos estimulantes de cheiro semelhante reagiriam com uma molécula receptora comum.

A interação da substância estimulante com a molécula receptora determinaria uma alteração na permeabilidade da membrana da célula sensorial olfatária com conseqüente fluxo de íons de sódio para dentro da célula, diminuindo o potencial da membrana negativo ocorrendo a despolarização, com conseqüente formação do potencial gerador no receptor, este determinando formação de potenciais de ação ou impulsos nervosos nas fibras olfativas.

Os registros de fibras individuais do nervo olfatório mostram que existe uma freqüência de descarga de impulsos de
repouso lenta, quando não ocorre estímulo olfatório. Um estímulo sendo apresentado, os axônios inicialmente produzem impulsos de alta freqüência, havendo em seguida, redução desta, a um nível de equilíbrio mais inferior, voltando a freqüência de repouso quando cessa o estímulo.

É possível que existam variações regionais para a recepção de estímulos diferentes como no sentido da gustação. Cada célula olfatória, entretanto, é excitada por várias substâncias em grau variável, mas a sensibilidade relativa desta célula a várias substâncias varia de uma célula para outra. Assim, os estímulos odoríferos são codificados em determinada concentração de tal modo que produzem um padrão de excitações que abrange um número grande de células receptoras.

Com relação à intensidade da sensação, esta aumenta com o aumento da concentração da substância estimulante. Esta correlação segue a lei da psicofísica de Stevens. Usando-se em gráfico coordenadas logarítmicas, os dados aparecem como uma linha reta. O expoente n indica o grau de inclinação da reta que no caso do olfato é de 0.5-0.6. As sensações de olfato se alteram lentamente, em relação às alterações dos estímulos.

A equação da lei de Stevens é:

S = K (C - Co)n
S = sensação
K = constante
C = concentração da substância
C = concentração limiar
n = grau de inclinação da seta



Figura 3 - Estrutura da mucosa olfatim



Limiar

Existem dois tipos de limiares olfativos.

O limiar de detecção, quando as pessoas percebem algum cheiro, mas não o identificam. O limiar de identificação, quando o odor é reconhecido especificamente. De modo geral, uma pequena quantidade do agente estimulante basta para estimular as células olfativas, o ácido butírico, por exemplo, produz estimulação com 2,4. 1012 moléculas por litro de ar. Existem certos animais com limiares muito mais baixos, como o cão, a enguia, o bicho-da-seda. Neste último exemplo, o macho vibra as asas, atraído pela substância atrativa das fêmeas, quando apenas 1% dos receptores das suas antenas são estimulados.

Adaptação

Nós sabemos que os axônios do nervo olfatório reduzem as suas freqüências de descarga de impulsos depois da exposição inicial a um estímulo. Esta mudança ocorre muito mais rapidamente do que as mudanças nas nossas sensações olfatórias. Os axõnios, como vimos, respondem até cessar a estimulação, entretanto nós deixamos de sentir um odor depois que a estimulação é apresentada, mesmo persistindo a estimulação. Deste modo, acreditamos haver um mecanismo de adaptação adicional no bulbo olfatório ou no cérebro.

Vias Olfativas (Fig. 4)

A informação sensorial viaja dos receptores olfativos até o cérebro em dois feixes de axônios curtos chamados nervos olfativos. No seu trajeto, estes axônios passam pela lâmina crivosa do etmóide chegando aos dentritos das células mitrais no bulbo olfatório. Estas células mitrais constituem os neurônios de segunda ordem da via olfatória. As sinapses dos neurõnios de primeira ordem com os de segunda ordem participam de estruturas do bulbo olfatório chamadas glomérulos. Aproximadamente 100 axônios fazem sinapse com uma célula mitral. Além das células mitrais existem outras células nervosas de segunda ordem, as células granulosas. Os axônios das células mitraís transmitem informações a estruturas subcort.cais profundas no cérebro. As células granulosas transmitem informações de uma área para outra dentro do mesmo bulbo olfatório. Os axônios das células mitrais (neurônios de segunda ordem) formam o trato olfatório que transmite os sinais olfatórios a várias áreas cerebrais, diretamente ou indiretamente. É interessante notar que diferentemente de outros órgãos sensoriais o sistema olfatório não envia informações a uma região particular do córtex. Entre as áreas cerebrais que recebem informações olfatórias estão: bulbo olfatório oposto, área pré-piriforme e lobo piriforme, hipocampo, núcleos autonõmicos do hipotálamo e que constituem duas áreas olfatórias do enféfalo: a área olfatória mediana e a área olfatória lateral. Estas vias olfatórias principais não têm uma área específica no tálamo o que é um fato incomum em sistemas sensoriais, disto acredita-se que o sistema olfatório tenha evoluído separadamente, e mais cedo nos vertebrados.



Figura 4 - Gráfico da variação da sensação olfativa com aumento da intensidade do estímulo



Existem tratos olfatórios secundários que vão ao hipotálamo, tálamo, hipocampo e núcleo do tronco cerebral. Estas vias estão relacionadas com a atividade sexual, reprodução, alimentação, emoções, como o medo e o prazer. Outros tratos secundários transmitem informações também da área olfatória lateral para o córtex temporal e córtex pré-frontal.

Existe um controle eferente da recepção olfatória. Estes axônios partem do sistema nervoso central, de áreas olfatórias, do cérebro e do tronco cerebral, terminando em células granulosas modificando assim os impulsos excitatórios provenientes dos ramos olfatórios ao nível das células mitrais.

Importância biológica da olfação

1. Controle da reprodução nos mamíferos.

2. Procura do alimento pelo sinal olfatório.

3. Limitação de território, através de sinais olfatórios.

4. Influência de sinais olfatórios nas emoções.

Um perfume é capaz de despertar emoções fortes, esta influência pode ser devida às conexões do sistema olfatório com o sistema límbico.

5. Proteção das vias respiratórias através de espirros quando sentimos cheiros desagradáveis.

6. Defesa, identificando a presença do inimigo pelo cheiro.

7. Participação nos fenômenos digestivos, pois o cheiro de alimentos estimula as secreções gástricas e salivares e os movimentos peristálticos do trato digestivo.

REFERÉNCIAS

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1 Professor Adjunto - Laboratório de ~acústica Professor Ricardo F. Marseillan - Faculdade de Medicina - Ribeirão Preto - USP. Laboratório de Biocomunicaçdo - Faculdade de Filosofia,
Ciências e Letras de Ribeirão Preto - USP. Departamento de Oftalmo-Otorrinolaringologia - Faculdade
de Medicina de Ribeirão Preto - USP.

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