Ano: 1997 Vol. 63 Ed. 3 - Maio - Junho - (10º)
Seção: Relato de Casos
Páginas: 276 a 278
TELANGECTASIA HEMORRÁGICA HEREDITÁRIA. RELATO DE CASO.
Hereditary Hemorragic. Telangiectasia. Case Report.
Autor(es): Luiz César Widolin*
Palavras-chave: telangectasia hemorrágica hereditária
Keywords: telangiectasia hereditary hemorragic
Resumo:
O autor apresenta um caso de telangiectasia hemorrágica hereditária ou síndrome de Osler-Rendu-Weber. O mais importante sinal é a epistaxe recorrente. Discute aspectos sobre diagnóstico, história clínica, exame físico, terapêutica e outros tópicos do caso.
Abstract:
The author present one patient diagnosed as hereditary hemorrhagic telangiectases or Osler-Rendu-Weber disease. The most important sign is a recurrent epistaxis. discuss aspects about the diagnostic, clinical history fisical, treatment and others topics of this case.
INTRODUÇÃO
A síndrome de Rendu-Osler-Weber ou telangiectasia hemorrágica hereditária (HTT) é um distúrbio autossômico dominante, caracterizado por telangiectasias em derme, mucosas e vísceras, assim como malformações arteriovenosas pulmonares e do sistema nervoso central1.
Descrito inicialmente em 1896 por Rendu, em 1901 por Osler e posteriormente por Weber, caracteriza-se principalmente (mais de 90% dos casos) por crises recorrentes de epistaxe, que ocorrem espontaneamente ou são facilmente provocadas por espirros, exercícios ou estresse emocional. Outros sintomas são hemorragias intestinais e alterações conseqüentes às malformações arteriovenosas como cirrose, insuficiência cardíaca e hemorragia cerebral2,3,4.
RELATO DO CASO
T. P. R., 45 anos, sexo feminino, negra, compareceu ao Serviço com história de epistaxes de repetição, iniciada aos 7 anos de idade. Segundo relata, as hemorragias ocorrem espontaneamente ou com o menor esforço físico. Relatou hemorragia digestiva alta há 2 anos, que necessitou de internamento e transfusão. Foi realizada, nessa internação, endoscopia digestiva alta, porém a paciente não possuía o laudo do exame.
O exame físico revelou diversas telangiectasias em septo nasal, mucosa da boca e lábios e em dedos. A lesão sobre a pele desaparecia à compressão extrínseca por lâmina de vidro. Não havia outros sinais característicos da patologia.
Os exames laboratoriais realizados revelaram hematócrito de 31%, hemoglobina de 10,6 g/dl e 3.050.000 eritrócitos por microlitro.
A história pregressa revelou falecimento de pai por "problema de coração" é uma irmã falecida aos 36 anos "derrame cerebral". A paciente possuía três filhos (2 homens e 1 mulher), nos quais o único achado sugestivo da patologia foi pequena telangiectasia no lábio de um dos filhos (Figura 1).
O RX de tórax e o anti-HIV (solicitado pelas transfusões) não mostraram alterações.
A paciente foi orientada a fazer uso de reposição foram realizadas cauterizações com ácido a 30% nas telangiectasias que apresentavam recente. A paciente não retornou para reavaliação.
Figura 1.
DISCUSSÃO
A síndrome de Rendu-Osler-Weber ou Telangiectasia Hemorrágica Familiar é displasia vascular autossômica dominante, com freqüência de aproximadamente 1 para 100.0006.
A epistaxe é a sintomatologia mais freqüente. Hemorragia gastrointestinal ocorre em aproximadamente 10% dos casos. Existem malformações vasculares pulmonares (levando ao cor-pulmonale), hepáticas e cerebrais (acidente vascular cerebral hemorrágico). As telangiectasias típicas iniciam-se na 3ª ou 4ª década, sendo rara sua ocorrência antes da puberdade. Em mulheres, a hemorragia destas lesões apresenta aumento durante o período anterior à menstruação, após a menopausa e seguido à ooforectomia. Com a gravidez, tem-se relatado diminuição do sangramento3, 4.
O aumento do número e tamanho das telangiectasias mucosas e cutâneas, freqüentemente vistas com o aumento da idade, são ainda inexplicáveis5.
O diagnóstico diferencial é com a síndrome CRST (calcinose, síndrome de Raynaud, esclerodactilia e telangiectasias), provável doença colagenosa vascular, nas quais as telangiectasias são indistinguiveis5.
Avaliação do paciente com hemograma, Rx de tórax (fístula artério-venosa), ecografia hepática e tomografia cerebral devem ser aventadas, para avaliar o estadiamento da doença4.
Muito pode ser feito pelo controle da epistaxes, mesmo que de eficácia temporária (cauterizações químicas e elétricas, fotocoagulação por laser, estrogênio sistêmico e dermoplastia septal), mas severa hemorragia intestinal ou cerebral pode ser fatal. Fístula artério-venosa pulmonar também necessita de atenção cirúrgica1, 4, 7.
O uso de estrogênio sistêmico deve ser sempre acompanhado cuidadosamente, em razão das possíveis complicações4.
Orientação quanto à patologia e suas complicações, além de sua transmissão genética, deve ser dada a pacientes e familiares.
No caso acima, a paciente não apresentava possíveis alterações pulmonares, apesar de que exames mais complexos não puderam ser realizados. O relato do pai falecido por problema cardíaco e de uma irmã por "derrame cerebral" faz pensar na possibilidade de que eles tenham sido portadores da anomalia.
CONCLUSÃO
A telangiectasia hemorrágica familiar é doença autossômica dominante, que tem como principal sintomatologia a epistaxe. Por este motivo, com muita freqüência, é o otorrinolaringologista o primeiro profissional a deparar-se com esta patologia, devendo estar consciente da mesma, para adequadamente orientar e tratar seu paciente.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1. AASSAR, O. S.; FRIEDMAN, C. M.; WHITE, R. I. - The natural history of epistaxis in hereditary hemorrhagic telangiectasia. Laryngoscope, 101: 977 - 980, 1991.
2.ROMAIN,G.; FISHE, R. M.; PERL, D. P.; POSER, C. M. - Mani-festation of hereditary hemorrhagic telangiectasia (Rendu-Osler-Weber diease): report of 2 cases and review of the literature. Ann. Neurol. 4: 130-144, 1978.
3. FLESSA, H. C.; GLUECK, H. I. - Hereditary Hemorrhagic Telangiectasia (Osler-Rendu-Weber disease). Manageme of epistaxis in nine patients using systemic hormone theraf Arch. Otolaryngol. Head and Surg., 103: 148 - 151, 1977.
4. HARRISON. D. F. N.; FRCS, M. S. - Use of estrogen in treatment of familial hemorrhagic telangiectasia.Laryngoscope, 92: 314 - 320, 1982.
5. WINTERBAUER, R. H. - Multiple telangiectasia, Raynaud's phenomenon, sclerodactyly and subcutaneous calcinosis: a syndrome mimicking hereditary hemorrhagic telangiectasia. Bull. Johns Hopkins Hospital. 114: 361 - 383, 1964.
6. GUTTMACHER, A. E.; MARCHUK, D. A.; WHITE, R. I. - Hereditary hemorrhagic telangiectasia. New England J. Méd. 333: 918-924, 1995.
7. McCAFFREY, T. V.; KERN, E. B.; LAKE, C. F.: Management of epistaxis in hereditary hemorrhagic telangiectasia: reviw of 80 cases. Archives Otolarvngology., 103: 627-630, 197
* Responsável pelo Serviço de Otorrinolaringologia do CAIF (Centro de Atendimento Integral ao Fissurado Lábio Palatal), Curitiba/ PR.
Correspondência: CAIF - Av. República Argentina 4334 - Portão - CEP 81050 0001 Curitiba/ PR. - Telefone: (041) 246-6718
Artigo recebido em 17 de junho de 1996. Artigo aceito em 22 de agosto de 1996.