Versão Inglês

Ano:  1997  Vol. 63   Ed. 3  - Maio - Junho - ()

Seção: Artigos Originais

Páginas: 212 a 215

 

CONCEITO HISTOPATOLÓGICO DE AMIGDALITE CRÔNICA NA INFÂNCIA.

Histopathological Concept of Chronic Tonsillitis in Children.

Autor(es): Luiza H. Endo*
Albina Altemani**
Carlos Chone*
Edson Idagwa*

Palavras-chave: hipertrofia de adenóide e de amígdalas, amigdalalite recorrente, amigdalite crônica

Keywords: tonsils, adenoids hipertrophy, recurrent tonsillitis, chronic tonsillitis

Resumo:
O propósito deste estudo foi averiguar em que grau a entidade clínica amigdalite recorrente (AR) está associada com o padrão da amigdalite crônica. Casos de hipertrofia amigdaliana idiopátiea benigna (HIB) não associados a infecções recorrentes foram usados para comparação. Realizamos estudo histopatológico de 126 amígdalas palatinas de crianças (57 casos devidos a AR e 69 a HIB). Os seguintes aspectos foram avaliados: reticulação elas criptas, quantidade relativa de tecido linfóicie difuso e folicular, intensidade da fibrose do parênquima, projeções papiliferas do epitélio, quantidade de detritos na luz das criptas e presença ele cistos de queratina. Não houve diferença quantitativa significativa entre os dois grupos (AR e HTB) e não encontramos padrão histopatológico distinto de AR ou HIB. Infecções recorrentes de amígdalas em crianças não apresentam padrão histopatológico que permita definí-las como amigdalite crônica inespecífica.

Abstract:
In order to define if some characteristics as lymphoid tissue hyperplasia, distension of the crypts, keratin cysts and papillary arrangenlent can give the diagnosis chronic tonsillitis, we performed histopathological study of 126 tonsils excised by surgery. Sixty nine cases, with surgery indication were tonsils and adenoid hypertrophy (T&AH), without acute recurrent tonsiflitis, and 57 ca of recurrent tonsillitis (RT). We analysed the above mentioned characteristics of chronic tonsillitis considering the presence or not of the recurrent infection. There were no significant difference within the two groups (RT and T&AH) and the findings can be found in many group, different ages with or without recurrent infection although they are more frequent in the group with recurrent infection. We conclude that we are unable to diagnose chronic tonsillitis, but only to make a good description of the histopathological findings, considering the knowledge of tonsillar recent phisiopathology.

INTRODUÇÃO

A amigdalite recorrente (AR), com ou sem hipertrofia, e a obstrução de vias aéreas digestivas por obstrução benigna (HIB) são as indicações mais comuns de amigdalectomia em crianças. Quando enviamos o material após cirurgia para exame anátomo-patológico, os resultados deste exame não foram condizentes com o quadro clínico do paciente. A presença de fibrose, cistos de queratina, criptas alargadas com muito conteúdo e tecido linfóide exuberante são aspectos que sempre forneceram subsídios ao patologista para definir a amigdalite crônica. O diagnóstico histopatológico das nossas amígdalas enviadas ao exame não nos satisfaziam. Assim sendo, do ponto de vista histopatológico, havia controvérsias com relação a amigdalite crônica não específica1. Esta situação contrasta com a da amigdalite aguda e amigdalite atrófica dos adultos, para as quais o padrão histológico é bem conhecido.

O propósito deste estudo foi o de avaliar até que ponto a manifestação clínica de amigdalite recorrente está relacionada com o padrão histopatológico de amigdalite crônica. Casos de hipertrofia amigdaliana idiopática benigna (HIB) não associados a infecções recorrentes foram usados para comparação.

MATERIAL E MÉTODOS

Realizamos o estudo histopatológico de 126 amígdalas obtidas após cirurgia. Destas, 57 casos foram atribuídos a amigdalites recorrentes, com ou sem hipertrofia amigdaliana (os pacientes tinham 3 a 5 crises agudas de amigdalite ao ano por 2 anos consecutivos, ou 5 a 7 crises agudas em um ano), e 59 casos foram causados por hipertrofia amigdaliana idiopática (sem recorrência de amigdalite).

As amígdalas foram fixadas em formol a 10% e em parafina; os cortes foram corados com hematoxilinaeosina. Os aspectos histológicos avaliados incluíam: grau de reticulação das criptas, quantidade relativa do tecido linfóide difuso e folicular, intensidade da fibrose do parênquima, projeções papilares do epitélio, quantidade de detritos na luz das criptas e presença de cistos de queratina. Os centros germinativos do tecido linfóide foram classificados conforme descritos por Veldman2. Em dos os casos, exceto pela presença de cistos de queratina, realizamos a análise semi-quantitativa, usando a seguinte escala: - (ausente), + (leve), ++ (moderada) e +++ (severa) intensidade.

Os testes estatísticos empregados para analisar ossos dados incluíram: Anova, Wilcoxon, X quadrado e os testes exatos de Fischer, assim colho Van de Waerden e análise de variança multivariada (Manova).

RESULTADOS

A idade dos pacientes variou de 2 a 14 anos (média = 5,5 ± 2,3 anos) e não houve diferença significativa entre os 2 grupos (AR e HIB). O exame histológico foi conduzido na forma de estudo duplo cego.

Não encontramos padrão histológico distinto em crianças com AR ou HIB. A reticulação das criptas foi leve em 14% dos casos, moderada em 63% e severa em 24%. Não houve diferença significativa nessa- porcentagem entre os grupos (Wilcoxon: S=3.484,00, p-valor=0,4410). As projeções papilíferas do epitélio estiveram ausentes em 50% dos casos e foram leves em- 25,4%, moderadas em 13,5% e severas em 10,3%. Nenhum desses valores foi significativamente diferente entre os 2 grupos (Van de Waerden: S=0,8719, p-valor=0,5251). A fibrose do parênquima não foi observada em 31,7% dos casos e foi leve em 54,8%, moderada em 11,9% e severa em 1,6%. Novamente, não houve diferença significativa estatisticamente entre os 2 grupos (X quadrado X2=0,270, p-valor=0,6745; Van de Waerden S=1,97, p-valor=0,6858).

Os cistos de queratina foram observados em 13,5% dos casos e não houve diferença significativa entre- os grupos AR e HIB.

A análise de variança multivariada (Manova) dos 4 aspectos acima não mostrou diferença entre os 2 grupos (Manova Wilk's Lambda; F=0,6301, df=4, p-valor=0,64).

DISCUSSÃO

Procedimento para a classificação de amigdalites crônicas tem sido sugerido recentemente, baseado em dados abrangendo adultos e crianças em conjunto. Entretanto, visto que amigdalites recorrentes afetam principalmente as crianças, restringimos nosso estudo a este grupo.

Os aspectos histológicos, tais como hiperplasia linfóide, distensão das criptas, fibrose cio parênquima, cistos de queratina e projeção papilar do epitélio têm sido relatados como sinais de amigdalite crônica1, 4, 5, 6, 7, 8.

No presente estudo, todos estes aspectos foram analisados, mas não encontramos diferença significativa entre os grupos: com ou sem AR (Figuras 1 a 4).

As amígdalas palatinas possuem extensa superfície críptica, com células especializadas e pequenos poros associados com linfócitos, macrófagos, granulócitos e plasmócitos9. A integridade deste complexo epitélio críptico é importante para o funcionamento imunológico da amígdala palatina como defesa contra infecções do trato respiratório superior.



Figura 1. Amígdala de criança com AR. Observar a infiltração do epitélio escamoso de cripta por linfócitos e plasmócitos (reticulação de cripta), à esquerda, e ausência desta infiltração normal, à direita (HE x 330).



Figura 2.- Amígdala de criança com HIB. O epitélio de cripta mostra projeção papilífera (HE x 132).



Figura 3. Amígdala de criança (2 anos) com HIB. Notar o espessamento fibroso do septo parenquimatoso. (F-Fibrose, - C-Cripta (.HE x 132).



Figura 4. Amígdala de criança com AR. Secção de uma cripta dilatada cheia de queratina (cisto de queratina) (HE x 132).



Nos casos analisados, áreas de epitélio críptico alterado foram observadas, embora não houvesse diferença entre os grupos com e sem infecções recorrentes. A própria cripta estava coberta por epitélio escamoso estratificado, o qual tinha projeção papilífera e não apresentava qualquer infiltração de linfócitos ou plasmócitos. A presença de cistos de queratina é também descrita como sugestiva de processo crônico em amígdalas. Realizamos estudo que avaliou amígdalas de 13 recém-natos (RN) e, para a nossa surpresa, todas apresentavam criptas dilatadas com formação de cistos10. A fibrose de parênquima, outro aspecto bastante relacionado com amigdalite crônica foi evidenciada em vários casos de amígdalas de crianças AR, mas com HIB.

Nenhum padrão histológico distinto foi observado no tecido linfóide folicular e difuso, tanto no grupo AR quanto no HIB. É descrito por muitos autores que, na hipertrofia amigdaliana, o tecido linfóide torna-se exuberante, com grandes folículos e extensas área peri-foliculares. Este aspecto foi encontrado tanto nos casos operados por AR quanto por HIB.

Será que as chamadas hipertrofias idiopática, benignas de amígdalas não poderiam ser casos em que as infecções ocorressem de maneira silenciosa? Estes fatos são atualmente o motivo de nossa pesquisa.

CONCLUSÃO

A infecção recorrente nas amígdalas de crianças não está associada a padrão histopatológico definido que permita denominá-la de amigdalite crônica inespecífica. A hipertrofia idiopática benigna não se distingue claramente da amigdalite de repetição. Do ponto de vista histopatológico, concluímos que as amígdalas devem apenas ser descritas pelo patologista, cabendo ao otorrinolaringologista conhecer as modificações estruturais importantes causadas pela repetitividade de infecções, como é o caso da perda de reticulação. Nossos dados contribuem com o fato já por nós discutido.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. FRIEDMAN, I. - The tonsils and oropharynx In: Systemic Pathology, 3ª ed. USA Churchill Livingstone, 1986 p.161-171.
2. VELDMAN, APUD; LENNERT, K. & MULLER - HERMELINK, I.K. In: Malignant Lymphomas Berlin, Springer Verlag, 1978, p. 33-40.
3. ENDO, L. H. & VASSALO, J. - Amigdalite Crônica. Acta AWHO, 9(3): 124-132, 1990.
4. LOPES FO. O.; MIMIÇA, L; PAES, R. A. P.; MIMIÇA, L. J.; LAZARINI, P. R.; BETTI, E.; PEREIRA, J. L. C., & HOLANDA, J. L. A. - Amigdalite crônica: estudo imuno-histoquímico e histológico. Rev. Bras. ORL 55 (2): 88-90, 1989.
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9. MAMA, S. & MOGI, G. - Funcional morphology of tonsillar crupts in recurrent tonsillitis. Acta Otolaryngol. 1984, (supp1.41 G): 7-19.
10. ENDO, L.H. & ALTEMANI, A. - Histopathology of the palatine tonsil in the newborn infant. Abstracts 3ª Internatinal Symposium on Tonsils. 1995, p. 91.




* Disciplina de ORA- Setor de ORL Pediátrica- UNICAMP.
** Departamento de Anatomia Patológica - UNICAMP.

Endereço para correspondência: Luiza H. Endo - Av. Andrade Neves, 611 - CEP 13013-161 - Campinas - SP.

Artigo recebido em 13 de junho de 1996. Artigo aceito em 13 de agosto de 1996.

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