Versão Inglês

Ano:  1979  Vol. 45   Ed. 3  - Setembro - Dezembro - ()

Seção: Trabalhos Originais

Páginas: 267 a 273

 

"O USO DE TUBOS DE VENTILAÇÃO SEMI-PERMEÁVEIS NO TRATAMENTO DAS OTITES MEDIAS SECRETORAS"

Autor(es): Otacílio Lopes F° *
Ney Penteado de Castro Jr.**
Fernando de A. Quintanilha Ribeiro***
Carlos Alberto Herrerias de Campos ****

0 termo OTITE MEDIA SECRETORA é usado para designar aqueles casos em que o revestimento mucoso do ouvido médio e anexos se mostram acometidos de um processo inflamatório crônico e uma efusão estéril de viscosidade variada.

Esta patologia não é nova já tendo sido descrita por POLITZER em 1867 como uma perfeição quase absoluta, e posteriormente por HINTON em 1869. No entanto por um longo período, quase um século, muito pouco se ouviu a respeito desta patologia em nossa literatura, uma vez que os Otologistas estavam muito preocupados com o tratamento dos processos supurativos do ouvido, suas seqüelas e complicações.

Parece ter sido ASTLEY COOPER em 1801, que primeiro fez uma Miringotomia, mas sua utilização no tratamento auxiliar das Otites Médias Secretoras, foi primeiro descrita por POLITZER (1867) e HINTON (1869). Estes autores para evitar a cicatrização precoce da incisão da miringotomia, utilizaram pontas de termocautério visando a obtenção de uma perfuração permanente, nem sempre conseguida. A introdução de um tubo plástico (polietileno), na membrana timpânica, visando a permanência da aeração do ouvido médio, parece ter sido feita por ARMSTRONG em 1954, que denominou o método de "timpanostomia".

Após os trabalhos de ARMSTRONG, várias foram as publicações na literatura mundial e o método passou a ser empregado na rotina diária do tratamento destas otites médias.

Se por um lado o emprego destes tubos de ventilação ou "timpanostomia", como os denominou seu divulgador, demonstram um efeito benéfico e muitas vezes um método heróico, no tratamento da otite média secretora, eles determinam algumas limitações ao paciente. Deve-se evitar a entrada de água nos ouvidos, sob o risco de sua penetração poder determinar eventual infecção do ouvido médio, seguindo-se um incômodo processo de supuração, muitas vezes de controle difícil. Mesmo a utilização de protetores auriculares, quer de cera, silicone ou polietileno não conseguem impedir que estes inconvenientes terminem por ocorrer.

Foi procurando superar este problema que algumas firmas especializadas na comercialização de tubos de "timpanostomia" introduziram no mercado, tubos protegidos em seu orifício, por uma membrana de polietileno expandido, que permite devido aos micro-poros a passagem do ar e impede a entrada de água através da mesma. Estes tubos segundo seu idealizador (CASTELLI) possibììïtaríam ao seu portador o uso de piscinas e até mesmo mergulhos, uma vez que só o ar poderia atravessar aquela membrana. Estes tubos levam o nome de seu idealizador, conforme o tipo de modelo empregado (Ex.: Paparella-Castelli, Donaldson-Castelli, etc.).

Entusiasmados com esta possibilidade resolvemos estudar um grupo de pacientes, nos quais introduzimos os tubos de CASTELLI através de um seguimento de cerca de 180 dias, a fim de avaliar seu desempenho e permitindo a estes pacientes o uso indiscriminado de piscinas ou mesmo evitando qualquer tipo de cuidado com a entrada de água nos ouvidos.

CASOS ESTUDADOS

Foram introduzidos 16 tubos de ventilação (13 do tipo PAPARELLA-CASTELLI e 3 do tipo DONALDSON-CASTELLI) em 10 pacientes portadores de Otite Média Crónica Secretora, cujas idades variavam de 2 a 12 anos (tabela 1).


TABELA 1



Lateralidade

Dos pacientes submetidos a miringotomia e colocação dos tubos de "timpanostomia" 6 (seis) apresentavam comprometimento em ambos ouvidos, sendo que nos outros 4 o problema atingia apenas um dos ouvidos. Nestes 4 pacientes que tiveram o tubo de CASTELLI introduzidos em apenas um dos ouvidos, em 3 deles foi feita uma miringotomia no lado oposto não tendo sido encontrado nenhum tipo de líquido, embora a timpanometria revelasse uma curva suspeita.

Etiologia provável

Nem sempre foi possível determinar uma etiologia definida nos casos aqui relatados. Em alguns, mais de um fator foi encontrado como possível determinante do processo, sendo que em 2 deles não conseguimos determinar a causa provável. As causas determinantes mais freqüentes por ordem foram: adenóides hipertrofiadas, alergia rinosinusal e sinusites (tabela2).


TABELA 2



Como podemos suspeitar pela tabela 2, em alguns casos mais de um fator etiológico foi encontrado, e que pudesse ter sido o fator determinante do processo em causa.

Timpanometria

A timpanometria a nosso ver é o melhor método objetivo para o diagnóstico e avaliação evolutiva de uma otite média secretora. Como já foi descrito por vários autores nos casos de otite secretora a timpanometria oferece uma curva timpanométrica muito típica e quase inconfundível com outra patologia (desde que a membrana timpânìca se apresente íntegra e sem cicatrizes). Na otite secretora encontramos a curva timpanométrica descrita por JERGER como sendo do tipo C (figura 1) podendo ter no entanto conformações variáveis, que se constituem em variações do tipo básico descrito por JERGER (figura 2), dependendo da viscosidade do líquido e de sua quantidade, da presença associada de ar ou de outros fatores imponderáveis.

Na tabela 3 estão discriminados os tipos de curvas timpanométricas encontradas em nossos 10 pacientes (16 ouvidos considerados).



FIGURA 1


TABELA 3



A curva tipo A (descrita como a normal) de JERGER não foi encontrada em nenhum dos casos. A do tipo B (disfunção tubária) foi encontrada em 1 caso, embora houvesse sido encontrado líquido durante a miringotomia. A curva timpanométrica tipo C foi encontrada em 11 dos casos e a Cm (modificação da anterior) em 4 ouvidos.

Tipo de liquido encontrado

Nos 16 ouvidos submetidos a miringotomia, em 15 deles encontramos líquido de alta viscosidade (denominado pelos Americanos de "glue") e em apenas 1 o líquido era fluído, seroso (o da tímpanometria tipo B).
Tipo de tubo utilizado

Dos 16 ouvidos operados, em 3 deles empregamos o tubo de DONALDSON-CASTELLI e em 13 o PAPARELLA-CASTELLI, em função do tempo de permanência desejado.

RECORRÊNCIA DE INFECÇOES AGUDAS

Após a colocação dos tubos de ventilação, tivemos a ocorrência ou recorrência de 5 (cinco) episódios de otites médias agudas em 16 ouvidos operados, num período de 30 a 120 dias após a miringotomia.

É um índice muito alto, considerando a presença do tubo de "timpanostomia" e seu objetivo, sugerindo que nos casos em que houve a infecção aguda, os tubos estavam obstruídos por alguma razão. A tabela 4 mostra a época das recorrências.


TABELA 4




Permeabilidade do tubo

As condições de permeabilidade dos tubos, Isto é seu funcionamento normal ou não, foram avaliadas segundo dois parâmetros: o aspecto da membrana timpânica e a audição no ouvido considerado. Os tubos foram considerados funcionantes de modo satisfatório quando a membrana timpânica apresentava um aspecto normal (de modo geral nestes casos a timpanometria mostrava uma curva tipo A) e a audição era normal. A tabela n° 5 foi elaborada segundo estes critérios.


TABElA 5



Pela tabela 5 verificamos que com o correr dos dias os tubos semi-permeáveis (???) passavam a não funcionar por alguma razão, dando origem à recorrência do problema anterior, isto é a permanência de liquido no ouvido médio com todas as suas conseqüências.

Ao final de 180 dias apenas 3 ouvidos dos 16 operados encontravam-se em condições satisfatórias de ventilação.

Recidiva de liquido no ouvido médio

A observação mensal dos pacientes aqui considerados permitiu a constatação, pela simples otoscopia, da recidiva do líquido no ouvido médio, e de modo progressivo nos ouvidos operados. A tabela 6 mostra o tempo decorrido entre a colocação do tubo e a recidiva da otite média secretora.


TABELA 6



Após um período de observação de 1B0 dias, 13 dos 16 ouvidos encontravam-se novamente com líquido.

Eliminação espontânea de tubos

Em 5 dos casos operados houve eliminação espontânea dos tubos num período compreendido entre 90 e 180 dias (3 de DONALDSON e 2 de PAPARELLA).

COMENTÁRIOS

Embora o objetivo a que se propõe, os tubos de CASTELLI, não demonstram utilidade prática. A presença de cerumen do conduto auditivo e a obstrução do seu orifício interno por tecido mucoso do ouvido médio, foram os fatores encontrados e que explicavam a obstrução dos tubos empregados nos casos aqui estudados. Tanto o cerumen como a obstrução de sua luz por tecido mucoso do ouvido médio tornavam os tubos inicialmente apenas permeáveis ao ar, em não permeáveis ao ar ou a água.

Em nenhum dos casos a entrada de água nos ouvidos pode ser imputada como a causa de sua obstrução, ou de otites agudas. Realmente estes tubos se mostraram extremamente eficazes contra a entrada de água no ouvido médio, porém progressivamente perdiam sua finalidade, não permitindo a passagem do ar, objetivo primordial a que nos propomos no tratamento das otites médias secretoras.

CONCLUSÃO

Dos dados obtidos em nosso estudo, podemos concluir que os tubos de CASTELLI (com membranas semi-permeáveis), não devem ser empregados no tratamento das otites médias secretoras, quando o líquido encontrado for do tipo mucoso (glue ear).

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. ARMSTRONG, B.W. - Arch. Otolaryng. (Chicago), 59: 653654,1954.
2. CASTELLI - Conferência durante o XV Congresso Pan Americano de ORL e BE, New Orleans 1976.
3. JERGER, J.J. e al. - Clinical experience with Impedance Audiometry Arch. Otolaryng. (Chicago), 92: 311-324,1970.
4. LOPES F°, O.C. - Contribuição ao Estudo Clínico da Impedância Acústica. Tese. Ed. Univers. S Paulo, 1972.
5. LOPES F°, O.C. - Temas de Otorrinolaringologia, vol. li],
pág. 85. Ed. Manole, S. Paulo, 1979.




ENDEREÇO DOS AUTORES:
Clinica de Otorrinolaringologia
Sta Casa de S. Paulo
Rua Cesário Motta Jr. 112 - 4° andar
01221 - S. Paulo

* Professor Titular de Otorrinolaringologia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de S. Paulo
** Professor Instrutor, tempo parcial da F.C.M.S.C.S.P.
*** Professor voluntário da F.C.M.S.C.P.
**** Professor Instrutor Tempo Integral da F.C.M.S.C.S.P.

Trabalho recebido para Publicação em julho de 1979

Imprimir:

BJORL

 

 

 

 

Voltar Voltar      Topo Topo

 

GN1
All rights reserved - 1933 / 2024 © - Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico Facial