Ano: 1936 Vol. 4 Ed. 6 - Novembro - Dezembro - (40º)
Seção: Trabalhos Originais
Páginas: 1541 a 1542
MIGRAÇÃO DE UMA ESPINHA PELA PAREDE ANTERIOR DO PESCOÇO
Autor(es): FRIEDRICH MÜLLER - São Paulo.
Um doente me contou, que tinha engulido uma espinha que migrou pela parede anterior do seu pescoço. Como se trata de um caso raro e como não podia achar no Handbuch der Hals-Nasen-Ohrenheilkunde um caso semelhante, julguei este caso digno de leval-o ao conhecimento dos colegas.
O proprio doente descreveu o acontecimento do modo seguinte
Por infelicidade minha, entrou-me uma espinha na lingua. Resolvi consultar um medico e este depois de muito trabalho disse-me que voltasse no dia seguinte e então faria um corte e com facilidade retraria a espinha.
Não ficando contente procurei outro medico. Disse-me, que nada mais encontrava da espinha. No dia seguinte disse-me novamente que nada encontrava e que a ferida da lingua, proveniente da espinha, estava já cicatrizando.
Passada uma semana sentia eu dores ao engulir qualquer alimento, tão fortes que até suava frio. Esperei uma semana e meia. Como me aparecesse uma inflamação externa no pescoço, tratei logo de procurar um medico especialista da garganta. Tendo-me examinado com todo interesse, disse-me que tirasse da cabeça o caso da espinha.
A inflamação não cedeu e as dores foram aumentando. Voltei ao especialista de garganta; disse-me que se tratava de reumatismo na garganta.
Aconselhou-me fazer aplicações de diatermia e á noite que fizesse compressas mornas com alcool.
No terceiro dia mostrou-se um ponto avermelhado e que parecia querer supurar. No dia seguinte pela manhã, com surpreza minha, apareceu a ponta da espinha, uns 2 mm fora, pelo que tratei então logo de mostral-a ao medico, que sem perda de tempo retirou-a com uma pinça.
A espinha tinha 1 cm. de comprimento e (lentes de um lado. Um arame penetrou mais ou menos 5 a 6 cm. no canal da ferida.
Dentro de dois dias o ferimento cicatrisou.
Assim o doente descreveu o raro acontecimento.
Não acredito que a espinha tenha entrado pela lingua, mas sim pela face lateral do seio piriforme direito ou mesmo pelo lado do hipofaringe.
De lá, ele perfurou pouco a pouco toda a parede do pescoço saindo perto do bordo inferior direito da cartilagem cricoide.
Como o corpo estranho não sómente tinha a forma de uma cunha, mas tambem apresentava dentes de um lado, póde-se imaginar com facilidade que não podia mover-se para traz, mas que a cada movimento de deglutição pouco a pouco foi empurrado para dentro da parede do pescoço, seguindo as fendas entre os musculos tireoideus e omohioideus, furando a fascia profunda e superficial e a propria pele.