Versão Inglês

Ano:  1936  Vol. 4   Ed. 6  - Novembro - Dezembro - (24º)

Seção: Trabalhos Originais

Páginas: 1319 a 1328

 

QUEILITE GLANDULAR SIMPLES SUPERIOR

Autor(es): DR. ALVARO DA SILVA COSTA - 1

SERVIÇO DE OUVIDOS, NARIZ E GARGANTA DA POLICLINICA DE BOTAFOGO, DO DR. RAUL DAVID DE SANSON

Descrita pela primeira vez por J. J. Puente e A. Acevedo no numero de Fevereiro de 1927 da Revista Médica Latino Americana, a queilite glandular simples é uma afecção caracterisada por hipertrofia e heterotopia de glandulas salivares labiais.

Até ha bem pouco tempo era considerada exclusiva do labio inferior.

Aspecto clinico: O labio torna-se hipertrofico e projectado para diante, apresentando ligeira eversão que faz com que certa area mucosa seja visivel embora esteja o doente com os labios cerrados. A mucosa assim exposta, bem como o epitelio que constitue a pseudo-mucosa do labio encontram-se dessecados; enrugados, com pregas e sulcos pronunciados e algumas vezes apresentam descamação esbranquiçada e aderente. Entre a área mucosa. e a área pseudo-mucosa ou zona de transição de Klein encontram-se pequenos orificios que se apresentam como pequenos pontos violaceos. Eles se acham de preferencia na linha de contato dos labios, que nos portadores de queilite está situada em plano posterior á séde normal em consequencia da eversão labial. Canas escretores de glandulas salivares labiais hipertrofiadas e heterotopicas, os orificios acima referidos podem ser cateterisados por meio de sondas muito finas ou fios de seda.

Comprimindo-se o labio vêm-se aparecer, saindo desses orificios, pequenas gotas de saliva, como goticulas de orvalho.

A' palpação sentem-se "pequenos nódulos duros que correspondem ás glandulas hiperplasicas" (Touraine e Solente).

A queilite glandular simples é e m geral indolor mesmo á pressão.

O inicio do processo é insidioso, não despertando nunca a atenção do doente.

EXAME ANATOMO-PATOLOGICO

Este exame revela dois fatos fundamentais

1.º - A presença de glandulas salivares labiais na zona de pseudo-mucosa. (Estas glandulas nos individuos normais só se encontram sob á mucosa).

2.° - A hipertrofia dessas glandulas e a dilatação ás vezes enorme dos tubuli glandulares com espessamento de suas paredes. (Puente, Bejarano, Covisa e Gay).

A descrição que fizemos em linhas gerais, se encontra com mais minucias no trabalho de J. Puente entitulado "La queilitis glandular simples y estados allegados" publicado em 1934 onde este autor inicia a parte referente a - "aspecto clinico" coar a seguinte frase: - "La lesión se presenta exclusivamente em el labio inferior". E mais adiante acrescenta: "Nunca hemos podido obsevar este aspecto en el labio superior". Em seguida, Puente, chega ainda á seguinte conclusão: "En resumen, puede decirse que no existe en la infancia, excepcional en la juventud y es propria de la idad adulta". Sendo nosso caso ora a:presentado relativo á queilite glandular simples superior e em individuo jovem, é natural que essas duas importantes particularidades o tornem digno de menção.

Por carta datada de 28 de janeiro de 1936 que José Puente teve a gentileza de nos enviar tivemos noticias de que ultimamente se conhecia um caso de queilite glandular simples superior. Esta publicação, devida a J. Bejarano se encontra nas "Actas Dermosifilograficas" numero de janeiro de 1935 pag. 405.

COMPLICAÇÕES

A queilite glandular simples é considerada como ponto de partida de outras afecções mais graves. Citaremos como principais a queilite glandular supurada e o cancer do labio.

OBSERVAÇÃO

D. de A. Ficha n.° 11.875. 23 anos - solteiro - operario. Resid. R. Corcovado, 34 - casa 6.

Procurou o serviço no dia 8 de Junho de 1935 para examinar o labio superior. Ha alguns anos sente o labio superior volumoso. Não sabe precisar a epoca em que se inciou essa hipertrofia.

Antecedentes pessoais: doenças proprias da infancia.

Ant. familiares: SS.

Exame do labio: Grande tumefação e eversão do labio superior. Com os labios cerrados normalmente, extensa area de mucosa se acha exposta ao ar. Esta faixa de mucosa, assim como a zona de transição de Klein se apresentam dessecadas e percorridas por pequenos sulcos. Alguns orificios na linha de adatação ao labio inferior dão pela expressão goticulas de liquido cristalino. Com certa dificuldade estes orificios e respetivos canais foram cateterisados

A palpação alguns nodulos endurecidos deslisam entre dedos.

Dentes: Máus, porém cuidados.

Gengivas: Dadas as relações intimas das queilites com processos inflamatorios ria boca, examinamos cuidadosamente as gengivas nada encontrando ne anormal.

Faringe: Amigdalas palatinas pequenas, sem reação inflamatoria.

Rinoscopia ant.: SS.

Rinoscopia post.: SS.

Wassermann: negativo.

Diagnostico: Queilite glandular simples superior.

INTERVENÇÃO EM 19 DE JUNHO DE 1986

Sob anestesia local retiramos um retalho em cunha, do labio superior abrangendo mucosa e epitelio da zona de transição de Klein na aparte correspondente aos orificios glandulares assim como do tecidos subjacentes.

Suturamos a ferida operatoria com fios de seda.

Enviamos o fragmento retirado a exame anatomo patologico.

EXAME ANATOMO-PATOLOGICO

(Trabalho do Instituto de Neurobiologia da Assistencia a Psicopatas - Diretor: Dr. Mario Pinheiro).

Pelo assistente Dr. Newton Salles.

Biopsia do labio superior que se acha tumefeito e formações tumorais.

Policlinica de Botafogo - Serviço do Dr. David Sanson.

O exame histopatologico do material revela: 1.° - mucosa labial integra, com orificios, externos de varios condutos revestidos por epitelio, que se aprofundam pelo corion; 2º - o corion revela-se fibroso, espesso, com numerosos vasos congestos, porém livres de celular infiltrativas inflamatorias; 3ºna porção profunda do corion (microfotografia I). vêm-se lobulos glandulares, separados por feixes conjuntivos fibrosos; essas glandulas reproduzem a estrutura das glandular sul-maxilares, ora em acinos forrados por celulas cilindricas e claras, que são predominantes (glandular mucosas), ora celular cubicas (glandulas serosas), que existem em menor proporção (microfotografia II). E' interessante notar a dilatação de alguns acinos, que assumem o aspeto de formações quisticas, sem conteudo visível, tornando-se achatadas as celulas que forram as referidas cavidades. E' digna de menção especial a acentuada infiltração inflamatoria mono-linfocitaria, que se dispõe entre os acinos, constituindo em certos pontos aglomerados bem condensados.

Diagnostico - Processo inflamatorio não especifico de glandulas labiais heterotopicas (mucosas e serosas), com formações quisticas edematosas.

Considerações

No caso estudado tres particularidades resaltam:

1° - a heterotopia glandular, possue glandulas salivares que só existem na porção mucosa labial e assim mesmo de dimensões colares.

2.º - notar como importante que autores são unanimes em proclamar a escassez de glandulas no labio superior, e ser justamente nesta o processo encontrado.

3.º - o processo inflamatorio cronico, com formações quisticas, parece ser puramente glandular, não participando dele o labio propriamente. Esta particularidade parece até certo ponto contrariar a denominação de queilite glandular simples, dado pelos autores e aceita pelo Prof. José J. Puente no seu magnifico artigo publicado em 1934.

Ora, o labio não nos parece participar diretamente do processa, sendo somente a séde ocasional por isso que, o que ha são glandulas heterotopicas inflamadas, que nele se encontram mas que são atingidas independentemente.

Não se nos apresenta muito justa, para a histopatologia a denominação de queilite glandular simples, e sem maiores pretensões, pensamos dever-se denominar adenite heterotopica labial simples ou quistica, como nosso caso, que descrimina melhor o processo, nas suas principais características.

A ferida operatoria cicatrisou por primeira intensão, obtendo nosso doente alta curado 10 dias após. Desde então tem sido observado algumas vezes sem que se verifique nada de anormal.

O unico vestigio que hoje apresenta de todo o processo que descrevemos é uma cicatriz linear na face interna do labio.

A fotografia (3) mostra o doente antes da operação.

Em (4) vê-se o doente alguns mezes depois de curado.




1- Assistente do Serviço de ouvidos, nariz e garganta do dr. Raul David de Sanson da Policlinica de Botafogo.

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