Versão Inglês

Ano:  1936  Vol. 4   Ed. 6  - Novembro - Dezembro - (12º)

Seção: Trabalhos Originais

Páginas: 1209 a 1220

 

POLIPO COANAL SOLITARIO (Caso Clinico)

Autor(es): DR. RUBEM C. L. AMARANTE *

A observação que se segue é de um enorme polipo coanal solitario. A raridade em observar casos semelhantes levou-nos a descreve-lo. Reside provavelmente na pequena frequencia destes casos o fato de possiveis confusões, com outros tumores no naso-faringe. A radiografia, o toque, a idade, o sexo auxiliam no diagnostico diferencial. No quadro clinico predominam os sintomas de obstrução nasal, cefaléa e crises nasais espasmodicas.

O exame anatomo-patológico, as macro e micro fotografias da nossa observação devemos á gentileza e á apurada tecnica do nosso colega dr. José Bica.

M H. D. 16 anos, brasileira, branca, solteira: 27-12-35.

Anamnese: - Ha dois mezes não póde respirar pelo nariz, está sempre com a boca aberta, passa mal as noites com falta de ar, a vóz se tem modificado consideravelmente. Não sente cheiro nem gosto, não se alimenta abem e tem emagrecido muito. Sente dor e zoada nos ouvidos e não escuta bem. Começou a sentir deficiencia respiratoria nasal, ha mais ou menos um ano.

Antecedentes: - Molestias proprias da infancia.

Rin. ant.: - (Fossa nasal esquerda inteiramente obstruida por formação poliposa.

Faringe: - Logo ao abrir a boca, nota-se pendente atraz da uvula, no oro-faringe, atingindo ja o hipofaringe, um tumor liso de cor rosea movel, de consistencia elastica, sangrando ao toque, do tamanho de um ovo de galinha (fig. n .º 1, mostra bem o tamanho e a localização do polipo).

A radiografia doe seios da face que pedimos, revelou opacidade do seio maxilar esquerdo (cliche n.° 12).

Tratamento: - Cirurgia, Intervenção sobre o seio maxilar. Caldwell-Luc. Anestesia local com novocaina-adrenalina. Mucosa toda degenerada, seio cheio de polipo e de um liquido amarelo de consistencia viscosa. Terminada a intervenção sobre o maxilar, com a sonda de Belloc passamos as extremidades de um fio de aço pelo meato infrior, lacando o polipo no faringe, prendemos as extremidades do Tio a uma alça de Brünnings e estrangulando-a cortamos o pediculo do polipo, retirando-o inteiro.

A fotografia n.° 3 demonstra abem o tamanho do polipo. Intervenção exangue. Pelo toque verificamos o recalcamento do vomer para o lado direito provocado pelo polipo. Auxiliou-nos o interno Cruz Guimarães.

Sequencias ótimas. - Alta curada.

Exame anatomo-patologico: - "Macroscopia" - A peça mostra conformação ovoide muito alongada medindo cerca de 7 cents. no eixo maior e 3 no menor. E muito nítida a individualisação de um pediculo (fig. n.° 3). A superficie é lisa, brilhante, ligeiramente rugosa em algumas zonas verificando-se no polo superior, em correspondencia com a face anterior um sulco superficial, de trajeto sinuoso delimitando o pediculo A face posterior (fig. n.° 4) mostra menor convexidade do que a anterior. A coloração é rosea esbranquiçada, observando-se na face posterior pequenas zonas de- coloração roses avermelhada. A consistencia é elastica, pouco firme. Ao corte (secção segundo o eixo maior) o tecido é de coloração rosea esbranquiçado distinguindo-se :nitidamente o desenho vascular. Observa-se 5 cavidades cisticas de volume variado que encerram liquido claro limpido, ligeiramente viscoso. em quantidade de cerca de 3 cmc. A parede destes cistos apresenta uma superficie lisa, humida e brilhante de coloração esbranquiçada. No liquido das cavidades cisticas, foi Identificado a presença de mucina. (Exame feito pelo dr. Italo Mattos do laboratorio do H. Pronto Socorro).

O exame microscopico do material revelou um polipo da mucosa do tipo edematoso com reação inflamatoria secundaria. Os aspectos histologicos verificados são os seguintes: a superficie é recoberta em quasi toda a extensão por epitelio cilindrico estratificado (C. fig. 6), exceto na extremidade inferior em que o revestimento é formado por epitelio pavimentoso estratificado sem transformação cornea (P, fig. 6). O tecido basilar abundante em substancia colagens mostra um edema difuso mais acentuado em algumas zonas do que em outras, sendo relativamente bem vascularisado, encontrando-se os vasos em geral dilatados e cheios de sangue (V, fig. 7). Nota-se abundante infiltração parvicelular de distribuição difusa, mais intensa nas zonas superficiais, sub-epiteliais, formada por elementos leucocitarios variados predominando em alguns focos linfocitos e plasmocitos, em outros leucocitos neutrofilos e eosinofilos (I, fig. 6). As glandulas mucosas são escassas. As formações cisticas não apresentam paredes individualizadas e tem o revestimento interno formado por uma camada de elementos celulares achatados endoteliformes. O produto de secreção conservado em algumas porções se apresenta como uma massa homogenia retraída tomando a coloração de eosina. Não se verifica nas cavidades císticas elementos epiteliais destacados nem leucocitos" (K. fig. 6 a 7). Assim, dr. José Bica.



Fig. 1



Fig. 2



Fig. 3



Fig. 4



Fig. 7



Depois dos trabalhos de Killian e Ino Kubo parece perfeitamente assentado a origem sinusal destes polipos, mais frequentes no maxilar raro no esfenoide e frontal. Caboche diz mesmo que "eles são a tradução rinoscopica de sinusites latentes maxilares e frontais".

Malan pensa que a maior parte deles são implantados no recesso alveolar do seio maxilar. Alguns autores com muita razão os denominam polipos antro-coanais.

No nosso caso a mucosa, conforme se ve na descrição que fizemos do tempo cirurgico, estava completamente degenerada. Todo o seio estava tomado por polipos implantados principalmente na parede nasal e no rebordo alveolar. O ostium se apresentava alargado e dava a impressão que o polipo inserido no seu contorno e nas paredes do seio era o mesmo que se continuava no rino-faringe. Segundo alguns autores a formação dos polipos é devido a hipertrofia da mucosa que, aumenta muito de volume, estrangula-se pelo ostium e, saindo por ai, vai crescer no naso-faringe. Para outros, a formação se faz a custa da secreção das celulas da mucosa dos seios, que se derramariam entre o osso e a mucosa, exteriorisando-se pela compressão através do ostium. Qualquer das teorias se baseiam na irritação cronica e hipertrofia da mucosa.

A gravura n .º 5 mostra o corte do polipo apresentando cinco cavidades quisticas cheias de um liquido no qual foi identificado a presença de mucina (Polipo quistico de Moure).

A interpretação da chapa radiografica pôde as vezes indusir a erro, mostrar a transparencia do seio normal e no entanto ele estar tomado. Aconselha-se nestes casos a lipiodagem dos seios para elucidar a origem do polipo e orientar o tratamento. No nosso caso a radiografia mostrou claramente a diminuição da permeabilidade do seio maxilar esquerdo. (Cliche n.° 2).

O polipo coanal solitario, logo ao primeiro exame, pode ser confundido com o fibroma do naso-faringe, com sarcoma, ou polipos mucosos. O fibroma do naso-faringe é doença da puberdade, mais frequente no sexo masculino, é um tumor séssil de consistencia lenhosa, sangra frequentemente e é doloroso. O sarcoma é de evolução mais demorada, mais frequente após os 40 anos e de consistencia lenhosa. Os polipos mucosos não atingem o tamanho do coanal, são quasi sempre multiplos bilaterais e de consistencia mole. O polipo coanal solitario é de evolução rapida, unico, como' seu nome indica, (Ino Kubo cita dois casos bilaterais) de consistencia elastica, pediculado, movel. Observa-se com igual frequencia no homem e na mulher, mais comum dos 16 aos 20 anos. Moure observou a sua existencia em um pequeno de 6 anos e Panas em um homem de 60. Segundo Caboche o polipo coanal é caraterisado por ser unico, unilateral e pediculado no meato medio estando a mucosa deste meato integra.

O tratamento deve ser radical - retirada do polipo e intervenção sobre o seio - não só para evitar as recidivas como tambem possiveis hemorragias. Ino Kubo conta ocaso de um doente operado por ele, homem forte de 25 anos, no qual arrancou com alça fria um polipo coanal. Este doente teve horas depois uma hemorragia que custou a ceder mesmo com o tamponamento. No dia seguinte ao operar o seio maxilar verificou que a sua mucosa estava em parte descolada e em alguns pontos rompida devido a tração feita pelo arrancamento do polipo. No nosso caso intervimos primeiro sobre o seio e depois retiramos o polipo. A intervenção foi exangue.

DISCUSSÃO

Dr. Theophilo Falcão - Conta um erro de diagnostico que teve ha muitos anos atraz, em um caso extremamente semelhante ao do Dr. Amarante. Tratava-se de um menino portador de um tumor, que, na ocasião, classificara de fibroma rinofaringiano, visivel á, simples abertura da boca, por detraz do veu do paladar, e que não permitia o toque. Indicou a intervenção e se cercou de preparos, esperando uma grande hemorragia, que não se deu. Recidivando o tumor, algum tempo depois, nova intervenção foi praticada, tambem sem perda de sangue apreciável. Tendo-se dado uma segunda recidiva, praticou, nessa ocasião, em que a sua pratica de especialista era bem maior, um exaras mais minucioso e verificou que o tumor vinha do seio maxilar esquerdo, que se mostrou, a diferentes processos de inspeção, séde de um processo inflamatorio cronico. Operado o seio, e extraído concomitantemente o tumor ficou o doente radicalmente curado.




* Assistente do Serviço de Ouvidos, Nariz e Garganta do Prof. David de Sanson no Hospital da Fundação Gaffrée e Guinle. Rio de Janeiro.

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