Versão Inglês

Ano:  1975  Vol. 41   Ed. 3  - Setembro - Dezembro - ()

Seção: Trabalhos Originais

Páginas: 267 a 271

 

INFLUÊNCIA DO ESTADO FUNCIONAL DA TROMPA DE EUSTÁQUIO NO MECANISMO DE AUDIÇÃO*

Autor(es): Zenshi Heshiki**

Resumo:
o autor apresenta o estudo de 17 ouvidos com lesão do tipo neurosensorial, confrontando-os com 47 portadores de obstrução crônica da trompa de Eustáquio e 23 ouvidos clinicamente normais. Agrupa os ouvidos com base no estudo sonomanométrico e verifica que cerca de 1/3 dos pacientes com lesão do tipq neurosensorial apresentam obstrução crônica da trompa de Eustáquio.

Summary: The autor present a study of 17 ears with sensorineural deafness, 47 with chronic obstruction of the Eustachian tube and 23 normal ears. After the sonomanometric test, he verified that 1/3 of the ears with sensorineural deafness, as had chronical obstrution of Eustachian tube.

Resumé: L'auteur a etudié 17 oreilles avec surdité neurosensoriel, 47 avec obstruction chronique de la trompe d'Eustache et 23 sans afection. Après l'étude sonomanometrique, il y a verifié qui 1/3 des oreilles avec surdité neurosensoriel ont des résultats sonomanométrique d'obstruction chronique ed la trompe d'Eustache.

Introdução

A trompa de Eustáquio tem sido objeto da atenção de especialistas em vários centros de pesquisa, particularmente pela sua participação nas afecções do ouvido médio tanto na indicação terapêutica como nos resultados da timpanoplastia.

O estudo funcional tomou grande impulso com a II Grande Guerra Mundial, devido a necessidade de seleção de soldados para o exercício nos submarinos e na aviação. Recentemente, o progresso da microcirurgia otológica, obrigou os pesquisadores a procurar métodos mais eficientes de determinação da função de equilíbrio das pressões da trompa de Eustáquio. Por outro lado, nos últimos anos o estudo das afecções do ouvido interno sofreu grande avanço, tanto em relação aos métodos semiológicos como da terapêutica. A exploração transtemporal do conduto auditivo interno constituiu assunto dominante no último Congresso Internacional de ORL que teve lugar em Veneza. No nosso meio, tal terapêutica não é ainda um método rotineiro nos hospitais, mas, inevitavelmente deverá ser. Nessa oportunidade, o estudo funcional da tuba deverá ser realizado com métodos objetivos para não levar à mesa cirúrgica, pacientes com problemas de disfunção do órgão. A escola européia, há vários anos introduziu um novo método de estudo funcional da trompa de Eustáquio, essencialmente objetivo, e que vem sendo empregado em alguns centros como método rotineiro. Tem a vantagem de permitir o registro gráfico da permeabilidade funcional, podendo ser empregado em ouvido com membrana timpânica íntegra ou perfurada. Tivemos o privilégio de introduzir este método pela primeira vez no Brasil há alguns anos e o presente trabalho tem a finalidade de reapresentar o método, mostrando que pacientes portadores de afecções do ouvido interno, podem apresentar disfunção da trompa de Eustáquio e que pode ser avaliada por este método objetivo conhecido com o nome de SONOMANOMETRIA.

Revisão Bibliográfica

Em 1941, Van Dishoeck, um dos precursores do estudo funcional da trompa de Eustáquio, já afirmava que a obstrução crônica desse órgão pode atuar na função auditiva e em particular sobre o labirinto coclear. Zollner (1942) admitia que a trompa exerce função protetora do órgão estato-acústico. Nesse mesmo ano Loch, publica os resultados de seu trabalho experimental demonstrando a interferência da disfunção da trompa sobre a audição e contesta a falsidade das teorias de Mygind (edema do órgão de Corti) e de Galloway (absorção de substâncias tóxicas), porquanto a descompressão determinava a recuperação da audição. Em 1943, Perlman utilizou a audiometria para determinar a função da trompa, mas não estabeleceu correlação entre o grau de estenose e a deficiência de audição.

Em 1948, Wever e col. estudaram variações do potencial coclear, provocando experimentalmente a hipopressão endotimpânica. Verificou que o limiar ósseo sofreu variação pequena nas freqüências graves, sendo mais acentuadas nas freqüências agudas. Terracol e col. (1949) afirmam que as variações de pressão ao nível do meato acústico externo interferem na função do ouvido médio e interno, podendo atingir a pressão intra-craniana. Tarab em 1958 verificou que a perda de audição é proporcional ao valor absoluto da pressão ao nível do meato acústico externo, concordando com a opinião de Terracol e col. Em 1962, Aubin e Aubry e col. demonstraram experimentalmente que as variações de pressão endotimpânica determinam modificações do potencial coclear. Flisberg e col. (1963) realizaram a mesma experiência, no homem, demonstrando o efeito evidente da variação de pressão endotimpânica sobre a função auditiva. O mesmo autor denominou de "vertigem alternobarica", a este efeito, afirmando que o mecanismo é ainda desconhecido (1970). Portmann & Portmann (1963), aceitam a existência da surdez progressiva nos casos de obstrução crônica da trompa de Eustáquio. O mecanismo seria por degeneração do labirinto ou por um mecanismo vasomotor atuando no aparelho coclear. Riu e col. (1966), afirmam que nos casos de obstrução crônica da tuba, a perda auditiva atinge cerca de 20 a 25 dB nas freqüências graves. Em 1971, tivemos a oportunidade de estudar trompas "clinicamente normais" em comparação com trompas clinicamente obstruídas pelo método sonomanométrico.

Material

O presente estudo é constituído de 17 ouvidos de 13 pacientes, portadores de afecção do ouvido interno pelo exame clínico e audiométrico. A idade mínima foi de 14 anos e o mais idoso com 70 anos, com a média de 53.6 ± 16.4 anos. Incluímos ainda 23 pacientes "clinicamente normais" e 47 com obstrução crônica da trompa de Eustáquio, que constitui material de nosso trabalho anterior. Todos os ouvidos foram submetidos ao exame sonomanométrico.

Método

Calculamos a média aritmética dos valores obtidos pelo exame audiométrico tonal. O exame sonomanométrico fornece elementos para dar a classificação funcional da trompa de Eustáquio. Temos assim:

Tipo I - permeável ao som pela manobra de deglutição.

Tipo II - não permeável ao som desde que acrescida de hiperpressão ao nível da rinofaringe.

Tipo III - dispermeável ao som, mesmo à manobra de deglutição com hiperpressão ao nível da rinofaringe. A pressão ao nível do ouvido sobre variação pelo efeito da hiperpressão ao nível da rinofaringe.

Tipo IV - dispermeável à pressão e ao som com as manobras de deglutição e hiperpressão ao nível da rinofaringe.

Resultados

A tabela 1 fornece a média aritmética das perdas auditivas em decibéis (dB) dos grupos "normais" com obstrução crônica da trompa de Eustáquio e nos portadores de afecção do ouvido interno.


Tabela 1 - Média aritmética das perdas auditivas por vias óssea, aérea e do diferencial ósseo, aéreo de 23 ouvidos clinicamente "normais", 47 com obstrução crônica da tuba e 17 com lesão audiométrica do ripo neuro-sensorial.

N = grupo "normal" - OT = grupo com obstrução crônica - NS = grupo com lesão neuro-sensorial - o = perda auditiva por via óssea - a/o = diferencial ósseo aéreo - a = perda auditiva por via aérea - Hz = Hertz - dB - perda auditiva em decibéis.



A tabela 2 nos fornece a distribuição das trompas de acordo com a classificação proposta, baseada nos resultados do exame sonomanométrico.


Tabela 2 - Distribuição dos ouvidos clinicamente "normais", com obstrução crônica da tuba e com lesão audiométrica do tipo neuro-sensorial de acordo com o tipo de trompa ao exame sonomanométrico.



Discussão

A influência da hipopressão endotimpânica nas funções do ouvido interno foi aceita por muitos autores como Van Disboeck, Zollner, Perlman, Terracol e col., Portmann & Portmann e Riu e col. Foi demonstrada em animais por Wever e col, Tarab, Aubin, Aubry e col., e no homem por Flisberg e col. Em 1968, Guillerm e col., introduzem no arsenal semiológico um novo método de estudo funcional da trompa de Eustáquio. Pelo mérito de ter introduzido este método no Brasil, e por julgar que o mesmo deverá trazer uma contribuição apreciável ao desenvolvimento técnico-científico neste campo de estudo, abrindo novos horizontes, principalmente com os progressos da cirurgia do conduto auditivo interno, pretendemos demonstrar que pacientes portadores de afecção do ouvido interno ao exame audiométrico, apresentam distúrbios de função da trompa de Eustáquio, detectáveis ao exame sonomanométrico.

A tabela 1 e os audiogramas permitem demonstrar que os diferentes grupos são perfeitamente distintos, tanto em relação aos limiares ósseos, aéreos como no diferencial ósseo aéreo. Por outro lado a tabela 2 nos mostra que a distribuição dos ouvidos com base no exame sonomanométrico apresenta algumas diferenças. Assim, no grupo com problemas do tipo neuro-sensorial apenas 41.18% dos ouvidos possuem a trompa de Eustáquio em perfeito estado funcional, em contraste com o grupo normal que mostra 65,2%. Por outro lado, considerando que os tipos III e IV representam aqueles ouvidos com estado funcional da trompa inegavelmente alterado, verificamos que no grupo normal totaliza 26.1%, no grupo com obstrução crônica atinge 55.33% (36.17 ± 19.15) e no grupo com problema neuro-sensorial remos 29.41% (5.88 ± 23.53). Verificamos, portanto que pacientes portadores de afecção do ouvido interno, embora aparentemente "normais" quanto ao estado funcional da trompa de Eustáquio, pelo exame sonomanométrico pode-se demonstrar que a porcentagem de trompas permeáveis (tipo I) somente à manobra de deglutição, é menor em relação ao grupo "normal", enquanto as trompas com maior dificuldade funcional (tipos III e IV) é ligeiramente maior em relação ao grupo "normal" e nitidamente menor em relação ao grupo clinicamente com obstrução crônica da trompa (grupo OT).

Conclusões

A análise do nosso material e a pesquisa bibliográfica sobre o assunto, nos autorizam propor as seguintes conclusões:

1. Pacientes portadores de afecções do ouvido interno do tipo neuro-sensorial, apresentam quedas auditivas mais acentuadas nas freqüências agudas. - 2. O exame sonomanométrico é um método semiológico que deve ser empregado sistematicamente na pesquisa da função da trompa de Eustáquio, inclusive nos portadores de afecção do ouvido interno do tipo neuro-sensorial. - 3. A porcentagem de trompas francamente permeáveis à manobra de deglutição verificadas com sonomanometria é de 41 contra 65% do grupo "normal" clinicamente. - 4. A soma dos grupos III e IV (trompas obstruídas) atinge 26% no grupo "normal", enquanto no grupo com problema neuro-sensorial é discretamente maior 29%.

Bibliografia

- Aubin, A. - Variations de pression aéreienne dans l'oreille moyenne et réponse cochléaire. Bull del'Academia Nat Med, 146: 50-54, 1962.
- Aubry, M.; Pialoux, P. & Borgeat, M. - Amplitude et phase de microphoniques cochleaires en fonction des variations de préssion à l'interieur de bulle tympanique chez la mérionne et la cobaye. Ann Otolaryng, 79: 387-394, 1962.
- Flisberg, K.; Ingelstedt, S. & Ortegreen, U. - On middle ear pressure. Acta Otolaryng, suppl. 182: 43-56, 1963.
- Flisberg, K. - The effects of vacuum on the tympanic cavity. Symposium on Eustachian tube problems. Otolaryng Clin N A. Philadelphia, 3: 3-12, 1970.
- Loch, W. E, - The effect on hearing of experimental occlusion of the Eustachian tube in man. Ann Otol Rhin Laryn, 51: 396-405, 1942.
- Loch, W. E. - Effect of experimentally altered air pressure in the middle ear on hearing acuity in man. Ann Otol Rhin Lmryng, 51: 995-1006, 1942.
- Perlman, H. B. - Quantitative tubal function. Arch Otolaryng, 38: 453-461, 1943.
- Portmann, M. & Portmann, Cl. - Précis d'Audiometrie Clinique, Masson et Cie. ed. Paris, 1965 3ème. ed.
- Riu, R.; Flottes, L.; Bouche, J.; Le Den, R.; Guillerm, R.; Le Mouel, C. & Badre, R. - La Physiologie de la trompe d'Eustache. Applications cliniques et thérapeutiques. Librairie Arnette, 2 rue Casimir-Delavigne, Paris, 1966.
- Tarab, S. - Le mecanisme de l'epreuve de Weber et les variations auditives en fonction de la préssion d'air dans l'oreille externe et moyenne. Rev Laryng, 79: 1223-1259, 1958.
- Terracol, J.: Corone, A. & Guerrier, Y. - La trompe d'Eustache. Masson et Cie. Ed. 120, Ed. Saint-Germain - Paris, 1949.
- Van Dishoeck, H. A. E. - Negative pressure and loss of hearing in tubal catarrh. Acta Oto-Laryng, 29: 302-312, 1941.
- Wever, E. G.; Lawrence, M. & Smith, K. R. - The effect of negative air pressure in the middle ear. Ann Otol Rhin, 57: 418-428, 1948.
- Zollner, F. - Anatomie, Physiologie, Pathologie and Klinik der Ohrtrompete. Spring Verlag, Berlin in: RIU 7 col. La physiologie de la trompe d'Eustache. Applioations cliniques de la trompe d'Eustache. Arnnete, 2 rue Casimir- Delavigne, Paris. 1966.




ENDEREÇO DO AUTOR:
Faculdade de Ciências Médicas e Biológicas de Botucatu - Cx. Postal, 102
18.600 - Botucatu

* Material de estudo obtido no Serviço de O.R.L. da Faculdade de Medicina de Bordeaux (Diretor: Prof. Michel Portmann)
** Livre-Docente de Otorrinolaringologia da Faculdade de Ciências Médicas e Biológicas de Botucatú - Estado de São Paulo.

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