Versão Inglês

Ano:  1975  Vol. 41   Ed. 3  - Setembro - Dezembro - ()

Seção: Trabalhos Originais

Páginas: 259 a 266

 

NISTAGMOGRAFIA DE FREQÜÊNCIA EM INDIVIDUOS NORMAIS SUBMETIDOS A PROVA ROTATÓRIA SINUSOIDAL AMORTECIDA

Autor(es): Marcos Grellet*
José Antonio A. de Oliveira**

Resumo:
Foram submetidos à prova pendular 15 indivíduos sem queixas relacionados com o labirinto anterior ou posterior. As freqüências do nistagmo per-rotatório em cada semi-período foram medidas nas acelerações de 18, 14, 10 6 e 4°/S2. Nas respostas analisadas houve uma variação para o semi-período anti-horário de 12 a 23 batimentos na aceleração máxima e no semi-período horário de 12 a 22. Os valores encontrados foram utilizados para a construção de nistagmograma de freqüência que possibilitaram determinar uma faixa de normalidade entre os valores limites.

Introdução

Atualmente grandes progressos vem alcançando a Otoneurologia em virtude da aparelhagem que se relaciona ao estímulo aplicado ao sistema vestibular e a técnica de registro da sua mais importante resposta, o nistagmo. Sabe-se que a estimulação mais adequada dos receptores vestibulares é obtida por rotação. Entre os métodos rotatórios o mais conhecido é o de Barany. Neste teste realiza-se uma parada repentina após uma rotação, para a observação de um nistagmo post-rotatório, que ocorre como resultado de uma inclinação da crista ampolar. Este método parece ser hoje inadequado para propósitos clínicos e fisiológicos. De acordo com os conhecimentos sobre mecanismo cupular a excitação da cúpula em um movimento rotatório resulta de uma aceleração ou deceleração da rotação. Por isso seria interessante saber que reações podem aparecer durante a rotação em uma velocidade progressivamente crescente e decrescente, em outras palavras observar o nistagmo per-rotatório. Assim necessita-se de um método mais adequado para estimulação rotatória dos canais semi-circulares, que permita a observação de uma aceleração inicial e os efeitos da deceleração, portanto permitindo a utilização de estímulos rotatórios de pequena intensidade.

Foi Mach (1875) o primeiro que realizou estudos de estimulação rotatória deste tipo no homem. Usou para determinar o limiar de excitabilidade vestibular movimentos oscilantes de pequena amplitude. Mach analisou em si mesmo e em seu assistente a sensação rotatória devido à estimulação vestibular com os olhos fechados. Ele determinou o limite de sensação entre 2 e 3°/S2. Kreidl utilizou em 1892 a estimulação rotatória pendular, usando uma plataforma suspensa por quatro cordas a um anel solidário a um cabo de torsão. Este tipo de estimulação permaneceu muito tempo esquecido pelos clínicos em favor da prova de Barany. A impossibilidade de se estudar o nistagmo per-rotatório pela ausência na época de aparelho para registro deste nistagmo, justificou a escolha deste método que permite a análise da resposta nistágmica post-rotatória (Barany).

Hennebert (1956 e 1961), retomou os trabalhos aprimorou a técnica e para definir os movimentos sinusoidais substituiu a freqüência e amplitude das oscilações pela aceleração angular. Deste modo o autor atraiu novamente a atenção sobre a estimulação alternada na pesquisa de problemas vestibulares sendo o primeiro a utilizar o método no plano clínico.

Greiner e cols. (1961) com uma aparelhagem relativamente simples usaram este tipo de estimulação analisando as respostas com eletronistamografia, fazendo comparações com os resultados obtidos nas provas clássicas referindo que este tipo de estimulação fornece informações válidas sobre o estado do sistema vestibular. Concluiu que a prova é de realização simples e rápida, permite o estudo do nistagmo perrotatório, torna possível a comparação imediata da resposta dos dois vestíbulos, coloca em evidência o limiar de excitação vestibular dos dois lados. Como pode-se observar o estudo da sensação provocada pelas oscilações sinusoidais coloca em evidência fenômenos fisiológicos não identificados. Permite obter-se um valor preciso do limiar do aparelho receptor e de estudar separadamente os fenômenos mecânicos do aparelho vestibular. O valor de tal investigação é logo verificado em clínica, entretanto este método não deve ser considerado isoladamente mas como complemento do exame otoneurológico. Para a análise da resposta nistágmica provocada utiliza-se o registro elétrico, ou seja, a eletronistamografia. Este movimento rítmico alternante do olho já fora verificado por Hipócrates e Galeno. Foi inicialrnente chamado de "hippus". Mais tarde o termo foi substituído por nistagmo. Em 1849 Du Bois-Raymond verificou a existência de um potencial corneo-retiniano. Schutt (1922) e Meyers (1929) foram os primeiros que utilizaram esta descoberta para análise do nistagmo. Jung (1939 ) foi o primeiro a registrar o nistagmo vertical e horizontal de cada olho separadamente. Hoje o registro elétrico do nistagmo (eletronistagmografia) é um método utilizado amplamente em investigações clínicas e experimentais do sistema vestibular.

Material e Método

A cadeira "Ototest" fabricada na França pela Alvar Eletrônica permite a estimulação rotatória pendular decrescente. Esse agente estimulante fisiológico provoca batimentos nistágmicos do globo ocular. É um método de exame importante para Otorrinolaringologistas e otoneurologistas. Um polígrafo marca Otographor IV-2-TR Alvar, de quatro canais está acoplado ao estimulador pendular (Figuras I e II). A prova rotatória sinusoidal inicia no sentido anti-horário com uma torsão máxima permitindo que a cadeira pendular parta com uma aceleração de 18°/S² girando em torno de seu eixo.



FIGURA I - Posição do paciente e dos eletrodos durante a prova pendular.



FIGURA II - Polígrafo para o registro do nistagmo per-rotatório.



A aceleração e a velocidade da cadeira são variáveis. A iniciar seu movimento anti-horário a velocidade irá aumentando e a aceleração vai progressivamente diminuindo. Um tambor graduado indicará a velocidade máxima da, cadeira quando passar pelo ponto zero e sua aceleração será nula nesse instante. Após a passagem do ponto zero a cadeira continua sua rotação no mesmo sentido anti-horário perdendo progressivamente velocidade e ganhando aceleração negativa até chegar - a sua excursão máxima. Nesse momento a cadeira automaticamente inicia um movimento no sentido horário verificando-se que o ganho e perda da velocidade e da aceleração se sucedem na dependência da passagem pelo ponto zero do indicador até atingir o máximo de excursão horária. A rotação da cadeira tem um período com duração de 20 segundos, portanto com semi-períodos de 10 segundos cada um. O número total de oscilações completas é de 18 a 20. A duração dos períodos é constante havendo perda progressiva da aceleração e velocidade. O tempo de duração da prova varia de 360 a 400 segundos. A cadeira pendular possui um potenciômetro que permite registrar no polígrafo a amplitude de sua excursão. O polígrafo que está acoplado à cadeira pendular dá um traçado dos movimentos nistágmicos, registra o movimento da cadeira e mudanças do sentido de rotação (Fig. III). Para a obtenção da curva normal utilizando-se a cadeira pendular colocam-se os eletrodos a 1 cm do ângulo externo da fenda palpebral. O eletrodo terra é colocado na região frontal. Na frente do paciente há um painel com lâmpada para calibração do aparelho. Ao acender-se a lâmpada à direita, obrem-se no polígrafo traçado ascendente quando o paciente desloca os olhos para esse ponto luminoso e descendente quando desloca os olhos para um ponto luminoso à esquerda. Para um deslocamento de 5 graus calibram-se os canais para obtenção de traçados com 10 mm de altura.



FIGURA III - Registro da rotação da cadeira e do nistagmo per-rotatório durante uma oscilação completa.



A estimulação do canal semi-circular horizontal será obtida ao refletirmos em 30° a cabeça do paciente, que está fixa em um cabeçote. Nessa posição esses canais permanecem em um plano horizontal. Durante a prova rotatória o paciente fica com os olhos fechados, com os joelhos juntos e pede-se que faça em voz alta cálculos numéricos com a finalidade de eliminar a inibição do nistagmo que pode ocorrer com freqüência. Na rotação anti-horária a corrente endolinfática é ampulópeta no canal semi-circular esquerdo, provocando um nistagmo para a esquerda. No sentido de rotação horária a corrente endolinfática ampulópeta é no canal semi-circular horizontal direito aparecendo um nistagmo para a direita. Foram examinados 15 pacientes de ambos os sexos cuja idade variou de 18 a 25 anos sem queixas relacionadas com o labirinto anterior e posterior. O audiograma desses pacientes mostrou um traçado dentro do padrão normal. Para a obtenção da curva normal da freqüência do nistagmo per-rotatório foram escolhidos cinco pontos de aceleração angular 18, 14, 10, 6 e 4°/seg², respectivamente. Para cada aceleração angular escolhida mediu-se a freqüência dos dois semi-períodos, sendo estas lançadas em um gráfico cuja abscissa representa a aceleração angular em graus por segundos ao quadrado (0/S²) e a ordenada a freqüência dos batimentos nistágmicos.

Resultados

Em 15 pacientes sem alterações cocleo-vestibulares submetidos à prova pendular, procurou-se determinar os valores da freqüência do nistagmo per-rotatório com a finalidade de se obter uma faixa de normalidade. Essas freqüências nistágmicas obtidas com as acelerações angulares já mencionadas para a determinação da normalidade estão lançadas nas Tabelas I e II.


TABELA I - Os valores de freqüência da tabela correspondem a estimulação per-rotatória anti-horária.



TABELA II - Os valores de freqüência da tabela correspondem a estimulação per-rotatória horária.



Como pode-se observar os valores das freqüências do nistagmo decrescem com a desceleração angular provocada pelo amortecimento da cadeira pendular. Esses resultados da tabela foram lançados em gráficos obtendo-se curvas de freqüências (Fig. IV). Essas curvas foram lançadas em um gráfico obtendo-se uma área que delimitou a faixa de normalidade das freqüências do nistagmo provocado por estímulos rotatório pendular decrescentes (Fig. V).

Discussão

A prova pendular oferece atualmente ao labirintologista uma estimulação muito próxima das condições fisiológicas permitindo investigação rápida. A leitura dos traçados permite estudar o comportamento vestibular no decorrer da prova e comparar as respostas do labirinto direito e esquerdo para cada valor da aceleração. Deste modo explora o campo limiar e supra-limiar da função introduzindo uma nova dimensão em vestibulometria.


PROVA GIRATÓRIA PENDULAR - NISTAGMO PER-ROTATÓRIO

FIGURA IV - Curva obtida com as freqüências nistágmicas durante semi-períodos anti-horários.



Durante a realização das provas pudemos observar que a resposta ocular aparece com início da rotação. O nistagnio se desenvolve muito rapidamente atingindo sua maior amplitude em alguns segundos. A intensidade do nistagmo permanece mais ou menos constante durante 2/3 do semi-período decrescendo rapidamente para o final da rotação surgindo a seguir um movimento tônico dos globos oculares indicando a inversão do movimento pendular. Outra observação nas provas realizadas nos indivíduos considerados normais refere-se ao registro nistágmico que se mostra em cada semi-período. A sucessão de batimentos apresenta uma amplitude crescente e depois decrescente com a estimulação. A latência sendo o tempo que separa o início da estimulação e o início da resposta não foi observada nas provas realizadas. Pudemos verificar nos indivíduos normais a simetria nas respostas do labirinto direito e esquerdo tanto na amplitude como na freqüência nistágmica, não se encontrando diferenças maiores que 15% em cada semi-período. A velocidade angular da componente lenta tem seu registro possível por amplificação com corrente contínua, não tendo sido considerada no presente trabalho. Quanto a habituação vestibular que é alteração de respostas pela repetição de estimulação resultante de fatores psico-fisiológicos não foi observada. Sabemos que quando se estuda a função vestibular pela prova calórica mede-se a velocidade angular da componente lenta por ser o parâmetro que melhor reflete aquela função (Van Egmond e Tolk, 1954; Milojevic, 1956). Na prova rotatória a velocidade angular da componente rápida do nistagmo per-rotatório sofre grande variação nas pessoas normais em uma mesma e nas diferentes pendulações. Esta ocorrência determina médias aritméticas diferentes dessa velocidade angular para a mesma pessoa ou entre elas (Koike, 1959; Hinchelif fe e Voots, 1962; Levashow, 1965; Formigoni, 1974).


PROVA GIRATÓRIA PENDULAR - NISTAGMO PER-ROTATÓRIO

FIGURA V - Faixa da normalidade das freqüências do nistagmo per-rotatório.



Por estes motivos utilizamos nas nossas provas a freqüência que é a medida quantitativa mais significativa (Montandon, 1954). A freqüência nistágmica é o número de batimentos por segundo sendo o parâmetro mais fácil de se medir e o mais fiel. Constitui o critério de intensidade da resposta. Seu valor varia com o logaritmo da aceleração. Considera-se como normal para uma aceleração 18°/S2, 15 a 20 batimentos e para 9°/S², 10 a 11, (Greiner, 1969). No presente trabalho foram realizados 30 nistagmogramas de freqüência em 15 indivíduos considerados normais. Encontramos para a aceleração máxima 18°S/² variação de freqüência de 12 a 23 batimentos (ver tabelas), portanto uma faixa um pouco mais ampla do que á de Greiner e col. (1969). Com os valores de freqüência obtidos foram construidos nistagmogramas de freqüência tendo por abscissa a aceleração angular máxima para cada semi-período (escala logarítmica) e o número de batimentos por semi-período (escala linear) em ordenada. Sobre este gráfico logarítmico obtivemos retas representando as respostas normais.

A noção de normalidade em biologia é sempre difícil de se estabelecer pois se assenta sobre a análise de uma população de indivíduos sem doenças. O mais certo para nós é falar-se de valores médios que permitam determinar os limites entre os quais um resultado registrado possa ser considerado normal. Para isso determinamos uma faixa de normalidade no gráfico logarítmico usando como limites os valores máximos e mínimos de freqüência encontrados. A faixa obtida é semelhante a descrita por Greiner (1969).

Summary

Fifteen people without complaints in relation to the anterior or posterior labyrinth were subjected to the "pendular test". The frequencies of the nystagmus in each direction were measured under accelerations of 18, 14, 10, 6 and 4°/S2.

lt was observed a variation in the frequency of the nystagmus under maximum acceleration from 12 to 23 on the counterclockwise phase and from 12 to 22 on the clockwise phase. The data were used to plot the frequency nystagmograms which allow the determination of the zone of normality between limiting values.

Bibliografia

- Du Bois Raymond, 1849 - Cit. por Milojevic (1965).
- Formigoni, L. G.: Estudo da componente rápida do nistagmo por estímulo rotatório pendular decrescente. Anais do XIV Con. gresso Pan Americano de Otorrinolaringologia e Broncoesofagologia, 1974, 40: 433
- Greiner, G. F., Conraux, C., Picard, P.: La stimulation vestibulaire rotatoire de forme pendulaire et ses applications cliniques. Conf. Neurol. 1961, 21: 438.
- Greiner, G. F., Conraux, C., Collord, M.: Vestibulometrie clinique. Editions Doin-Deren et Cie. Paris, 1969.
- Hennebert, P. E.: Les reactions vestibulaires aux épreuves rotatoires sinusoidales. Acta Oto-Laryngologica, 1956, 46: 221.
- Hennebert, P. E.: Aplications cliniques des principes physiques de la stimulation vestibulaire. Confin. Neurol. 1961, 21: 416.
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- Mach, E.: Grundlinien der Lehre von den Bewegungsempfindugen Verlog, Engelmann, Leipzig, 1875.
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- Montand, A.: A new tecnique for vestibular examinations. Acta Oto-Laryng., 1954, 44: 594.
- Schutt, 1922. Cit. por Milojevic (1965).
- Van Egmond, A. A. J. and Tolk, J.: On the slow phase of the caloric nystagmus. Acta. Oto-Laryng. 1954, 44: 589.




ENDEREÇO DO AUTOR:
Gen. Osorio, 362 - 9.° andar
14.100 - Ribeirão Preto - SP.

* Professor Livre-Docente e Coordenador da Clínica Otorrinolaringológica do Depto. de Oftalmologia e Otorrinolaringologia da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto - USP.
** Professor Assistente Doutor da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto da USP. Disciplina Fisiologia Humana.
Professor Assistente Doutor Contratado na Clínica Otorrinolaringológica do Depto. de Oftalmologia e Otorrinolaringologia da USP.

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