Versão Inglês

Ano:  1975  Vol. 41   Ed. 3  - Setembro - Dezembro - ()

Seção: Trabalhos Originais

Páginas: 219 a 231

 

AVALIAÇÃO DA CRIANÇA SURDA

Autor(es): J. E. de Rezende Barbosa*,
Otacílio de C. Lopes F.° **
Alda Christina de C. Borges***

INTRODUÇÃO

A avaliação da criança surda, ou melhor da audição na criança pequena, representa uma área altamente especializada e um desafio à audiologia. clínica. Dadas as características próprias da criança ela adquire aspectos pluridimensionais.

Muitas das técnicas empregadas na medida da audição em adultos, não se aplicam a crianças, particularmente aquelas com problemas na área de comunicação, isto é, ausência ou retardo de linguagem. Os problemas da avaliação são ainda complicados pela presença associada de outras entidades patológicas, que não a que determinou a deficiência como: retardo mental, problemas emocionais graves, distúrbios no sistema nervoso central, e que contribuem para a piora das condições de comunicação. Essas crianças, com deficiências outras que não unicamente auditiva, devem ser logo de início diferenciadas daquelas cujo problema é unicamente relacionado com a audição.

Pode-se verificar o aumento do número de crianças com problemas relacionados com deficiência auditiva, o que se deve em grande parte aos progressos da medicina moderna e especialmente da "Perinatalogia". Graças aos avanços da Obstetrícia e dos cuidados ao recém-nascido, inúmeras crianças, que em outras épocas não teriam condições de sobrevida, agora podem ser entregues aos pais, porém portadoras de deficiências as mais variadas. Entre elas incluímos as técnicas modernas de transfusão no neo nato, permitindo que se salvem crianças portadoras de eritroblastose fetal, determinada principalmente pela incompatibilidade RH. Mesmo na infância precoce, crianças normais, podem no decurso de uma moléstia ou devido ao emprego de certos medicamentos, adquirir deficiências auditivas graves.

O objetivo deste estudo é fornecer aos colegas, que afastados dos grandes centros e não dispondo de equipamentos sofisticados, elementos que permitam com certa precisão uma adequada avaliação auditiva destas crianças, permitindo um diagnóstico precoce e o tratamento necessário em tempo oportuno.

Embora haja alguma discordância com relação à classificação das deficiências auditivas, creio ser conveniente uma breve análise, com relação à que adoramos, de modo a poder empregá-la de maneira clara.

DEFICIÊNCIAS AUDITIVAS

a) Condutivas: por comprometimento do aparelho de condução do som (ouvido externo e médio). Boa discriminação vocal. Causas mais freqüentes: Otite média não supurativa, otites médias crônicas, má formações congênitas, etc.

b) Neuro-sensorial: deficiências causadas por comprometimento da cóclea ou nervo auditivo. Discriminação auditiva comprometida. Podem ser cocleares (sensoriais) e retro-cocleares (neurais). São distinguidas através de testes audiológicos específicos.

c ) Centrais: conseqüentes a lesões no sistema nervoso central: núcleos auditivos (bilateral) ou lesões corticais, determinando o que se denomina de afasia, isto é, inabilidade em codificar e decodificar os símbolos lingüísticos, ou seja, dificuldade em manipular a linguagem simbólica.

Nestes pacientes os limiares auditivos são normais, havendo alterações neurológicas e inclusive modificações no E.E.G.

d) Funcional: Pode se apresentar em crianças com distúrbios da comunicação, desde aquelas portadoras de pequenos problemas psicológicos até as psicoses, incluindo o autismo e esquizofrenia. Nos distúrbios funcionais, não se encontra lesões em qualquer parte do aparelho auditivo quer centrais ou periféricas.

A SUSPEITA DA DEFICIÊNCIA AUDITIVA

a) Não atende à voz materna, não ri, não movimenta a cabeça em direção à fonte sonora;

b) Parada do balbucio, quando há início da criação de "feed-back" auditivo (imagens acústicas);

c) Retardo na aquisição da linguagem no momento esperado;

d) Emissão inadequada, preocupando os familiares.

Dependendo do grau de deficiência auditiva, ou de sua lateralidade (uni ou bilateral), podem permanecer sem que haja qualquer suspeita até a idade escolar. De modo geral na escola, ou por seu comportamento, ou pela oportunidade de expressão ou seu aproveitamento escolar, ou ainda pela rotina de avaliar a audição em algumas escolas, a deficiência é detectada num exame especializado. O ideal é o que se faz em certos países mais desenvolvidos, como na Inglaterra em que as crianças recém-nascidas, são rotuladas como "de risco", sempre que durante a gestação, ou no período natal, houver a incidência de alguma causa determinante de deficiência auditiva. Por exemplo, recémnascido de mãe que teve uma rubéola ou sarampo na gestação (primeiros meses) é rotulado "de risco". Determinou-se que problemas auditivos em crianças "de risco", eram 14 vezes mais freqüentes do que em normais. No grupo natal; os problemas relacionados com a administração de ototóxicos, prematuridade, anóxia, trabalho laborioso de parto, hipermaturidade, etc., eram os mais considerados. No grupo pré-natal, o uso de ototóxicos, rubéola, surdez familiar, incompatibilidade RH etc., recebiam o rótulo de "de risco". Cerca de 10% destas crianças e não todas é que vem sofrer de algum problema auditivo. As crianças "de risco", são revisadas pelo especialista, com um cuidado muito especial, de tal modo que aquela pequena parcela possa ser identificada o mais precocemente possível. São retestadas ao completar um ano, 2 ou 5 anos e seis meses antes da idade escolar.

CAUSAS DE SURDEZ NA CRIANÇA

Distingue-se três períodos importantes, nos quais a deficiência auditiva pode ocorrer e relacionados com as características próprias de cada um deles.

Período pré-natal:

Este período é considerado como se iniciando na fecundação do ovo, até o nascimento. As lesões podem estar relacionadas com o desenvolvimento do órgão, ou comprometer um órgão já desenvolvido. Quando nas primeiras doze semanas, há comprometimento em seu desenvolvimento, após as primeiras doze semanas elas se dão em órgãos já desenvolvidos, como ocorre com a presença de certas substâncias tóxicas em estágios mais avançados da gestação. Algumas vezes a lesão ocorre não como um fato isolado, mas dentro de um conjunto de alterações em outros órgãos. No período pré-natal as causas podem ser genéticas (hereditárias-cromossômicas) ou devido a fatores mesológicos. As primeiras de modo geral determinam o aparecimento de síndromes, com lesões do aparelho auditivo, associadas com outras alterações.

Anormalidade no ouvido médio e externo

O desenvolvimento do ouvido externo e ouvido médio é filogenética e embriologicamente diferente do ouvido interno. Suas anomalias na maioria das vezes, independem das do ouvido interno, daí seu melhor prognóstico, quanto à possibilidade cirúrgica. As agenesias do ouvido externo e médio, podem ter vários graus, desde a ausência de todo o conjunto, uni ou bilateral, a simples atresias ou estenoses do conduto auditivo externo, associados ou não a alterações do pavilhão auricular. Algumas vezes podem ocorrer anomalias do ouvido médio independente do ouvido externo, pois juntamente com a trompa de Eustáquio, tem sua origem no recesso faríngeo. Nestas má formações isoladas, do ouvido médio, o que se encontra com mais freqüência, são má formações ossiculares ou fixações congênitas do estribo.

Anomalias do ouvido interno

O otocisto inicia sua diferenciação em redor da 5.° semana da gestação. No 6.° mês o ouvido interno já se encontra totalmente desenvolvido. Algumas anomalias graves podem ocorrer no ouvido interno, durante seu desenvolvimento e podem ser basicamente classificadas, segundo WHETNALL e FRY nos seguintes tipos:

a) falha no desenvolvimento do órgão (Tipo Michel): É a mais severa, pois há uma falha no desenvolvimento do ouvido interno. Pode ocorrer junto com problemas do ouvido médio e externo, mas é raro. A este tipo de anomalia dá-se o nome de MICHEL.

b) Interrupção no desenvolvimento (Tipo Mondini): O ouvido interno pode sofrer uma grande variedade de anomalias, como: ausência do órgão de Corti, defeitos na cápsula ótica, alterações na estria vascular, ou ainda alterações das células ganglionares. A surdez de modo geral vai depender do grau de comprometimento daquelas estruturas e em particular do órgão de Corri, estria vascular, gânglio de Corri etc. De modo geral os sons agudos são mais atingidos, e a surdez é neurosensorial. Chama-se de alterações tipo MONDINI e de maneira geral são hereditárias.

c) Alterações degenerativas (Tipo Scheibe): Estas são as mais freqüentes (cerca de 70%) e se denominam de tipos SCHEIBE. As anormalidades se limitam ao sãculo e duro coclear. Várias alterações são encontradas neste tipo, como comprometimento no órgão de Corri, astria vascular, membrana tectória, etc.

Causas Mesológicas

São fatores ambientais que podem determinar alterações no órgão em desenvolvimento ou já desenvolvido.

a) Nutricional: Deficiências de Vit. A, Complexo B, vir. K etc.

b) Químicas: Substâncias como antibióticos, ototóxicos, tranqüilizantes, álcool, diuréticos (ac. etacrínico), salicilatos, atitireoidianos etc.

c) Endócrinas: Hipotireoidismo.

d) Actínias: Irradiações.

e) Infecções: Rubéola, Influenza, Parotidites, toxoplasmose, etc.

f) Anoxiantes: Anemias sérias.

g) Mecânicos: Compressão etc.

Causas Natais

São aquelas que comprometem o recém-nascido, desde o início do trabalho de parto até cerca de oito dias após o nascimento, período em que ele ainda está sob a influência do parto.

a) Anóxia; b) Prematuridade; c) Hipermaturidade; d) Traumas de parto; e) Encefalopatia bilirrubínica (Kernicterus).

Causas pós-natais

Aquelas que ocorrem após o nascimento. São as mais freqüentes:

a) Otites médias e suas complicações; b) Infecções e vírus como: sarampo, paroditite, etc; c) Meningites (em geral especial a tuberculose); d) Encefalites; e) Drogas ototóxicas; f) Traumas cranianos; g) Otosclerose (Sind. de Van der Hoeuve) etc.

A AVALIAÇÃO DA PUNÇÃO AUDITIVA NA CRIANÇA

A deficiência auditiva quando presente deve ser suspeitada e diagnosticada o mais precocemente possível, e de preferência nos primeiros meses de vida. MONTEIRO encontrou cerca de 3 % de deficiência auditiva em recém-nascidos. Tendo-se em conta que em 1972 nasceram cerca 3.000.000 de crianças, encontramos a média de 90.000 deficientes auditivos por ano no Brasil o que dá uma média diária de cerca de 252 recém-nascidos com deficiência de audição. Dependendo da idade da criança a ser estudada, a história, dados de anamnese, testes a serem empregados, etc., oferecem características especiais. Assim sendo, agrupamos as crianças em grupos etários, cada um deles com características comuns:

a) Recém-nascido; b) Lactente; c) De 9 meses a 3 anos; d) Mais de 3 anos a 5 anos; e) Mais de 5 anos e escolar.

RECÉM-NASCIDO

É extremamente difícil a avaliação da audição no recém-nascido. Seu próprio comportamento é um fator de limitação. É raro que os pais suspeitem de alguma alteração auditiva durante esta fase. A anamnese é talvez um dos dados de maior importância. Alguns fatos podem levar à suspeita como: a criança quando dormindo não acorda com ruídos, chora muito alto e descontroladamente, não se assusta com ruídos intensos, fica muito quieta no berço, não demonstra alegria quando alimentada etc. Estes fatos podem nos levar à suspeita da presença de uma deficiência auditiva. As crianças rotuladas "de risco", é que representam o grupo de suspeita mais definida. O próximo passo é uma história clínica bem feita, procurando detalhar e investigar todas as causas pré-natais e predisponentes ou determinantes, assim como possíveis casos de deficiências auditivas de caráter familiar. Um recém-nascido com audição normal, somente se interessa por sons graves, tais como barulho de aspirador, bater de portas, ruflar de papel, etc. Normalmente se assusta com sons agudos, como a campainha do telefone.

TESTES EMPREGADOS

Dois tipos fundamentais de testes podem ser empregados no recém-nascido:

a) Empregando ruídos intensos: Sons fortes ou ruídos constantes e intensos, são capazes de despertar um reflexo de alerta no recém-nascido. Podem ser utilizados tons puros (pouco eficazes), ruídos brandos, ruídos de tambor, campainha, palmas, ruídos estridentes, gaitas, etc. Como resposta aos sons intensos o recém-nascido pode apresentar alguns reflexos como:

1 - Reflexo cócleo pálpebral: Em resposta a ruídos fortes, é desencadeado um reflexo de piscar os olhos (pálpebras), e no recém-nascido normal é obtido em torno de 75 dB (NPS). A falta de resposta não indica necessariamente surdez, sendo que o encontro do reflexo é dado significativo.

2 - Reflexo cócleo pupilar: Costuma aparecer a tons agudos, e é constituído de delicada contração ou dilatação da pupila. A luz forte no ambiente pode inibir o reflexo.

3 - Reflexo cócleo muscular (ou reflexo de Moro): A ruídos intensos o recémnascido pode responder com uma contração muscular, principalmente de braços e pernas, como que dando um pulo. A contração, representada pela extensão do braço, seguida da contração ou melhor da flexão e do retorno junto ao corpo; a reação é simétrica e as pernas fazem um movimento análogo (este é o reflexo do Moro), Este tipo de reação é típico do recémnascido e desaparece em torno do quarto mês.

A repetição do estímulo sonoro, pode determinar o desaparecimento das reações reflexas. Segundo alguns autores, é necessário um ruído em torno de 100 dB NPS, para desencadeá-los, sendo que em torno de 75 dB NPS, é apenas suficiente para acordar o recém-nascido.

b) Empregando ruídos ou sons pouco intensos: Como no berçário o nível de ruído é muito alto, devem ser utilizadas salas protegidas, para estudar as respostas do RN a sons pouco intensos. Vários tipos de fontes sonoras podem ser empregadas, havendo aparelhos especiais que oferecem ruídos medidos (Neometer-Zenith). Podem ser usados pequenos brinquedos como: campainhas, caixas de música, etc.

De início os sons são apresentados com menor intensidade e dependendo das respostas obtidas, vai-se aumentando sua intensidade. As respostas que uma criança normal apresenta, são discretas. O acordar a um ruído empregado é uma resposta bastante significativa. Pequenos movimentos do corpo, dos membros, movimentos da cabeça, ou mesmo dos olhos significam respostas positivas. Como já foi assinalado a ausência de respostas não tem um significado conclusivo de falta de audição. Assim sendo as provas devem ser repetidas mais de uma vez em oportunidades diferentes. Parece que os momentos mais oportunos são antes das mamadas (cerca de meia a uma hora antes). Quando as respostas do RN se apresentam dentro dos padrões esperados, então tem um valor positivo. Aqueles que não respondem aos testes, embora não possam ser considerados deficientes auditivos, devem ser acompanhados mais de perto no seu desenvolvimento.

RECÉM-NASCIDO AOS 9 MESES - LACTENTE

Características do grupo

Neste período a criança inicia seu desenvolvimento neuro motor e começa a reconhecer o ambiente, tomando contato com os ruídos e reconhecendo os que lhe são mais familiares.

Suspeitas da deficiência

1 - Não acorda com sons intensos; 2 - Atitude corporal e movimentação no berço; 3 - Não se alegra, na hora das mamadas; 4 - Não reconhece, demonstrando alegria, a voz da mãe; 5 - Choro descontrolado.

Anamoese: Alguns dados são de máxima importância e devem ser pesquisados: sua movimentação no berço, atitudes corporais, indiferença ao meio que o cerca, sua iniciativa em buscar posições próprias no berço, a posição da cabeça, se ela procura mantê-la de modo firme, seu humor frente a ruídos familiares e reações à voz materna. Os antecedentes relacionados com a gestação e o parto devem ser interrogados com muito cuidado, assim como as condições imediatamente ao nascer. Febres inexplicadas, medicamentos administrados etc.

TESTES PARA AVALIAÇÃO AUDITIVA

Estes testes devem sempre ser precedidos de completo exame O.R.L. e em particular do ouvido. Um exame neurológico a fim de se avaliar seu desenvolvimento neuro motor também é indispensável.

Da mesma forma que no RN os testes neste grupo etário, apenas podem nos ofereçer uma idéia qualitativa e são os mesmos empregados no RN, principalmente os reflexos, dentro de suas limitações. Podemos acrescentar alguns ruídos, agora familiares ao lactente, como o de uma colher num pires, ruídos de brinquedos etc. Nesta idade a voz da mãe se constitui no som mais importante. Ele muda totalmente sua atitude quando ouve a voz materna, pára de chorar, de brincar, abandonando sua atitude em função da voz da mãe, é enfim o que lhe dá maior satisfação.

Neste grupo etário o emprego de ruídos pouco intensos oferece respostas mais positivas A criança tende a responder, procurando a fonte sonora, quando em torno de 3 a 6 meses, mas não se interessa quando o mesmo é repetido muitas vezes. Os sons relacionados com a alimentação são os que mais lhes despertam interesse. Os tons puros são os menos eficientes neste grupo etário. Quando o lactente apresenta uma deficiência auditiva, suas respostas são inconsistentes. Mesmo se o ruído familiar for feito próximo ao seu ouvido, pode não responder se a perda auditiva for profunda ou mostrar vago interesse quando menos intensa. Na maioria das vezes o lactente com deficiência é incapaz de localizar a fonte sonora, mesmo aos sons que lhe são familiares e reage pouco à voz materna. Os testes quando negativos, embora possam ser sugestivos, não nos oferecem um diagnóstico de certeza e devem ser repetidos. É conveniente uma avaliação psicomotora e neurológica para se ter uma idéia mais global da criança.

Testes como a Impedanciometria, o E.R.A. E. Coch. G. tem limitações próprias, e de modo geral não encontram indicações muito precisas nesta fase, podendo no entanto ser realizados, levando-se sempre em conta suas limitações e seu valor relativo. São no entanto testes muito especiais e sofisticados e que não estão à disposição da maioria dos Otorrinolaringologistas, devendo ser deixados para casos muito especiais.

CONCLUSÕES:

Neste grupo erário, os testes de que dispomos podem oferecer uma idéia qualitativa da audição. Resultados negativos não podem ser aceitos, sem a repetição dos testes. Não se pode tirar conclusões mais definitivas, devendo o lactente ser acompanhado em sua evolução e o diagnóstico da deficiência só pode ser estabelecido após uma observação correta e repetida.

É importante a análise comportamental da criança com suspeita de deficiência auditiva. Esta análise feita através de observação clínica, complementada por exames e anarnnese, é que auxiliará na conclusão do diagnóstico diferencial, afasia, surdez periférica, distúrbios emocionais.

CRIANÇAS ENTRE 9 MESES E 3 ANOS DE IDADE

Características do grupo etário

Neste período a criança inicia e quase completa seu desenvolvimento da linguagem. O desenvolvimento neuro motor se completa adquirindo coordenação de seus seus movimentos, resumindo teríamos as seguintes características fundamentais:

1 - Desenvolvimento neuro motor segundo o esperado

2 - Conseguem localizar Ereconhecer a fonte sonora.

3 - Iniciam o desenvolvimento da linguagem, e este segue o padrão esperado.

Suspeita da deficiência auditiva

Teríamos então dois grupos:

1 - No período Peri natal:

a) Choro descontrolado. b) Não tem riso. c) Não adquire linguagem segundo os padrões esperados, dependendo do grau. d) Acentuado uso de gestos: indicativos, representativos, e simbólicos, para exprimirem suas necessidades, e se comunicarem com o meio. e) Uso de pista visual.

2 - Adquirida (pós-lingüística)

a) Regressão da linguagem adquirida. b) Tendência à desatenção. c) Necessidade de sons bem intensos.

EXAME CLÍNICO

Anamnese: A agressividade nessa fase é uma das características muito importantes na criança com deficiência auditiva. Costumam ter bom relacionamento com os companheiros e irmãos, mas agridem na impossibilidade de uma comunicação eficiente ou quando contrariadas. Apresentam um èhoro diferente, sem controle de intensidade. Arrastam os pés quando andam, pois percebem bem as vibrações e sentem-se mais seguras.

Revelam total desinteresse pelos sons (dependendo do grau de deficiência) quando ela é menos acentuada, apresentam um vocabulário obre ou mesmo rudimentar nas mais acentuadas. Iniciam a expressão manual (manualismo) para representar sua vontade ou se comunicar. Neste grupo etário é difícil uma boa anamnese com os pais, pois os mesmos procuram de modo involuntário esconder sua falha no diagnóstico mais precoce deficiência. $ no entanto importante investigar de modo detalhado, todas as possíveis causas pré-natais e pós-natais e entre estas em especial, febres inexplicadas, medicamentos ototóxicos, traumatismo, etc.

O exame O.R.L.; em especial do ouvido deve ser detalhado. A colaboração do Neurologista é indispensável na avaliação do seu desenvolvimento neuro motor, assim como da psicóloga para a análise das funções psicomotoras.

TESTES AUDITIVOS

Neste grupo etário, os testes podem ser empregados com mais facilidade e permitem uma avaliação quantitativa dentro dos limites aceitáveis.

A criança após os 9 meses já localiza com, perfeição a fonte sonora, fato este que foi utilizado por Suzuki para desenvolver seu teste que se presta bem neste grupo etário.

1 - Reflexo de orientação condicionado (SUZUKI e OGIBA)

Em uma sala acústica, são posicionados dois alto falantes de modo estratégico, sendo que em cada alto falante há uma figura (e acende uma luz na figura, dois segundos após a emissão do som). Os alto falantes são dispostos em ângulo de 45°. O condicionamento é feito, procurando-se um som, acima do limiar auditivo da criança e que desperte sua atenção para o aparecimento dos iluminados, sobre o alto falante que emitiu o som. Após estar a criança condicionada, vai-se diminuindo progressivamente a intensidade do som até buscar seu limiar auditivo, que estará em torno daquele, em que ela não mais procura o boneco iluminado, pois não ouviu o som. Acredita-se que o método ofereça a possibilidade de se medir níveis de audição a cerca de 20 dB de seu limiar real. Algumas crianças não ficam sentadas e tendem a ir buscar o boneco, oferecendo alguma dificuldade na realização do teste.

2 - Condicionamento auditivo:

A avaliação da audição pode ser feita através de método de condicionamento auditivo com vários tipos de brinquedos. A criança é condicionada a só brincar após ter ouvido um som. Existem vários jogos de "encaixe" em que num pequeno poste ou haste, são encaixadas peças de brinquedo. A criança só pode encaixar uma peça após ouvir um som. De início apresenta-se sons bem intensos. Após ter conseguido o condicionamento, pode-se ir diminuindo de modo progressivo a intensidade sonora até que a criança, não mova mais o jogo, por não ter ouvido o som. São testes que exigem muita paciência do examinador (e por que não do examinado!!! ). Para que se consiga manter a criança interessada no jogo é conveniente de vez em quando presenteá-las com doces e balas, quando realiza seus movimentos corretamente (seria uma gratificação). Neste tipo de teste, pode-se estudar o limiar auditivo à várias freqüências tanto para via aérea como óssea. É um dos testes mais empregados pelos audiologistas de todo o mundo para este grupo etário. Podemos utilizar um autoroma (para meninos!!!) acoplado ao audiômetro, de tal modo que o carro só se movimenta após o som ter sido emitido pelo audiômetro. Na Santa Casa de São Paulo, estamos empregando este jogo com bons resultados, já há vários anos.

Estes restes podem ser feitos em campo livre, mas se a criança aceitar os fones, será bem melhor pois poderá permitir a apreciação da unilateralidade do problema.

3 - Audiometria com palavras:

O emprego de palavras através de campo ou dos fones, pode também nos dar alguma idéia a respeito da audição na criança. É evidente que não faremos testes com listas de discriminação neste grupo etário. Podemos no entanto avaliar a reação da criança a pequenas ordens dadas, ou através de um alto falante (o examinador fora da sala) ou pelos fones (podendo apreciar as reações às ordens quando dadas a ouvidos diferentes). Devem ser dadas ordens bem simples e de acordo com a idade da criança. Nosso objetivo é naturalmente saber se a criança ouviu ou não a ordem, não importando muito se a entendeu. É assim, a reação da criança, e não o cumprimento da ordem que nos interessa.

É importante a avaliação através dos testes com frases e palavras afim de obtermos dados qualitativos, que completarão os dados quantitativos obtidos no condicionamento infantil. Caso não tenha sido feito o condicionamento para tons puros poderemos obter informações sobre o grau da deficiência auditiva, conversando com a criança em intensidades variadas.

4 - Psicogalvanometria:

É um método objetivo, na avaliação da audição na criança. Foi desenvolvido por Hardy e durante muitos anos foi empregado principalmente nos Estados Unidos. Parece que hoje está abandonado pelas próprias dificuldades que o cercam. Neste teste emprega-se um aparelho gerador de correntes galvânicas através de eletrodos na pele, um outro que mede as deficiências de potencial (na pele), fones e um audiômetro. A passagem de uma corrente galvânica, determina pela secreção das glândulas sudoríparas, um aumento da diferença de potencial entre dois pontos. Condiciona-se o paciente a um estímulo sonoro emitido junto com a corrente galvânica de tal modo que depois de algum tempo ele responde com alteração dos potenciais, apenas ao estímulo sonoro.

Pode-se assim determinar seu limiar auditivo de várias freqüências sonoras.

5 - Impedanciometria:

Este teste adquire neste grupo etário uma importância muito grande. Através da timpanometria e do reflexo do músculo do estribo. pode-se conhecer as condições funcionais do ouvido médio, e segundo trabalhos recentes de Niemeyer e col, de Jerger e Lopes F.°, é possível a determinação dos limiares auditivos, de modo objetivo em pacientes portadores de disacusia nervo-sensorial. Sendo um equipamento de custo não muito alto (o mesmo de um audiômetro) seu emprego deverá em futuro próximo estar situado entre os métodos de rotina na avaliação audiológica dos pacientes em nossos consultórios.

6 - Audiometria de respostas elétricas (E.R.A.):

É outro método objetivo para a avaliação da audição em casos especiais. O método é indicado quando os testes comuns não nos forneceram informações adequadas a respeito da audição na criança.

Ele se baseia no aparecimento de um potencial cortical em resposta a um estímulo súbito. Este potencial, chamado de potencial V, já era conhecido há algum tempo e não é específico ao estímulo sonoro, podendo aparecer como respostas a qualquer estímulo sensorial, feito de modo súbito. Apenas com o advento dos computadores é que foi possível o emprego clínico dos conhecimentos relacionados com a onda V. Construiu-se um aparelho que é constituido de um computador, um eletroencefalógrafo, um audiômetro e um programador. O audiômetro controlado pelo computador fornece uma série de estímulos programados. O potencial colhido no vertex (por um eletrodo) é analisado ao fim de cada programação, sendo fornecida ao examinador, a média das respostas, já registrada. Deste modo pode-se obter a menor resposta a um dado estímulo sonoro, para cada freqüência, pela via aérea e óssea, que representa o nível auditivo do paciente.

Embora possa ser aplicado a qualquer grupa etário de crianças, os resultados, nas crianças menores devem ser analisados com certas precauções, pois um certo número de fatores imponderáveis entra em jogo. É um método muito útil, algumas poucas vezes indispensável, mas não pode se constituir parte de uma rotina audiológica, ficando seu emprego restrito a casos especiais.

7 - Eletrococleografia (E. Coch. G.):

Da mesma maneira que o potencial cortical, a resposta elétrica na janela redonda é resultante de um estímulo sonoro. Esta resposta elétrica tem dois componentes, mais importantes: o microfonismo coclear e o potencial de ação do nervo, que é o utilizado na avaliação objetiva da audição. O potencial é colhido por um eletrodo-agulha que perfurando a membrana timpânica toca o promontório. Embora possa ser colhido em outros locais, parece que no promontório ele é mais fácil de ser obtido com menor interferência de outros potenciais locais. O estímulo sonoro é um "click", no lugar de um tom puro, que pode ser oferecido em campo (por alto falante) ou por fones. É um método ainda em desenvolvimento entre nós, da mesma maneira que o E.R.A., sendo como esta de aplicação apenas em casos especiais.

CONCLUSÕES

A avaliação da audição na criança entre 9 meses e 3 anos, pode ser feita com alguma facilidade, podendo-se obter dados da mais alta importância. Embora as respostas na maioria das vezes tenha apenas valor qualitativo, os testes de condicionamento juntamente com o Suzuki, quando aplicados adequada e corretamente, nos oferecem dados quantitativos da mais alta confiabilidade.

CRIANÇAS COM IDADE ENTRE 5 ANOS E IDADE ESCOLAR

Crianças com idade acima de 5 anos, podem ser examinados quase como adultos. É evidente que existem certas limitações que o bom senso indicará em cada caso especial:

Características:

1 - Seu desenvolvimento neuro motor já está completo.

2 - Linguagem praticamente estabelecida dentro dos padrões esperados, nas áreas: fonológica, semântica e sintática; isto é, conseguem expressar corretamente, suas construções de frases mostram uma concordância adequada, com significado claro.

Suspeitas da deficiência:

1 - Desvios de emissão, conseqüente ao prejuizo da recepção.

2 - Alterações de linguagem, levando a falhas na comunicação oral, que refletem na parte escolar, ou seja, com relação à aquisição da comunicação escrita.

3 - Desatenção.

4 - Preferência por sons intensos.

EXAME CLÍNICO

Anamnese: deve-se pesquisar, a presença de supurações ou doenças do ouvido coma infecções repetidas, que são as que predominam como fator etiológico das deficiências auditivas neste grupo etário. Embora menos freqüentes, as ototoxicoses, ou as perdas auditivas como conseqüências de parotidites, febres inexplicadas, meningites, etc. Muitas vezes a deficiência é unilateral, daí ter passado desapercebida em alguns casos até a idade escolar, quando começam a surgir as dificuldades e a criança não tem condições de superá-las.

Exame Otorrinolaringológico: Adquire aqui também valor especial, não só com relação aos problemas de ouvido, como adenoides, sinusites crônicas e outras afecções nasais e de rinofaringe que podem ser determinantes de otites repetidas ou de otites não supurativas, que por sua vez podem também ser determinadas por problemas de origem alérgica.

O exame neurológico, assim como uma avaliação psicomotora, não podem ser dispensados.

TESTES

Neste grupo etário, quando não há outros problemas, como doenças do sistema nervoso central ou endócrinas, o exame da função auditiva se torna bem mais simples. Podem ser empregados os testes que usamos para adultos com algumas limitações.

1 - Testes de diapasão: Estes podem ser feitos, dando-se destaque especial aos Rinne, Weber, Schwabach e Fred-Frederici.

2 - Audiometria tonal: Também pode ser feita sem maiores problemas. Alguns cuidados devem ser tomados para não cansar as crianças como: testar inicialmente as três freqüências da fala (500, 1.000 e 2.000) e as mesmas por via óssea. Se a criança não cansar e colaborar, então completaremos com as outras freqüências. É necessário um cuidado especial em relação ao mascaramento, para não haver dúvidas ou confusão quanto ao tipo de perda, mista, neuro-sensorial, com condutivas puras, principalmente nos casos unilaterais.

3 - Discriminação auditiva: Deve ser sempre feito, com os cuidados habituais de mascaramento, nos casos de disacusias unilaterais.

As listas empregadas devem conter palavras do vocabulário infantil, onde aparecem todos os fonemas em diferentes posições, grupos consonantais e arquifonemas.

É muito importante para a alfabetização, verificar se a criança discrimina os traços distintivos da língua portuguesa, tais como Modo de Articulação: saber que mola é diferente de mora; faca é diferente de maca, etc.

Ponto de Articulação: tapa é diferente de capa; gabo é diferente de babo; etc. Traço de Sonoridade: pato e bato são diferentes, assim como cola e gola.

Neste último item encontramos um maior número de desvios. Para estes testes são dados pares de palavras para a criança responder se são iguais ou diferentes.

4 - Testes supra limiares: Em sua maioria são difíceis de conseguir resultados, mesmo nesta idade. Talvez em crianças maiores estes testes possam ser realizados.

5 - Impedanciometria: A impedanciometria adquire aqui uma importância, bastante grande, principalmente se levarmos em consideração a grande incidência de otites médias não supurativas (otites médias serosas), neste grupo etário. Trabalhos de Brooks, demonstram que a impedanciometria em escolares, como "screening" tem um valor maior do que a audiometria tonal simples. Muitas vezes a criança tem uma otite média não supurativa em evolução e com audição ainda boa, e a audiometria convencional dará resultados normais. Por outro lado ARMSTRONG revela que certas crianças com otite média serosa, apresentam uma curva do tipo neuro-sensorial (bloqueio simultâneo das duas janelas?) e que regride inteiramente com o tratamento da otite. Como já assinalamos a impedanciometria é um teste simples e deve fazer parte integrante da avaliação audiológica destas crianças.

Através da impedanciometria podemos também obter dados objetivos sobre a presença de recrutamento, e verificar a adaptação, isto é, teríamos condições de detectar lesões cocleares ou retro-cocleares.

6 - Outros testes especiais: Naqueles poucos casos em que os exames anteriores não nos permitiram uma adequada avaliação da função auditiva nestas crianças, estarão indicados testes especiais, objetivos como a E.R.A. e E. Coch. G.

CONCLUSÕES:

a) Na avaliação da criança com deficiência auditiva, devemos dar valor aos dados positivos.

b) Na valorização dos dados obtidos, devemos dar maior importância ao valor hierárquico de cada um deles.

c) A avaliação do deficiente auditivo depende de um trabalho conjunto de: pediatra, fonoaudióloga, neurologista, psicóloga, liderados pelo otorrinolaringologista, cujos dados poderão determinar o grau de perda, isto é, leve, moderada ou severa, profunda, e permitir o melhor aproveitamento dos restos auditivos.

d) Nesta avaliação serão relevantes todos os dados obtidos, sendo a análise do conjunto, o elemento de básica importância para esse diagnóstico, na medida em que um dado isolado poderá nos levar a um diagnóstico falho, mesmo sendo ele obtido através de um exame objetivo, como Impedanciometria, E.R.A. ou E. Coch. G.

Através dos métodos que temos a disposição, atualmente, poderemos atingir o diagnóstico clínico, audiológico e algumas vezes etiológico, da deficiência auditiva.

Leitura recomendada

Boies, L. & al. - "Hearing Loss-problems in diagnosis and treatment", O.R.L. Clinics of North America, vol. 2, n .° 1, 1969.
Davis, H. & Silverman, S. R. - "Hearing and Deafness", Holt, Rinehart & Winston, N. York, 1970.
Henenway, W. G. & al. - "Symposium on Congenital Deafness", O.R.L. Clinics of N. A., vol. 4 n.° 2, 1971.
Hungria, H. - "Manual de Otorrinolaringologia", G. Kogan, 3.° ed. Guanabara, 1973.
Keaster, J. - "The evaluation of hearing in children in Guidelines for clinical auditory evaluation", Am. Acad. Opht. Otolaryng., Rochester, 1972.
Lassman, P. M. - "The measurement of the hearing in children, in: Otolaryngology, vol. 1, pag. 943, Saunders Co, Philadelphia, 1973.
Miller, M. & Polisar, 1. - "Audiological evaluation of the Pediatric Patient", C. C. Thomas, Illinois, 2nd ed. 1971.
Myklebust, H. R. - "Auditory Disorders in - Children", Grune & Stratton, N. York, 1954.
Myktebust, H. R. - "The Psychology of the Deafness", Grune & Stratton, N. York, 1954.
Mangabeira-Albernaz, P. L. - "Electrococleografia-Informe preliminar" Rev. Brasil. O.R.L., 41: 9-14, 1975.
Spinola, R. - "Audiometria cortical" - Rev. Brasil. O.R.L., 36: 31-33, 1970.




Endereço dos autores:
Disciplina de Otorrinolaringologia
Faculdade de Ciências Médicas -
Santa Casa de São Paulo
Rua Cesario Morta Jr., 112, 5.°
01221 - São Paulo.

* Professor Consultor da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo.
** Professor da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo.
Livre Docente em O.R.L. pela Escola Paulista de Medicina.
*** Professora de Audiologia (Auxiliar de Ensino) Escola Paulista de Medicina.

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