Versão Inglês

Ano:  1975  Vol. 41   Ed. 2  - Maio - Agosto - (11º)

Seção: Trabalhos Originais

Páginas: 193 a 201

 

DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL DAS DOENÇAS DO APARELHO VESTIBULAR: UMA SINOPSE

Autor(es): F. C. Z. Mala*
e R. M. Neves Pinto**

Resumo:
Os autores apresentam uma sinopse dos resultados dos principais exames otoneurológicos e sua significação no diagnóstico diferencial das doenças do aparelho vestibular.

O objetivo do presente trabalho é oferecer aos colegas, que se iniciam na oroneurologia e aos otorrinolaringologistas em geral, uma visão panorâmica dos resultados fornecidos pelos principais exames otoneurológicos e sua significação no diagnóstico diferencial das doenças do aparelho vestibular.

O homem vem aperfeiçoando através dos tempos sua habilidade em manter a postura adequada em relação ao meio em que vive. Isto tem sido possível graças ao desenvolvimento de uma espécie de sistema ""feed-back" negativo biológico1.

As informações recebidas por esse sistema ""feed-back" são provenientes de:

1 - Impressões sensoriais originadas do aparelho visual;

2 - Impressões sensoriais originadas do aparelho vestibular o qual faz parte do ouvido interno (labirinto posterior);

3 - Impressões originadas da sensiblidade táctil, visceral e proprioceptiva.

Os impulsos oriundos de todos esses órgãos sensoriais são integrados por uma trama celular no sistema nervoso central (S.N.C.). O processamento central fornece um quadro completo da posição em repouso ou movimento do indivíduo, a cada momento, e é realizado a nível do subconsciente. Os impulsos motores iniciados nesse centro de integração ativam grupos musculares que controlam a postura adequada. As respostas motoras são cordenadas pelo cerebelo e sistema extra-piramidal1.

As funções básicas do aparelho vestibular são:

1 - Detectar as acelerações lineares (utrículo e sáculo);

2 - Detectar as acelerações angulares (canais semi-circulares);

3 - Controlar a musculatura esquelética para a manutenção adequada da postura.

A fim de executar sua tarefa o aparelho vestibular dispõe de:

1 - Um dispositivo periférico (labirinto vestibular) que transduz os estímulos mecânicos produzidos pela aceleração em estímulos nervosos;

2 - De um feixe de fibras nervosas (pars vestibularis do VIII par craniano) que conduz esses estímulos até o sistema nervoso central e representa o primeiro neurônio da via vestibular.

3 - Um conjunto de núcleos vestibulares (superior, inferior, lateral e medial) que servem de "relais" para as diversas vias vestibulares centrais e representam o segundo neurónio da via vestibular.

Nas figuras 1 e 2 temos uma visão de conjunto dessas vias e de suas conexões mais importantes no S.N.C.

Tontura é uma sensação real ou subjetiva de deslocamento do corpo em relação aos objetos circunjacentes ou destes em relação ao corpo. Pode ser causada por doença (estrutural ou funcional) ou por estímulo anormal de qualquer das estruturas neurosensoriais que participam da manutenção do equilíbrio. Isso vale dizer que a tontura poderá ser patológica ou não. São exemplos importantes de tontura não patológica a tontura das alturas e a tontura após movimentos de rotação produzidas, respectivamente, por estímulo não usual do aparelho da visão ou dos canais semicirculares. Todavia, doravante, neste trabalho, sempre que mencionarmos o sintoma tontura estaremos nos referindo à tontura patológica. A tontura rotatória (vertigem) é apanágio de patologia do aparelho vestibular enquanto que a não rotatória poderá ser de origem vestibular, vascular, psíquica, ocular, etc... Nos processos vestibulares periféricos, devido à íntima relação entre labirinto anterior (cóclea) e posterior (lab. vestibular), os sintomas disacusia e acúfenos estão mais das vezes associados aos sintomas tontura e/ou vertigem. A distinção entre tontura ("dizziness") e vertigem ("vertigo") é defendida pelos que seguem a Escola Inglesa. Para outras Escolas esses termos podem ser sinônimos.

Do exame otoneurológico deverá constar o exame das seguintes vias:

1 - Via vestíbulo-espinal: provas de Romberg simples e sensibilizada, prova de Unterberger, prova do desvio do índex;

2 - Via vestíbulo-mesencefálica: nistagmo de posição, espontâneo e provocado (provas calóricas e rotativas);

(FIGURA 1, PÁG. 195)

FIG. 1 - Vias vestibulo-espinal, vestibulo-cerebelar, vestibulo-mesencefalica e vestibulo-mesencefalo-cortical (inspirado em CRANMER) (19)

3 - Via vestíbulo-cerebelar: prova dedo-nariz, prova de movimentos sincrônicos e coordenados das mãos (diadococinesia), prova do desvio do índex, força muscular;

4 - Via vestíbulo-mesencefalo-cortical: vertigem de posição.

Além das provas vestibulares o paciente deverá ser submetido a exame audiométrico liminar e supraliminar, neurológico, radiológico e laboratorial. Podemos dividir as sindromes vestibulares em centrais e periféricas. São consideradas periféricas as lesões que atingem o labirinto vestibular e/ou o primeiro neurônio. São geralmente características das sindromes centrais os seguintes sinais e/ou sintomas:

1 - Tontura não rotatória.

2 - Nistagmo bilateral, vertical, oblíquo ou múltiplo.

CORTEX CEREBRAL

(FIGURA 2, PÁG. 196)

FIG. 2 - Via vestibular eferente: conduz estímulos do cortex cerebral ao cerebelo e daí aos núcleos vestibulares (inspirado em CRANMER) (19)

3 - Nistagmo pervertido.

4 - Nistagmo não fatigável.

5 - Relação desarmônica entre os desvios segmentares e a fase lenta do nistagmo.

As principais características diferenciais entre as diversas sindromes vestibulares periféricas estão resumidas no Quadro I. O Quadro II nos oferce uma sinopse dos traçados eletronistagmográficos (E.N.G.) obtidos por uma bateria de testes e sua significação clínica.

CARACTERÍSTICAS DAS SÍNDROMES VESTIBULARES PERIFÉRICAS

QUADRO 1

QUADRO 2

O Quadro III, finalmente, sumariza as alterações eletronistagmográficas mais encontradiças nas diversas sindromes vestibulares centrais e periféricas. Para não tornarmos esses quadros mais complexos, apenas anotamos as características diferenciais realmente importantes. A classificação dessas sindromes é basicamente a mesma adotada por Albernaz e Ganança2.

Aos interessados em aprofundar os conhecimentos aqui apenas esboçados, com as limitações próprias dos esquemas e generalizações, aconselhamos a leitura dos trabalhos de Henriksson8, Jongkees4, 5, Rubin6, 7, Albernaz - Ganança - Pontes8, Gillingham9, Busis10, Eliachar - Keels - Wolfson11, Page12 Clemis - Becker13, Barber14, Shiffmann - Dancer - Rothballer - Baum15, Frederic16, Burns17 e Maclure18, lém dos anteriormente citados.


QUADRO 3


Summary

The authors present a sinopsis of the results furnished by the chief otoneurological tests and its value in the differential diagnosis of the vestibular apparatus diseases. The papes includes two figures and three tables.

Referências Bibliográficas

1. Battin, R. R.: Vestibulography. Charles C. Thomas, Springfield (USA) 1974.
2. Albernaz, P. L. M. e Ganança, M. M.: Otoneurologia prática. Ars curandi (São Paulo), 5: 42, 1972.
3. Henrik.rton, N. G.: Speed of slow component and duration in caloric nistagmus. Acta Otolaryng. (Stockolm), Supt., 125, 1956.
4. Jongkees, L. B. W.: Cervical vertigo. Laryng. (St. Louis), 82: 6, 1972.
5. Jongkees, L. B. W.: The caloric test and its value in evaluation of the patient with vertigo. Otolaryng. Cl. N. Amer., 6: 73, 1973.
6. Rubin, W.: Clinical electronistagmography. Laryng. (St. Louis), 80: 610, 1970.
7. Rubin, W.: Electronistagrnography and its value in the diagnosis of vertigo. Oto-laryng. Cl. N. Ames., 6: 95, 1973.
8. Albernaz, P. L. M., Ganança. M. M. e Pontes, P. A. L.: Vertigem. Ed. particular, São Paulo, 1969.
9. Gillingham, K. K.: Training the vestibule for aerospace operations: central control of vestibular function. Mil. Med. (USA), 131: 696, 1966.
10. Busis, S. N.: Diagnostic evaluation of the patient presenting with vertigo. Otolaryng. Cl. N. Amer., 6: 3, 1973.
11. Eliachar, I., Keels, E. e Wolfson, R. J.: Basic audiotnetric findings in Meniere's disease. Otolaryng. CI. N. Ames:, 6: 41, 1973.
12. Page, J. M.:Audiologic tests in the diferential diagnosis of vertigo. Otolaryng. Cl. N. Amer., 6: 53, 1973.
13. Clemis, J. D. e Becker, G. W.: Vestibular neuronitis. Otolaryng. CI. N. Amer., 6: 139, 1973.
14. Barbes, H. O.: Positional vertigo and nistagmus. Otolaryng. Cl. N. Amer., 6: 169, 1973.
15. Shiffmann, F., Dances, J., Rothballer, A. B., Barret, A. e Baum, S.: The diagnosis and evaluation of acoustic neuromas. Otolaryng. Cl. N. Amer., 6: 189, 1973.
16. Frederic, M. W.: Central vertigo. Otolaryng. Cl. N. Amer, 6: 267, 1973.
17. Burns, R. A.: Basilar-vertebral artery insufficiency as a cause of vertigo. Otolaryng. Cl. N. Amer., 6: 287, 1973.
17. Maclure, R.: Otoneurologia em Alonso, J. M.: Tratado de Oto-rino-laringologia e broncoesofagologia. Ed. Paz Montalvo (Madrid), 2a. ed., 1946.
19. Cranmer apud Maclure, obra citada.




R. M. NEVES PINTO

Serviço Médico VARIG
Aeroporto Santos Dumont
Rio de janeiro - RJ 20.000

* 2.° Ten. med. aer. Assistente da Cl. O.R.L. (H.C.Aer.).
** Maj. med. aer. Assistente da Cl. O.R.L. (H.C.Aer.). Prof. Livre-docente da Cl. O.R.L. da F.M.P.A. (U.F.R.G.S.).

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