Versão Inglês

Ano:  1975  Vol. 41   Ed. 1  - Janeiro - Abril - ()

Seção: Notas Clínicas

Páginas: 44 a 45

 

RINOSPORIDIOSE NASAL

Autor(es): Raul Renato Guedes de Melo*
Silvia Bolliger**

Resumo:
RINOSPORIDIOSE NASAL, - Registro clínico de um caso de autoctone de rinos poridiose observada em jovem de 15 anos, residente em Campinas, acompanhado de considerações sobre a freqüência, etio-patogenia e tratamento da doença.

Infecção crônica rara, produzida por um fungo Rinosporidium Seeberi - caracterizada pela presença de massa vegetante, polipóide, localizada preferentemente na mucosa nasal do homem e de alguns animais (cavalo, boi, cão, etc.).

Doença considerada rara entre nós. Na Clínica de Otorrinolaringologia do Instituto Penido Burnier foram registrados apenas três casos num total de 191.700 pacientes. A afecção talvez seja pouco conhecida entre os especialistas brasileiros, pois as publicações na literatura indígena são bastantes escassas. Muitas das observações publicadas são casos alienígeos, provenientes quase sempre da Ásia, onde a rinosporidiose é freqüentíssima em alguns países. Em nosso meio, entretanto, já foram observados vários casos autóctones semelhantes ao da observação hoje apresentada.

Do exposto, torna-se evidente que ainda não existem dados concretos que permitam avaliar entre nós a freqüência de rinosporidiose, justificando-se assim a divulgação do 3.° caso da Clínica de Otorrinolaringologia do Instituto Penido Burnier, a seguir relatado.

A. S., 16 anos, branco, brasileiro, solteiro, estudante, residente em Campinas. Ficha n,° 195.889.

Procurou-nos em maio de 1973 com queixa de "carne na narina D" (sic) que dificultava a respiração. O exame mostra pequena tumoração na parte anterior da narina D, pediculada, vermelho escuro, com base de implantação na confluência da cartilagem alar com a triangular. Refere o paciente que, nos períodos de férias, costumava freqüentar a fazenda de seu pai em Mato Grosso, onde tinha contacto com cavalos e tomava banho em lagoas. Em junho de 1973 foi submetido à cirurgia - extração com alça fria de três massas polipóides, seguida de diatermo-coagulação no local da implantação. Exame anátomo patológico n.° 39533 em 28.06.73, Dr. Monteiro Saltes: "material representado por três fragmentos polipóides, castanho avermelhados dos quais o maior mede 10x5x2mm. Grande quantidade de cistos com cápsula própria refringente, espessa, de conteúdo escasso, representado por restos de grinulos de rinosporos: Classificação - Rinosporidiose - 30.06.73".

Deve-se a Seeber, na Argentina, em 1896, os primeiros estudos a respeito, ao observar nos cortes de pólipo nasal de um jovem agricultor, micro-organismos, que seu mestre Wernicke, em 1900, chamou de Coccidium seeberi.

Na índia em 1903, O'Kinealq, desconhecendo os trabalhos de Seeber, isolou o mesmo mico-organismo ao qual, juntamente com Minchin e Fanthann, denominou Rinosporidium kinealy. Em 1912, Seeber reivindicou a prioridade da descoberta e passou a chamá-la de Rínosporidium seeberi, devido a localização freqüente na mucosa nasal.

Foi considerado por muito tempo um protozoário, até que Ashworth" em 1923, após quatro anos de estudos na Índia com material abundante e fresco, provou a natureza vegetal do parasita e o incluiu entre os cogumelos, denominando-o Rinosporidium Seeberi. Até a presente data foi infrutífera toda a tentativa de cultura dos esporos. As experiências mais felizes foram as de Rettie em 1923 e as de Rao, em 1938, embora com resultados duvidosos.

A rinosporidiose é doença cosmopolita, mais freqüente na Ásia (Índia e Ceilão) também encontrada na África, América do Sul (Argentina, Paraguai e Brasil) América do Norte (Estados Unidos) Europa (Itália), não tendo sido descrita na Austrália e Nova Zelândia.

O contágio parece ser exógeno através da poeira e da água. O contágio direto, lembrado por Ashworth, em 1923, de indivíduo para indivíduo, mesmo com contato prolongado, parece pouco provável, embora Mohapatia, de Nova Dely, descreva um caso da doença nos órgãos genitais de um casal. Animais - bovinos, equinos e muares - são hospedeiros dos fungos, considerados animais reservatórios. Os lavradores ao arar a terra seriam contaminados, pela inalação dos esporos, motivo pelo qual se pensou em doença profissional. Admite-se também que estes esporos são parasitas ou saprófitas de determinados peixes susceptíveis de contamir a água onde vivem, transmitindo assim a moléstia aos homens e animais que dela fazem uso.

A sintomatologia depende muito da localização. No nariz produz obstrução lenta e progressiva com sensação de corpo estranho. Rinorréia sem odor fétido com presença de esporos. Epistaxe ao assoar o nariz. Massa vegetante, única ou múltipla, sésil ou pediculada, avermelhada, friável e sangrente. Foram descritas outras localizações da Rinosporidiose - conjuntiva ocular, laringe, faringe, órgãos genitais, pele e conduto auditivo externo. Os outros dois casos da nossa Clínica publicados por Ferreira Filho, Monteiro Salles e Gabriel Parto, localizavam-se no septo. É mais comum no sexo masculino e na faixa etária de 20 a 30 anos.

O diagnóstico é sugerido pela anamnese - doença profissional (agricultores e freqüentadores de lagoas em zona endêmica). É confirmado pela presença de esporos na secreção nasal e pelo exame histopatológico.

O prognóstico é bom quando a excisão for total. A exérese incompleta explicaria os casos publicados de recidiva.

O tratamento ideal é a excisão com alça fria, seguida de diatermo-coagulação na base de implantação. A terapêutica com antimoniais tri e pentavalentes tem sido usada, porém, com resultados pouco animadores. Alguns autores associam-na à cirurgia.




*Otorrinolaringologista do Instituto Penido Burnier - Campinas - SP. Professor de Clínica Otorrinolaringológica da Faculdade de Ciências Médias da Universidade Estadual de Campinas.
** Residente - I. da Clínica de Otorrinolaringológia da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas.

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