Versão Inglês

Ano:  1988  Vol. 54   Ed. 2  - Abril - Junho - ()

Seção: Artigos Originais

Páginas: 54 a 56

 

CISTO DE EPIGLOTE (Relato de um caso)

Autor(es): José Roberto Carvalhaes Fernandes
Gaspare Bosco
Juan Carlos Maiztegui Antunez
Roberto Campos Meireles
Maria Cristina Cursino de Moura
Moacir Tabasnik

Resumo:
Os autores relatam um caso de um paciente portador de um cisto de epiglote que foi removido cirurgicamente. Considerando a raridade com que estes cistos são vistos na clínica diária os autores tecem considerações gerais sobre os cistos laríngeos localizados nesta região.

Introdução

Os tumores benignos e malignos originários da epiglote são raros e pouco se tem escrito sobre estas patologias.

Relataremos um caso de cisto de epiglote que é uma patologia pouco frequente e de diagnóstico precoce difícil, porque apresenta uma evolução lenta com sintómatologia pobre.

O diagnóstico destes tumores é realizado por exame endoscópico de hipofaringe e laringe, às vezes ao acaso, em pacientes com outras patologias laríngeas, a não ser quando se tornam grandes a ponto de apresentarem sensação de bolo na garganta e, mais raramente, disfagia.


Caso clínico

Paciente AGF, masc., 47 anos, branco, natural do Rio de Janeiro, casado, motorista, Reg. 611751, procurou o ambulatório de ORL do HUPE-UERJ, com queixa principal de "caroço na garganta". Relatava história com um ano de evolução de disfagia progressiva para alimentos sólidos, emagrecimento de 7 kg. Neste período, voz com timbre alterado e negava dispnéia.





O paciente estava lúcido, orientado, hipocorado (++/4) e o exame físico geral sem anormalidades.

Na endoscopia indireta de hipofaringe e laringe foi observado grande tumor, com aspecto de cisto, cor clara, brilhante, com finos vasos em sua superfície, obstruindo quase totalmente a hipofaringe e não permitindo a visão das estruturas anatômicas inferiores.

A palpação da região cervical foi negativa para adenomegalias, a laringe estava centrada e a crespitação presente.
A radiografia simples em perfil da região cervical mostrava tumor volumoso de nítido contorno liso, ocupando quase toda hipofaringe. (Figura 1)

Procedeu-se a tratamento cirúrgico que foi realizado por faringotomia supra-hioideana com exérese total do tumor, que media aproximadamente 5 cm de diâmetro. (Figura 2). Não foi possível a realização da cirurgia por via endoscópica devido ao grande volume do tumor.

O pós-operatório evoluiu sem anormalidades e o paciente recebeu alta, assintomático, 7 dias após.

Laudo histopatológico

Macro: nódulo branco acinzentado com 4 cm de diâmetro, mostrando ao corte aspecto cístico único, contendo material pastoso-amarelado.

Micro: parede de cisto com revestimento escamoso. O laudo histopatológico confirmou o diagnóstico de cisto.

Comentários

A presença de tumoração na epiglote não é frequentemente encontrada na clínica diária.

Entre os tumores malignos, que comprometem a epiglote, o mais frequente é o carcinoma de células escamosas (92%). Mais raramente podemos ter carcinoma anaplásico, basoespinocelular, carcinoma de células de transição, fibrossarcomas, lipossarcomas e rabdomiossarcomas.

Segundo levantamento realizado por Harvey e colaboradores a epiglote estava comprometida em 89% dos casos de tumores malignos que envolvem a supraglote. Estes tumores são mais frequentes em homens após os 50 anos de idade e têm como fatores predisponentes o álcool, o fumo, a siderose, a sífilis e as radiações ionizantes. Geralmente são descobertos em fase avançada, podendo até transpor os limites da hipofaringe atingindo regiões contíguas com a base da língua, parede posterior da orofaringe, esôfago cervical, glândula tiróide e planos pré e latero-faríngeos.





A queixa mais frequente é de sensação de bolo na garganta, seguida de alteração do timbre de voz (hot patato speech), halitose, disfagia, emagrecimento, odinofagia e, nestes casos, em aproximadamente 60% já apresentam comprometimento dos nódulos cervicais.

Os tumores benignos são ainda menos frequentes e podemos encontrar comprometendo a epiglote: os fibromas, fibrolipomas, rabdomiomas, leiomiomas, hemangiomas, condromas, adenomas pleomórficos, hamartomas e lesões granulomatosas como a tuberculose e a blastomicose, além dos cistos.

Os cistos da laringe podem ser classificados em sacciformes e canaliculares. Também existe um cisto foraminal da cartilagem tireóide, muito raro, que se origina por saliência da mucosa através de um defeito congênito desta cartilagem no local de passagem venosa. Esta classificação está baseada nas seguintes considerações propostas por DE SANTO em 1970: a) local da laringe; b) tamanho e conteúdo; c) relação com a mucosa laríngea.

Os cistos sacciformes são menos freqüentes que os cistos canaliculares e se devem a uma distensão do sáculo do ventrículo de Morgani. Estes cistos são supraglóticos de diâmetro variável e podem dar origem a uma variedade de lesões que diferem segundo seu tamanho, existência de comunicação com a luz da laringe e a presença ou não de inflamação.

Os cistos sacciformes laterais ou cistos congênitos de laringe costumam ser lesões grandes que abaúlam a falsa corda, prega ariteno-epiglótica e toda porção supraglótica da laringe, obstruindo-a. podem chegar algumas vezes, à membrana tireóidea atravessando-a (atravéz de seu hiato) e se apresentando no pescoço. Geralmente são revestidos de epitélio respiratório. O sintomas mais comum é a rouquidão e nos lactentes observa-sse incapacidade para o choro ao nascer e respiração laboriosa. Não existe comunicação do sáculo com a luz da laringe.

Os cistos sacciforme que apresentam comunicação do sáculo com a luz da laringe recebem a denominação de laringocele.

Os cistos sacciformes que infeccinam produzem as laringopioceles.

Concluindo: os cistos sacciformes pequenos, os sacciformes laterais grandes, também chamados congênitos, as laringoceles e as laringopioceles apresentam uma origem comum.

O tratamento dos cistos saccifornes anteriores costuma ser realizado através da ressecção endoscópica, porém os cistos sacciformes laterais podem requerer faringotomia lateral enntre o osso hióíde e a cartilagem tireóide. Os cistos infectados podem necessitar uma drenagem inicial para controlar a infecção e posteriormente procede-se à excisão definitiva. Nos lactentes pode-se fazer aspiração por punções repetidas para aliviar os sintomas até que a laringe se desenvolva para um procedimento cirúrgico com menores riscos para a laringe. Nos pacientes idosos, com risco cirúrgico elevado, também se pode fazer aspirações repetidas até que o estado geral se estabilize o suficiente para exérese definitiva.

Os cistos canaliculares são os mais comuns e podem ocorrer em iuuualquer região da laringe. A localiação mais comum dos cistos canaliulares é a corda verdadeira, com excessão da sua borda livre que não apresenta glândulas e condutos.

Em geral estes cistos são pequenos com diâmetro inferior a 1 cm e costumam estar na superfície sob a mucosa. Segundo Kleinssasser, os cistos da laringe podem ser encontrados na cordas vocais em 55% dos casos, na faixas ventriculares em 25% e na epiglote em 20%. Os cistos da epiglote, em sua maioria, são únicos e são revestidos por epitélio pavimentoso. Geralmente os cistos da epiglote estão localizados ao lado da linha mediana, na superfície lingual da epiglote e o tratamento é cirúrgico com extirpação, sempre que possível íntegro por endoscopia ou faringotomia em casos de cistos exageradamente volumosos.

Finalizando, os tumores da epiglote são raros, principalmente os benignos, que, de acordo com seu volume, podem ser assintomáticos ou de pobre sintomatologia, levando o paciente, na maioria das vezes, a procurar atendimento médico num estado avançado da doença.

Summary

The authors relate a case of a patient with an epigotc cyst that was surgically removed. Considering that those cysts are rare and not frequently seen in our daily clinic, the authors give general information about that subject.

Referências bibliográficas

1. DAYAL, U.S. - Preepiglottic space. An anatomy study. Arch Otolaryngol. 95, 1972.
2. COATES, H.L. - Carcinoma of the supraglotic larynx. A review of 221 cases. Arch Otolaryngol. 102: 686-89, 1976.
3. COTELINGAN, J.D. - Pleomorphic adenoma of the epigIottis. Arch Otolaryngol. 103: 245-47,1977.
4. KLEINSSASSER, O. - Microlaringoscopia e microcirurgia da laringe. Técnica e achados típicos. São Paulo. Editora Manole. 1977.
5. PAPARELLA, M. E SHUMRICK - Otorrinolaringologia, 28 edição, Editorial Médica Panamericana. S.A. Buenos Aires, 1982.




Endereço dos autores:
Hospital Universitário Pedro Ernesto.
Serviço de Otorrinolaringologia. Av. 28 de Setembro, 87, Vila Isabel, RJ.

Prof. Aux. da Disciplina de ORL da FCM-UERJ
Prof Assistente da Disciplina de ORL da FCM- UERJ
Prof. Titular da Disciplina de ORL da FCM-UERJ
Prof. Aux. da Disciplina de ORL da FCM-UERJ
Ex-residente do Serviço de ORL do HUPE- UERJ
Prof. Aux. de Ensino de ORL do HUPE-UERJ Rio de Janeiro/ RJ

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