Versão Inglês

Ano:  1984  Vol. 50   Ed. 4  - Outubro - Dezembro - ()

Seção: Relato de Casos

Páginas: 33 a 35

 

CÂNCER DA LARINGE EM JOVENS

Autor(es): JOSÉ ANTÓNIO PINTO-1
WALTER PAIVA CRUZ-2
WILSON DE ARAÚJO SILVA-2
MARIA ANGÉLICA AYRES-3
JÚLIO MARCOS PINHEIRO-3

Resumo:
O câncer da laringe em jovens com menos de 20 anos é raro. O presente trabalho tem por objetivo apresentar três casos de carcinoma de laringe em jovens com menos de 20 anos, observados no período de 1972-1983 dentre 469 pacientes portadores de neoplasia maligna da laringe no Serviço de Otorrinolaringologia do Hospital Ibirapuera, assim como a conduta terapêutica e a evolução clínica dos mesmos.

Introdução

A incidência de câncer da laringe no adulto é de 4,801o com relação aos tumores malignos de um modo geral (Fundação Antonio Prudente: 1953-1978) (1). A faixa etária de maior incidência é a 6~ década, com predomínio do sexo masculino em cerca de 90%.

O carcinoma espinocelular (CEC) de cabeça e pescoço em jovens abaixo de 20 anos é incomum, cerca de 4,0%, e sua incidência na laringe nesta faixa etária é estimada em 1,001o (2), havendo um predomínio do sexo masculino em 90010 dos casos (3).

Poucos registros existem na literatura mundial a respeito do carcinoma da laringe em jovens. Aqueles casos registrados na idade pré-puberal geralmente são extensos e têm um prognóstico grave (3,4,5).
Jones e Gabriel (1964) (4), em uma revisão da bibliografia mundial, relacionam 99 casos de CEC de laringe em jovens com menos de 20 anos, sendo que em 20 casos estes jovens tinham menos de 12 anos. O 1° caso data de 1868, tendo sido observado por Rehn.

Gindhart et al. (1980) (3) fazem referência a 54 casos de câncer da laringe em jovens abaixo de 15 anos, numa revisão bibliográfica regional.

Em uma revisão de 33 pacientes abaixo de 35 anos de idade, tratados no M.D.

Anderson Hospital, de 1947 a 1990, com carcinoma da laringe, a taxa de sobrevída foi de 81070. Constatouse que a maioria das lesões estavam localizadas nas cordas vocais e que, quando comparados com carcinomas da laringe em pacientes mais velhos, não demostraram pior comportamento. Além do mais, houve melhor evolução quando comparados com pacientes jovens com CEC de outras partes da cabeça e pecoço (Newrnan e Bayers, 1982) (5).

Até o presente, a etiologia destes CECs em jovens é bastante controversa. Rabbett (6) descreve oito casos de papilomas de laringe em jovens que receberam diferentes métodos terapêuticos (exérese, hormônios, radioterapia), e todos evoluíram com malignização destes papilomas.

Gindhart (1980) (3) afirma que o principal fator predísponente do câncer da laringe em jovens é o tratamento radioterápico na papilomatose juvenil. Segundo este autor, numa série de 101 casos de papiloma juvenil da Mayo Clinic, seis (14010) dos 43 casos tratados com radioterapia evoluíram para CEC da laringe.

Material e métodos

O Serviço de Otorrinolaringologia do Hospital Ibirapuera (SP) registrou, no período de março de 1972 a julho de 1983, um total de 469 pacientes com câncer da laringe, todos com confirmação anatomopatológica. A faixa etária de maior incidência foi a 6! década, com predomínio de 95% no sexo masculino.

Destes 469 pacientes com carcinoma espinocelular da laringe, três pacientes (0.,6%) tinham menos de 20 anos de idade, na época do diagnóstico.

Apresentação dos casos

-QP: rouquidão progressiva há sete anos. Há dois meses com respiração ruidosa e dispnéia aos grandes esforços.
-Laringoscopia direta: lesão vegetante tomando toda a corda vocal direita, desde comissura anterior até próximo ao processo vocal, invadindo ventrículo direito, com motilidade discretamente diminuída.

-Tratamento: submetido a laringectomia parcial frontolateral e reconstrução glótica. -Retornos: -18/07/83-Edema acentuado de neocorda com fenda glótica estreita. Ainda traqueotomizado. 31/08/83-Fenda glótica mais ampla, voz clara pouco rouca. Descanulizado. 10/12/83- Evoluindo bem. Boa respiração e voz.

1° caso

-08/11/72 - A.G., 13 anos, masculino, branco, estudante.
-QP: rouquidão há ± 6 meses, progressiva, tosse seca.
-Laringoscopia direta: lesão ulcerada, vegetante de 1/3 anterior da corda vocal direita, comissura anterior e corda vocal esquerda em seu 1/3 anterior. T2N0M0.
-Após biópsia, confirmando carcinoma espinocelular, perdemos contato com o paciente.

2. caso

-01/04/81-C.N.P., 20 anos, masculino, branco. -QP: rouquidão progressiva há oito meses. -Laringoscopia direta: lesão exofítica de ± 2,0 cm, em corda vocal esquerda com motilidade discretamente diminuída, infiltrando comissura anterior, ventrículo esquerdo e banda ventricular esquerda e discreta diminuição de motilidade. T2N0M0.

-Tratamento: 04/81-Laringectomia parcial frontolateral esquerda, tipo Leroux-Robert com reconstrução glótica, segundo a técnica de Hirano.

-Retornos: 10/11/81; 10/11/82-Paciente com voz rouca, sem aspiração. Junho/ 1983-Neocorda fixa, com boa motilidade da corda vocal oposta, boa voz e respiração.

3. caso

-11/07/83-E.P., 17 anos, pardo, estudante.

Discussão

Poucas referências existem na literatura mundial sobre o câncer da laringe em jovens (3,4,5,7,8,9,10,11). Os casos descritos na fase prépuberal são geralmente os de pior prognóstico (8,9,10,12,13). Por outro lado, o CEC da laringe oferece um prognóstico melhor em relação aos outros cânceres de cabeça e pescoço em jovens. Grande parte dos autores considera a irradiação da papilomatose juvenil como principal causa de malignização na laringe do jovem (3,6). No Serviço de Otorrinolaringologia do Hospital Ibirapuera, entre 469 casos de câncer da laringe, foram encontrados três casos com menos de 20 anos (13, 17 e 20 anos) e, em nenhum deles, havia o antecedente de papilomatose e/ou irradiação. Um caso não foi tratado, por não ter retornado ao nosso Serviço, e os dois outros foram submetidos a cirurgias conservadoras (laringectomia parcial frontolateral), evoluindo bem, sob o ponto de vista funcional e de sobrevida (pacientes descanulizados e com boa voz), apesar do pouco tempo de seguimento.

É importante ao otorrinolaringologista ter em mente a possibilidade de haver um tumor maligno na laringe, mesmo em se tratando de pacientes jovens; na vigência de uma disfonia persistente. O aspecto exofítico vegetante destas lesões pode nos levar ao diagnóstico inicial de papilomatose juvenil, razão pela qual o estudo histopatológico minucioso é obrigatório. Faz-se também necessário sempre um follow-up acurado destes pacientes, a fim de que possamos acompanhar o comportamento destes tumores primários e detectar o surgimento de outros possíveis cânceres primários de vias aéreas e digestivas superiores.

Conclusão

1. A incidência de câncer da laringe em jovens abaixo de 20 anos é rara, porém não deve ser ignorada. No Serviço de Otorrinolaringologia do Hospital Ibirapuera, a incidência deste carcinoma espinocelular foi de 0,6% (469/3), vindo ratificar as estatísticas mundiais.
2. Rouquidão em jovens não pode passar como simples patologia benigna da laringe. Estes pacientes devem ser ruidosamente examinados e, na persistência dos sintomas, o exame microlaringológico deve ser feito, como estudo histológico das amostras colhidas.
3. Apesar de a grande maioria dos autores citar a irradiação da papilomatose da laringe como a principal causa de malignização, em nenhum dos nossos casos verificamos tal antecedente.
4. Os cânceres da laringe em jovens, quando diagnosticados precocemente, podem ser submetidos a tratamento cirúrgico conservador.

Summary

Cancer of the larynx in youngs under 20
years is rare. This paper report three cases (0,6alo) of larynx carcinoma in youngs under 20 years in a total of 469 cases of câncer of the larynx, froco 1972 to 1983 at Hospital Ibirapuera, São Paulo.

Referências

1. BERTELLI, A.P. - Câncer da Laringe, p. 207, 1980.
2. JAFFE, B.F. e JAFFE, N. - Diagnosis and treatment. Head and neck tumors in children. Pediatrics, 51.-731-39, 1973.
3. GINDHART, T.D.; JOHNSTON, WH.; CHISM, S.E. e DEDO, H. - Carcinoma-of the larynx in childhood. Pediatric Laryngeal Cancer, 46.1683-87, 1980.
4. JONES, G. e GABRIEL, E.C. - The incidence of carcinoma of the larynx in persons under twenty years of age The Laryngoscope, 79.251-55, 1969.
5. NEWMAN, R.K. e BAYERS, R.M. - Squamous carcinoma of the larynx in patients under the age of 35 years. Otolaryngol. Head and Neck Surgery, 90.431-33, 1982.
6. RABBET, W.F. - Juvenile laryngèal papilomatosis. The relation of irradiation to malignant degeneration in this disease: Ann. Otol. Rhinol. Laryngol., 74.1149-61, 1965.
7. VERMEULEN, V.R. - Laryngeal carcinoma in the young.The Laryngoscope, 76.1724-27, 1966.
8. NSAMBA, C. e MARROCCO, G. - Carcinoma of the larynx in a child.The Journal of Laryngology and Otology, 93:89-92. 1979.
9. FEARON, B.; BRAMA, I. et al. - Laryngeal carcinoma in the pre-teen patient. The Journal of Otolaryngology, 11:232-34, 1982.
10. CROOKS, J. - Carcinoma of the laryngs in a boy 9 1/2 years old. J. Laryngol. Otol., 67.- 433, 1953. 11. CARNIOL, P.J. e FRIED, M.P. - Head and neck carcinoma in patients under 40 years of age. Ann. OtoL, 91..152-55, 1982.
12. SETH, R.R. et al. - Epidermoid carcinoma of the Iaryngopharynx in a young girl. J. Laryngol. Otol, 92:925-26, 1978.
13. OSSOFF, R.H. - Carcinoma of the larynx in a 11 years old boy with later clinical metastasis. Otolaryngol. Head and Neck Surgery, 88.142-45, 1980.




Endereço dos autores: Hospital Ibirapuera
Av. Rubem Berta, 3350 - Vila Clementino 04074 - São Paulo - SP

1 - Diretor Clínico e Diretor do Centro de Estudos e Pesquisas do Hospital Ibirapuera
2 - Médicos da Unidade Santista de Otorrinolaringologia
3 - Médicos residentes do 1° ano do Hospital Ibirapuera e do Hospital Nossa Senhora de Lourdes

Trabalho apresentado no XXI Congresso Brasileiro de Endoscopia Peroral realizado no penbdo de 3 a 6 de setembro de 1983, São Paulo, e no lX Congresso Brasileiro de Cirurgia de Cabeça e Pescoço, realizado no período de 14 a 17 de setembro de 1983, Guarujá, São Paulo.

Trabalho realizado pelo Centro de Estudos e Pesquisas do Hospital Ibirapuera e pelo Núcleo de Otorrinolaringologia do Hospital Nossa Senhora de Lourdes de São Paulo.

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