Versão Inglês

Ano:  1984  Vol. 50   Ed. 3  - Junho - Setembro - ()

Seção: Artigos Originais

Páginas: 17 a 20

 

NEUROMA BILATERAL DO ACÚSTICO

Autor(es): DANIEL DAMASCENO EUGÊNIO PROCÓPIO -1
ARTHUR OCTAVIO KÓS-2
RENATO CARREIRÃO-3
JOÃO PAULO AZEVEDO-4

Resumo:
Os autores descrevem um caso de neuroma bilateral do VIII par craniano, concomitante com dois meningiomas da fossa posterior sem 'sinais de neurofibromatose. O diagnóstico foi feito através de exame clínico, audiológico, eletronistagmográfico, politomográfico e tomografia computadorizada. O paciente evolui com ataxia, vertigens e hipoacusia, sem sintomas de hipertensão intracraniana; negou-se a ser submetido à intervenção cirúrgica, sendo acompanhado clinicamente pelo Serviço de Otorrinolaringologia do HU da UFRJ.

Introdução

Dentre os tumores do ângulo pontocerebelar, o neuroma do acústico se impõe como o principal causador desta patologia.

O presente trabalho mostra um caso de neuroma bilateral do nervo acústico concomitantemente com dois meningiomas de fossa posterior e média.

A pesquisa bibliográfica segundo levantamento na literatura mundial, dentre os vários autores pesquisados, mostrou ser esta patologia extremamente rara. A maioria dos casos de neuroma do acústico bilaterais são descritos juntamente com neurofibromatose (Doença de Von Recklinghausen) quando associado com os tumores do ângulo ponto; também são relatadas outras neoformações, principalmente nos trajetos de nervos periféricos, levando à presença de neurofibromas cutâneos, juntamente com manchas tipo "café-com-leite" na epiderme.

Os casos de neuroma do acústico bilateral isolados, isto é, sem sintomas de neurofibromatose, são em número menor que aqueles acompanhados de Doença de Von Recklinghausen. Dentro do levantamento feito pelos autores do presente trabalho, em 1.448 casos de neuroma do acústico, operados até 1976, somente 40 casos descritos foram de neuromas bilaterais, sendo que 21 associados a neurofibromatose e 16 casos isolados (sem outros sinais ou sintomas) de neuroma do VIII par bilateral.

Um estudo sobre estes tumores demonstrou que a mortalidade operatória é relativamente baixa, estando em proporção direta com o tamanho e conseqüente localização do tumor, sendo que a via de acesso mais utilizada, de acordo com a bibliografia consultada, foi a da fossa posterior.

A cirurgia de extirpação foi feita, na maioria dos casos, em dois tempos cirúrgicos, com intervalo de seis meses a dois anos.

É tentada a preservação do nervo facial e outros nervos e estruturas circunvizinhas, sendo a cirurgia, entretanto, o mais radical possível, para evitar a recidiva tumoral (que agravaria o prognóstico de uma futura intervenção).

Apresentação do caso

Identificação - A.D.J., do sexo masculino, 46 anos, pardo, natural da Paraiba, servente. Procurou o Hospital Universitário em janeiro de 1981, sendo que, na época, referia: hipoacusia bilateral, mais acentuada no ouvido esquerdo, e com caráter progressivo, queixando-se também de otorréia fétida intermitente no ouvido esquerdo, não fazendo referências a tonturas.

Ao exame clínico otorrinolaringológico: OROFARINGOSCOPIA - Amígdalas encastoadas, com os dentes em regular estado de conservação e sem outras alterações significativas. RINOSCOPIA ANTERIOR - Cornetos inferiores de tamanho e turgência normais, com mucosa rósea; septo e demais áreas da fossa nasal sem anormalidades.

OTOSCOPIA - OE - Perfuração timpânica central, ampla com exsudato fétido no meato acústico externo.

OD - Membrana timpânica com mobilidade e aspecto normais.

Foram solicitados: audiometria, impedanciometria e estudo radiológico da mastóide, que mostraram os seguintes resultados:



Figura 1


Audiometria (Figa) - Disacusia sensorioneural moderada no ouvido direito, com discriminação de 68%. Disacusia mista acentuada no ouvido esquerdo, com grave componente neuro-sensorial e discriminação de 0%.

Radiografias da mastóide (Fíg.2) - Sinais de otite média crônica na mastóide esquerda, com alargamento dos meatos acústicos internos bilateralmente.

Diante do quadro apresentado, foram realizados novos exames:



Figura 2



Figura 3



Audiometria (Fig.3) - Disacusia sensorioneural acentuada no ouvido direito, com baixa discriminação. Disacusia mista acentuada com 0% de discriminação no ouvido esquerdo.

Eletronistagmografia - Hiporreflexia labiríntica bilateralmente.

O paciente evoluiu com piora da hipoacusia, aparecimento de vertigens e marcha atáxica, sendo solicitada a iodocisternografia.



Figura 4



Figura 5



Iodocisternografia (Fig.4 e Fig.5) - "Obliteração dos meatos acústicos internos, com massas lobuladas para as cisternas dó ângulo pontocerebelar. Permitindo o diagnóstico de neuroma do acústico, bilateralmente".

A tomografia computadorizada mostrou (Fig.6): "Presença de dois tumores na fossa posterior, um em cada região dó ângulo pontocerebelar. O maior é à esquerda e mede 3cm de diâmetro. Presença de um tumor extracerebral, hipercaptante de contraste, na fossa média esquerda, estendendo-se superiormente até a fossa anterior e outro ovalar, com as mesmas características do anterior, na foice do cérebro, adjacente aos lobos parietais e crescendo bilateralmente. Ventrículos cerebrais de volume normais. O aspecto sugere: neuroma do acústico bilateral e dois meningeomas supratentoriais".



Figura 6



O paciente foi rastreado para sinais de neurofibromatose, que se mostrou negativa.

Realizado exame neurológico, o mesmo apresentava diminuição do reflexo corneano bilateral; marcha atáxica e Romberg positivo. O exame do fundo de olho foi prejudicado, por ser o enfermo portador de catarata. Indicada a cirurgia, o paciente não quis submeter-se à intervenção, embora cientificado das conseqüências futuras.

Conclusão

O neuroma do acústico é um tumor histologicamente benigno, de crescimento lento, originando-se na bainha de Schwann do nervo, sendo sua sintomatologia devida à compressão de estruturas vizinhas, durante o seu crescimento.

Nos casos de neuroma de ambos os nervos acústicos, a literatura descreve a associação com a neurofibromatose e, em percentagem menor, há relato da neoplasia dupla, sem concomitância com qualquer outra enfermidade.

O processo mórbido é primariamente da área otorrinolaringológica, onde é rastreado com diversos exames complementares, próprios da especialidade.

O tratamento é cirúrgico pelas vias translabirínticas ou pela fossa média, de acordo com as dimensões dos tumores.

Em casos onde a neoplasia extrapola o poro acústico, avançando para o ângulo pontocerebelar, a intervenção é realizada pelo neurocirurgião que utiliza geralmente a via da fossa posterior, sempre tentando preservar o nervo facial e as outras estruturas vizinhas, como os pares cranianos X e X1. É também possível a abordagem conjunta pelo cirurgião otológico e pelo neurocirurgião. De uma maneira geral, a cirurgia de ressecção do schwanoma tem uma baixa mortalidade, mas nos casos de neoplasia bilateral, a extirpação simultânea dos tumores não é indicada, devido ao desequilíbrio da circulação liquórica. A técnica com melhores resultados indica a cirurgia em dois tempos com espaço de seis meses a um ano. Nestes casos, o pós-operatório apresenta mortalidade relativamente baixa e morbidade abrandada pelos métodos de reabilitação, que fazem o paciente ter um padrão de vida bastante razóavel.

Summary

The authors describe one case of bilateral neuroma of the VIII cranial nerve together with two meningiomas ai the posterior fossa with no signs of fibromatosis.

The diagnoses was made by clinical exams, audiologic and electronistagmographic tests, polylomography and CT Scan study.

The patient presented hearing loss vertigo and a taxia without signs of intracranial hypertension.

Referências

1. ALVISI, C. e BORROIv1EI, A. - Neurinome bilateral du nerf acoustique. Minerva Med., 58:1-2, 29-35, 1
2: BENITEZ, G.T.; LOPES RIOS, G. e NOVOA, V. - Bilateral acoustic neuroma. A humn temporal bone report. Arch. Otolaryngol., 86: 25-31, 1967.
3. CAPAROSA, R.J. - Bilateral acoustic neuroma: combined otoneurosurgical approach. 4: 758-771, 1966.
4. GARDNER, W. e TURNER - Bilateral a neurofibromas, further clinic and technolog. hereditary diafness and D. Recklinghausen. Arch. 1VeuroL. 44:76, Chicago. 1940.
5. HITSELBERGER, W. e HAINE, W. - Classification of acoustic neuromas. Arch. Otolaryng., 84: 245, 1966.
6. NARGER, G. - Association of bilateral VIII nerve tumor with meningiomas in Von Recklinghausen's Disease. Laringoscope, 74: 1220, 1964.
7. YOUNG, D.; ELDRIDGE, e GARDNER, W. - Bilateral acoustic neuroma a large Krinped. J. Amer. Med. Assn_ 214: 347. 976. Laringoscope,datas on .




1 - Médicos Residentes do Serviço de Otorrinolaringologia do Hospital Universitário da UFRJ
2 - Professor Adjunto, Chefe do Serviço de Otorrinolaringologia do Hospital Universitário da UFRJ, Coordenador do Curso de Pós-Graduação em Otorrinolaringologia da UFRJ
3 - Mestrando do Curso de Pós-Graduação em Otorrínotaringologia da UFRJ
4 - Professor Assistente da Disciplina de Otorrinotaríngologia da UFRJ, Mestre em ORL da UFRJ

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