Versão Inglês

Ano:  1984  Vol. 50   Ed. 2  - Abril - Junho - ()

Seção: Artigos Originais

Páginas: 09 a 14

 

ABORDAGEM SUBLABIALPARA TRATAMENTO DE AFECÇÕES DAS FOSSAS NASAIS E DOS SEIOS PARANASAIS

Autor(es): LÍDIO GRANATO-1
IVO BUSSOLOTI FILHO-2
CARLOS MARIGO-3

Resumo:
Os autores discutem uma via de abordagem (sublabial), pouco utilizada em nosso meio, para tratamento de tumores e outras afecções do terço médio da face que exigem exposição ampla da estrutura da região. Mostram a técnica cirúrgica, possibilidade de combinação com outras vias e suas vantagens quanto à facilidade e resultado estético.

INTRODUÇÃO

O intuito deste trabalho é divulgar uma técnica de abordagem sublabial das estruturas do andar médio da face.

A grande vantagem desta via é que não há incisões externas, conseqüentemente mais fácil para abrir como para fechar, além de evitar cicatriz visível.

Durante muito tempo utilizamos, para ressecções ampliadas de processos patológicos dos seios paranasais e fossas nasais, a incisão de rinotomia lateral (1) e médio-labial. As vezes tínhamos que fazer uma derivação transversa infra-orbitária.

Estas incisões, além das dificuldades técnicas - normalmente sangram bastante -, traziam o inconveniente de deixar cicatrizes que sempre chamam a atenção no pós-operatório. Há também que se considerar a possibilidade de formação de cicatrizes hipertróficas em alguns pacientes.

TÉCNICA CIRÚRGICA

A técnica consiste nos seguintes passos: para possibilitar uma boa exposição dos seios da face, faz-se uma incisão ampla sublabial. A seguir utilizam-se incisões próprias de rinoplastia, isto é, basicamente as intercartilaginosas nos vestíbulos nasais e transfixante do septo. Tem-se assim possibilidade de bom descolamento da pele de toda a região dorso-nasal.

Eleva-se o perïósteo das paredes anteriores dos dois seios maxilares, a partir da incisão sublabial. Fazendo-se uma incisão mais ou menos circular no bordo do seio piriforme, pode-se chegar até o rebotdo orbitário inferior e ossos próprios do nariz, expondo-se assim todo o andar médio da face. (Figs. 1, 2 e 3).



Figura 1 - Incisão Intercartilaginosa.



Figura 2 - Incisão Transfixante do septo.



Figura 3 - Elevação do lábio superior a partir da incisão sublabial.



Por esta abordagem podemos trabalhar em todas as patologias que acometem o septo com boa exposição. Por exemplo, na ressecção de tumores mistos (adenomas pleomorfos) do septo, condromas, hemangiomas, displasias fibrosas etc. e também no tratamento das teleangectasias hereditárias com a técnica da dermoseptoplastia.

Para tratamento das patologias sinusais, principalmente tumores, podemos com boa visibilidade efetuar uma frontoesfeno-etmoidectomia transmaxilar.

Ainda há possibilidade de se explorar, por esta via, a rinofaringe. Neste caso removemos as paredes anterior e posterior do seio maxilar e a parede medial. Desta forma a fossa pterigo-palatina e a nasofaringe ficam bem expostas. Há até condições de ligadura da artéria maxilar interna, utilizando-se esta abertura do seio maxilar ou mesmo por trás do seio, sem abri-lo.

As patologias da rinofaringe, tais como cistos e tumores, e destes principalmente os angiofibromas, podem ser abordadas por esta via.

No caso do angiofibroma juvenil, que freqüentemente se fixa na rinofaringe e regiões vizinhas como fossa nasal, fossa pterigo-palatina e seios paranasais, preferimos a via transpalatina. Nos últimos tempos operamos três casos, associando a via sublabial à transpalatina, com ótima exposição do tumor.

A abordagem pela via sublabial, como foi descrita, tem sido usada ainda para tratamento de patologias da região infratemporal e zigomática, desde que se tracione bem o lábio superior, fazendo uso de retratores.

Segundo Allen e Siegel (2), (1981) esta técnica tem sido usada há mais de 20 anos, porém não tem sido referida na literatura. Passamos a utilizá-la depois de termos tomado conhecimento através do trabalho destes autores.

APRESENTAÇÃO DE CASOS CIRÚRGICOS

J.M.S. - 50 anos, fem., branca, proc. Recife (PE). QD - Há um ano obstrução nasal progressiva. HMA - Refere a paciente que há um ano iniciou obstrução nasal progressiva à direita. Há seis meses foi operada para remoção de "carne esponjosa" nesta fossa nasal. A paciente não experimentou melhora alguma com a cirurgia. Nega emagrecimento ou qualquer outro sintoma.



Figura 4 - Massa tumoral ocupando o seio etmoidal D. e prolongando-se para a fossa nasal correspondente. Velamento dos seios maxilar e etmoidat E.



Ex. O.R.L. - Presença de massa tumoral com superfície lisa, multilobulada, esbranquiçada e brilhante na fossa nasal direita.

Após retração tivemos a impressão de que a massa era proveniente do seio etmoidal e ocupava quase que inteiramente a fossa nasal direita.

Rinoscopia posterior - massa tumoral com superfície rugosa fazendo saliência na rinofaringe.

Ex. subsidiário - tomografia computadorizada. Massa tumoral ocupando seio etmoidal direito e com prolongamento para fossa nasal correspondente. O seio maxilar direito estava com mucosa espessa na sua porção inferior.

Os seios etmoidal e maxilar esquerdo apresentavam-se com grande velamento (Fig. 4).

Com a hipótese de tumor benigno de natureza fibro-epitelial ou papiloma invertido, foi indicada a cirurgia com abordagem sublabial.

A cirurgia consistiu basicamente numa fronto-esfenoetmoidectomia D. Tratava-se de massa friável, porém com presença de um fragmento maior de superfície irregular, que foi retirado pela rinofaringe (Figs. 5, 6 e 7).

Completando o tratamento cirúrgico foi feito uma sinusectomia pela técnica de Em-iro de Lima no lado E. Tratava-se de uma sinusite hiperplástica.

Resultado histológico - papiloma invertido com presença de carcinoma de células transicionais in situ (Figs. 8 e 9).

Pós-operatório - Muito bom, não só sob o ponto de vista funcional como estético (Fig. 10).

E.P.S. - 17 anos, branco, natural do Cabo - África do Sul.

QD - obstrução nasal há dois anos.

HMA - Há três anos o paciente começou a apresentar dificuldades para respirar pelas narinas, que se foi agravando progressivamente, e há dois anos com obstrução nasal total, perda do olfato e voz anasalada.



Figura S - Exposição da massa tumoral. A pinça está posicionada entre o septo e o tumor.



Figura 6 - Após ressecção do tumor, antro maxilar aberto e ainda pode-se ver o septo nasal e as conchas inferiores.



Figura 7 - Peça cirúrgica: tumor e mucosa hiperplástica dos seios paranasais do lado esquerdo.



Também refere hemorragias freqüentes há ± seis meses, tendo sido internado uma vez em virtude de grande sangramento.

Ex. O.R.L. - Boca - com palato mole abaulado e empurrado para frente por massa tumoral que mostrava seu bordo livre ao nível da orofaringe (Fig. 11).



Figura 8 - Corte histológico - visão panorâmica, mostrando áreas de ' papitoma invertido.



Figura 9 - Zona de transição entre tecido displásico e carcinoma "in situ ".



Figura 10 - Aspecto da face no 7° dia de pós-operatório.



Rinoscopia posterior - Massa tumoral que preenchia inteiramente a rinofaringe, com superfície lisa, cor rósea e com pontos de ulceração discretos na sua superfície inferior (Fig. 12).

Rinoscopia anterior - Desvio de septo para a esquerda. Secreção mucosa nos assoalhos e massa tumoral ocupando um terço posterior de ambas as fossas nasais.

Ouvidos - ndn.

Ex. subsidiários - Exame,radiológico revelou: Rebaixamento do palato duro. Tumor invadia o esfenóide pela direita, rompendo o assoalho do seio. Opacidade total das fossas nasais e do antro maxilar D., tendo desaparecido a parte óssea entre esta cavidade e a fossa nasal. O comprometimento do seio etmoidal posterior é bem menor e não há sinais de invasão da órbita (Figs. 13 e 14).

Evolução - Enquanto o paciente aguardava cirurgia, apresentou grande hemorragia, obrigando-nos a interná-lo de urgência. Recebeu 1.000 ml de sangue total para reposição, pois estava bastante anêmico.

Com a hipótese diagnóstica de angiofibroma juvenil, ele recebeu vinte ampolas de Progynon-B no pré-operatório.

Achado cirúrgico - Via: transpalatina f sublabial (Fig. 15).

Havia erosão do palato duro. O tumor invadia o seio maxilar D., destruindo sua parede medial, originário da fossa nasal correspondente.

Aderia na região coanal D. junto do septo, empurrando-o bastante para o lado oposto. Também invasão da fossa pterigo-palatina e parte do seio esfenoidal D.



Figura 11 - Grande abaulamento de pálato mole.



A aderência maior do tumor era na parede posterior da rinofaringe, onde se confundia com a fáscia pré-vertebral.



Figura 12 - Massa tumoral que preenchia toda rinofaringe.



Figura 13 - Opacidade total e alargamento das fossas nasais com invasão do seio etmoidal e fossa pterigo-palatina esquerda.



O tumor estava torcido para acomodar-se na rinofaringe (Fig. 16).

Resultado anátomo-patológico: angiofibroma.

COMENTÁRIOS

Esta técnica se aplica muito bem a casos de papiloma invertido, como aconteceu com o relatado. A exposição é muito ampla, podendo evidenciar o tumor antes de manipulá-lo.

Também casos de outras neoplasias malignas ainda carcinomas. O nosso paciente reunia as duas patologias limitadas podem ser tratadas por esta via, como comprovadas histologicamente.



Figura 14 - Tumor ocupando toda a rinofaringe.



Figura 15 - Abordagem sublabial e transpalatina.



Figura 16 - Tumor retorcido para acomodar-se na rinofaringe.



Esta via de acesso dá ainda possibilidade de associação com outras abordagens. No caso do angiofibroma, há necessidade desta exposição mais ampla, em virtude de tratar-se de um tumor séssil com fixação muito firme no rinofaringe e estruturas próximas. Além disso, é grande a sua vascularização, dificultando a remoção, se o acesso for limitado.

Utilizamos então além da sublabial a via transpalatina. Para efetuarmos esta última, fazemos uma incisão tipo Ruddy, porém modificada, avançando mais anteriormente no palato duro e tendo o cuidado de manter as palatinas fora do retalho (Fig. 18).

Freqüentemente o angiofibroma invade, além da rinofaringe, as fossas nasais, seios paranasais e fossa pterìgo-palatina. Em função disso é necessário remoção das paredes anterior, posterior e medial do seio maxilar, para atingirmos se necessário os demais seios da face, rinofaringe e fossa nasal.

A combinação destas vias, ou seja, sublabial, transpalatina e transmaxilar, dá uma exposição magnífica e ideal para os angiofibromas muito invasivos.

Sugerimos a via sublabial em substituição àquelas de abordagem através da pele, para tumores e outras afecções do terço médio da face, por apresentar vantagens quanto à facilidade técnica e ao indiscutível aspecto estético.



Figura 17 - Pequeno aumento de neoplasia mostrando abundante tecido fibroso em meio ao qual há vasos de diferentes calibres.



Figura 18 - Abordagem transpalatina: incisão de Ruddy modificada.



SUMMARY

The authors reported a sub-labial aproach that is not too much used by the E.N. T. in the threatrnent of third middle of the face that needs the total exposition of the structure in the area.

They show the surgical techinic and the possibilities to combine with others approaches and their advantages for the facilities and to the stetic result.

AGRADECIMENTOS:

Sr. Eugênio Macário, Sr. José Gomes Barbosa, Sra. Rosemary Silva M. Ribeiro e Denise Ap. Sima Alves, pela documentação fotográfica.

BIBLIOGRAFIA

1. MONTGOMERY, W.W. - Surgery of the Upper Respiratory System, 1971.
2. ALLEN, G.E. e SIEGEL, G.J. - The sub-labial approach for extensive nasal and sinus resection. 1981. vol. 1, pág. 306 - Lea & Febiger, Philadelphia, Laryng. 91: Oct.




Endereço para correspondência: DR. LÍDIO GRANATO
Rua Tabapuã, 1341 apto 92 Itaim-Bibi - 04533 - São Pauto - SP.

Professor Assistente no Dep. de ORL da Fac. de Ciências Médicas da Sta. Casa de São Paulo-1
Instrutor de Ensino do Dep. de ORL da Fac. de Ciências Médicas da Sta. Casa de São Paulo-2
Professor Pleno do Dep. de Patologia da Fac. de Ciências Médicas da Sta. Casa de São Paulo-3

Trabalho realizado no Dep. de ORL da Sta. Casa de São Paulo.

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