Versão Inglês

Ano:  1947  Vol. 15   Ed. 4  - Julho - Agosto - (18º)

Seção: Trabalhos Originais

Páginas: 129 a 137

 

DEMONSTRAÇÃO EXPERIMENTAL DA PRESÊNÇA DO BISMUTO NO TECIDO AMIGDALINO - (Micro-química)

Autor(es): ARISTIDES MONTEIRO

Como se pode verificar pelos resultados dos nossos trabalhos anteriores, não ficou demonstrado a presênça do bismuto no tecido amigdalino, em que pese o número, a espécie e as experimentações que se fizeram, assinadas por nomes consagrados no seu metier, preciosos colaboradores das nossas pesquizas.

Conversando com o Dr.Augusto Zamith sobre os resultados negativos que tinhamos obtido quer com a anatomia patológica, quer com a espectroquímica, aconselhou-nos aquele experimentador recorressemos então a um tipo de pesguiza ultra sensivel para determinação da presênça de corpos inorgânicos, no caso o bisnuito. A reação, - dizia-nos então aquele nosso atencioso colaborador, é tão sensível, que é suficiênte a presênça de quantidade infima até 0,0000005 (meio inicrograma) para que ela seja positiva. - "Si nas suas amigdalas, dizia-nos o Dr. Zamitli, tiver essa quantidade mínima de bismuto, a "reação de toque" do Prof. Feigl será positiva". Ficamos entusiasmados com o que ouviamos e pedimos ao referido coleca nos proporcionasse uma apresentacão ao eminente mestre de Vienna, contratado pelo governo brasileiro, emigrado de sua terra de origem por motivos raciais.

Para as pesquizas terem cunho oficial, fomos apresentados ao Dr. Mario Pinto, diretor do Departamento Nacional de Produção Mineral, nos encaminhou ao PROF. FEIGL e seu assistente Dr. Ignacio Miranda que realizaram as pesquizas e fizeram o relatório-que se vai ler e iremos comentar.

As amostras do material enviado ao exame micro-químico foram de amigdalas aparentemente sãs, provenientes de pessoas com passado de anginas, retiradas cirúrgicamente. Procuramos selecionar os casos, separando aqueles que não tivessem feito uso do bismuto pelo menos dois anos antes. Injetavamos então préviamente antes do ato cirúrgico, preparados, de bismuto intramuscular, num prazo que variou de 8, 10, 12 e 24 horas antes da amigdalectomia, tempo esse rigorosamente observado. Os sais de bismuto empregados nessa série de observações foi sempre o mesmo comum a todas as outras realisadas, para guardarmos uma mesma linha de conduta. Foram injetados preparados soluveis, insoluveis e coloidais contendo os primeiros a dose de 0,02 de iodobismutito de sodio; o segundo 0,03 de carbonato de bismuto e o último 0.008 de bismuto metalico coloidal.

Nessas experiências usamos ainda as amostras 1, 2, 3, 4, 5, 12 e 13 dos que serviram para a terceira série das pesquizas espectro-químicas do Dr. Alvaro Zamith, aliás à conselho dele e para uma posterior comparação com os resultados micro-químicos do Prof. Feigl. E foram bem interessantes como se verá adiante negativas na espectroquímica, positivas na microquímica.

As amostras 1, 2 e 3, correspondem respectivamente às amígdalas retiradas cirúrgicamente com o praso de 24, 12 e 8 horas, tendo se injetado um sal de bismuto soluvel, o iodobismutito de sódio. As outras amostras 4, 5 e 6 foram tratadas de maneira idênticas às anteriores quanto ao praso de injeção, diferenciando-se somente no sal de bismuto empregado, um insoluvel, carbonato de bismuto. As amostras 7, 8, 9 e 10 foram usadas nas mesmas condições de experimentação que as anteriores, intercalando-se porem entre o praso de 12 e 24 horas, um de 16 horas; nesses pacientes usou-se um bismuto coloidal, o mesmo empregado por PESCE'TTI nos seus experimentos sobre a presênça positiva do bismuto no estroma amigdalino, referido no nosso trabalho anterior.

A amostra 11, que serviu de testemunha, foi de uma amigdala de criança de dez anos de idade, da clínica particular e que jamais tomara injeção de bismuto. Fizemos tambem pesquizas com o tempo de 6, 4 e 2 horas depois de injetado o bismuto, amostras 12, 13 e 14. As amostras correspondentes aos números 15 e 16 foram semelhantes às usadas tambem na experimentação anatopatológica, contendo cerca de 10 micra de espessura. Esses pormenores são necessários para melhor compreensão dos resultados finais do trabalho.

Damos na íntegra o relatório FEIGL-MIRANDA

PESQUISA DE BISMUTO EM RESIDUOS E FRAGMENTOS DE AMIDALAS

Remetente - Dr. Aristides Monteiro.

Amostras - de 1 a 16.
"Recebemos 16 amostras, sendo as de n.° 1 a 8 e 12, 13 e 14 um resíduo calcinado, contendo visivel quantidade de carbono, estando as mesmas acondicionadas em papel sobre o qual se lêm os respectivos números; as de Nº. 9, 10 e 11 que estavam acondicionadas em frascos de boca larga contendo alcool e devidamente numeradas, eram amostras de amigdalas em natureza; as de n.° 15 e 16 constavam de laminas de 10 micra de espessura de material ao natural, tambem estas, conservadas em alcool e acondicionadas em frascos de boca larga.

DETERMINAÇÃO DO PESO DAS DIVERSAS AMOSTRAS

Material in-natura

Material húmido

Amostra 9 - 16,1 g.
Amostra 10 - 14,8 g.
Amostra 11 - 15,2 g.

Material seco a 110º C (1 hora)

Amostra 9 - 12,4 g.
Amostra 10 - 11.2 g.
Amostra 11 - 10,8 g.

Resíduo ao rubro (1 hora)

Amostra 10 - 0,1006 g.

Nota - Este residuo contem grande quantidade de carbono.

Após tratamento do residuo acima com ácido nítrico foi o mesmo calcinado até não conter particular de carvão.

Peso do residuo assim obtido - 0,0402 g.

Material em laminas (n. 15 e 16)

Peso aproximado de uma lamina seca a 110ºC

Peso médio - 0,0148 g.

Peso do resíduo ao rubro de uma lamina

Peso médio - 0,0004 g.

TRATAMENTO PRÉVIO DAS AMOSTRAS

Todas as amostras foram tratadas com HN03 concentrado e calcinadas, sofrendo sempre que foi necessário, devido a grande quantidade de carbono, repetidos tratamentos pelo ácido nítrico.

O residuo na maioria dos casos se apresentou branco.

Nas amostras de 1 a 14 o residuo resultando do tratamento acima, foi retomado com cinco gotas de água e uma gota de HCL - 6N, levando-se então uma gota desta mistura á uma placa de Toque, para a respectiva prova de bismuto.

REAÇÃO EMPREGADA

A reação empregada na pesquisa figura no livro "Qualitative Analysis. Tupfelreaktionen", do prof. F. Feigl, usou-se para isso o estanito de sódio. Esta reação chega a ter um limite de percepção de 0,05 de bismuto.

Importante:

Em todos os nossos trabalhos foram empregadas soluções com sensibilidade para 0,5 isto é, 0.0000005g (meio micrograma) de bismuto por gota de solução.

RESULTADO DA ANALISE QUALITATIVA

Amostra 1 - positivo
Amostra 2 - positivo
Amostra 3 - positivo fracamente (* )
Amostra 4 - positivo
Amostra 5 - positivo
Amostra 6 - positivo fracamente (* )
Amostra 7 - positivo
Amostra 8 - positivo
Amostra 9 - positivo
Amostra 10 - positivo fraco (*)
Amostra 11 - negativo
Amostra 12 - negativo
Amostra 13 - negativo
Amostra 14 - negativo

(*) Nossos resultados não permitem avaliar o teor em bismuto, devido à complexidade da reação e em virtude da comparação com soluções padrões é que as amostras 3, 6 e 10 parecem conter menor teor em bismuto.

Outro fator que nos levou a acreditar na menor quantidade de bismuto nestas amostras, foi o tempo de aparecimento dos precipitados, ou melhor, o tempo de reação.

As amostras 12 e 13 foram submetidas a um exame espectrográfico, sendo o resultado o seguinte:

12 - Na, K, Mg, Fe, Si, AI.
13 - Na, K, Mg, Fe, Si, Al.

Este "test" indica pois, a ausência de bismuto; trata-se, aqui, de um dos casos em que a análise espectrografica é menos sensivel que a anásile micro-quimica.

Anexo a este relatório, encontra-se uma chapa espectrografica das amostras e de um sal puro de Bi.

PESQUISA DE BISMUTO NAS AMOSTRAS 15 E 16 (LAMINAS)

Estas amostras sofreram os mesmos tratamentos que as anteriores, sendo algumas delas calcinadas sem tratamento de ácidos; as reações foram feitas diretamente sobre o residuo, sem adição de água e dentro dos micro-cadinhos nos quais foram calcinados.

Resultados:

Amostra n. 15

Com uma lamina aproxte. 10 micra

Micro cadinho n. 1 - negativo
Micro cadinho n. 2 - negativo
Micro cadinho n. 3 - negativo
Micro cadinho n. 4 - negativo
Micro cadinho n. 5 - negativo
(*) Micro cadinho n. 6 - negativo

(*) Amostra sem tratamento de ácidos.

Com duas laminas aproxte. 20 micra

Micro cadinho n. 7 - negativo
Micro cadinho n. 8 - negativo
Micro cadinho n. 9 - negativo

Amostra n. 16

Com uma lamina aproxte. 10 micros

Micro cadinho n. 10 - negativo
Micro cadinho n. 11 - negativo
Micro cadinho n. 12 - negativo
Micro cadinho n. 13 - negativo
Micro cadinho n. 14 - negativo
Micro cadinho n. 15 - negativo
Micro cadinho n. 16 - negativo

Com laminas, aproxte. 20 micros

Micro cadinho n. 1 A - negativo
Micro cadinho n. 2 A - negativo
Micro cadinho n. 3 A - negativa
Micro cadinho n. 4 A - negativo
Material sem tratamento com ácido nítrico.

Conclusão - Nos tecidos de amidalas "in-natura" e no residuo de calcinação foi positiva a identificação do bismuto; nas laminas a quantidade de bismuto existente estava abaixo do limite de identificação para ser percebido."

Rio, 3 de maio de 1943.

(a) F. Feigl - Técnico esp. em pesquisas quimicas.

(a) Luiz Ignacio Miranda - Técnico em quimica analitica.

Comentário: Lendo-se com atenção o relatório acima descrito, verifica-se o rigor das pesquisas realizadas por FEIGL MIRANDA. Começaram por determinar o peso das diversas amostras in-natura, quer no imaterial húmido quer a seco. Passam depois ao resíduo ao rubro. Em seguida fazem a mesma operação com o material enviado em laminas, das usadas para a pesquiza anatomopatológica. - Nessa primeira série de experiencias verifica-se que o peso da amigdala in-natura varia, indo de l4g. a 16. No hospital S. Francisco de Assis fazíamos a mesma coisa, pesavamos as amígdalas logo após a retirada cirúrgica das mesmas, em cerca de 20 amigdalas o peso variou entre 14g até 22g. essas, as grandes amigdalas hipertrofiadas ao máximo, das que dificilmente entram no fiel n.° 3 de Sluder. Estava conforme o nosso, o resultado da pesagem feita por Feigl-Miranda.

Quando se estuda a parte do relatório que diz respeito a análise qualitativa, verifica-se cotio ele é interessante nos seus resultados; nota-se num breve relance que nas de; primeiras amostras êle é positivo, demonstrando a regularidade com que a "reação de toque" evidenciou o bismuto. Segundo suas próprias palavras "fracamente positivo" nas amostras 3, 6 e 10, as que correspondiam a pacientes que tomaram injeção 8 horas antes do ato cirúrgico. Isto vem provar que esse tempo decorrido é o limiar do aparecimento do bismuto rio tecido amidalino. Mostraram se nulos os resultados das amigdalas operadas com tempo de 6, 4 e 2 horas após a injeçção de bismuto. Nas amostras 15 e 16 que representavam cortes histológicos dos usados para os preparados histopatológicos, montados entre lamina e laminula, não se evidenciou tambem o bismuto, mesmo quando se fez a "reação de toque"' coro dois dos "cortes", somando 20 micra.

Si compararmos o resultado que obtivemos com a microquímica, ao anatomopatológico de PESCETTI e ao clínico observado por nós e a grande maioria dos pesquisadores que experimentaram o nosso método de tratamento, veremos que ele é concordante em toda a linha. Poucas vezes se verá relação tão estreita entre a experimentação clinica e a de laboratório.

Nos nossos primitivos trabalhos (1) diziamos que os resultados clínicos positivos apareciam após b a 8 horas após a injeção, quando os benefícios do novo tratamento começavam a se fazer sentir. Observando-se a tabela FEIGL-MIRANDA verifica-se que desde o tempo de oito horas após a injeção de bismuto (amostras ris. 3, h e 10) já se mostrava a reação positiva fracamente. Nas outras amostras, correspondentes a 12 e 24 horas, então a reação era francamente positiva, correspondente à observação clínica de ser nesse praso verificado a melhoria e, às vezes a cura da angina aguda submetida ao tratamento bismútico. Excepção antes desse tempo, entre outros poucos, é o caso citado por NEURNBERG (2'), cuja doente 4 horas após a injeção já se tinha beneficiado com o tratamento.

Na tabela PESCETTI (3), a 3.ª e 4.ª observação correspondendo à amigdalectomia após 8-9 horas da injeção é positiva (+) sendo 20 e 24 horas após observado o máximo de presença do bismuto com a notação de tres cruzes (+++). Temos de fazer certa reserva quanto as conclusões do trabalho de Pescetti, pois que repetimos seus experimentos sem resultados: porém não podemos deixar de cita-lo comparativamente com os outros processos; ou o autor italiano ou nós cometemos erro de técnica em que se concluiu de maneira diversa. A nosso favor milita o resultado da "reação de toque" feita em preparados idênticas aos usados por Pescetti no seu trabalho, preparados esses cortados no microtomo com 10 e 20 micra e nos quais não se conseguiu evidenciar, a presença do bismuto. Não se contentou o Dr. Miranda, o precioso colaborador do Prof. Feigl, em fazer a reaçção somente com uma "lamina" de corte histológico, fez mais, juntou 2, ao todo 20 micra, e o, resultado foi sempre o mesmo: negativo para as laminas.

Devemos salientar que a "reação de toque" do PROF. FEIGL é sensibilissima, conforme reais adiante ficou dito, sendo de notar que as cinco primeiras amostras de n.° 1 a 5 foram largamente utilisadas na espectroquímica e cerca de uni terço foi levado para a microquímica onde se verificou a presença do bismuto.

Depois de verificarmos experimentalmente que a presença do bismuto nas amígdalas operadas e injetadas previamente, aparecem nas oito horas seguintes, acentuando-se nas subsequentes e sabendo-se por consenso unânime dos autores que usaram o tratamento, que as melhoras e em regra a cura dos pacientes, sobrevem exatamente depois désse praso, deve-se presupor que existe íntima ligação biológica entre o aparecimento da reação positiva (oito horas) e as melhoras observadas nos doentes. A elaboração da antiestreptofibrinolisina no seu climax, que é resportsavel a nosso ver (2) pela rapidez da cura da angina aguda, ficaria relacionada estreitamente com a presença do bismuto no tecido amigdalino, ligada ao fator tempo de presença na "reação de toque".

Foi principalmente nas 12 e 24 horas após a injeção de Bique o relatório FEIGL-MIRANDA acentuou a presença do bismuto nas suas reações, este fato experimental coincide com observado na clínica por atais de meia centena de autores, de ser justamente nesse praso que se fazem sentir atais os benefícios da terapêutica bismútica.

Conclusões

1) O bismuto foi evidenciado no tecido amigdalino pela " reação de toque" de Feigl

2) O aparecimento da reação positiva (tempo de oito horas) coincide cote a melhora clínica obtida pelos doentes -submetidos ao tratamento bismútico.

3) Ha pois uma concordância flagrante entre o observado na microquímica e na observação clínica.

BIBLIOGRAFIA

1) MONTEIRO A. - O bismuto na terapêutica das anginas agudas não específicas. O Hospital. Z. 119. 1934.
2) MONTEIRO A. - Da ação do bismuto nas anginas agudas contribuição clínica e experimental. Ed. Jornal Comércio. Rio. 1934.
3) NEURNBERG W. - Über die Wismuttherapie der unspezifischen Angina. Hals-USW Arzt. I. Orig. 27.284. 1936.
4) PESCETTI V. - La bismutoterapia nelle tonsillite acute. Dimonstrazioni sperimentable della rapida invazione dei tessuti tonsillari da parte dei sali bismutici. Arch. Italiano Otol. 51.607. 1939.

- Monteiro, Aristides - Demonstração experimental da presença do bismuto no tecido amigdaliano. (Espectroquimica) (I) - Rev. Brasil. de O. R. L. XIV: 371-378, Set-Out., 1946.
- Monteiro, Aristides - Demonstração experimental da presença do bismuto no tecido amigdaliano. (Anatomia Patologica) (II) - Rev. Brasil. de O. R. L. XIV: 445-448, Nov-Dez., 1946.

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