Versão Inglês

Ano:  1947  Vol. 15   Ed. 1  - Janeiro - Fevereiro - ()

Seção: Casos Clínicos

Páginas: 35 a 38

 

CASOS CLINICOS

Autor(es): ARISTIDES MONTEIRO

1.°) TRATAMENTO DA OZENA PELA PENICILINA

Primeiros resultados

Senhora, antiga cliente nossa, com a filha moça de 17 anos, sofrendo de ozena desde três anos de idade, conhecendo os resultados esplendidos conseguidos por nós com a pencilina no caso de trombo-flebite do seio cavernoso, resolveu fazer o mesmo tratamento na filha, procurando-nos para isso. Relutamos, ela insistiu, acedemos, nada porém prometendo, pois não tinhamos experiência alguma, nem lida, nem vivida.

Durante uma semana a moça tomou 320.000 unidades diárias, ou sejam 40.000 cada três horas; por fim verificamos que o olfato que ela nunca tivera, voltara; a sua alegria era manifesta; e a secreção que era fétida, a ponto de se isolar durante as refeições dos outros irmãos, diminuira, desaparecera o máo cheiro por completo. Não se modificara porém a atrofia da cavidade nasal, e as crostas mais finas ao serem retiradas, mostravam a mucosa nasal hiperemiada, em certos pontos, contrastando com a côr palida habitual. Três mêses após, ainda era a mesma a situação da paciente. Dispensara a lavagem nasal diária, ocorrência que a aborrecia bastante. Clinica e socialmente resultado bastante apreciavel.

Repetimos o tratamento em mais dois doentes, um de clínica particular outro hospitalar. Aquele com penicilina americana (Squibb) este com a do Instituto Oswaldo Cruz. Os resultados não foram idênticos. O olfato e o máo cheiro muito pouco influenciados. Pudemos rever ha dias o de clínica particular, estava no mesmo.

São sómente três casos, mas são observações que são dadas á lume sem pretenções definitivas, a esperarem maior tempo de verificação para podermos concluir. O fim da publicação delas é simplesmente chamar a atenção dos colegas para esta nova tentativa terapêutica para uma molestia que até agora tem zombado de todo o tratamento conhecido.

2.°) DIFTERIA RECIDIVANTE DO OUVIDO EXTERNO

Duas observações sôbre esta afecção uma delas recidivante, é o assunto do nosso comunicado a essa casa. A primeira, tratava-se de senhora de colega nosso, técnico em laboratório, se queixava de segregar-lhe o ouvido ha cerca de um ano, rebelde a todo tratamento. Ao exame verificamos o conduto auditivo cheio de secreção mucopurulenta. Feita a limpesa do mesmo, notamos o conduto auditivo e parte da membrana do timpano revestida por uma falsa membrana rebelde a tentativa de retirá-la, vindo o algodão do estilete tinto de sangue. Desconfiamos do caso, colhemos o material enviando ao seu marido o esfregaço. A cultura revelou o corynbacteriae diphteriae (Fluegge). Instituimos o tratamento pelo sôro antidiftérico intramuscular, injetavel, dose 20.000 unidades única, e instilações no ouvido com um sal de prata. Em 48 horas modificava-se o aspecto do ouvido. Quasi limpo, secreção discreta na parede inferior do conduto em relação com o timpano. Dois dias após, nada mais se verificava, dando-se alta à paciente, que ficou em observação mensal até cerca de um ano sem acusar nada de maior.

O segundo caso mais interessante: cliente antigo portador duma eczema crônica, com surtos agudos durante os quais visitava nosso consultório. Duma feita, queixando-se de dores mais acentuadas que as habituais e secreção sôro-sanguinolenta, examinamo-lo e verificamos que o timpano estava edemaciado, sangrando ao mais leve contato com o algodão do estilete, com uma falsa membrana cobrindo-o em partes. Colhemos o material, enviando ao Dr. Mario Santos, do Instituto Oswaldo Cruz, que evidenciou em exame direto, granulações metacromáticas em bacilos curtos bastantes suspeitos para o primeiro exame bacterioscópico (método G. Lacorte). A cultura dois dias após, revelou no meio do hôfler pureza de bacilos completa. Injetamos 30.000 unidades de sôro antidiftérico, dessensibilisando o doente por ter sido anteriormente injetado com outro sôro. Curou-se. Mêses após novamente com secreção purulenta pelo conduto, com falsa membrana e secreção sôro-sanguinolenta. Colhe-se novamente o material, sendo positivo o resultado para difteria em cultura. Desconfiando que se tratava de simples portador, fez o Dr. Mario Santos o "test" de virulência na cobaia, sendo positivo. Curativos e tratamento locais. Desaparecimento da secreção, cura aparente. Mêses após sente o ouvido "cheio". Volta. Novo exame: secreção abundante, tímpano sangrando, edemaciado. Falsas membranas. Novo exame bacteriológico: resultado positivo para bacilos de Klebs-Löfler, tanto no esfregaço como na cultura. O doente recusa-se repetir outra dose de sôro. Desaparece. Procura-nos depois de um mês. Verificamos estar completamente seco o ouvido. O que fizera? Respondeu-nos: "lavamos com sua receita antiga para o eczema, agua boricada, tão sómente". É desconcertante.

Seria facil destruir o bacilo no conduto, bastaria instilarmos ácido fênico a 1% que o mata em 10 minutos ou o sublimado a 1%o em um minuto (G. Lacorte. Bacteriologia. 1940. Rio). Mas da ação do primeiro só viemos a saber depois de procurado pelo paciente; o segundo na dose descrita é contraindicado em instilações no conduto.

Talvez condições especialissímas do doente tenham influido organicamente, ao lado de uma resistência menor do germe para fazê lo desaparecer, pois outra não nos parece a razão desse capricho biológico da natureza nesse caso de difteria recidivante.

3.°) ABCESSO DO LARINGE CURADO PELA PENICILINA

Doente com 40 anos, residente nessa capital procura-nos no consultório dizendo que "gripado ha dias, desde os dois últimos, sentia dificuldade em deglutir", apresentando-se o pescoço "inchado". Temperatura 38,2. Pulso 110. Dificuldade em falar; defesa muscular da região cervico-lateral direita, com empastamento dessa zona. Uma vez por outra dificuldade respiratória. Disfagia intensa que obrigara o doente a usar até barbitúricos. Havia ainda para complicar o caso, a história de um peixe comido dias antes com suspeita de que uma espinha o tivesse picado.

Examinamos o paciente e verificamos um extenso processo inflamatório no laringe, extendendo-se desde a epiglote até a prega gloscepiglótica, fazendo seu maior abaulamento em, plena valecula. Fizemos sentir ao paciente a necessidade de se internar em casa de saúde para debridar o abcesso. Tergiversou, acabando por recusar dizendo espérar até a manhã seguinte a volta de sua mulher, em Petrópolis. Queria, disse-nos, um lenitivo para o seu sofrimento, principalmente para a disfagia, intensissima. Na manhã seguinte decidiria com a esposa o que fazer. Instituimos o tratamento com a penicilina na dose de 50.000 unidades cada duas horas. Sedol. Começou o tratamento ás 6 horas da tarde, disse-nos no dia seguinte ás 10 horas da manhã, que pela madrugada já não sentia quasi mais dores quando deglutia, tendo dormido oito horas a fio. Examinamo-lo e verificamos quasi o completo restabelecimento do, local inflamatório. Admiramo-nos do que viamos. O vermelho intenso da região anteriormente inflamada e o resto de edema da epiglote eram os restos daquilo que viramos na vespera. Apirético. Falando e comendo bem, sentia-se o doente melhor. O empastamento do pescoço quasi desaparecido. Lembrando-nos de um caso semelhante de PERSCH citado em trabalho que escrevemos sobre abcessos do laringe (Brasil-médico, 2, 23. 1938), ainda continuamos com a penicilina na mesma dose até completarmos 24 horas. Depois passamos para o praso de 3 em 3 horas com trinta mil unidades outras 24 horas, realisando aquilo que chamamos "terapêutica de amaciamento dos germes". Quarenta e oito horas depois a laringe do nosso doente estava normal.

Nessa observação foi à penicilina em doses elevadas e injetada com intervalo de tempo menor, que contribuiu para o resultado satisfatório e rápido do caso. Si o doente consentisse na intervenção cirúrgica naquele dia, teria se curado, talvez com o post-operatório mais prolongado e doloroso.

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