Versão Inglês

Ano:  1999  Vol. 65   Ed. 1  - Janeiro - Fevereiro - ()

Seção: Artigos Originais

Páginas: 10 a 17

 

Estudo da Flora Bacteriana e Viral na Otite Média Secretora e Rinofaringe na Infância.

Viral and Bacterial Cultures from the Nasopharynx and Middle Ear in Children with Chronic Otitis with Effusion.

Autor(es): Vera Andiara Rezende*,
Edigar Rezende Almeida **,
Ricardo Ferreira Bento***,
Edison Luíz Durigon **** ,
Viviane Fongaro Botosso***** ,
Divina Queiroz******.

Palavras-chave: otite média com derrame, nasofaringe, bactérias, vírus

Keywords: chronic secretory otitis media, nasopharynx, bacteria, virus

Resumo:
Ainda existe controvérsias em relação à presença ou não de microorganismos na patogênese da otite média secretora crônica (OMSC). Vários estudos têm sido realizados na tentativa de se demonstrar a importância da presença de microorganismos na OMSC. No presente estudo foram analisados os fluídos das orelhas médias de 30 crianças com diagnóstico clínico e timpanométrico de OMSC quanto à presença de bactérias e vírus. Foram encontrados cerca de 33,6% de bactérias e 16,6% de vírus em orelha média; 66,4% de bactérias e 16,6% de vírus em rinofaringe. As bactérias mais comumente encontradas foram as do gênero Streptococcus, seguido pelo Staphylococcus, e o vírus mais freqüente foi o adenovírus seguido pelovírus sincicial respiratório.

Abstract:
The role of bactéria and viruses in the pathogenesis of chronic otitis media with effusion (COME) is unclear. In this study, the authors cultured the nasopharynxx and middle ear of 30 children with clinical diagnosis of COME, confirmed by tympanometry. Cultures of the middle ear effusions were positive for bactéria in 33,6%, and for vir-uses in 16,5%. Nasopharyngeal cultures revealed bactéria in 66,4% of the children, and viruses were isolatedin 16,6%. The bactéria most comnlonly identified were streptococci and staphilococci, and the most common viruses were adenoviruses, followed by respiratory syncitial viruses.

INTRODUÇÃO

A otite média secretora (OMS) é uma doença caracterizada pelo acúmulo de secreção serosa ou mucóide na orelha média, na vigência de uma membrana timpânica íntegra resultando em perda auditiva condutiva'.

É uma doença muito freqüente em crianças com idade inferior a 10 anos, ocorrendo com maior incidência entre os dois e quatro anos de idade².

Os principais sintomas referidos são plenitude auricular, sensação de líquido na orelha, desconforto otológico e diminuição da audição.

A OMS é considerada uma das afecções otológsas mais freqüentes e complexas na prática clínica, desde os tempos remotos3.

Segundo Sunderberg e colaboradores (1981)4, a OMS é uma doença enigmática, e sua etiologia, real incidência e o melhor modo de tratamento têm preocupado otologistas há mais de um século. Embora se trate deuma patologia de indiscutível importância, continua sendo uma doença enigmática na qual sua etiologia, sua real incidência e o melhor tratamento indicado têm desafiado os otologistás por mais de um século.

Atualmente, acredita-se que o processo inflamatório pela presença cie agentes bacterianos ou virais na orelha média teria um importante papel na fisiopatologia da OMS, ocasionando alterações locais no nível da mucosa da orelha média e disfunções no nível de tuba auditiva 5,6.

Várias expressões têm sido utilizadas para a denominação dessa doença, sendo as mais freqüentes: otite média serosa, otite média com efusão e otite média catarral, entre outras.

Essa diversidade na denominação da OMS pode ser devida ao fato de sua etiopatogenia ainda não estar totalmente conhecida.

Nenhum desses termos descreve adequadamente essa doença do ponto de vista etiológico ou patológico, pois as expressões, otite média serosa e secretora implicam na presença de uma verdadeira atividade glandular por parte da mucosa da orelha média, mas isso se dá provavelmente de forma mínima ou está ausente na maioria dos casos, enquanto que as expressões, otite média catarral e otite média com efusão implicam na ocorrência de um processo inflamatório envolvido, o que também nem sempre é comprovado 7.

Utilizamos denominação otite média secretora (OMS) por acreditarmos ser esta a expressão mais abrangente, a melhor aceita na literatura e a mais empregada em nosso Serviço.

Adotamos a classificação da OMS segundo preconiza o comitê americano Ad Hoc para otite média aguda (OMA) é OMS, que classifica a OMA como uma inflamação na membrana timpânica e denomina OMA com efusão quando existe presença de líquido no cavidade da orelha média. Quando a OMA com efusão persiste até três semanas de maneira assintomática, exceto
pela hipoacusia e sensação de líquido na orelha, é denominada OMS aguda; quando esse quadro persiste de três semanas a três meses, é denominada OMS subaguda; e quando o quadro persiste por um período superior a três meses é denominada OMS crônica (OMSC). A OMS pode apresentar períodos de agudização, acompanhada de otalgia, febre -e hiperemia ele membrana timpânica 8.

O diagnóstico da OMS é realizado através dos sintomas da doença e do exame otorrinolaringológico, através da avaliação clínica e audiológica.

Segundo Shaw e colaboradores, (1995) 9, a OMS é a causa mais comum de perda auditiva na infância, afetando cerca de 70% das crianças com idade inferior a sete anos, sendo que, destas, aproximadamente 30% irão apresentar otite média secretora crônica (OMSC).

Com sua incidência centrada em crianças em idade préescolar e escolar, e devido ao fato de os sintomas de OMS muitas vezes passarem despercebidos em crianças mais novas, a perda auditiva causada por essa afecção pode comprometer a aquisição e o desenvolvimento da linguagerrl escrita e falada, acarretando um conseqüente mau aproveitamento escolar e repercussões sociais negativas 10.

Apesar da grande importância da OMS em otologia pediátrica, sua etiopatologia é ainda controversa, sendo que as principais hipóteses diagnosticas propostas são as disfunções e obstruções da tuba auditiva.

Corno a maioria das infecções cio trato respiratório superior na infância são causadas por vírus, é provável que também nas infecções de orelha média eles exerçam um importante 11,12.

Tradicionalmente, acreditava-se que a OMS era estéril, sendo que todos os tratamentos propostos visavam apenas tentar restabelecer a ventilação da orelha média; isso de certa maneira desencorajava estudos microbiológicos da secreção de orelha média nas OMS.

Em nosso meio, alguns estudos bacteriológicos nas secreções da orelha média tem sido realizados 13,14,15,16; porém, nenhum estudo em relação ao papel virai na OMS foi realizado até então, devido possivelmente às dificuldades técnicas implicadas.

Em virtude do exposto, os autores realizaram um estudo em que se analisou a presença de bactérias e vírus na orelha média e rinofaringe na otite média secretora crônica, tentando correlacionar os achados virais e bacterianos de orelha média com a microbiologia encontrada na rinofaringe.


CASUÍSTICA E MÉTODOS

Casuística

Foram estudadas 30 crianças, acompanhadas no ambulatório de Otorrinolaringologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, no período de dezembro de 1994 a dezembro de 1996, que apresentavam diagnóstico de OMSC rebelde ao tratamento clínico e tinham indicação de miringotomia com colocação de tubo de ventilação bilateral, com ou sem indicação de adenoidectomia ou adenoamigdalectomia.

Dessas crianças, 17 eram do sexo masculino e 13 do sexo feminino.

A idade variou de dois a 12 anos, com a média de 4,8 anos.

Como critério de inclusão, os doentes foram selecionados do ponto de vista clínico e audiológico.

Quanto ao critério clínico, considerou-se a otoscopia em que a membrana timpânica se apresentava com perda da semi-transparência, com aumento da vascularização, evidenciando-se ou não nível líquido, com ou sem retraçãol 1,17. Do ponto de vista audiológico, todos os doentes foram submetidos a audiometria tonal limiar e/ou timpanometria, que mostrou hipoacusia do tipo condutiva com gap de pelo menos 20 dB na audiometria tonal e curva impedanciométrica tipo B de Jerger 18,19.

Todas, crianças apresentavam diagnóstico de otite média secretora rebelde ao tratamento clínico há mais de três meses. Para defini-lá como otite média secretora crônica (OMSC), foi utilizada a classificação recomendada pelo comitê Ad Hoc na determinação e classificação da otite média e otite média secretoras 8. Utilizamos o termo secreção para denominar o líquido da orelha média, que, de acordo com o comitê acima mencionado, foi definido como secreção o líquido resultante de uma otite média em que a membrana timpânica se encontra intacta, podendo ocorrer em todo o osso temporal pneumatizado.

Entre as 30 crianças, 25 (80% dos casos) apresentaram secreção tipo mucóide, também conhecida como glue ear, e as cinco restante (16,6%) apresentaram secreção tipo serosa.

Cerca de 50% dos casos (15 crianças) apresentavam uma obstrução nasal de moderada a importante, com quadro de respiração bucal e roncos noturnos; os restantes apresentavam respiração nasal normal ou obstrução nasal eventual (em estados gripais), tendo sido realizada a curetagem da adenóide em 15 casos (50%).

Em seis crianças (20%) foi realizada adenoamigdalectomia.

Foram excluídos todos os casos de malformações anatômicas cranianas, como por exemplo as fissuras palatinas e a síndrome de Down.

O doente foi submetido a anestesia geral e entubação orotraqueal tendo sido realizada assepsia do conduto auditivo externo (CAE) e orelha externa, utilizando-se álcool ethyl ou isopropyl por um minuto; a seguir, realizou-se lavagem do CAE com soro fisiológico (solução de cloreto de sódio a 0,9%) e emoção p, por aspiração, dos resíduos de cerumen e descamações. Realizou-se miringotomia sob visão microscópica binocular, aspiração da secreção através de um coletor estéril (Juhn Tym-Tap, Xomed- Jacksoville, Fla), procedimento este realizado em ambas orelhas.

Após a colocação dos tubos de ventilação, posicionaramse os doentes em "Rose" , colocou-se um abridor de boca ortostático, procedeu-se o afastamento do palato mole, realizando-se a aspiração da secreção da rinofaringe próximo aos óstios faríngeos das tubas auditivas e utilizando-se um coletor estéril como o que foi utilizado para as orelhas.

O material foi conservado em um recipiente isolante térmico contendo gelo, de modo que a temperatura fosse em torno de 4° C por um período máximo de 2 horas, até o seu processamento, que foi realizado no setor de vírologia do Laboratório de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo.

Estudo virológico
No laboratório, em período máximo de quatro horas, uma parte de cada amostra, tanto da orelha, quanto da rinofaringe, foi tratada com 1% de penicilina/estreptomicina (Gibco BRL).

Após 30 minutos a 4°C, as amostras foram separadas em três alíquotas:

(i) Uma parte para inocular em cultura de células.
(ii) Outra parte para a imunofluorescência indireta (Chemicon International, Inc.).

(iii) O restante para armazenar em Freezer a menos 70° C após adição de MEM (Meio Mínimo Essencial EAGLE, modificado com sais de EARLE, com glutamina -Foles Ltda.) acrescido de antibióticos e 2% de soro fetal bovino (Cutilah), volume a volume.

Para cultura de células, foram utilizadas duas linhagens de células: Hep 2 e NCI H292 (carcinoma de laringe e mucoepidermóide, respectivamente)-gentilmente cedidas pelo Dr. Larry Anderson, Division of Viras and Rickettsial Diseases, Centers for Disease Control and Prevention (Atlanta - Ga - USA).

Observou-se o aparecimento de efeito citopático diariamente por um período de 15 dias. Caso positivo, fizeram-se mais duas novas subculturas e identificaram-se mais novas subculturas e o vírus por imunofluorescência (as lâminas foram montadas com glicerina tamponada e lidas em microscópios de imunofluorescência Zeiss com epí-íluminação). Quando não houve aparecimento de efeito citopático, eram feitas mais duas passagens em cultura de células, a fim de confirmar a negatividade.

Com as amostras positivas na triagem, fez-se identificação do vírus através de reação com monoclonais específicos para influenza A e B, parainfluenza 1, 2 e 3, vírus respiratório sincicial e adenovírus.



Figura 1. Distribuição da faixa etária em relação aos 30 doentes portadores de otite média secretora crônica.



Figura 2. Presença de vírus na orelha média.



Figura 3. Presença de vírus na nasofaringe



Figura 4, Presença de bactérias na orelha médica.



Estudo bacteriológico
Realizou-se a semeadura das amostras enviadas, até duas horas após a coleta do material, em agar sangue, onde permaneceram a 37° C por 24 horas. Após esse período, realizou-se a coloração Gram e a bacterioscopia.

A seguir, realizou-se a prova da Catalase para definir o gênero entre Staphylococcus e Streptococcus.

Para definição da espécie, nos casos em que se obteve o gênero Stapbylococcus, realizou-se a prova da DNAse e da plasmocoagulase, e, nos casos em que se obteve o gênero Streptococcus, realizou-se a prova da optoquina e da bacitracina.

Para identificação de bacilos Gram negativos foi utilizada a reação de oxidase utilizando dos meios de cultura Ágar Mac Conkey, Trypitic Soy Ágar e Api 20 E.

RESULTADOS

Em relação ao sexo, 17 eram do sexo masculino (56,67%); e, 13 (43,33%) do sexo feminino.

Quanto à idade, esta variou de 2 a 12 anos, com a média de 4,8 anos (Figura 1).
Em relação aos vírus, identificou-se em orelha média a presença do adenovírus em três doentes (10%) e do vírussincicial respiratório em dois doentes (6,67%), totalizando 16,66% dos casos (Figura 2).

Na rinofaringe houve a identificação do adenovírus em um caso (3,33%), do vírus sincicial respiratório em dois casos (6,67%), e do parainfluenza tipo 1 em um caso (3,33%), e do parainfluenza tipo 11 em mais um caso (3,33%), totalizando 16,6% de presença viral em material colhido da rinofaringe (Figura 3).

Em relação à presença concomitante de vírus em orelha e rinofaringe, houve a ocorrência do vírus sincicial respiratório na orelha e na rinofaringe simultaneamente em um doente; e em outro encontrou-se o adenovírus simultaneamente em orelha e rinofaringe. Não houve coincidência dos achados virológicos em orelha e rinofaringe nos demais casos analisados.

Quanto à presença de bactérias, observou-se um crescimento em orelha média ele 10 casos (33,4%) e de 20 casos (66,6%) em rinofaringe.

As bactérias encontradas, segundo a ordem de freqüência, foram:

Na orelha: Streptococcus pneumoniae (pneumocoeo) em quatro casos (13,33%), Staphylococcus aureus em dois casos (6,67%), Haemophilus influenzaeem dois casos (6,67%), Staphylococcus epidermidis em um caso (3,33%), Moraxella Catarrhalis em um caso (3,33%) (Figura 4).

Na rinofaringe: Streptococcus pneumoniae (pneumococo) em sete casos (23,33%), Staphylococcusaureusem quatro casos (13,33%), Staphylococcus epidermidis em três casos (10%), Haemophilus influenzaeem três casos (10%), Moraxella Catarrhalisem um caso (3,33%) (Figura 5).

Houve crescimento concomitante de bactéria na orelha e na rinofaringe em cinco casos (16,6%).

Em quatro casos (13,3%) houve crescimento de bactéria e vírus simultaneamente em rinofaringe, e em nenhum caso se observou crescimento simultâneo de vírus e bactéria no material analisado de orelha média.

No total, encontramos na orelha cerca de 16,67% de vírus, 33,33% de bactéria e 50% de resultados negativos (Figura 6).

Na rinofaringe, obtivemos cerca de 47% de crescimento apenas de bactérias, 13% bactérias e vírus concomitantemente, 3% apenas de vírus e 37% de resultados negativos (Figura 7)-.



Figura 5. Presença de bactérinas na rinofaringe.



Figura 6. Presença de vírus e bactérias na orelha média.



Figura 7. Presença de vírus e bactérias na nasofaringe.



DISCUSSÃO

O presente estudo foi destinado a verificar a presença ou não de vírus e/ou bactérias na secreção de orelha média nos casos de otite média secretora crônica (OMSC) na infância, bem como tentar estabelecer uma correlacão com os achados da rinofaringe.

A escolha da OMSC, especificamente na infância, devese a grande freqüência com que a mesma ocorre nessa faixa etária

Em relação à faixa etária, nossa casuística variou de dois a 12 anos, com média de idade de 4,8 anos (Figura 1), sendo que, em nossos achados, a maior incidência de OMSC foi em torno de três a cinco anos, o que está de acordo com os achados da maioria dos autores3,15,16,20,21 os quais verificam uma incidência maior dessa doença em crianças abaixo de 10 anos, com uma maior freqüência em torno de dois a cinco anos de idade.

Levando em conta as características da nossa amostra em relação ao sexo, observamos a presença de 20 (58,8%) doentes pertencentes ao sexo masculino; e 14 (48,2%), ao sexo feminino, sendo que, embora não tenha haviciodiferença estatisticamente significativa entre os dois grupos (p>0,05), encontramos uma maior prevalência da OMS, em nossa casuística, no sexo masculino, o que parece concordar com a literatura, que tende a indicar maior freqüência da OMS no sexo masculino 15,16. Acredita-se que possa haver uma tendência à cronificação nos doentes do sexo masculino 22, 23, 24.

Em relação aos vírus, sabe-se que infecções virais ocasionam uma depressão do transporte mucociliar, diminuição na função dos neutrófilos e das células T, além de um edema mucoso, sendo que todas essas alterações poderiam contribuir para a instalação de um quadro de OMS 25,26.

Estudos em animais têm demostrado que a inoculação intranasal com adenovírus e influenza A causam significantes alterações histopatológicas na tuba auditiva, muitas das quais com deliberada obstrução da mesma 6,27.

Em nosso estudo, obtivemos uma positividade de 10% para adenovírus em secreção da orelha média e 6,66% para o vírus sincicial respiratório.

Poucos estudos virológicos foram realizados na OMS, sendo que alguns autores detectaram a presença de vírus em alguns casos de OMA e OMS inicial ou aguda, ou seja, com menos de três semanas de duração, segundo o comitê americano Ad Hoc28,29,30,31 mas não na OMSC.

Yamaguchí e colaboradores12 (1984) acreditam que essa negatividade na OMS possa ser atribuída à presença de anticorpo viral na secreção de orelha média. Em 113 crianças estudadas por esses autores, num total de 128 aspirados, houve culturas negativas para vírus; porém, foi detectada, na secreção de orelha média, lgA secretora antiadenovírus, vírus sincicial respiratório e parainfluenza tipo 11, em 24,22% dos casos.

Shaw e colaboradores9, em 1995, encontraram cerca de 6,8% de adenovírus e 9,9% de vírus sincicial respiratório em secreção da orelha média de 88 crianças com OMS, utilizando a técnica de PCR (polymerase chain reaction) na identificação dos vírus.

Possivelmente, a presença viral na orelha média exerça um papel importante na manutenção do quadro, embora, devido às dificuldades técnicas, poucos estudos tenham sido realizados até o presente momento.

Em relação à rinofaringe, identificamos a presença do adenovírus em um caso (3,33%); do vírus sincicial respiratório, em dois casos (6,66%); do parainfluenza tipo 1, em mais um caso (3,33%); é do parainfluenza tipo 11 em outro caso (3,33%), totalizando 16,6% de presença viral em secreção de rinofaringe. Houve a presença simultânea em orelha e rinofaringe do vírus sincicial respiratório em um caso e do adenovírus em outro caso, o que nos leva a pensar que, possivelmente, a porta de entrada para a orelha média possa ter sido a rinofaringe, mas que a colonização viral da orelha média e da rinofaringe não coexistam de maneira significativa.

Portanto, achados virais na rinofaringe não implicariam na existência do mesmo agente etiolõgico em orelha média nas OMS.

Em relação à presença de bactérias na orelha média nos casos de OMS, vários estudos têm sido realizados em todo o mundo, sendo que a média de positividade varia de 20 a
52%14,32,33,34,35,36.

Já Saffer e colaboradores 16,em m 1995, não detectaram presença de bactérias nos casos de OMS por eles analisados.

O agente etiológico mais freqüentemente encontrado nos estudos europeus e americanos é o o Haemophylus influenzae, seguido do Streptococcus pneumoniae, Staphylococcus aureus e a Moraxella catarrhalis.

No nosso estudo, obtivemos 33,33%, de resultados positivos na secreções de orelha, sendo que o principal agente encontrado foi o Streptococcuspneumoniae (40%), seguido pelos Staphylococcusaureus(20%), Haemophilusinfluenzae, Staphylococcus epidermidis (10%) e a Moraxella Catarrhalis (10%).

Quanto à presença de bactérias na rinofaringe, Tomonaga e colaboradores37, em 1989, encontraram uma positividade de 66,7% em aspirados de 216 crianças com OMS, sendo o Staphylococcus aureus o mais freqüente (25,5%), seguido pelo Streptococcus pneu mo niae (22,8%) e o Haemophylus influenzae(11,2%).

Em nossa amostragem, obtivemos cerca de 66,66% de resultados positivos nas secreções de rinofaringe, sendo o Streptococcus pneumonias o agente mais freqüente (35%), seguido pelo Staphylococcus aureus (20%), Staphylococcus epidermidis (15%), Haemophylus influenzae (1506) e a Moraxella Catarrhalis (5%).

Encontramos a presença do mesmo grupo bacteriano, simultaneamente, na orelha média e na rinofaringe em cerca de quatro doentes, o que eqüivale a 40% dos casos em que houve crescimento bacteriano nas secreções da orelha média.

Ressaltamos a importância de se realizar mais estudos em nosso meio, na tentativa de se identificar e isolar os vírus e bactérias mais freqüentemente envolvidos na etiologia da doença, possibilitando o desenvolvimento de vacinas mais eficientes, permitindo assim a realização de uma prevenção mais efetiva, tanto da otite média aguda quanto, conseqüentemente, da otite média secretora crônica.

Para finalizar, enfatizamos que, embora diversos estudos tenham sido realizados em relação a OMS na infância, muitas questões ainda permanecem sem respostas e pesquisas devem ser realizadas no intuito de que haja um melhor conhecimento da doença e, conseqüentemente, uma abordagem terapêutica mais adequada em relação ao doente.

CONCLUSÃO

Concluímos que a presença de vírus e bactéria na orelha média nas otites secretoras crônicas ocorre com freqüência, podendo ter um papel significativo na-fisiopatologia da doença.

Não houve correlação significante entre a flora viral e bacteriana da orelha médio e rinofaringe, podendo indicar que a OMS apresenta uma fisiopatologia independente da rinofaringe ou que ocorreriam infecções na rinofaringe e orelha média em tempos distintos.

Para finalizar, acreditamos que mais estudos em torno deste assunto devam ser realizados em nosso meio, pois existe uma diferença significativa principalmente no que diz respeito
à flora bacteriana encontrada em nossa população, quando comparada com a flora bacteriana encontrada nos estudos europeus e norte-americanos.


AGRADECIMENTOS

Agradecemos ao Sr. José Maria Lopes e à Sra. Íris Takako, técnicos do Instituto de Ciências Biomédicas 11 da Universidade de São Paulo, pelo suporte técnico na análise bacteriológica do material estudado.

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*Médica Assistente do Hospital das Clínicas da FMUSP e Pós-Graduanda (Doutorado) da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
**Professor Doutor da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
***Professor Livre Docente e Professor Associado da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
****Professor Doutor em Medicina e Chefe do Setor de Virologia do Instituto de Ciências Biomédicas II da Universidade de São Paulo.
*****Mestre em Microbiologia pelo Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo e Doutoranda em Ciências Biomédicas pela Universidade de São Paulo.
****** Mestre em Patologia Tropical pela Universidade Federal de Goiânia e Doutoranda em Ciências Biomédicas pela Universidade de São Paulo.

Trabalho apresentado na XII Reunião da Sociedade Brasileira de Otologia & III Encontro Brasileiro de Trabalhos Científicos em Otorrinolaringologia, Rio de Janeiro, 1997; ato XIII Congresso Nacional e 1 Congresso Nacional Lusófono de Otorrinolaringologia, em 1998, em Coimbra, Portugal.

Suporte: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Endereço para correspondência: Dra. Vera Andiara Rezende - Avenida Angélica, 2473 - 01227-000 São Paulo /SP - Fax: 259-9025. Artigo recebido em 15 de maio de 1998. Artigo aceito em 13 de outubro de 1998.

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