Versão Inglês

Ano:  1986  Vol. 52   Ed. 1  - Janeiro - Março - ()

Seção: Artigos Originais

Páginas: 09 a 12

 

AMILOIDOSE DE LARINGE TRATAMENTO COM "LASER" DE CO2

Autor(es): ESTER M. DE NICOLA -1
LUIZA HAYASHI ENDO -2
GUILHERME WANDERLEY -3

Resumo:
Os autores apresentam um caso de amiloidose de laringe, discutindo a etiopatogenia da doença sob a luz das teorias atuais. Os tratamentos utilizados até então são apresentados e, por fim, mostram o resultado do tratamento com aplicação de raios laser de CO2, que, no caso, foi excelente.

Introdução

A amiloidose de laringe é uma patologia relativamente rara (2, 4, 5, 6, 8, 9, 10, 11); constitui menos de 1% de todos os tumores benignos de laringe. A substância amilóide é semelhante ao amido vegetal, uma vez que se cora em azul quando tratada pelo iodo. O aspecto microscópico é semelhante ao da substância hialina, diferindo desta pelas reações de coloração: cora-se pelo vermelho-congo (a substância amilóide fica vermelho-brilhante), metil violeta e violeta de genciana (1, 3).

A amiloidose laríngea ocorre sob duas formas: tumoral e infiltrativa difusa (6), e sua manifestação depende do local onde a substância é depositada. O diagnóstico é feito pela laringoscopia direta e bíópsia.

Apresentamos um caso de amiloidose de laringe, alguns conceitos atuais da doença e os tratamentos preconizados até a época atual. E relatado o uso do laser de CO2 no presente caso, com ótimo resultado.

Apresentação do caso

M.M.G., 47 anos, sexo masculino, branco, procedente de Mato Grosso do Sul. Data da internação: 08/07/82.

HMA: há dois anos apresentou disfonia repentina. Procurou o médico de sua cidade na ocasião, tendo sido medicado com antiinflamatório e sulfa. Nesta ocasião foram realizados os seguintes exames: RX de tórax, teste cutâneo de Mantoux, exame de sangue e de escarro. Segundo o paciente, todos os exames estavam dentro da normalidade, exceto o exame de escarro, que acusou presença de fungo (não soube referir qual). Tomou sulfa (8 comp./dia) durante oito meses, sem ter tido melhora do quadro. Procurou o Serviço de ORL da UNICAMP, com queixa única de disfonia.

Exame ORL: paciente em ótimo estado geral. Exame de ouvido, nariz e orofaringe - normal.

Laringoscopia indireta: epiglote caída, dificultando o exame. Apenas visualizada a região interaritenóidea com mucosa hipertrofiada e hiperemiada. Proposta laringoscopia direta.

12/07/82 - Laringoscopia direta sob anestesia geral. Visualização de hipertrofia de mucosa da região interaritenóidea, comissura posterior com massa polipóide. Colhido material para exame histopatológico - amiloidose de laringe (Figs. l e,2).

11/08/82 - Microcirurgia de laringe com utilização de raios laser. Primeira sessão - retirada de massa de comissura posterior para novo exame histopatológico e cauterização da área com raios laser. Verificada massa infraglótica. Resultado do exame histopatológico: amiloidose.



Figura 1 - Amiloidose. Material amorfo depositado abaixo doepitélio de revestimento, difusamente, e formando grumos, (setas). HE. 100 X.



Figura 2 - Amiloidose. H.E. 200 X.



Paciente apresentou melhora acentuada da disfonia infraglote estavam com aspecto inteiramente dentro após a primeira aplicação de laser.
da normalidade.

22/09/82 - Segunda sessão de aplicação de raios laser com o objetivo de cauterizar a massa infraglótica .

13/10/82 - Terceira sessão de aplicação de raios laser. Cauterizada a região interaritenóidea que mantinha hipertrofia e hiperemia. A glote e infraglote estavam com aspectos inteiramente dentro da normalidade.

18/10/82 - Paciente recebeu alta em boas condições, com disfonia discreta. Ficará sob controle ambulatorial.

Discussão:

A amiloidose foi descrita pela primeira vez por Rokitansky, em 1842, e o termo amilóide empregado por Virchow, em 1851. Até 1964, Mc Alpine e Fuller haviam coletado em revisão bibliográfica 177 casos: Desde então, temos vários casos relatados (6).

Há quatro variedades de amiloidose: a primária, também chamada atípica ou paraamiloidose, cujo fator predisponente é desconhecido, sendo de aparecimento comum em musculatura de língua e coração; a secundária, que é a forma mais comum, cujo aparecimento é precedido de patologias crônicas, tais como tuberculose, leishmaniose, blastomicose, lepra etc.; a forma tumoral localizada, que é rara, sem causa predisponente, e de localização freqüente no trato respiratório (laringe), associada ao mieloma múltiplo (1, 3).

A amiloidose de laringe ocorre preferencialmente em homens, cujas idades variam entre 40 e 60 anos. As localizações, em ordem de freqüência decrescente, são: falsas cordas vocais, prega aritenoepiglótica e região subglótica (6). Alguns autores acham que a localização é mais freqüente na região supraglótica, apesar de um levantamento destes casos na Clínica Mayo ter demonstrado ser a forma glótica a mais freqüente.

Clinicamente, a amiloidose se comporta como qualquer outro tumor benigno, isto é, a mucosa é respeitada, há ausência de ulceração e a mobilidade laríngea é preservada. O tumor amilóide é de consistência firme ao contato com a pinça e não sangra com a retirada de fragmentos para biópsia.

O caso apresentado era o de um paciente de 47 anos, do sexo masculino, com massa tumoral na região interaritenóidea e comissura posterior. Parecia tratar-se de amiloidose secundária, uma vez que o paciente apresentava um antecedente de disfonia no qual foi diagnosticada infecção por fungo, tendo sido receitado sulfa por tempo prolongado (blastomicose?).

Apesar das várias investigações, a natureza da substância amilóide permanece obscura (5, 6). Glenner e Page (apud 7) definem proteínas amiloidogênicas como aquelas que prontamente formam fibrilas amilóides sob condições adequadas, tanto in vivo como in vitro. São conhecidas pelo menos três grandes classes de proteínas: as primeiras fibrilas são fragmentos de imunoglobulinas que aparecem em pacientes com discrasia plasmocitária, mielomas e amiloidose primária. A segunda classe ocorre em pacientes com amiloidose secundária, onde as fibrilas são compostas de proteínas não imunoglobulínicas, conhecidas como amilóide A ou proteína AA. A terceira classe de proteínas fibrilares amilóides é proveniente de células de origem neuroendócrina, em que as fibrilas parecem originar-se de hormônios peptídeos e seus precursores (7).

Revendo a literatura no que diz respeito ao tratamento, encontramos o clínico e o cirúrgico. A cortisona associada ao ACTH ou à vitamina E foi empregada com algum resultado positivo (9). Alguns autores (2) referem que o esteróide, ao invés de diminuir o tumor amilóide, o faz aumentar, enquanto outros (11) dizem que não há alteração no curso da doença com o uso do esteróide. Para amiloidose de origem imunoglobulínica é proposto tratamento com imunossupressores e citostáticos, com algum sucesso.

A radioterapia foi utilizada também por alguns autores (9, 11), sem sucesso.

Quanto ao tratamento cirúrgico, temos a microcirurgia endolaríngea para pequenos tumores (4, 6, 8, 9, 10) e a laringofissura para áreas extensas de tumor (2, 4, 9).

Recentemente, têm sido empregados os raios laser por microlaringoscopia em várias sessões, até o completo desaparecimento das lesões, através de controles periódicos (5).

No caso apresentado, fizemos o tratamento da amiloidose laríngea através do emprego de raios laser de C02, produto inteiramente fabricado no Brasil (UNICAMP). Foram realizadas três sessões de aplicação de laser, em intervalos de mais ou menos 30 dias, e pudemos verificar a eficácia deste tipo de tratamento nesta patologia.

Summary

In this paper, the autores present one case of laryngeal amyloidosis The etiopathology and current treatment are discussed in basis of actual theories. Finally, they present the treatment with C02 laser used in this case and discuss the good results observed.

Referências

1. ANDERSON, W.A.D. - Palhology. 5 ? ed., S. Louis, C Y. Mosby Company, 1966. Cap. 3.
2. BARNES, E.L. Jr. & ZAFAR, T. - Laryngeal amyloidosis. Ann. Otolaryng, 86:856-863, 1977.
3. FARIA, J.L. - Anatomia patológica geral. 2 ? ed., Rio de Janeiro, Guanabara Koogan, 1977. Cap. 1. 4. FLEURY, P.; BOCQUET, L.; BASSET, J.M.; COMPÈRE, J.F.; STERKERS, O.; PANSIER, P. & VISSUGAINE, C. - Quatre tumeurs rares du larym. Ann. Otolaryng., 9:611-617, 1979.
5. GAILLARD, J.; HAGUENAUER, J.P.; PIGNAL, J.L.; DUBREUIL, C.; ROMANET, P.V. & GIGNOUX, B. - Uamylose laringée. A propos de deux cas. Uamylose sous-glottique traités par laser. J Eram Oto-Rhino-Laryng., 28(8):547-549, 1979.
6. HELLQUIST, H.; OLOFSSON, J.; SOKJER, H. & ODKVIST, L.M. - Amyloidosis of the larinx. Acta. Otolaryng., 88:443-450, 1979.
7. KAISER-KUPFER, M.I.; McADAM, K.M.J. & KUWABARA, T. - Localized amyloidosis of the orbit and upper respiratory tract. Am. J. ~tal., 84(5):721-728, 1977.
8. MELLO, R.R. & CARSAVA, A.M. - Amiloidose de laringe. Rev. Bras. Otorrinolaring., 1(41):90-93, 1975.
9. MURATTI, G.; MELATO, M. & BARTOLI, M. - Amiloidosi primitiva della laringe. "Amiloidoma". Movo Arch. Ital. Oto1, 5(2):95-104, 1977.
10. PIQUET, J.J.; DESAULTY, A.; ANSART, G. & DECROIX, G. - Amylose laryngo trachéale. Tratement endosçopique. J. Franç. Oto-Rhino-Laryng., 27(2):127-128, 1978.
11. RUBINOW, A.; CELLI, B.R.; COHEN, A.S.; RIGDEN, B.G. & BRODY, J.S. - Localized amyloidosis of the lower respiratory tract. Ann. Rev. Resp. Dis, 118:603-611, 1978.




1-Professora Assistente da Disciplina de ORL da UNICAMP.
2-Professora Assistente, Doutora da Disciplina de ORL da UNICAMP.
3-Ex-residente da Disciplina de ORL da UNICAMP.
Trabalho realizado pela Disciplina de ORL da UNICAMP e Instituto de Física da UNICAMP.

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