Versão Inglês

Ano:  1934  Vol. 2   Ed. 1  - Janeiro - Fevereiro - ()

Seção: Progressos da O. R. L.

Páginas: 48 a 52

 

Uma epidemia da febre ganglionar de Pfeiffer

Autor(es): DR. MARIO OTTONI DE REZENDE

DR. E. SCHULZ (Münch. Med. Wschr. N.o 46 - 1933 - Pag. 1809
(Sumula pelo DR. MARIO OTTONI DE REZENDE)

Poucos casos menciona, em detalhe, a literatura sobre o assunto. A benignidade da molestia e o modo isolado por que tem sido observada, faz com que os medicos, em geral, pouca importancia liguem aos pacientes afetados. Inflamações das amigdalas seguidas de reações ganglionares para o lado do pescoço e, mesmo, em outras regiões; fórma de tipo gripal, com mau estar geral e elevação termica passageira, são atribuidas á resfriamentos e curam-se, quasi sempre, em poucos dias. Por vezes uma indicação de apendicectomia, seguida de intervenção, aparece aqui e acolá, geralmente sem haver tido necessidade de havê-la feito. No entanto, uma observação cuidadosa nos levará a tomar a serio esta molestia que tantas vezes ataca os medicos e estudantes de medicina, e não raro apresentando fórmas serias e que são acompanhadas de dissabores e aprensões.

O autor teve a ocasião de observar este ano, entre Maio e Junho, uma verdadeira epidemia em Allenstein. Seus casos, quasi todos passados entre militares e suas familias, somam 40 e crê o autor que o total de casos desta epidemia devia ir além de uma centena.

Descreve, em seguida, tudo quanto existe sobre a febre ganglionar, desde Pfeiffer em 1889, que a poz em fóco, passando pela sua nomenclatura tão variada: reação linfatica, febre ganglionar linfoide, angina com linfocitemia atipica, angina com linfoblastose, linfoadenite idiopatica, linfomatose agúda sub-linfoide, linfadenose agúda, linfoblastose agúda benigna e mesmo leucemia agúda benigna. O autor considera, ainda, a angina monocitica, descrita por W. Sehultz, hoje angina á celulas linfoides, como uma fórma de febre ganglionar de Pfeiffer, pois que teve ocasião de observar, nesta epidemia" casos graves de angina em familias em que outros componentes foram atacados de fórmas não anginosas.

Como o complexo sintomatico encontrado em todos constituiu uma unidade, deve-se, tambem, considerar como tal a molestia observada.

Em seguida descreve um quadro geral da molestia, abstendo-se da relação de casos clinicos, pois se enquadram todos no que disse Pfeiffer. O tempo de incubação, pelo que póde
deduzir da observação, deve variar entre alguns dias e uma semana.

Os sintomas prodromicos são pouco carateristicos, existem, no entanto, alguns que podem ser notados regularmente: grande cançaso e o aparecimento de um humor caprichoso. Ao
passo que o cansaço e a sonolencia são mais intensos no adulto; na criança não existe, e, ao contrario, são irritadas a ponto da mãe não saber o que ela deseja. Como sintoma mais avançado tem lugar a sudação, a falta de apetite, o mal estar, as dôres de cabeça e as dôres no corpo. Este estado poderá ir de alguns dias a uma semana e mesmo mais.

Os primeiros sintomas objectivos: a conjuntivite folicular, ás vezes com edema das palpebras, foi observada 4 vezes, hemorragia nasal com vomitos 1 vez e dôres no corpo muito
fortes uma vez. Geralmente é a febre o primeiro sinal notado pelos doentes e pelos pais. A temperatura pôde alcançar 39º, 40º que caírá, depois de 1-8-14 dias (a maioria já depois do 2º dia da molestia) em lisis. O interessante é que depois de 5 e mesmo 24 dias de intervalo afebril, novo estado febril poderá aparecer durando muito menos tempo que o primeiro. Casos de temperatura sub-febril e mesmo afebril são possiveis.

O cansaço aumenta perturbando o sono de fórma a apresentarem, os doentes, pela manhã, facies palido e cansado, com olheiras, dôres de cabeça frontais; as creanças tornam-se caprichosas, choram sem motivo, ficando alegres logo depois. Este estado póde durar mesmo depois da quéda da temperatura, 1 à 3 semanas.

O engorgitamento ganglionar é o sintoma principal da febre ganglionar. Tanto póde preceder quanto seguir-se á molestia. Geralmente aparece juntamente com a febre, outras vezes alguns; dias depois. Os ganglios, geralmente, só são observados depois que o paciente queixa-se de dôres no pescoço á compressão dos nodulos, apenas palpaveis. Os ganglios nas axilas, virilhas, abdominais, etc., não são dolorosos e, por isso, não observados. O engorgitamento dura poucos dias, a regressão poderá ir até 4 semanas e mais. Em regra os ganglios da nuca e do bordo posterior do esterno-cleido-mastoideo, são engorgitados e sentidos como se fôra um colar de perolas, facilitando, quando encontrados, o diagnostico da molestia. Adenite generalisada é, geralmente, dificil de ser notada, dada a pequenez dos ganglios. Não é necessario que as adenites se apresentem de fórma simetrica. Em geral as adenites axilares, inguinais etc., são dificilmente palpaveis. As adenites toracicas podem produzir tosse, e, por vezes, imitando a da coqueluche. As abdominais ocasionam dôres umbilicais, diarréa, dôres lombares, ás vezes albumina nas urinas, forte aumento do baço e do figado.

Particularmente interessante são as modificações para o lado da garganta. Antigamente eram tidas como insinificantes. Hoje o numero de casos, em que o inicio da molestia se assentou de principio, como uma angina carateristica, é de tal fórma grande, que muitos medicos contentaram-se com o diagnostico exclusivo de angina, como afecção primaria. O contrario, tambem, existe, assim é que a molestia dos ganglios poderá ser primaria e a inflamação das amigdalas secundaria. Esta angina é, geralmente, pertinaz, durando até 4 semanas. O faringe, véo paladar e sobretudo as amigdalas apresentam-se formente vermelhas e adematosas. Amigdalas vermelho-escuras, lisas e brilhantes, sem a principio, nenhum deposito sobre elas, podendo, no entanto, formar em suas superficies, qualquer especie de ulcerações ou membranas difteroides sendo que a associação fuso-esperilar é a mais encontradiça. A disproporção entre as pequenas lesões da garganta, com a grandeza do desenvolvimento ganglionar, constitue sintoma carateristico da febre ganglionar. Em alguns deu-se o aparecimento de uma cistite tipica e em outros depois da quéda da temperatura, logo no segundo dia, reapareceu a febre no fim de uma semana com o desenvolvimento de uma otite média e inflamação do naso-faringe. Um quadro clinico desta especie clama por exame meticuloso do sangue, pois só desta fórma o diagnostico se esclarecerá. A principio o quadro hematologico nada tem de carateristico, podendo confundir-se com outras molestias. Por vezes só depois de 15 e mais dias de febre, o quadro hematologico torna-se tipico desenvolvendo-se, então, os sintomas ganglionares.

A linfocitose, alcançando alta porcentagem 50 % a 90 % etc. com o aparecimento de formas linfocitarias de diferenciação dificil e alguns grandes linfocitos 3 á 8%, constitue o aspeto predominante do exame hematico. A predominancia é dos pequenos linfocitos, apresentando, em geral, perturbações nucleares. Em alguns casos a confusão com os monocitos é possivel, exigindo do analista muito cuidado no exame. O numero dos leucocitos é, em geral, normal ou ligeiramente aumentado (10 - 20.000), e em raros casos póde subir até 80.000.

Se seguir-se os casos desde o inicio, pode-se observar pequena linfocitose com ligeiro desvio para a esquerda (5-8 % nucleos em bastão), ao lado dos linfocitos em porcentagem normal, assim como de eosinofilos. Entre os linfocitos encontra-se, já, fórmas atipicas. Só com o engorgitamento ganglionar as modificações no quadro hematico, tornam-se tipicas. O autor encontrou até 68 % de celulas não granuladas e, comumente, 5-10 % de fórmas apenas diferenciaveis. Com as fortes reacções das amigdalas o numero de linfocitos atipicos torna-se maior. Em alguns casos apareceu a eosinofilia 6-10-17 %, caindo, logo, a 3 %. Nas fórmas de febre ganglionar grave, o desvio forte (10 % nucleos em bastão, 30-40 % segmentados), é bastante prolongado. A permanencia das modificações no quadro hematico, está em concordancia com o engorgitamento ganglionar, cessando ou diminuindo este, aquele melhorará, peorado peorará.

O prognostico da febre ganglionar é bom. Todos os casos observados curaram-se. O decurso é bom e dura 1 á 2 semanas. Casos ha, porém, de fórma grave, que podem durar 1 á 2 mezes e mais. O que predomina é a queixa de dôres na garganta (15 dos 35 casos observados). O engorgitamento ganglionar, tal qual o quadro hematico, póde persistir por longo tempo, mesmo semanas após o desaparecimento dos sintomas gerais.

O diagnostico diferencial não é dificil: o decurso, a curva de temperatura, o estado do baço e o quadro hematico, tornam-no claro. Assim, o quadro hematico póde ser tomado com o de uma leucemia: a falta de anemia, da diatese hemorragica, o numero normal de plaquetas e a variedade de colorido das fórmas linfocitarias, falam, sem duvida, pela febre ganglionar. Ainda outras confusões podem ter lugar: a linfogranulomatose, septicemía, tifo na 2ª e 3ª semanas, influenza, apendicite e agranulocitose. Nas formas anginosas é necessario pensar-se na difteria. Sobre a patogenese da febre ganglionar é preciso ter-se em consideração que não se trata, aqui, como se pensava antigamente, de uma propriedade constitucional do doente, trata-se mais de uma molestia geral de carater infecioso. A via da infecção e o virus que a ocasiona não são, ainda, conhecidos. A porta da entrada, é sem duvida o nariz e a garganta. O virus que pela garganta póde penetrar por todo o trato intestinal, assim como pela arvore respiratoria pulmonar, goza de propriedades linfotropas, espalhando-se, assim, pelas vias linfaticas de todo o corpo. A melhora do organismo se processa lentamente devido o periodo necessario a sua imunisação. Epidemias já têm sido descritas a começar por PFEIFFER, outros autores notaram a frequencia da molestia nas escolas e nos colegios. GLANZMANN, em 1929, observou, em Berne, 70 casos esporadicos e 50 casos, em fórma de epidemias, em cerca de 20 familias, onde, tanto adultos quanto creanças foram afetados.

SCHITTENHELM fala sobre o caso de um professor, que infectou toda classe que dirigia. Os americanos mencionam grandes epidemias, assim em 1925 mais de 300 casos em New Jersey, 100 casos em New York e em 1926, 32 estudantes de medicina, etc. O autor menciona, em seguida, 35 casos de sua observação em que predominavam as creanças, havendo, no entanto, tambem muitos adultos, e prova; pelas circunstancias intercorrentes, o carater epidemico de todos eles.

Terapeutica - Não tem importancia especial pois que, geralmente, todos os doentes curam-se. Os pacientes pedem para que se lhes diminua os incomodos e, ainda mais, para que se lhes encurte a duração da doença.

Entre as muitas medicações empregadas, as que provaram melhor foram:

Em caso de febre - Pyramidon: de 2 á 4 anos 0,1, mais velhos, 02, 3 á 4 vezes ao dia até que a temperatura caía. Mais tarde calmantes para as creanças, especialmente narcoticos, por exemplo Adalina. Contra as dôres ganglionares oleo quente ou curativo com parafina. Como gargarejos agua oxigenada. Desde que a febre cáia deixar a creança levantar-se e tomar sol. Recaída voltará para cama até nova quéda da temperatura. O melhor fator de cura é a permanencia no ar fresco, melhorando o apetite e o sono da creança. Nos casos graves tratamento pelo «sol das alturas». (Höhensonne.)

Profilacticamente usar, os que tratam ou tenham contacto com os doentes, gargarejos com agua oxigenada.

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