Versão Inglês

Ano:  1933  Vol. 1   Ed. 4  - Julho - Agosto - ()

Seção: Notas Clínicas

Páginas: 284 a 290

 

OTITE MEDIA AGUDA E PARALISIA DO FACIAL Operação. Cura da Paralisia.

Autor(es): DR. FRANCISCO HARTUNG

Da Santa Casa de S. Paulo

O caso de otite média aguda que nos serve de motivo de apresentação, tem um interesse especial pela violencia dos seus sintomas que culminaram numa paralisia do nervo facial, exigindo uma pronta actuação cirurgica. Mastoidites de andamento rapido, fugindo ao classicismo das tres semanas, não constituem raridade; a paralisia do setimo par, entretanto, não costuma entrar em cena com muita precocidade. Segundo Politzer, em cada 100 otites medias agudas não ha mais de que 3,7 paralisias faciais, emquanto que a estatistica de Bezold não acusa mais de 1 paralisia para cada centena do citado tipo de otites.

Observação - L. A. P., com 25 anos, casada, residente nesta Capital é acometida no dia 12 do mês passado, de fortes dôres de ouvido, no lado esquerdo. Passa a noite bastante mal, apezar da aplicação de banhos , de luz e na madrugada do dia 13 surge nos citado orgão um derrame sanguineo, aliviando-se um tanto as dôres; temperatura acima de 38º. O dia 13 passa um pouco melhor, mas a 14 recrudecem os seus padecimentos, razão pela qual somos chamados a vê-ia. Nesta data encontramos a paciente com dôres expontaneas no ouvido em questão e temperatura de 37.8º, pela manhã; supuração abundante sero-sanguinolenta. Queixa-se de ruidos pulsateis no ouvido doente e intensa surdez; tem o pavilhão da orelha queimado por um banho de luz muito) intenso, que fizera, e por isto, dolorôso. Fortes dôres á pressão na mastoide, tanto na ponta como em cima do antro.

Uma vez limpo o conduto da abundante secreção, na parte que a otite externa, consequente á queimadura, permitia a otoscopia, pudemos avaliar da violencia da otite pela intensidade da congestão e pulsação; o timpano sangrava com grande facilidade, falando pelo caráter gripal da otite. Como therapeutica, receitámos um analgésico local, acompanhado de compressas humidas quentes, depois de proteger o pavilhão da orelha com vaselina boricada. Medicação geral, uma ampola de omnadina.

No dia 15, o estado da doente continúa o mesmo. Como a ore lha houvesse melhorado da queimadura, resolvemos aplicar tambem a lâmpada Solux que bastante alivia as dores; temperatura á noite 38,4º.

No dia 16, apesar da supuração ainda abundante, os sintomas continuam e com intensidade redobrada: a doente queixa-se de insônia absoluta, tem fortes dores de cabeça, e, como se esboçasse uma paralisia do facial, resolvemos recorrer a uma radiografia da mastóide, cujo resultado não é muito elucidativo. Afim de não sermos desorientados por uma possível reação da omnadina, suprimimos esta injeção; como a doente não evacuasse ha três dias, receitamos um purgativo.

A situação continua a mesma no dia 17; a doente, que experimentará tonturas durante o dia, tem um verdadeiro desmaio, á meianoite; visitando-a a esta hora não encontramos nistagmo espontâneo; continua a queixar-se de violentas dores de cabeça, e já ha três ou quatro noites que não consegue dormir, apesar dos sedativos.

Nos dias 18 e 19 a sintomatologia continua com a mesma intensidade: dores no ouvido, cefaléia, náuseas, tonturas (sem nistagmos), e a paralisia do facial cada vez mais pronunciada; temperatura á noite, 38.6º sem injeção. Já com o conduto menos inflamado pela otite externa, percebemos claramente o edema do antro; apesar de continuar boa a supuração, resolvemos alargar a perfuração existente ainda na noite de 18. No dia 19, pela madrugada, desaparece de todo a temperatura, fato que nunca se dera, mas a cefaléia continua forte e o facial está manifestamente pior. Apesar de ligeira melhoria nas dores da mastóide, somos de opinião de se proceder a mastoidectomia: mesmo que se quizesse atribuir á gripe as dores de cabeça, e talvez neste caso uma atitude de expectativa fosse aconselhável, a decadência do facial era alarmante, e, si o canal de Fallope era deficiente ou permeável, seria imprudente expô-lo a novas investidas da infecção, tanto para defender o endocraneo como o lado estético. O nosso coléga e amigo Dr. Mario Ottoni é chamado em conferencia; pactúa com o nosso modo de vêr, dando muita importância á dor de cabeça, propondo, porém, antes se operar um exame hematológico. Este exame é realizado pelo Dr. Marcos Lindenberg, que acusa em seu relatório: anemia ligeira (4 milhões de hematias), leucocitóse franca (15 mil leucócitos) e neutrofilóse; pequeno desvio para a esquerda, no hemograma da Schilling, atingindo só neutrefilos em bastão; nucleos jovens normais.

Uma semana e um dia depois do inicio da otite, portanto no dia 20, pela manhã, a temperatura sóbe de novo a 37.9º; resolvemos, em definitivo operar a doente. Operação comum, sem detalhe digno de nota, a não ser a enorme congestão de caráter gripal. Pús; apenas no antro.

Periodo post-operatorio ótimo; apenas ligeiras hipertermias nos tres primeiros dias; do quarto em deante, jamais a temperatura ultrapassou 36.9º.

O nervo facial melhorou bastante com a descompressão operatoria, para depois estacionar; auxiliado pela estrichnina, cianureto de mercurio e electricidade, em breve recuperou completamente as suas funcções, e nada mais resta dos fenomenos paraliticos depois de 28 dias de convalescença.

Cicatrisação da ferida ótima.

Como se depreende desta observação, a presente otite veiu acompanhada de um cortejo de sintomas invulgarmente vialentos. Corrimento com pulsações, sempre abundantissimo durante oito dias, demonstrando que só da caixa do timpano não poderia provir tanto exsudato. Temperatura sempre acima de 38º; apenas na madrugada de 20 vae a 36.9º, para á note de novo subir para 37.9º. Edema no conduto, dificil de se avaliar no começo da molestia, mas evidente no fim de alguns, dias. Cefaléa, insonia, nauseas e vertigens; si, na creança, o menigismo da otite media, em geral, não é alarmante, no adulto, estes fátos têm via de regra, outra repercussão.

Este quadro já possuia côres bastante vivas que justificavam uma intervenção na apofise mastoide; entretanto, si essa sintomatologia não fosse bastante convincente, e uma contemporisação ainda fosse aconselhavel, o facial, per se, pela, sua decadencia, protestava veementemente pela sua segurança e pela do endocraneo, contra novas delongas, exigindo mastoidectoimia imediata. É suficiente esclarecer, que este nervo, sete dias deis da operação, apezar da manifesta melhoria operatoria, ainda acusava ao exame elétrico, procedido pelo Dr. Paulino Longo: hipoexcitabilidade acentuada, tanto do ramo temporo-facial como do cervico-facial; do temporo-facial, apenas ias filetes frontais estavam integros; todos os outros, quer dizer, nasas, bucais e palpebrais com notavel deficit. Corda do timpano, duvidosa ás sensações gustativas.

É nossa firme intenção fugir a citações de classicos. Uma a eceção fazemos apenas, e vae nisso uma homenagem á memória de Alexander, este vulto, formidavel, cujo desaparecimento toda a otologia moderna deplora neste instante, e que ditava com a sua imensa autoridade: não operar ias paralisia do facial, que tem conservada a sua reação faridica, nos doentes cujos sintomas de otite evoluem favoravelmente, apireticos, sem dôr e sem abaulamento do conduto. Em caso contrario, imediata antrotomia.

Diagnostico precoce em meningite. Estudos químicos do fluido espinal.

SAMUEL KOPETZKY E ELLA FISCHBERG

A positividade do exame bacteriológico do liquor geralmente vem muita tarde para permitir o diagnostico das meningites no período de invasão, quando a terapêutica pôde ser eficiente. Atendendo, a estas dificuldades, os AA. procuraram verificar as alterações precoces que sofre o conteúdo químico do liquor nas meningites bacterianas, tanta no que se refere á diminuição ou mesmo ausência de substancias normalmente presentes no liquor como no que respeita á presença de substancias tóxicas ou de produtos do metabolismo cerebral ainda não reabsorvidos. Como método de estudo, os AA. procuraram, preliminarmente estabelecer as quantidades padrões normais, fazendo dosagens nos liquores de 50 indivíduos não portadores de meningites bacterianas. Em seguida dosaram as substancias em questão tanta no liquor como no sangue, em indivíduos portadores de processos meningeos para estabelecer as relações respectivas, fazendo destarte um estudo bastante interessante sobre as condições de permeabilidade da barreira hemo-liquorica. Eles verificaram que, apenas iniciado o processo meningeos, os cloretos diminuem ao passo que aumentam o acido lático e as proteínas provenientes, muito provavelmente, da própria destruição tissular. Em conseqüência do aumento da quantidade do acido lático, o acido carbônico é deslocado de suas combinações, donde uma diminuição da taxa de bicarbonato, em virtude do que diminui a reserva alcalina. Este Testudo, não têm caráter definitivo, constituindo entretanto ótima contribuição para o estudo quimico-biologico do líquido céfalo raquidiano. Parece mesmo que, a parte mais valiosa deste trabalho é a que se refere ao estudo das condições da barreira hemo-liquorica pela comparação entre os teores sanguíneo e liquorico dos vários elementos pesquisados. Como elementos diagnósticos para os períodos iniciais das meningites bacterianas, as dosagens do Ca, do Na, do K, do acido lático, da reserva alcalina e da acidez iônica dependem ainda do estabelecimento das respectivas taxas normais. Neste particular, tem-se a impressão que o trabalho de Kopetzky e Fischberg não é de absoluto rigor porquanto entre os seus 50 casos dados como normais figuram alguns, de individuos portadores de moléstias febrís como a pneumonia ou com lesões em orgãos importante da economia (rins, figada e pancreas), nos quais as taxas citadas só poderão ser consideradas como normais depois de novas sanções.
Dr. O. Lange.

Tratamento dos acidentes séricos.

Da L'Infomation Médicale An. 15, n.- 3, Março 1933, extraímos as seguintes notas

O Prof. Vincent propõe substituir o clorureto de calcio, medicamento classico dos acidentes séricos, pela medicação benzo-salicilada, e Camescasse assinála os bons efeitos da medicação láctica.

O Prof. Vincent utilisa uma poção entendo 6 gramas de salicilato de sodio e 6 gramas de benzoato de sodio em 200 cmc. de excipiente. Ele dá, desde os primeiros sintomas, uma colhér das de sopa todas as horas, depois todas as duas horas. É util diluir cada tomada do medicamento em chá fraco ou em tisana quente. Este tratamento, diz o autor, faz parar os sintomas de reacção em poucas horas.

Camescasse (La Médicine Pratique, Dec. 1932) emprega depois da injecção de sôro, ou no inais tardar, após o aparecimento dos acidentes, a seguinte poção:

Acido láctico . . . . . . . . 15 grs.
Xarope de framboeza . . . . . 250 grs.
Tomar 1 colhér das de sopa em um copo de agua. Beber tantos copos quantos púder.
O autor conseguiu sempre, com esta medicação simples, excelentes resultados.

Considerações sobre os resultados obtidos pelo método de Coutard.

V. E. WESSELY - Um carcinoma da laringe curado cora raios XY

J. M. com 33 anos, vem i á consulta a 7-8-931, queixando-se, de rouquidão. O exame revelou infiltração tumoral da falsa corda direita, que se apresentava consideravelmente espessada, com superfície irregular, tendo na parte média uma perda de substáncia. Biópsia: carcinóma com epitélio chato.
Foi então praticada a radioterapia profunda de Coutard pela dr. Borak. A péle foi presa de típica epidermiólise, que chegou a grau elevado. A reação da mucosa da laringe foi, por algum tempo inquietante: congestão inflamatória, ambas as pregas ari-epiglóticas e cordas vocais edemaciadas provocando estenose estridulosa. A mucosa achava-se coberta de fibrina branca, cinzenta. A fase pior durou 14 dias, após os quais, o doente entrou a melhorar. Hoje, 16 mêses depois da aplicação, apresenta-se a laringe com o aspecto de uma laringite crônica. O lucrar em que se achava o tumôr, é apenas reconhecível pela diferença da coloração. Biópsia: tecido não específico. A voz é alta e clara. O doente sente-se bem, tenda engordado 13 kg. É este um dos primeiros casos nos, quais se pode falar de cura de carcinoma da laringe, tratado pela processo de Coutard.

L. FORSCHNER - O quadro laringoscópico da epitelióse (Epitelite) no tratamento radiológico do carcinoma do laringe pelo processo de Coutard.

O A. apresenta um doente com 76 anos de idade, em tudo semelhante ao apresentado por Wessely. Após aplicação do método de Coutard, foi acometido de epiteliólise: reação edematosa da mucosa, com grande quantidade de membranas, dando a impressão de pênfigo da mucosa. A reação atine, após alguns dias, o ponto culminante, cedendo em seguida paulatinamente.

Sobre o assunto faz o dr. Borak as seguintes considerações. Ha 1 ano, o dr. Kofler apresentou á Sociedade um caso de carcinoma da amígdala, que irradiado pelo método de Coutard, curou-se sem recidiva. Hoje, Wessely e Forschner apresentam, cada um, um doente de carcinoma da laringe, curados. ambos pelo mesmo processo. Nós podemos delinear a forma externa e nortear a norma interna do processo. A forma interna consiste em doses irradiantes, pequenas, aplicadas diariamente, durante muitas semanas. A dose global daí resultante é extraordinariamente elevada, atinge muitos milhares de unidades, isto é, uma multiplicação da quantidade que se costumava aplicar antigamente nos tratamento do câncer. Ficou demonstrado que o cancro plano-epitelial necessita de doses muito maiores para a sua regressão, do que as que eram usadas. O grande mérito de Courtad consiste em haver descoberto, uma norma para a elevação dessa dose. Coutard, aproveitando os trabalhos de Regaud no tratamento dos epiteliômas da pele, aplica doses tão elevadas, que consegue a destruição da matriz do tumor. Os franceses dão a essa reação a denominação de radio-epitelite, mas a designação de epiteliólise é mais apropriada, visto como, aqui, não se trata de uma inflamação, mas de dissolução e destruição do epitélio.

Enquanto, que, após doses elevadas, a destruição do epitélio da péle só se dá depois de 4 semanas, consegue-se destruir o, epitélio da mucosa já após 3 semanas, com doses pequenas. De perfeito acordo com Coutard, podemos dizer que a produção da epiteliólise pressupõe o desaparecimento do carcinôma plano-celular. Isto é para o laringologista muito significativo, pois, pela observancia da reação da mucosa, pode êle, sem conhecimento do gráu da dose, julgar se a irradiação: foi correta. Se não se der a epiteliólise, significa que a dose foi pequena. Por outro lado, o laringologista necessita saber que esse acometimento não é uma reação que deva ser evitada, mas deve ser provocada, no interesse da cura do carcinôma. Esta é a norma interna e a natureza do processo irradiante de Coutard. Quanto mais extenso for o tumôr, tanto maior deve ser a dose a ser aplicada. As doses variam entre 7000 e 10000 r.

Em seguida á aplicação, da série irradiante, dá-se a re-epitelisação, em um espaço de tempo que varia de acôrdo com a extenção do tumôr, com uma completa "restitutio ad integrum" da mucosa irradiada.

Dr. Roberto Oliva.

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