Versão Inglês

Ano:  1933  Vol. 1   Ed. 3  - Maio - Junho - ()

Seção: Trabalhos Originais

Páginas: 205 a 208

 

ANGINA PSEUDO-DIFTÉRICA A PNEUMOCOCUS

Autor(es): Dr. FRANCISCO HARTUNG

Da Santa Casa de S. Paulo.

E' facil geralmente o diagnostico clínico de difteria, e o laboratorio nada mais faz de que confirmar um fáto j,á descortinado pela experiencia e intuição do especialista. Qual de nós, entretanto, não terá tido a eventualidade de se desapontar com um resultado de exame bateriológico, em caso em que requereu mais para documentação cientifica de que por necessidade pratica?

Foi um caso destes que me animou á presente comunicação.

Observação R. P. B. menino branco de dois anos e meio de edade, cáe doente com fortes dôres de garganta e de corpo. Temperatura de 38°,5. Um colega é chamado a vér o pequeno, pensa que se trata de um caso de difteria, apelando para o laboratorio. O resultado do exame bacteriologico é negativo, tanto em relação a Loeffler coma á associação fuso-espirilar; o caso é naturalmente interpretado como uma forte gripe acompanhada de angina lacunar. Receita salicilato e uma pincelagem com azul de metileno.

Passada uma semana, como as condições da creança não melhorassem, alguem lembrou-se-do nosso nome.

Encontrámos o menino em aspeto geral pouco animador. A creança dava a impressão de intoxicada, temperatura de 38'5 pela manhã, muito abatida, impaciente, e recusando-se a tomar qualquer alimento devido ás dôres que experimentava. Relata-nos a mãe, que sentira certo mão cheiro na boca do pequeno, sendo que o colega que me precedéra lhe falara em necróse.

O exame revelou: garganta muito vermelha, principalmente os pilares e palato mole; amigdalas não muito hiperemiadas, mas de volume bastante aumentado e cobertas em alguns logares de zonas de fibrina; mucosa da boca e dos labios fissurada; nariz muito humido e congesto; ouvidos, niíl. Ganglios hipertrofiados, sobretudo os cervicaes e supraclaviculares, apesar de que eram assim encontrados por todo o corpo. Baço, talvez palpavel ou doloroso, o menino não consentia num exame apurado.

Deante destes elementos clinicos e da negatividade do exame do laboratorio, no tocante á difteria e Vincent, passámos a considerar varias hipoteses plausiveis.

Angina lacunar banal, não era provavel, porquanto a temperatura estava se prolongando demais, e havia exagerada reacção ganglionar. Passou-nos tambem pela mente a possibilidade de escarlatina, devido ao rubor dos pilares e á intensa disfagia; tuas como a molestia já havia começado ha uma semana e não aparecera até então exantema, acabamos por abandonar esta hipotese.

Duas interpretações ainda se nos afiguravam: a primeira, seria colocar as membranas que justificaram o exame microscopico, sob a dependencia de um outro germem que não o bacilo de Loeffler, germem este capaz tambem de produzir membranas, e gerar mão estado geral, como por exemplo o pneumococus; a segunda, dependendo com a informação de necrose, dada pela familia, ao lado da intensa defeza do sistema linfatico, seria admitir uma perturbação no quadro hematologico, rebatendo o caso clinico apara uma mono - ou mesmo agranulocitóse.

Por isso, tambem batemos ás portas do laboratorio com um novo esfregaço da garganta, em busca do citado tipo de germem, além de que requeremos um duplo exame de sangue: estudo dos globulos brancos e hemocultura.

Os resultados dessas pesquizas, se vieram nos desiludir sobre alterações leucocitarias, em compensação, confirmaram as nossas suspeitas quanto á natureza bacteriologica do germern retirado da garganta porquanto, o exame do frottis nos revelou pneumococus tipo II e III.

Façamos um rapido estudo deste tipo de angina.

Sintomas - Tal qual a difteria, o começo da molestia é verdadeiramente tormentoso. A temperatura sóbe rapidamente a 39°, e a creança intoxica-se com rapidez. O opistotono é, em geral, presente, embora não haja outros sinais de irritação meningéa. O doente recusa-se á alimentação e a tomar líquidos de modo a se desidratar rapidamente. A péle torna-se sêca, ós labios apresentam fissuras, e em cima delas aparece um exsudato amarelo. Tanto na garganta como na boca, labios, e nariz, fórmam-se pseudo-membranas, que sangram com facilidade: as conjuntivas tambem tornam-se afectadas, apresentando intensa hiperemia. O pulso é muito rápido e fraco, mas regular. Todos os ganglios do pescoço hipertrofiam-se e são dolorosos, provindo daí o opistotono. Quando caem as membranas, fórma-se um material amarelo, que se deposita no faringe e no laringe, tornando muito dificil a respiração, de modo a tornar necessario aspira-lo, para evitar a sufocação.

Diagnostico - O diagnostico diferencial exige a separação deste tipo clínico de outras sérias anginas, na seguinte ordem difteria, angina de Vincent, mono e agranulocítóse, além de várias alterações relacionadas com outros tipos de discrasias sanguíneas. Para tanto, é absolutamente essencial o exame bacteriológico.

Prognostico e tratamento - Quando a angina; a pneucocus tipo III, é reconhecida a tempo, o prognostico parece bom. Entretanto, a sua confusão com a difteria é extremamente comum, e isto faz com'que se retarde o tratamento. O grande problema da sua terapêutica é evitar a desidratação da creança; para isto é necessario o uso de hipodermoclise, injeções intraperitoniais, etc. O tratamento específico será o sôro antipneumococico, de preferencia ás vacinas. Localmente antisepticos.

A terapêutica seguida no nosso caso merece um pequeno comentario.

Não foi feito sôro, como preconisam os autores que se têm dedicado ao assunto, e sim vacina do germen obtido da cultura; isto de comum acôrdo com o colega, em cujas mãos já estava a creança desde o inicio da molestia, aliás pediatra de grande prestigio entre nós. Fá-to é que o menino entrou a melhorar rapidamente, logo em seguida á segunda dóse de vacina, desaparecendo a febre, as dôres na garganta e a repugnancia á alimentação, e facultando uma rápida convalescença. Para bem consolidar a cura, foram feitas outras dóses de vacina. Sómente os ganglios não regrediram em proporção com a melhoria do estado geral.

A literatura fornece-nos os dados que se seguem

WOOD e KOLMER, em 1911, descreveram 72 casos de nasofaringites a pneumococus; eles dividiam estes tipos de anginas em tres grupos:

1.º - Casos com abundante exsudato tonsilar.
2.º - Casos mostrando edema e rubor das partes inflamadas, mas sem exsudato.
3.º - Um tipo raro, caraterisado por uma úlcera perfurando o palato mole ou situado na mucósa da boca. Este tipo eles encontraram em creanças desnutridas, não fazendo menção da idade.

Recentemente, GLASER descreveu dois casos de anginas a pneumococus, em creanças respectivamente de 4 anos e de 3 mezes, sendo que uma delas veio a falecer.

BERT e RISLER tambem se referem a dois casos identicos, nos quais a molestia começou por uma diarréa. Estes autores mencionam o encontro de pneumococus nas fézes.

CHALIER e MESTRALLET citam dois casos de anginas em adultos, um de 19 e outro de 37 anos, e ainda um terceiro caso citado por JAOUR. Na opinião deles, o prognostico no adulto é sempre favoravel, depois de uma semana a dez dias de tratamento.

Finalmente NOAH FOX, de Chicago, apresentou o ano passado quatro detalhadas observações, sendo que dois doentinhos vieram a falecer, um de pneumonia e outro de meningite á pneumococus. Em ambos houve a citada confusão inicial com difteria e tratamento antidifterico sem resultado.

SUMMARY

Dr. Francisco Hartung - Angina caused by pneumococus type II and III.
A child two and a half years old had a strong sore throat with pain, dysphagia, temperature 38°5 and bad general conditions. There were membranes in the throat, mouth and lips; hypertrophic ganglions eveirywhere principally the cervical and supraclavicular ones. The bacteriologic examination of the throat smears was negative for Loeffler and Vincent. Salycilate was given without good results. A week later the conditions of the child were still the same and another microscopic examination was made revealing this time .pneuimococus type 11 and II1. Rapid recovery with use of vaccines made of the smears.

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