Versão Inglês

Ano:  1954  Vol. 22   Ed. 3  - Maio - Junho - ()

Seção: -

Páginas: 213 a 223

 

A HEMOSSEDIMENTAÇÃO NAS AMIGDALECTOMIAS

Autor(es): F. J. MONTEIRO SALLES (Patologista)
R. B. PIMENTEL (Otolaringologista)

No intuito de verificar a possibilidade de complicações depois das amigdalectomias, seguramente ligadas à hemossedimentação elevada, nos casos de reumatismo evolutivo ou de outras afecções conseqüentes à infecção focal amigdaliana, fizemos um pequeno inquerito nos doentes operados, tanto portadores das complicações referidas, quanto livres delas no passado e no momento da operação.

Teoricamente não nos pareceu justificável o conceito vigorante entre especialistas, para os quais a hemossedimentação elevada constituiria contraindicação à cirurgia das amígdalas, especialmente nos casos de reumatismo infeccioso.

Para realizar urna avaliação da possível incidência de complicações post-operatórias, ou de agravações do quadro clínico nos doentes operados das amígdalas, seria necessário primeiramente verificar a hemossedimentação também dos doentes operados sem afecções ou infecções concomitantes ao processo amigdalino, e a possível correlação entre ela e o post-operatório. Sendo certo que a amigdalectomia agrava um processo reumático evolutivo (hemossedimentação elevada), dever-se-iam esperar complicações nos doentes portadores só da afecção ou infecção amigdalina, operados também durante a fase de hemossedimentação elevada.

Assim sendo, era mister antes de mais nada verificar a hemossedimentação dos doentes livres de processos reumáticos, ou de concomitância de outras afecções do tipo da infecção focal, afim de se saber qual a percentagem dos operados com hemossedimentação normal, e com hemossedimentação elevada.

O comportamento da hemossedimentação imediata e tardiamente à intervenção cirúrgica, foi outro problema que entendemos conveniente investigar, afim de colher dados suficientes para orientação clínica nos casos que mostrem complicações depois da operação.

MATERIAL E MÉTODOS

Não houve especial seleção de casos. Foram examinados 29 doentes de idade variando entre 6 a 45 anos. Do sexo masculino, 10 e do sexo feminino 19. Apresentando concomitância de fenômenos atuais relacionados à infecção focal, examinamos 10 doentes dos quais 6 com reumatismo (crônico não evolutivo 4; agudo 1; evolutivo 1); com uveite 2 casos; com hipertensão 1 caso (Max. 210 e Mn. 140) e com moléstia mitral compensada 1. Os 19 casos restantes eram constituídos pelos doentes rotineiramente operados por afecção amigdaliana isolada (hipertrofia, vegetações adenóides, amigdalites lacunar e supurada crônicas).

Determinou-se a hemossedimentação na véspera da operação e no dia seguinte. Outras determinações foram feitas nos dias subsequentes, variando do 4.º ao 23.º dias.

Os processos empregados obedeceram à técnica :padronizada dos métodos de Westergreen e Wintrobe. Compreendemos como limites normais, as cifras de 0 a 15 mml. e 0 a 20 mml. na primeira hora para o método de Westergreen, e de 0 a 9 mml. e 0 a 20 mml. para o método de Wintrobe, respectivamente para o sexo masculino e o feminino.

As condições pré-operatórias eram verificadas como de rotina (exame somático, verificação do mecanismo da hemostasia). Os processos cirúrgicos conistiram no de Sluder (2 vezes), e no da dissecção (27 vezes).

RESULTADOS

1 Grupo: 10 doentes com infecção amigdaliana e concomitância de perturbações noutros departamentos orgânicos. Em 7 dêles, a hemossedimentação estava alta e uma vez normal antes da operação para ambos os métodos, excepção do caso 10 no qual só foi realizado o método de Westergreen. 2 vezes havia discrepância entre os métodos, sendo normal em Westergreen e elevado em Wintrobe. No dia seguinte à operação, 9 vezes a hemossedimentação estava elevada, e 1 vez normal em ambos os métodos. Neste único-caso normal, a hemossedimentação estava elevada na véspera, e voltou a ser elevada do 4.º ao 10.º dias depois da operação, sendo estas cifras sempre mais altas do que as obtidas na véspera (caso 3). As determinações feitas tardiamente (entre o 7.º e 23.º dias), foram sempre elevadas, ora menos e ora mais do que as determinações feitas antes da operação. Não observamos qualquer relação constante nessas diferenças, entre as cifras observadas e o tempo decorrido. Não houve complicações nem agravações clínicas. Pelo contrário, houve melhoria nos casos de reumatismo. Os dados relativos a este grupo estão tabulados no Quadro 1.

II Grupo: 13 vezes foi a hemossedimentação normal, e 4 elevada em ambos os métodos; 2 vezes houve discrepância, sendo uma vez maior pelo método de Westergreen (caso 17), e 1 vez maior em Wintrobe (caso 5). No dia seguinte à operação, 9 vezes a hemossedimentação foi elevada, 7 vezes normal, e 2 vezes houve discripâncias (Wintrobe maior). Uma vez não foi determinado (caso 18). Nos dias subsequentes, 12 vezes foi elevada, e 5 vezes normal. Não foi determinada 2 vezes. Também aqui não observamos correlações entre o tempo decorrido depois da operação, e a cifra da hemossedimentação. Nos casos normais antes da operação (13), a hemossedimentação permaneceu normal 7 vezes, elevou-se 4 vezes e 1 vez houve discrepância entre os métodos (Wintrobe maior) logo no dia seguinte à operação. 1 vez não foi realizada nesse prazo. Os dados relativos a êste grupo estão tabulados no Quadro II.

COMENTÁRIOS

Do exposto, podemos verificar que a hemossedimentação tende a se elevar após a amigdalectomia, permanecendo alta durante tempo afastado da intervenção. A falta de correlação entre as cifras obtidas e o espaço de tempo decorrido por um lado e, por outro, as variações embora raras (normalização dias depois da operação em casos em que a hemossedimentação era antes elevada), não possibilitam tirar qualquer conclusão definida no que diz respeito às taxas da hemossedimentação depois das amigdalectomias. O trauma cirúrgico pode em parte ser invocado para explicar este aumento no dia seguinte à operação, embora este fato não tivesse sido constantemente observado. A queda da escara, as intercurrências possíveis no post operatório tardio, poderiam ser invocados para explicar o aumento prolongado que foi mais constantemente observado nos dois grupos de casos estudados.

Foram observados 4 resultados discrepantes entre os 2 métodos antes da intervenção cirúrgica, sendo 3 vezes a hemossedimentação mais elevada em Wirtrobe, e 1 vez em Westergreen. Deve-se notar, no entretanto, que esses aumentos não foram significativos. A maior incidência das taxas pouco mais altas em Wintrobe, devem decorrer da menor fidelidade deste método (Litter, D.K.: Eritrosedimentacion y Proteicas del plasma sanguineo. Tese da Fac. de Ciências Medicas, Buenos Aires, 1945 - Liv. Ateneu ed.).

A ausência de qualquer complicação ou agravação nos casos de afecções concomitantes - alguns dos quais em plena fase evolutiva, e a quase totalidade (7 casos sobre 10) com hemossedimentação elevada, permite-nos supor que cifra elevada da hemossedimentação não constitui contraindicação à amigdalectomia. Não podemos sinão fazer uma suposição razoável, visto como a casuística nossa é muito restrita.

A hemossedimentação elevada está em relação estreita com as alterações do fibrinogênio e da fração globulínica do plasma sanguíneo (Litter), assim indicando inespecifícamente um distúrbio atual de ordem infecciosa na composição do sangue. Ora, isto pode servir como índice da necessidade da remoção de fóco - desde que seja ele o responsável pelas manifestações focais da doença - para que o mecanismo de defesa do organismo atacado possa atuar eficientemente. É óbvio que a permanência de um fóco infeccioso não possibilita a cura de uma afecção. Se os anticorpos formados específica ou inespecificamente contra determinada infecção, fazem parte da fração globulínica do plasma, e se o aumento dessa fração imprime maior velocidade na eritrosedimentação, uma cifra elevada da hemossedimentação indica necessariamente a persistência de um estímulo, contra o qual o organismo está reagindo. A supressão brusca desse estímulo (no caso da remoção das amígdalas infectadas) ao contrário de trazer um transtorno no mecanismo de defesa, deverá trazer um alívio e uma plena utilização, nas manifestações focais, do volume de anticorpos disponíveis. Assim pensando, entendemos que a hemossedimentação elevada, ao invés de contraindicar, é motivo para a cirurgia imediata. É claro que não cogitamos aqui de doentes em condições pré-operatórias precárias que apresentem desordens graves da resistência orgânica.

A nossa verificação de cifras elevadas de hemossedimentação nos casos sem complicações (só de amigdalites) permite supor que o número destes casos, em algarismos absolutos, deve ser colossal nos serviços cirúrgicos. É tão grande êste número que, excetuadas as complicações propriamente cirúrgicas, ninguém pensa em atribuir à amigdalectomia uma perturbação do tipo reumático, ou outra, que por acaso possa aparecer precoce ou tardiamente num operado. É mais lógico pensar em coincidência nestas circunstâncias. E de fato não entra nas cogitações do cirurgião a possibilidade de manifestações focais num amigdalctomizado que não as apresente antes da operação. E não obstante ele opera sem saber doentes com sedimentação alta, pois a pesquisa da hemossedimentação não está incluida na rotina de exames pré-operatórios.

HEMOSSEDIMENTAÇÃO - Quadro I

1 - Amigdalites e lesões associadas

W: Método de Westergreen na primeira e na segunda hora.
Wt: método de Wintrobe.

HEMOSSEDIMENTAÇÃO - Quadro I

2 - Amigdalites e lesões associadas

W: método de Westergreen.
Wt: método de Wintrobe.
H.A.: hipertrofia amigdalin.
V.A.: vegetações adenóides.
A.L.C.: amigdalite lacunar crônica.
A.C.S.: amigdalite crônica supurada.

RESUMO

Num total de 29 operados das amígdalas verificaram o comportamento da hemossedimentação antes e depois da operação. 10 dêsses operados apresentavam manifestações atuais de processos focais (reumáticos, oculares, etc.). 19 eram apenas portadores de infecções amigdalinas. Nos dois grupos houve casos de aumento da hemossedimentação antes da operação (7 vezes sôbre 10 no primeiro grupo e 4 vezes sôbre 19 no segundo). A hemossedimentação geralmente ficou elevada nos dias subseqüente à operação. Não houve nenhuma complicação nem agravação dos doentes portadores de reumatismo e de uveites. Pensam os AA. que a hemossedimentação elevada não deve contraindicar a amigdalectomia.

SUMMARY

A report is mude studuying the rate of blood sedimentation before and after tonsill's operation, ín 20 patients. 10 of them had complications of focal infections (rheumatism and ocular descases, etc.) and 19 had only tonsill's infection. In both group of cases were observed increase of the drate oft blood sedimentation (seven times in 10 cases of the first group and four times in 19 cases of the second group). The rate of blood sedimentation were, usually, increased in the days following operation. Complications or aggravations were not observed in patients suffering rheumatism and uveitis. The writers conclude that tonssilectomy can be indicated in patients having inereased rate of blood sedimentation.

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