Versão Inglês

Ano:  1944  Vol. 12   Ed. 3  - Maio - Junho - ()

Seção: Trabalhos Originais

Páginas: 155 a 166

 

AS APLICAÇÕES DAS SULFANILAMIDAS EM OTORINO-LARINGOLOGIA (1)

Autor(es): DR. SILVIO MARONE (3)

De todas as substâncias quimioterápicas empregadas em nariz, ouvidos e garganta, nenhuma tem tão larga aplicação quanto a sulfanilamida e seus derivados. Graças a este poderoso medicamento, muita das infeções cócicas localizadas no terreno oto-rino-laringológico são hoje totalmente vencidas, algumas das quais se apresentavam até agora de prognóstico bastante sombrio.

DOSES: - Embora até o presente não tenha sido possível estabelecer-se um quadro geral e exato que indique as doses eficazes para cada afecção, pois a quantidade e a qualidade do sal estão condicionadas ao estado geral do paciente, à gravidade dessa afecção, ao momento em que se estabelece a terapêutica sulfanilamídica, ao tipo do germe, etc., contudo é lógico o princípio de que uma afecção mais grave necessita de uma quantidade maior de sal que outra mais benigna.

O conceito predominante é que a dose inicial deve ser elevada para se ir diminuindo lentamente à medida que as melhoras se estabelecem. Dentro desse princípio estamos com os partidários das pequenas doses iniciais, nas primeiras horas afim de se tactear a sensibilidade de cada doente. Esta conduta, é evidente, também está subordinada à gravidade da moléstia. Assim, quando esta não é de grande gravidade, pode-se administrar, em adulto, até 2 a 2,5 grs. por dia, dividido em 3 ou 4 vêzes espaçadas de 4 a 5 horas. Desde que 'o doente suporta bem o medicamento, pode-se subir, no dia seguinte, até 3 ou 4 grs., dose que deve ser mantida até o declínio do processo, quando então também se diminue paulatinamente até atingir uma grama por dia, até a extinção completa da moléstia.

Nunca se deve suspender a. droga logo que o doente apresenta melhoras, mas prorrogar o seu uso por mais 2 ou 3 dias, diminuindo-se as doses lenta e progressivamente; também nunca se deve prolongar o seu uso por muitos dias seguidos, uma vez que a afecção não o está a exigir. Enfim, o medicamento deve permanecer no organismo o tempo suficiente para a destruição geral das bactérias, permitindo a ação posterior das defesas orgânicas.

Uma dose perfeitamente tolerada por organismo infantil, segundo os AA. é de 0,10 a 0,15 grs. por quilo de pêso e por dia, dose esta repartida em administrações iguais com intervalo de 4 horas. Para o adulto essa taxa sobe a uma grama, para cada nove quilos de pêso corpóreo. Essas indicações não são rígidas, ao contrário, bastante flexíveis e de acôrdo com cada caso.

VIAS DE INTRODUÇÃO: - Qualquer via pode ser usada para o emprego desse composto nas afecções oto-rino-laringológicas. Assim, quando se necessita uma resposta rápida do medicamento, as vias intramuscular e. endovenosa são as mais convenientes, principalmente para as primeiras doses. Mas logo que a via bucal seja suficiente, deve ser preferida.

A via bucal é mais comumente usada. A sua preferência é tanto maior quanto se sabe que assim póde muitas vezes o sal entrar em contacto direto com a lesão. Por isso é que em muitas lesões da cavidade bucal (blastomicose, etc.) é aconselhado ingerirem-se os comprimidos como balas, chupando-os.

Quando sobreveem transtornos gastro-intestinais pode a via bucal ser substituida pela parenteral. Nos casos mais complicados podem-se associar a via bucal e a intra-muscular, o que ainda dá a vantagem de se administrarem doses maiores por dia. Nos casos de meningites graves, pode-se administrar o medicamento por via raquidiana.

Devido à localização dos orgãos no setor oto-rino-laringologico; pode-se praticar com muita facilidade, em grande número de afecções, o contacto direto e constante da droga, sob a forma de pó, com o processo patológico.

Esta prática, isolada ou associada à medicação geral sulfanilamidada, permite a obtenção de rápidos e surpreendentes resultados.

Analisaremos, em seguida, as principais aplicações oto-rino-laringologicas desse medicamento.

Sulfanilamida nas moléstias da garganta

Qualquer processo infeccioso de localização faringea causada por agentes estreptococos beneficia-se grandemente com a sulfanilamida desde que tais lesões sejam superficiais.

Desta maneira, excluimos da ação benéfica da sulfanilamida as anginas supuradas exsudativas ulcerosas, necróticas e, principalmente, as flegmonosas ou abcedadas, visto que, como é sabido, para a droga poder agir, deve ser colocada em contacto diréto com o processo patológico, fáto que não acontece na angina flegmonosa ou abcedada.

Uma vez porém eliminado o pus, póde então ser empregada a sulfanilamida em doses convenientes, por via oral e mesmo localmente.

Quando o processo flegmonoso ainda se acha no periodo congestivo, grandes são os benefícios dessa terapêutica. As vezes, os efeitos do medicamento são surpreendentes. Casos que se apresentam com intensa congestão de toda uma região periamigdaliana, com edema de úvula, trimus, intensa dôr e alta temperatura, com a administração de 3 a
4 grs., nas primeiras 24 horas, reduzem a sua sintomatologia à metade e depois de 48 ou 72 horas tudo se acha resolvido.

Nas amigdalites necróticas, como em qualquer outro processo dessa especie, a sulfanilamida e seus derivados não podem atuar, sobre os germes, devido à inibição decorrente da formação do composto protéico originado à custa das substâncias orgânicas em decomposição.

AMIGDALITE AGUDA: - Neste processo em que predomina o estreptococo hemolítico, a ação da sulfanilamida é evidente. A dose suficiente é no geral de 3 a 4 grs. por dia. Desta maneira, a evolução da infecção, que antes era de 5 a 6 dias, passa agora a 2 ou 4, notando-se quéda da temperatura depois de 24 horas de tratamento, para resolver-se, na maioria, nas 48 horas com diminuição das dores, melhora do estado geral, etc..

AMIGDALITE LINGUAL: - As amígdalas linguais, assim como as palatinas, são sédes frequentes de processos agudos, crípticos ou flegmonosos, que quasi sempre requerem intervenção decidida e eficaz.

O principal agente dessa infecção é o estreptocóco hemolítico, que é facilmente subjugado pela sulfanilamida nas primeiras 24 horas, quando usada nas dóses eficazes.

ANGINA DE PLAUT-VINCENT: - Por se tratar de um processo também necrótico, pequeno é o benefício que sobre esta infecção fuso-espirilar se obtem com a sulfanilamida.. Entretanto está indicado este medicamento, pois que vai atuar sobre os agentes estrepto e estafilocócos existentes na cavidade bucal e que contribuem também para essa infecção.

ADENOIDITE AGUDA: - As vegetações adenoides são habitualmente séde dos seguintes germes: tetragenos, estreptocócos, pneumocócos, pneumobacilos, etc. à custa dos quais se dão as complicações à distância, e bastante conhecidas, do organismo infantil; deve-se, pois, antes de se instituir tratamento adequado, proceder ao exame bacteriológico das secreções naso-faríngeas para se saber qual o germe que no quadril está predominando, e, desta maneira, indicar-se o sal apropriado. Frequentemente o agente principal é o pneumocóco e então se recomenda a sulfapiridina.

A sulfanilamida nas adenoidites agudas manifestam-se imediatamente sobre o quadro térmico com encurtamento da evolução do processo; nas fórmas de evolução longa a secreção diminue, descongestiona-se a massa adenoideana, o que dará melhoras na respiração da criança.

Para a obtenção de ótimos resultados basta empregarem-se dóses à razão de 0,10 a 0,15 grs. por quilo de pêlo por dia.

Nos casos de adenites, derivadas de extirpações das amígdalas palatinas e com tendência a evolver para adeno-flegmão, - casos de pouca frequência - obtem-se ótimos resultados com o empreso do sulfatiazol, principalmente quando fôr ministrado ainda na fase de adenite.

A sulfanilamida ou sulfatiazol em pó apresentam-se também como agentes hemostáticos, embora de pequeno valor, quando aplicados na superfície operatória, embora segundo estudos de Baila e Bandon "in,vitro" as ditas substâncias têm ação anticoagulante, prolongando a coagulação, às vezes, até 24 horas. Temos feito sistematicamente nas lojas amigdalianas recem-operadas, insuflações de sulfanilamida. Com esta técnica muito simples, temos verificado, não só o poder bacteriostático, como também bactericida da sulfanilamida, traduzindo-se por formação menos espessa das placas de cicatrização da zona operada, bem como o por um processo de granulação muito mais rápido; (e ainda ausência de hemorragia secundária). Essas verificações sobre a ação da sulfanilamida em pó nas lojas amigdalianas recentemente operadas, estão sendo prosseguidas por nós.

Deve-se ainda acrescentar os resultados obtidos pelo uso das sulfanilamidas nos casos de blastomicóse. Moléstia, antes do advento dessa terapêutica, cem por cento mortal, apresenta hoje grande coeficiente de curas pelo uso de 100 a 150 comprimidos de sulfanilamida (4 a 6 por dia). As lesões blastomicóticas desaparecem totalmente, sendo substituidas por tecido conjuntivo cicatricial em todos os pontos em que anteriormente havia lesão específica. Tais casos têm sido de observação comum, principalmente entre os especialistas de São Paulo. Tem-se notado que a ação farmacodinâmica dessa droga é mais enérgica quando os comprimidos são chupados como balas ou mastigados demoradamente, pois-o contacto da substância com as lesões é assim muito maior.

Também em relação à leishmaniose, a sulfanilamida tem apresentado resultados bastante animadores, principalmente quando empregado como medicamento coadjuvante.

Sulfanilamida nas moléstias do nariz

Nas rinites purulentas a ação da sulfanilamida é escassa, quasi nula; o mesmo não acontece nas rinites cujo germe é o pneumocóco.

Sulfanilamidas nas sinusites

Como o agente etiológico nesses processos costuma ser o mesmo nas várias cavidades para-nasais, poderemos generalizar as indicações da sulfanilamida nas sinusites maxilar, frontal e esfenoidal aguda.

Das várias pesquizas praticadas por inúmeros autores sobre as secreções inflamatórias do nariz - local onde reside geralmente a causa das infecções em questão - verificou-se que o agente mais comum é o pneumocóco tipos II, III e IV, acompanhado de estreptocóco hemolítico, estafilocóco, bacilo da influenza, micrococus catarrhalis, etc. Nessas afecções, a sulfanilamida tem a sua maior aplicação, sempre auxiliada por medicamentos locais descongestionantes, e gerais de ação estimulante.

Imediatamente, sob a ação da sulfanilamida, o quadro térmico, se normaliza, as secreções se tornam mais fluidas e menos abundantes, a dôr diminue e a evolução para a cura é mais rápida.

Nos processos sinusais crônicos, nenhuma ação benéfica foi verificada quando se emprega a sulfanilamida. Entretanto, Hirsch-Lerent, citado por Nemirowsky, relata bons resultados em alguns casos de sinusite maxilar crônica, tratados por injeções endo-antrais de um composto sulfanilamidado solúvel em combinação com a glicerina iodoformada.

Têm os autores obtido resultados satisfatórios utilizando pulverizações endo-nasais de uma solução a 5% de sal sódico de Sulfatiazol repetidas cada 48 horas, dando ao pulverizador, direção adequada afim de que a substância chegue e penétre no meato médio.

Pulverizam-se 2 gramas de solução cada vez, e aconselha-se que o doente não assoe o nariz, até meia ou uma hora depois dessa prática, dando assim tempo para que o medicamento atúe.

Com esta técnica nota-se um rápido alívio dos sintomas, e em muitos casos, ligeira desobstrução nasal se faz notar no fim de 30 ou 60 minutos.

Referem os doentes que, algumas horas depois da pulverização, eliminam menor quantidade de pus pelas fossas nasais. Ao, exame, nota-se, ao cabo de algumas pulverizações, diminuição ou desaparecimento do pus, desaparecimento das crostas, diminuição, de volume dos cornetos, voltando a mucosa ao seu aspecto normal, readquirindo lentamente seu brilho natural.

As melhoras subjetivas são confirmadas, depois de certo tempo de tratamento, pelas chapas radiográficas.

O uso destas pulverizações não impede por completo a medicação clássica local que póde ser menos intensa.

Mais recentemente, Setembro de 1942, Brown aconselha a aplicação local, nos processos de sinusite, de sulfanilamida em pó.

Acha esse autor que nos casos de sinusite crônica purulenta, a sulfanilamida em pó parece ter melhor ação terapêutica do que em solução, provavelmente devido a seu maior contacto com a mucosa.

Recomenda empregar-se esse tratamento nos casos de pansinusite de um ou ambos os lados, nos casos em que existe não um, estado alérgico, mas uma infecção purulenta, que torna a operação, radical perigosa, no sentido da difusão da infecção principalmente no seio frontal. (2)

Sulfanilamida nas moléstias do ouvido

Otite média aguda: - E' sabido que esta afecção tem origem geralmente numa inflamação da naso-faringe, cujos germes, de virulência exaltada, invadem a trompa de Eustaquio e atingem a caixa do tímpano. A flora causadora é formada, na maioria, por estreptocócos, estafilocócos, pneumocócos, etc. predominando ora um, ora outro; desta maneira, deve-se não só tratar do ouvido como também da séde inicial, sem o que, qualquer terapêutica se torna insuficiente; no ouvido está perfeitamente indicada a sulfanilamida, que irá diminuir grandemente a evolução da moléstia, desde que seja tratada desde o início. Uma vez, porém, que a evolução da otite, média é mais avançada, o que se traduz por um tímpano abaulado, indicando a retenção de pus na caixa, a ação do medicamento é ineficaz para impedir a evolução, visto como a droga não se acha livre, para atuar sobre os germes, (tal como acontece quando os vasos sanguíneos superiores são bloqueados por trombose, como nas proximidades de um abcesso), e então se faz mistér a parancentese prévia, podendo-se aplicar, posteriormente, a sulfanilamida tanto geral, como localmente.

Nas otites médias agudas supuradas a ação da sulfanilamida é evidente. Em nossos casos, além de darmos a droga por via oral; utilizamo-la localmente aplicando a técnica (que será descrita adiante nos processos de otite média crônica supurada) e pudemos notar que os sintomas subjetivos melhoram imediatamente e a evolução clínica se abrevia, tornando-se a secreção mais fluida, progressivamente menor, até extinguir-se. Aconselha-se, porém, a prática do exame do pus para que se possa determinar o germe predominante, e, desta maneira, indicar-se a sulfanilamida adequada.

Enquanto não se obtiver o resultado do laboratório quanto ao germe predominante e como em geral é frequentemente o pneumocóco ou estafilocóco, a sulfadiazina parece ser o medicamento de escolha.

Nas otites médias necrosantes, por já existir uma necrose dos tecidos, a ação da sulfanilamida é pequena, como já foi dito, constituindo, porém elemento de grande valor terapêutico, no sentido de diminuir a ação nefasta dos germes-de associação.

Todo tratamento de otite média aguda tem como objetivo a redução da incidência da mastoidite cirúrgica. Levanta-se então a questão de se saber si é conveniente administrar até o seu máximo limite terapêutico, uma droga de comprovada toxidez, sendo esta maior ou menor, segundo a sensibilidade particular, e que ainda vai mascarar os sintomas de uma moléstia de baixa mortalidade e sem complicações em cerca de 90% dos casos.

A indicação dessa terapêutica é deixada à pratica do oto-rino-laringologista que se baseará nas variações periódicas, na virulência dos germes das infecções epidêmicas do aparelho respiratório que comprometem o ouvido médio.

Estabeleceram-se alguns princípios gerais para o uso das sulfanilamidas nas otites médias. Usam-se as sulfanilamidas:


l. - Nas infecções agudas fulminantes do ouvido médio produzindo sinais de comprometimento da mastoide no fim do segundo ou terceiro dia e caracterizadas por sepsia, profuso corrimento auricular, dôr e empastamento mastoideo. Neste tipo há frequentemente uma difusão da infecção por tromboflebite séptica das pequenas. veias comunicantes da mastoide;

2. - Nas infecções agudas do ouvido médio, sejam brandas ou severas, mas secundárias a um processo virulento na garganta, naso-faringe, nariz ou cavidades para-nasais. A quimioterapia, nestes casos, póde prevenir uma mastoidite supurativa pelo controle da infecção primária;

3. - Nas supurações do ouvido médio, precoces, agudas, de desenvolvimento rápido, caracterizadas por um tímpano avermelhado e edematoso, com um exudato sero-purulento ou sero-sanguíneo sob pressão no tímpano. Este é o tipo de infecção que póde extender-se rapidamente à mastoide, si não fôr prontamente tratada.

4. - Em todos os casos de otite média supurativa, cuja cultura revelou pneumocócos ; e

5. - Nos casos de otite média crônica perfurada, em que temos feito, depois de pequena higiene da caixa do tímpano, insuflações de sulfanilamida (de preferência sulfatiazol) no interior desta. Notamos com tal prática, além de grande diminuição da purgação, que esta se apresenta de fetidez diminuida ; e

Nos casos de otite média crônica colesteatomatosa, a aplicação de sulfanilamida local e geral é de resultado terapêutico nulo.

A sulfanilamida nas complicações otogênicas

A mastoidite é, das complicações da otite média, a mais frequente, devido à íntima relação que a mastoide tem com a. caixa do timpano, através do "additus ad antrum", assim se compreende como um processo patológico localizado na caixa do tímpano, tenha sua repercussão nas células mastoideas. Explica-se assim também a reação denominada de mastoidismo que se encontra no inicio de qualquer processo agudo no ouvido médio.

Quando a infecção se propaga nas células mastoideas, e nestas se estabelece uma necróse, temos verdadeiramente mastoidite. Assim sendo, os germes causadores da otite média aguda são os da mastoidite.

Nos processos mastoideos quando o agente é o pneumocócos múcosus, temos a considerar duas ações da sulfanilamida:

1 - Quando há exclusivamente uma reação da mastoide, o chamado mastoidismo, isto é, quando ainda não se processou a necróse das células mastoideas, a sulfanilamida tem evidente ação profilática, no sentido de evitar o estabelecimento, da infecção nessas células. Assim, autores há que citam estatísticas sobre 135 casos de otite média aguda tratados por sulfanilamidas, dos quais resultaram sómente 7 casos de mastoidites - 4 ½ % -, enquanto sobre 607 casos de otite tratados antes do advento da sulfanilamida, se originaram 138 mastoidites, ou seja 22%;

2 - Quando há células já necrosadas, todos os autores estão concordes em sustentar que não há nenhuma ação benéfica por parte da sulfanilamida, sob o ponto de vista curativo, sendo, como já foi referido, tais casos exclusivamente operatórios. Entretanto, temos observado alguns casos que se beneficiaram enormemente com aquela terapêutica, o que poude ser comprovado por radiografias feitas antes e depois desse tratamento. Na radiografia posterior ao tratamento verificamos uma eliminação de todo o trabeculado ósseo necrosado, tal como acontece quando se radiografa mastoide operada recentemente.

Contudo, a sulfoterapia nas otites médias e mastoidites requer cuidados por parte do especialista, pois às primeiras dóses da medicação as melhoras subjetivas se iniciam. Não deve, porém, dar-se por curado sem a confirmação radiografia da ausência de todo o processo infeccioso no osso, pois, póde essa melhora subjetiva mascarar o processo que ainda existe em evolução, e que virá a surgir posteriormente.

Mesmo nos casos cirúrgicos, depois da abertura e drenagem do fóco, podem-se ainda obter curas mais rápidas quando na região operada se faz a terapêutica pela sulfanilamida (pulverização), e ainda se administra por outra via essa terapêutica, durante vários dias após a operação.

A sulfadiazina é o medicamento de escolha, nestes casos, pois permite obter concentrações elevadas (8 a 12 mgrs. por c. c.) no liquor.

Pode-se também utilizar o sulfatiazol, que tem, porém, a desvantagem de ser tão rapidamente absorvido como eliminado.

As Sulfanilamidas nas meningites otogênicas

Outra grave complicação da otite média aguda e de caráter já bastante mais grave é a meningite. Na sua terapêutica, ao lado do processo cirúrgico, deve-se estabelecer a medicação pela, sulfanilamida e sulfadiazina, pois que estes sais passam com facilidade para o líquido céfalo-raquidiano, onde são encontrados numa concentração quasi igual à do sangue. Não se deve empregar o sulfatiazol, devido à sua dificuldade em passar para o liquor. A concentração que os autores indicam ser adequada para efeito sobre as meninges assim infectadas, é de 12 miligramas por 100 c.c., devendo-se manter nessa concentração 2 ou 3 dias depois que o líquido céfalo-raquidiano se tornou de aspecto normal.

Deve-se, seguida à eliminação do fóco séptico, prolongar a medicação por vários dias e não suspende-la bruscamente.

Apresenta-nos Tato estatística bastante elucidativa sôbre os resultados obtidos em casos de meningite otogênica tratados antes e depois do advento da sulfoterapia.

Com sulfanilamida Casos tratados Curados Mortalidade
Sem operação 6 6 0
Com operação 4 2 2
Com operação e soro 1 1 0
Total 11 9(81,82%) 2(18,18%)
Sem sulfanilamidas
Com operação 20 2(20%) 18(80%)

Baseado em suas observações e nas estrangeiras, preconiza o eminente mestre: Em todos os casos de meningite otogenica:

(a) Tratamento com doses eficazes pelas sulfanilamidas ou derivados. Preferentemente usar a via oral, com ou sem droga por via endorraquidiana. Nos casos em que não é tolerada a via oral, usar-se-á a parenteral, associada à endorraquidiana e também à retal.

(b) Eliminação do fóco otogenico, exceção dos casos de lesões regressiveis como são as de otocelulite aguda não complicada de outra lesão fóra de meningite, especialmente quando tudo evolue bem. Em caso de dúvida é preferível operar.

Como se vê, insistem os autores que a sulfanilamida não exclue o ato cirúrgico, pelo contrário, completa-o.

Sempre que num processo de meningite aguda se encontram lesões mastoideas ou petrosas, labirínticas tromboflebite do seio lateral, abcesso extradural, intradural, subdural ou encefálico, os autores são unânimes em se proceder à operação prévia. Quando se combinar o ato cirúrgico com o sulfoterapia, muitos são os resultados satisfatórios relatados, principalmente quando a infecção corre por conta de estreptocóco. Ainda, segundo Ombredanne, as sulfanilamidas reduzem grandemente o ato operatório, tornando-o uma simples mastoidectomia que, em caso de fracasso, deve ser ampliada.

Na trombóse do seio cavernoso poderão ser utilizados o Sulfatiazol ou Sulfadiazine, devendo-se então dar Heparina, em dóse suficiente, afim de manter entre 60 a 90 minutos, o tempo de coagulação.

As Sulfanilamidas nas moléstias da laringe

Laringite aguda: Dentro as laringites agudas a que interessa sob o ponto de vista da sulfoterapia é a fórma flegmonosa difusa ou localizada, constituindo esta última a epiglotite aguda, a qual pode tornar-se de extrema gravidade pelos transtornos asfíxicos que determina. São produzidas por germes variados, predominando o estreptocóco, o estafilocóco, e o pneumocóco. Aqui a sulfanilamida apresenta seu largo emprego, que deve ser usado mesmo depois de curado o processo.

Nos casos de flegmões graves da laringe já foram relatados casos que com o emprego da sulfanilamida, esta se apresenta de ação terapêutica enérgica, fazendo desaparecer qualquer possibilidade de abcesso laríngeo, e evitam-se muitas das futuras e certas traqueotomias pela suspensão do evolver do processo invasor e ameaçante de breve asfixia.

Mesmo, porém, nos casos em que não se poude evitar a traqueotomia, as sulfanilamidas estabelecem ótimas defesas, provocando a cura em tempo mais curto.

Conclusões

1 - A quimioterapia sulfanilamídica constitue arma poderosa e de largo manejo em oto-rino-laringologia;

2 - Sua ação é de comprovada eficácia nos processos estreptocócicos estafilocócico e pneumocócico;

3 - E' de grande conveniéncia conhecer-se, em todos os casos, o agente microbiano preponderante afim de se determinar o derivado sulfanilamidico mais eficaz;

4 - Em todas as otites agudas perfuradas ou não, está indicado o uso dessa droga, devendo ser administrada precocemente e em quantidade terapéutica;

5 - As complicações das otites agudas diminuiram, com o uso da sulfanilamida, de cerca de 50%;

6 - Nos processos de mastoidismo, isto é, quando não houve ainda necrose das células mastoideas, a sulfanilamida evita o aparecimento dessa necróse;

7 - Quando já se instalou a necrose das células mastoideas, a ação da sulfanilamida é escassa, quasi nula;

8 - O uso da sulfanilamida nas otites médias e suas complicações deve ser cuidadoso, pois pode mascarar a Infecção que ainda existe em evolução;

9 - Nas meningites otogénicas, a sulfanilamida apresenta-se de grande valor terapéutico, devido à enorme facilidade com que passa para o liquido céfalo-raquiano, indo diminuir acentuadamente o coeficiente de mortalidade dessa afecção;

10 - A sulfoterapia não exclue o ato cirúrgico (que deve eliminar o foco otogenico), antes completa-o, reduzindo-o a intervenção mais simples;

11 - Nas laringites agudas localizadas, a sulfoterapia evita a formação de abcessos laringeos.

BIBLIOGRAFIA

1) ARAUZ, IRURETA E DEL SEL: - "Consideraciones sobre la quimioterapia sulfamidica en Nariz, Garganta y Oido" In Anales de Oto-rino-laringologia del Uruguay, Tomo X, parte IV, 1940, Montevideo.
2) BOMPET: "Nuevas indicaciones de Sulfamidoterapia en Otorrinolaringologia" in Anales de Oto-rino-laringologia del Uruguay. Tomo XI, parte III e IV, 1941. Montevideo.
3) BROWN L.: - "Intrasinal Application of sulfonamide powder" in The Annals of otology, rhinology and laryngology. Vol LI, N.º 3, Setembro, 1942.
4) NEMIROVSKY S.: - "La quimioterapia sulfamidica en otorrinolaringologia" 1.ª e 2.ª Partes; in "Revista Médica de Rosario"; Ano XXXI, Nos. 5 e 6 Maio e Junho de 1941.

"No hospital, sob anestesia local, fazem-se
(1) uma resecção sub-mucosa, a não ser que o septo nasal esteja muito desviado do lado infectado;
(2) extirpa-se a metade anterior do corneto médio;
(3) com um forceps de esfenoide, alarga-se o osteo natural do antro até o mesmo atingir pelo menos três vezes seu tamanho normal;
(4) acha-se o dueto naso-frontal, removendo-se completamente as células anteriores etimoidais em redor;
(5) insere-se um raspador no dueto naso-frontal, sendo este canal alargado de modo que um cateter eustachiano
N.º 3, possa ser facilmente introduzido no seio frontal. (E' mister que a abertura no seio frontal seja
suficientemente grande para permitir o manejo folgado do cateter eustachiano N.º 3). Não se extirpam mais
células etimoidais, a não ser que as células posteriores ou o seio esfenoidal estejam igualmente infectados. Os
seios frontal e maxilar são cuidadosamente lavados com uma solução salina através de um cateter uretral
fléxivel N.º 6 F de uma seringa de 10 c.c. e agulha de 22, seguindo-se esta prática por uma injeção de ar da
seringa. Logo um cateter eustachiano, comumente um de N.° 2, é introduzido no seio frontal através da
abertura alargada.

Uma coluna de ar proveniente da pressão da parede ou de um pequeno compressor a motor, sob uma pressão
extremadamente baixa, é insuflada através do cateter frouxamente inserido.

Uma vez certos de que não existe obstáculo de circulação do ar do seio ao redor do cateter, (isto podendo ser determinado absolutamente pela inserção do cateter na abertura do seio frontal antes de injetar o ar), um pulverizador comum, enchido até a metade com o pó sulfanilamidico, é introduzido no extremo dilatado do cateter eustaquiano, ajustando-se a pressão do ar ao pulverizador.

Aplica-se suficiente - quantidade de pó através do cateter no seio, de tal modo a causar a saida de parte do pó em questão do seio pára o nariz.

Este procedimento repete-se no seio maxilar através do osteo natural alargado. Finalmente, uma pequena quantidade de pó é espalhada diretamente do pulverizador na região etimoidal anterior.

Só após uma ressecção submucosa faz-se o tamponamento nasal com gaze simples.

Trata-se de um tamponamento muito leve afim de manter em posição as azas septais, sendo retirado depois de uma 18 horas".




(1) Relatório apresentado na Secção de Medicina Geral, da Associação Paulista de Medicina, realizada em 29 e 30 de Abril de 1943.
(2) A técnica utilizada por Brown é a seguinte:
(3) Oto-rino-laringologista da Clinica da Faculdade de Medicina e da Policlínica de S. Paulo

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