Versão Inglês

Ano:  1946  Vol. 14   Ed. 4  - Julho - Agosto - ()

Seção: Trabalhos Originais

Páginas: 337 a 343

 

TRATAMENTO CIRÚRGICO DAS SINUSITES (*)

Autor(es): DR. MARIO 0TTONI DE REZENDE (**)

A estensão do tema não me permite discorrer, no espaço de tempo restrito de uma hora, sobre o quanto se possa dizer sobre ele. Assim sendo, vou limitar-me a falar, por alto, tocando em alguns pontos essenciais.

As sinusites dividem-se, sumàriamente, em agudas e crôricas. Nas agudas, a cirurgia deverá ser a mais restrita possível e empregada. tão sòmente, como auxiliar do tratamento conservador; e, não como método próprio de tratamento. A cirurgia, nestes casos, não deverá ser coisa de fato, mas mínima, a fim de que sejam evitadas complicações gravíssimas para o paciente. Em certos casos, pode constituir um crime o praticá-la.

Nas agudas, as punções e lavagens, a drenagem cirúrgica pelo meato inferior para o antro maxilar, a resecção da cabeça do corneto médio para melhoria da drenagem fronto etmoidal, a abertura do canal naso frontal por meio de raspas diversas praticadas com cuidado, a abertura da parede dos seios frontais no ponto de MOURET e nos casos de dores lancinantes, seguida de drenagem, constituem métodos permitidos, desde que o cirurgião atue com leveza de mão e com desgastes mínimos. Tôda intervenção outra, de maior amplitude, deverá ser evitada, por grandemente nociva, nos casos agudos.
As sinusites crônicas dividi-las-emos de acordo com o que clàssicamente se faz, em: - maxilares, etmoidais, frontais e esfenoidais.

A cirurgia das sinusites maxilares é praticada de várias formas. Primitivamente, DESAULT foi quem, pela primeira vez, abriu o seio maxilar pela fossa canina. Nessa época, a abertura da fossa canina não ia além de um orifício do tamanho necessário ao comportamento de um dedo mínimo. Por este orifício a mucosa era curetada, o orifício era tamponado, ficando aberto.

CALDWELL e em seguida LUC ampliaram - a intervenção e se constituíram, assim, pioneiros da intervenção que, hoje, traz os nomes de ambos. Não descreveremos sua técnica, propriamente dita, por demais conhecida. É feita pela via bucal com drenagem pela parte anterior do meato inferior. Modificada por CANFIELD, STURMANN praticou uma intervenção pela via endonasal, com incisão ao longo da abertura piriforme, seguida de afastamento e descolamento subperiostal dos tecidos da fossa canina, com resecção,de grande parte da parede óssea nasal e facial, conservando o corneto inferior.

O método de VACHER, é idêntico.

Outras técnicas, servindo mais para drenagem ampla pelo meato inferior, são as de MICKULICZ, abertura ampla pelo meato inferior; de COWPER, abandonada, mas infelizmente, ainda usada por algulks . cirurgiões dentistas, sendo praticada para lavagens, através dos alvéolos, comunicando com a cavidade do antromaxilar.

As sinusites frontais crônicas podem ser operadas.

1) pela via interna, 2) pela via externa.

Pela via interna, destacaremos dois métodos principais e mais um, outro não muito empregado, por ser defeituoso. HALLE idealizou e realizou um processo cirúrgico, inclusive o instrumental necessário, para tratamento das sinusites frontais pela via endonasal. Ele emprega a frase de sua invenção, montada num cabo revolver e movida a eletricidade. Pratica um retalho quadrangular, compreendendo todo o agger nasi, que é, em seguida, descolado e fica preso por seu bordo inferior ao nível do corneto inferior. Penetra no agger nasi com uma frese, e, por ele através das células etmoidais anteriores e posteriores, entra no seio frontal pelo seu soalho. Com outra frese, cortando somente nos bordos e não na ponta, como a primeira, desbasta a spina nasalis anterior, realizando uma comunicação larga e quase reta, entre o seio frontal e o meato médio: O corneto médio é afastado para a parte mediana, afim de, não só aumentar a visibilidade, como também de proteger a lâmina crivada, que se acha situada para dentro de sua inserção, na parede lateral do nariz. Todos os instrumentos devem ser dirigidos para fóra, na direção do ângulo interno da órbita. A operação de HALLE, quando bem realizada, dá resultados ótimos.

Os seios frontais podem, também, ser operados pela via transetmoidal e endonasal, muito bem descrita pelo Prof. JOÃO MARINHO, em seu magnífico livro sobre o tratamento das sinusites fronto-etmoidais. Dispenso-me, pois, de descrever, aqui, o desenvolvimento da técnica, magistralmente feito naquele esplêndidos trabalho. Direi, somente, que quando de sua realização minuciosa, tantos as células etmoidais, quanto o seio esfenoidal, e também o frontal, sofrem a ação benéfica do intervento cirúrgico, tal qual como o que se poderá realizar pela via maxilo-etmoido-fronto-esfenoidal de SIEUR e JACOB - PIETROANTONIO e ERMIRO DE LIMA.

MATTIS idealizou, executou e abandonou um método também transnasal, tendo como porta de entrada a fenda periforme - que era exposta tanto em sua face nasal interna quanto na face nasal externa e subperiostal até à parede anterior do seio frontal. Derrubada a fenda, entrava no etmóide anterior e em seguida, no posterior, abatendo a apófise montante do maxilar inferior. Abria o frontal no ponto de MOURET. Abandonou o método pela deficiência de visibilidade, ficando o seio frontal situado no fundo de um largo funil. Havia ainda a necessidade de dilatações sucessivas do canal operatório por meio de pinça nasal que era introduzida até o frontal e, em seguida, retirada aberta. Nada prático e bastante doloroso, acrescendo a tendência ao rápido fechamento do canal.

Pela via externa os seios frontais podem ser operados por vários processos, cada um deles representando um passo adiante do que o precedia, todos com o fito de, pela melhor drenagem E, limpeza, conseguir-se a cura completa da sinusite com sua desagradável secreção.

OGSTON, em 1884, foi o primeiro que. interveio sobre a parede anterior do seio frontal, abrindo um orifício ao nível da glabela, com drenagem pelo nariz. Já antes dele, em 1882, KOCHER preconizara, sem porém realiza-la, a destruição total da parede anterior do seio frontal.

KUHNT, em 1895, praticou a resecção total da parede anterior do seio frontal, sem, no entanto, fazer drenagem para o nariz. Quando o etmóide estava afetado, operava-o pelo nariz. TAPTAS modificou o processo, descendo a resecção da parede anterior do antro até seu soalho e drenando-o pelo etmóide, que ressecava praticando, também, a retirada da apófise frontal. Hoje, só a combinação KUHNT-TAPTAS é, ainda, usada por alguns especialistas.

KILLIAN, em 1903, apresentou seu método cirúrgico que consistia em resecção total da parede anterior e orbitária do seio frontal, com conservação de uma ponte compreendendo o rebordo supraorbitário e parte das paredes limítrofes dos seios. 9 método teve por fim evitar a deformação causada pelo processo de RIEDEL, que consistia em abater totalmente a parede anterior e orbitaria do seio, seguido de drenagem nasal. A técnica de KILLIAN é bem conhecida; seus pontos essenciais são: a conservação da ponte supraorbitária com seu periósteo; b) preservação da troclea, cuja inserção vai até o rebordo inferior e interno da órbita, alcançando, às vezes, o foramen supraorbitário. Sutura-a neste bordo quando deslocada. MARSCHIK, além de várias modificações concernentes à forma e localização da ponte, quer que se .conserve, sobre ela, não só o periósteo, mas também
as partes moles.

É método para os seios grandes. Quando da fratura da ponte, ele não poderá ser executado.

IANSEN reseca totalmente a parede orbitária do seio frontal, com conservação de sua parede anterior. Tôda a técnica visa, não só a cura da sinusite, como e sobretudo qualquer deformação, ulterior. A desvantagem se apresenta nos seios grandes, por ser diminuta a visibilidade e difícil a limpeza completa da cavidade.

RITTER procurou melhorar este inconveniente, abrindo uma janela na parede anterior do seio, e, por ela, curetando a cavidade, tal como fez OGSTON e LAURENS. RITTER, retomando o método abandonado Por seu autor, praticou a resecção do bordo iferior da parede anterior e melhorou a visibilidade intracavitária, tornando-o assim o nosso melhor processo cirúrgico para a intervenção radical nos seios frontais pequenos e tamanho médio.

A intervenção em ambos os seios frontais, em um só tempo, foi praticada ppr LOTHROP - e melhorada por SEBILEAU, e, mais tarde, por MOULONGUET; consiste ela na abertura de ambos os seios frontais, incisão em asa de morcego através o dorso da raiz, resecção do soalho de ambos os seios ou de um só, alisamento da crista nasal anterior e destruição do tabique intersinusal e da parte postero-superior do septo nasal, curetagem minuciosa e esvasiamento completo do etmóide, que poderá ser prèviamente praticado por via nasal. A drenagem obtida é de grande amplitude, e muito dificilmente estenosará. A intervenção é, particularmente, indicada para os casos de sinusites fronto-etmoidais crônicas e bilaterais. Os perigos são os decorrentes da resecção do septo intersinusal em sua parte antero-inferior, e causados pela lâmina crivada e apófise crista-galli que, ambas, correm o risco de fratura, com complicações endocranianas.

MOULONGUET é grande admirador do método, considerando-o o que melhores garantias fornece a uma cura radical das sinusites frontais crônicas.

BRIEGER e SCH'ONBORN idealizaram o método osteoplástico, praticado pela resecção temporária da taboa externa do frontal por meio de um retalho ósteo-periósteto-cutâneo, pela abertura do, seio frontal e canal naso-frontal, seguida de curetagem; pelo tamponamento a gaze iodoformada e tubo drenagem pelo nariz; pela reposição do retalho e sua justaposição; e, finalmente, sutura. A intervenção não deu bons resultados, devido ao espaço morto que dela resultava. Abandonada, foi mais tarde modificada, quanto a melhor imagem, por HAJEK e WINCKLER.

O labirinto etmoidal poderá ser operado, tanto pela via endonasal, quanto pela via externa. - Sobre esses métodos já nos referimos, quando falamos sobre as intervenções dos seios frontais. Muito raramente constituem ele ato cirúrgico ,autónomo, estando o labirinto etmoidal, como está, metido em cunha, entre os vários da face e sofrendo, quase sempre, suas influências patológicas.

Além da via direta endonasal, e da indireta pela via externa citaremos de passagem, o método transmaxilar, de IANSEN e WINKLER, que alcança o etmóide, e o esvazia, por esta via, penetrando pelo ângulo superoposterior da parede nasal do antro maxilar. Quando necessário, também, o seio esfenoidal era aberto por este caminho. O inconveniente que o processo apresenta é o de ficarem fechadas as células, infundibulares. Ele era usado nos tumores do seio maxilar, invadindo o etmóide.

Há, ainda, si bem que pouco usado, pelos perigos e complicações possíveis, o processo que aconselha a retirada em massa do labirinto etmoidal - REAVESMOSHER-BALLANGER e HAYS- foram os precursores deste modo de atuar. Vimo-lo aplicado, experimentalmente em cadáver, aqui em São Paulo, pelo Prof. SIMANSKI, quando professor da Faculdade de Medicina de Curitiba. Ele retirou o etmóide num bloco, por meio da faca apropriada idealizada por BALLANGER. - Nunca tivemos a coragem de aplicá-lo. Seu maior inconveniente era a ozena cirúrgica.

Os seios esfenoidais podem ser alcançados tanto pela via endonasal, quanto pela via externa. Dois são os processos cirúrgicos pela via endonasal : - - o transetmoidal, com resecção do corneto médio, aconselhado e idealizado por HAJEK, e o trans septal de HIRSCH-SEGURA, já praticado, anteriormente, por SPIESS e WATSON WILLIAM, tendo este ocasião de abrir um empiema bilateral do esfenóide por esta via.

Também foi utilizada por IANSEN, a via transmaxilo-etmoidal, com resecção da cauda do corneto médio. - FURET praticou-a sem intervir sobre o etmóide.

GUISEZ, num caso de abcesso da órbita, abriu o etmóide e, também, o esfenóide por esta via.

KILLIAN abriu o seio esfenoidal, após esvasiar o etmóide no decurso de sua operação, seguida de resecção do processo frontal do maxilar superior.

A via peroral, transpalato, foi executada nos casos de tumores, sequestros ósseos, corpos extranhos (projectis). É operação difícil e correndo certo perigo, devida à grande espessura da parede inferior do seio esfenoidal e a presença, no interior do mesmo e junto ao soalho, da artéria e nervo vidiano.

Entre os processos cirúrgicos mixtos empregados no tratamento das Pansinusites, citaremos os de CALICETI e o transmaxilo-etmóido-fronto-esfenoida1 imaginado por SIEUR e JACOB, realizado por LUC, aperfeiçoado e sistematizado por PIETROANTONIO e, entre nós, por ERMIRO DE LIMA e MAURO PENNA.

CALICETI abre, inicialmente, como primeiro tempo do, ato cirúrgico, o etmóide anterior, ampliando, por meio dos raspadores de WATSON WILLIANS ou VACHER, o canal naso-frontal, pela destruição das células etmoidais anteriores. Se esta intervenção não fosse suficiente para a cura, praticava, em seguida, o 2.° tempo operatório, que consistia no esvasiamento do etmóide, pela via externa, com resecção da spina nasalis anterior. A porcentagem de curas, na opinião do autor, era bastante elevada.

A via transmaxilar, para a cura das pansinusites, foi sistematizada, e realizada inúmeras vezes, entre nós, por ERMIRO DE LIMA e MAURO PENNA, tornando-a grandemente vulgarizada no Brasil, e em alguns Países sul-americanos. Não vejo necessidade de uma descrição do processo pois que os especialistas brasileiros manejam-no, hoje, com grande desembaraço e afinamento de técnica. Ainda há pouco tempo, o Prof. JOÃO MARINHO descreveu-o, com rara clareza e magnífica documentação, quando teve ocasião de expôr, no Primeiro Congresso sul-americano de Otorrinolaringologia reunido em Buenos-Aires, o têma "Da sinusite fronto-etmoidal e seu tratamento". Aí, o Prof. MARINHO não só descreveu, em suas minúcias anatômicas, o etmóide, o frontal, como discutiu as melhores vias de acesso para a prática de seu esvasiamento total e drenagem ampla, e apresentou os pontos essenciais das diferentes técnicas descritas, para que a intervenção tivesse resultado completo e para que a vida do paciente não corresse perigo. Aos que desejarem bem conhecer o assunto, não há senão ler a exposição magistral do eminente mestre.

As pequenas modificações introduzidas, recentemente, por ERMIRO DE LIMA, na técnica primitiva de seu processo, tornaram-na ainda mais eficiente.




(*) - Relatório apresentada à Associação Paulista de Medicina (secção de Otorrinolaringologia e Cirurgia Plástica) em 17-5-1945.
(**) - Chefe da Clínica de Otorrinolaringologia Misericórdia de São Paulo.

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