Versão Inglês

Ano:  1951  Vol. 19   Ed. 6  - Novembro - Dezembro - ()

Seção: Notas Clínicas

Páginas: 210 a 214

 

MUCOCELE ETMOIDAL SIMULANDO TUMOR MALIGNO (*)

Autor(es): Antonio Corrêa (**)

(Caso Clinico)

O presente caso que trazemos à consideração dos colegas, tem o seu maior interesse ria questão diagnóstica, mostrando a necessidade dos detalhes radiológicos, e da comprovação histopatológica, antes de iniciarmos qualquer terapêutica nos doentes suspeitos de tumor maligno.

Observação - M. G. F., do sexo masculino, branco, com 17 anos de idade, foi matriculado no Hospital das Clínicas da Faculdade sob o n.° 184.398 em 9 de agosto de 1950, com a seguinte historia: - Conta que há 2 anos apareceu um tumor no canto interno do olho esquerdo, ao qual se seguiu dificuldade respiratoria nasal do mesmo lado. Como piorasse esses sintomas, decorrido 1 ano, procurou médico em Campinas, sendo-lhe indicado e feito aplicações de raios X sobre a região tumoral, sem qualquer exame de laboratorio prévio. Não sabe informar a técnica do tratamento roentgenterápico, mas conta que diminuiu o tumor e a obstrução nasal por algum tempo, sem desaparecimento completo dos sintomas.

Decorridos alguns meses, os ditos sintomas se acentuaram, num gráu maior do que antes do tratamento.

Relata que nunca teve dôres ou hemorragias.

Em agosto ultimo procurou o Hospital das Clínicas, sendo encaminhado à Clínica Oftalmológica, onde foi constatada a existencia de exoftalmo do O. E. por tumoração do canto interno da orbita, sem lesões neuro-musculares do aparelho ocular (Jorge Wilmersdorf) ), e encaminhado à Clínica O. R. L. devido a suspeita de tumor da fossa nasal E.

Exame O. R. L. - Tumor do canto interno do O. E., acompanhado de lesão ulcero-crostosa da pele da região, e acentuado exoftalmo para fóra e para cima. (Fig. 1). Mobilidade conservada do globo ocular E, notando-se ligeira epifora.

A pele que recobre o tumor está livre e elastica, sobre o plano osseo, excepto ao nivel da ulceração.

Fossas nasais: - fossa nasal E obstruida por uma formação tumoral lobulada, rosca, que fecha a abertura vestibular, e desvia o septo cartilaginoso para D, acarretando obstrução também da fossa nasal D. Pela rinoscopia posterior evidencia-se o tumor com o mesmo aspecto anterior, fechando a conta E.

O exame da boca e faringe, somente revela, pela palpação, abaulamento da parede anterior do antro maxilar esquerdo.

O exame radiográfico das fossas nasais e cavidades paranasais, em posições naso-mento, e naso-fronto, mostram sinais de um processo tumoral comprometendo a região maxilar e orbitaria conforme relatorio do Prof. Raphael de Barros: destruição do rebordo orbitario inferior e interno; destruição da parede interna do antro; obscuridade dos seios maxilares e fossas nasaes" (Fig. n.° 2).

Com esses dados clínicos e radiolôgicos, suspeitos de um tumor do massiço maxilo-etmoidal, fizemos uma biopsia, da extremidade anterior do tumor endonasal E, e pedimos exame histopatologico, cujo resultado foi "processo inflamatorio crônico sem sinais de malignidade" (Dra. Maria Luiza M. T. de Lima).



Fig. 1



M. G. F. - Mucocele etmoidal esquerda, acarretando exoftalmo, obstrução nasal, latero-desvio da piramide nasal, abaulamento do ramo montante do maxilar E e obstrução das vias lacrimais à E.

Considerando a possibilidade de unta biopsia insufiicente, internemos o. paciente na Clínica O. R. L. e fizemos uma segunda intervenção na fossa nasal E, procurando retirar um fragmento maior do tumor.

Com essa intervenção esclarecemos o caso clínico, porque ao ser feita a extirpação do fragmento tumoral com pança saca-bocado, abrimos, cavidade, dando saida à um liquido espesso, cremoso e esverdeado, semelhante ao encontrado em casos de mucocele.

MUCOCELE ETMOIDAL SIMULANDO TUMOR MALIGNO

Pudemos constatar então que o suspeito tumor endonasal era o corneto médio hipertrofiado, e, toda a parede nasal externa recalcada para dentro, provocando fechamento da fossa nasal respectiva e tambem desviando o septo nasal para o lado direito.

Fizemos a limpeza da cavidade cistica pela abertura da biopsia, e não notamos sinais de degeneração maligna nem no seu contendo e nem nas suas paredes.

O exame histopatologico pela segunda vez, negou a existencia de malignidade, e novo exame radiografico agora com melhor orientação clínica, e com a cavidade cistica cheia de ar, veio confirmar a hipotese de mucocele etmoidal. O relatorio do Prof. Raphael de Barros foi o seguinte "acentuado dismorfismo anatomico com recalcamento da região nasal e maxilar; não há sinais de processos destrutivos. Sinais de um processo tumoral expansivo de natureza benigna". (Fig. n.° 3).



Fig. 2



Mucocele etmoidal E. - Radiografia: "destruição do rebordo orbitario inferior e interno; destruição da parede interna do antro e obscuridade dos raios maxilares e antro". (A.C.)

Completados os exames pré-operatorios, fizemos a intervenção no dia 25.9.50, e que consistiu numa sinusotomia maxilo-etmoidal, por via bucal. O achado operatorio comprovou a existencia de uma cavidade cistica etmoidal E, com recalcamento da parede orbitaria para fora e para cima, e do antro maxilar para frente e pra fora.



Fig. 3



Mucocele etmoidal E, esvasiada, cheia de ar. Radiografia: "recalcamento da região nasal e maxilar; sinais de um processo tumoral expansivo de natureza benigna". (A.C.)

O antro maxilar, de volume reduzido, apresentava infecção crônica supurativa (pus e hiperplasia da mucosa). A cavidade cistica etmoidal recobert ade capsula fina, que foi extirpada, recalcava também a parede nasal para dentro. O post-operatorio decorreu sem complicações, e o paciente teve alta após 30 dias da intervenção, com as fossas nasais e vias lacrimais permeaveis, além de notavel redução dos abaulamentos das paredes ósseas.

COMENTARIOS

No presente caso, vimos que a negatividade do exame histopatológico para um processo maligno, fez com que a revisão do exame clínico e radiográfico e a segunda biopsia com mais cuidado e detalhe, permitiram mudar completamente a suspeita diagnóstica.

No exame clínico, o aspecto dos cornetos deslocado das suas posições, e associado à infecção secundaria, deu ao primeiro exame impressão de tumor maligno, que numa inspecção mais cuidadosa e sem espirito preconcebido, não teria tanta base, dada a ausencia de tecido degenerado.

No reexame da primeira radiografia, depois de levantada a suspeita de mucocele, pudemos encontrar os sinais de tumor benigno, tais como o deslocamento da lamina papiracea e das paredes do antro.

Si os fatos citados acima orientaram o diagnóstico para um processo benigno, no entanto haviam dados que desde inicio encaminhavam o espirito do otorrinolaringologista para um cancer. Assim, a ulceração da pele do canto interno da orbita (Ca. do etmoide?); a historia de uma redução dos sintomas pelas aplicações de raios X; o tumor endonasal e as lesões ósseas destrutivas nas radiografias, estavam nos orientando para um diagnóstico de malignidade.

Talvez a importancia que damos ao esclarecimento histopatológico dos casos de tumores, adquiriu maior valor no caso desse paciente, possibilitando um diagnóstico e uma resolução muito mais favoravel.

RESUMO

O A. apresenta -um caso de mucocele etmoidal gigante, cujo aspecto clínico e radiológico fez suspeitar de tumor maligno. Uma intervenção endo-nasal para obtenção de material de exame histopatologico, acidentalmente abria uma cavidade cistica, permitindo com um exame mais detalhado da região, confirmar o diganostico de mucocele feita documentação fotográfica e radiográfica do caso.




(*) Apresentado à secção de O.R.L. cia A: P. M. em 17-8-51.
(**) Assistente da Clínica O.R.L. da Faculd. de Med. da U. S. P.

Imprimir:

BJORL

 

 

 

 

Voltar Voltar      Topo Topo

 

GN1
All rights reserved - 1933 / 2024 © - Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico Facial