Versão Inglês

Ano:  1940  Vol. 8   Ed. 4  - Julho - Agosto - ()

Seção: Trabalhos Originais

Páginas: 265 a 267

 

ULCERA PERFURANTE DO SEPTO (ULCERA DE HAJEK) (*)

Autor(es): DR. ERNESTO MOREIRA

S. PAULO

Definição. Tambem chamada ulcera simples, ulcera redonda, é, uma necrose progressiva de evolução crônica, localisada na região anterior da mucosa do septo e da cartilagem quadrangular. Inicia-se invariavelmente por hemorragia da mucosa.

Etiologia. E' relativamente frequente a perfuração do septo cartilaginoso. Para certos autores, tratar-se-ia de uma afecção congenita, mas, jamais, foi encontrada nos embriões e nos recemnascidos. E' portanto uma afecção adquirida. Molestia essencialmente local. Hajek, Zuckerkandl, Voltolini, não admitem que seja produzida pela tuberculose, sifilis, lupus. Na realidade é uma ulcera hemorragica que se produz no ponto de eleição das hemorragias do septo, aparecendo espontaneamente, e, favorecida pelo traumatismo, irritação, poeiras, vapores irritantes, e, sobretudo pelas unhas donde a denominação vulgar de dedose.

Por essas diversas influencias, a hemorragia se processa no tecido mucoso, realisando o que Zuckerkandl denominou xantose. E' um estado da mucosa nasal, caracterizado por uma côr amarelo-fusco, metamorfose sofrida pelo estroma seguidamente ás hemorragias internas. A xantose é, segundo o mesmo autor, a causa predisponente essencial da ulcera perfurante.

Potiquet, vai procurar a causa desta afecção no orgão de Jacobson que teria aqui o papel de receptáculo de micróbios. Rosenfeld atribue a uma trofonevrose do septo cartilaginoso coco causa responsavel.

Anatomia patologica. O tamanho da ulcera varia desde ao de uma cabeça de alfinete ao de uma moeda de 200 réis. De fórma arredondada ou ovalar, localisa-se na porção anterior do septo cartilaginoso. Excepcionalmente atinge o septo cutâneo assim como o ósseo. Assim limitada a uma porção da cartilagem a ulceração jamais comprometerá a solidez do arcabouço nasal. A marcha da ulcera é lenta. O processo se inicia geralmente pelo revestimento mucoso de um dos lados do septo, raramente pelos dois. A infecção se continua a produzir, as camadas superficiais necrosam pondo a mostra a cartilagem. Produz-se então a perfuração do septo.

Sintomas. Incidioso geralmente no inicio, passando despercebido ao doente, fato este observado sobretudo nas crianças. Ha um caso curioso na literatura, um senhor com grande surpresa notou que seu filho havia atravessado o nariz com um pequeno pedaço de madeira "para brincar de selvagem" e só então descobriu que essa criança era portadora de uma perfuração do septo. A ulcera se manifesta de ordinario por uma secreção sanguinea levemente purulenta, ou por crostas que se desprendem mecanicamente ou no assoar-se, ou pela unha. O desenvolvimento da ulcera é indolor. O esqueleto nasal não sofre nenhuma modificação.

Diagnostico. A perda de substancia consecutiva a um abcesso do septo difere muito da de uma ulcera perfurante não só pela sua historia como pela sua dimensão. Em varias molestias como na difteria gangrenosa, no mal de Bright, na febre tifóide, tem sido encontrada a ulcera perfurante, porém justificada por uma moleslia geral ou por um transtorno na circulação nasal. O diagnostico diferencial da ulcera perfurante deve ser feito: com a perfuração luetica, com a perfuração tuberculosa, e, não mencionaremos a perfuração cirurgica que o ato operatorio esclarecerá. A sifilis terciaria determina perfurações septais, porém o aspéto, séde, e conformação das bordas são inteiramente diferentes. A ulcera é dolorosa, as crostas mal cheirosas havendo deformação do esqueleto nasal. A evolução muito mais rápida. A perfuração tuberculosa, é diagnosticada secundariamente em um tuberculoso adiantado e o aspéto que apresenta é inteiramente diverso da ulcera simples.

Prognostico. Benigno. A ulcera não causa deformação esterna nem perturbação funcional. Entretanto certos doentes preocupam-se seriamente com o seu mal, causando ás vezes estado neurastênico.

Tratamento. De inicio cuidar das epistaxes repetidas, depois que se instalar a perfuração apenas tratamento higiênico com o fim de remover as crostas, de modo que estas sejam eliminadas espontaneamente, jamais retiradas com as unhas. Uso constante de uma pomada inerte.

OBSERVAÇÃO

D. R. R., 19 anos, solteira, brasileira, residente nesta capital, ha 4 anos. Ha um ano mais ou menos, foi examinada por profissional especialista que constatou desvio do septo e hipertrofia da mucosa dos cornetos inferiores. Foi aconselhada a operação, mas, como o colega havia se ausentado, ficara a intervenção adiada. Na ausencia do colega, teve uma hemorragia muito forte (epistaxes) para o lado direito. Foi então nessa ocasião examinada por outro especialista que então verificou já a perfuração do septo cartilaginoso. As hipoteses e opiniões do medico especialista foram as mais variadas possiveis: sifilis, tuberculose, mal de Hansen, leishmaniose, deformação do arcabouço nasal, isto é, queda do nariz. Desesperada com tantos prognostico apavorantes, de novo volta ao colega que então havia regressado de sua viagem. Este verifica a ulcera já perfurada e, acalma o espírito atribulado da senhorita. Esta, porém, ainda sob a impressão desesperada de ficar deformada recorre a outro colega que ma enviou ao serviço da Santa Casa. Inteiramente desnorteada, acabrunhada, prefere á morte á deformação do nariz. A pessoa que a acompanha solicita com franqueza minha opinião sobre o caso. E' bem de ver que, si a lesão patologica quasi nada tem de importancia, o mesmo não se dá com o estado moral da paciente. Opinei como já havia dito o colega que nada de importancia havia. Desta banal observação tirarão os colegas o simples ensinamento que o diagnostico bem orientado, e, um pouco de bom senso, na maior das vezes resolve situações embaraçosas.




(*) Trabalho apresentado á Secção de O.R.L. da Associação Paulista de Medicina em 18-5-1940.

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