Melanoma Maligno da Fossa Nasal - Relato de sem Caso Clínico*
Autor(es):
Osvaldo B. Müller 1,
Alexis Geremio 2
João Grigoletti Scholl 3
Introdução
O melanoma maligno nas vias aéreas superiores, e, principalmente do septo nasal, é uma entidade rara e, geralmente esquecido quando se elaboram hipóteses diagnósticas sôbre tumores malignos da fossa nasal.
Êste trabalho relata um caso de melanoma maligno do septo nasal, e analisa os resultados do tratamento escolhido, após 8 meses de evolução.
Caso Clínico
S. G., 69 a., fem., branca, doméstica, brasileira e natural do Estado de Sta. Catarina. Relata a paciente que há um ano notou obstrução na fossa nasal esquerda, e hemorragias freqüentes pelo nariz. Fêz polipectomia e 20 aplicações de cobalto. Os sintomas reapareceram há 4 mêses comprometendo também a fossa nasal direita. Consultou, nessa fase, nosso Serviço; constatou-se que a região anterior do septo estava invadida, bilateralmente, por um tumor vegetante, polipóide, pardo-escuro, friável e hemorrágico, que se infiltrava em ambas as asas da (pirâmide nasal (fig. 1). Na fossa nasal direita a tumoração fazia saliência, dilatando e obstruindo complemente o vestíbulo dêsse lado. No lado esquerdo, o tumor tinha aspecto ulcerado, menos desenvolvido, apresentando sinais de infecção secundária, inclusive com eliminação de secreção purulenta e exalação de mau odor.
A biópsia revelou ser um melanoma maligno (fig. 4). Foi feita exerese da pirâmide nasal e do septo em 23.09.1970 (fig. 2). A biópsia dos limites da incisão cirúrgica não manifestou infiltração neoplásica (fig. 2).
Como a paciente apresentasse cefaléia atípica e de pequena intensidade, foi realizado exame neurológico que estava normal.
Após a alta, retornou, periòdicamente, ao Serviço para exames de controle, fixando-se em 1 ano o prazo para a colocação de prótese, caso não houvesse recidiva local. Em 10.03.1971 surgiu uma lesão com as características acima descritas no limite cirúrgico do lado direito (figs. 3 e 5). A exerése da recidiva local foi realizada em 06.04.1971. A paciente continua sob controle.
FIG. 1 - "Aspecto da paciente quando consultou nosso Serviço. Nota-se tumoração no vestíbulo nasal direito e ulceração no vestíbulo nasal esquerdo".
FIG. 2 - "Paciente após a primeira intervenção. Ressecção completa da pirâmide nasal. Os bordos cirúrgicos sem infiltração neoplásica."
FIG. 3 - "Presença de tumor recidivante no limite cirúrgico do lado direito".
FIG 4 - "Melanoma maligno: proliferação carcinomatosa de células atípicas, vacuoladas, com elevado índice de mitose e produção de pigmento melânico."
FIG. 5 - "Melanoma maligno da fossa nasal: mucosa atrófica, com proliferação carcinomatosa, sub-mucosa, formada por células atípicas, vacuoladas, que invadem focalmente a camada basilar da mucosa."
FIG. 6 - "O gráfico mostra, na vertical, o n' de células do tumor com o respectivo pêso do mesmo. Observe-se que, até um aumento de 29 vêzes o tumor não manifesta sintomas. Com pêso de 0,38 g., o que corresponde à 1,9 x 108 células, os sintomas aparecem. Da primeira manifestação do tumor até o momento da biópsia, decorrem, em média, 4 meses, quando então o tumor está com 1,5 g. e 7,5 x 108 células.
Feita a biópsia, por mais radical que seja, resta em média 5% do tumor primitivo, o que corresponde a 9,075 g. e 3,8 x 108 células, e o paciente fica assintomático. No terceiro ramo do gráfico, está representada a evolução do tumor, sem tratamento, levando o paciente á morte em aproximadamente 2,3 anos. Neste período o tumor cresceu 14 vêzes, está com 11,0 g. e 5,5 x 1011 células. É êste terceiro ramo do gráfico que pode ser modificado em função ao tratamento escolhido, e nos permite avaliar a sua eficácia, em relação a outros."
Discussão
Os melanomas do rinofaringe tem incidência ele 1,5% a 3% sobre os melanomas do organismo8,9. Duas pessoas entre cem mil são atingidas por melanomas, e cêrca de 1% dêsses ocorrem nas fossas nasais 5. Atingem preferencialmente o sexo masculino, embora tenham sido encontrados no sexo feminino6. A raça mais atingida é a caucasiana, sendo rara nos negros onde a incidência é de 16%, segundo a literatura médica, u. É mais freqüente em pessoas de 50 à 70 anos.
A obstrução nasal e as epistaxes são as manifestações usuais do melanoma da fossa nasal, atingindo 90% dos casos4,6. Os pacientes apresentam também dor, representando 10% dos casos4. Quando a localização do tumor é no seio paranasal, êste sintoma é precedido por uma parestesia sôbre a pele do seio afetados, 7.
Polipectomia prévia é relatada em 13% dos casos. A duração entre a primeira manifestação do tumor e a realização da biópsia varia bastante, dando uma média de quatro mêses4, o que corresponderia no gráfico (fig. 6) a um tumor com contendo, aproximadamente 7,5 x 108 de células.
O aspecto citológico varia muito, e se assemelha a outros tumores quando a melanina é esparsa4. Pode ser confundido com: carcinoma anaplásico, angiormiosarcorma, sarcoma de células reticulares, carcinoma de células transicionais, rabdomiossarcoma de células embrionárias e Schwanoma malignos. O pigmento melânico deve ser encontrado para confirmação do diagnóstico, embora isso nem sempre seja possível, utilizando os métodos usuais de coloração4. O diagnóstico nêsse caso só deveria ser feito quando o corte apresentar as seguintes particularidades: a técnica de coloração com Fontana positiva, o pigmento for passivel de descoloração pelo métode do permanganato-oxalato, e a coloração para pigmento férrico como a hemossiderina fôr negativa4.
O prognóstico é desfavorável quando histològicamente existe: - invasão da dermeatividade mitótica, pouca relação linfócito e célula plasmática (imunidade), invasão linfática e ulceração2. O prognóstico desfavorável não tem relação com a forma das células, o grau de pigmentação, atividade juncional lateral, presença, de nevos prévios - e encapsulamento2.
No que se refere à morfologia e coloração, êsses tumores se apresentam de maneira bastante diversificada4. Dependendo da intensidade de impregnação com melanina, a côr varia de branca à prêta, passando por côr rosa, vermelha e marrom4,6. A consistência pode ser necrótica, friável, granular, gelatinosa ou cística6.
A origem dêsses tumores é controvertida. Pensa-se que provenham de melanócitos embora sómente em alguns casos foram encontradas mudanças juncionais4. Segundo Allen' a atividade da junção é patognombnica e diferente da invasão passiva do revestimento pela neoplasia.
0 lugar mais freqüente de implantação dêsses tumores é o septo nasais. Raramenf, atinge os seios paranasais. Na especialidade, as fossas nasais são os locais de eleição para a localização de melanomass.
A maior parte dos casos apresentam sobrevida de 3 a 4 anos, havendo um caso com 8 anos. Clinicamente, todos os doentes com mais de 6,5 anos têm sobrevida prolongada a evolução é mais benigna nessa fase etária, face a menor atividade mitótica.
Somente 11% dos 226 casos que a literatura mundial relata, sobreviveram cinco anos, sendo que dez anos de sobrevida só ocorreu em 0,5% dos casos4.
A discordância entre a freqüência das metástases à distância e a raridade relativa das adenopatias cervicais. De 20- casos, 15 morreram com metástases à distância sem adenopatia cervical. As metástases atingem preferencialmente os pulmões, cérebro, esqueleto e fígados, 6. As suprarenais foram envolvidas em 8 pacientese.
A gravidade dos melanomas do rinofaringe está na dependência de quatro fatores: sòmente após várias biópsias consegue-se fazer a diagnóstico do tumor; cavidade: profundas e ocultas permitem metástases precoces e graves; a abordagem cirúrgica é difícil e as lesões são mais suscetíveis à infecção que os tumores da pele3.
Do ponto de vista terapêutico, o tratamento mais indicado para êsses tumores é a cirurgia, sempre mais ampla possíveis. A sobrevida é de 31 meses quando os pacientes são tratados cirúrgicamente; 43 meses quando a cirurgia é seguida por radiações; sòmente o emprêgo de radiação oferece uma sobrevida de 9 meses6. Os tumores melânicos são pouco pesquisados, mostrando-se em alguns casos ineficientes9,6. os nódulos regionais são retirados somente quando palpáveis. Não se tem experiência, no que se refere à abolição da atividade hipofisiária, seja por medicamentos ou cirurgias. Entre os antiblásticos, os mais empregados são os Metrotrexate, compostos nitrogenados e carboxamidas, que podem dar 20% de remissãos.
A avaliação da evolução, considerando o tratamento escolhido, seja êle cirúrgico. radioterápico ou combinado, pode ser feita através do gráfico (fig. 6).
Resultados e Conclusões
O resultado das biópsias realizadas antes de cada intervenção revelou a existência de melanoma rico em melanina, fàcilmente identificado pelas técnicas usuais de coloração, sem que se fizesse necessário o emprêgo de técnicas mais elaboradas para a confirmação diagnóstica.
O tratamento escolhido foi o cirúrgico, através do que se fêz a exérese da pirâmide nasal, já que ambas as asas estavam infiltradas.
A observação clínica da paciente, feita periòdicamente, durante 8 meses, mostrou uma recidiva tumoral no lado direito da orla da incisão cirúrgica, quase ao nível da base da pirâmide nasal removida.
O exame anátomo-patológico, realizado em pontos diferentes nos limites cirúrgicos. após a primeira intervenção não revelou células neoplásicas e melanina, seja porque a escassez désses elementos não tornou possível a sua identificação com as técnicas usuais de coloração, seja porque, os fragmentos coletados não continham, de fato, restos de células de melanoma. Por outro lado, a ausência de gânglios cervicais e maxilares palpáveis não exclui a possibilidade de metástase à distância, que, uma vez presentes, tornam o prognóstico reservado e contraindicam a remoção da recidiva local, cingindo-se o tratamento à radioterapia e antiblásticos usados juntos ou isoladamente.
Como a paciente não apresentasse nenhuma manifestação sistêmica que pudesse ser conseqüência de metástase, foi feita a exérese da recidiva local, estando os bordos cirúrgicos livres de neoplasia como demonstrou o último exame anátomo-patológico.
Summary
The authors of this paper present one case of malignant melanoma of nasal septum, and comment the various aspects of this tumor, regarding the consulted bibliography. The events during eight months after two surgical interventions are commented.
Bibliografia
1. Anela, M., de Brux, J., Leroux-Robert, J. - M61anome malins des muqueuses des voies adro-digestives supérieurs. II. Signification prognostique de 1'étude histologique. Ann. Oto-Laring., 87:129-36, 1970.
2. Cochran, A. J. - Histology and prognosis in malignant melanoma. Journal of Pathology, 97:469-68, 1969.
3. Crone, R. P. - Malignant amelanotic melanomes of the nasal septum and maxillary sinus. Laryngoscope, 86:1826-33, 1966.
4. Gallagher, J. O. - Upper regpiwatory mela. noma; pathology and growth rate. Ann. Otol. Rhinol. and Laryng. 79:561-6, 1970.
5. Harrison, D. F. N. - Malignant melanoma of the nose. Trans. Pacific Coast Oto-Ophthalmological Soc. 49:116-20, 1968. (Abstract).
6. Holdcraft, J. & Gallagher, J. O. - Malignant melanomas of the nasal and paranasal sinus mucosa. Ann. Otol. Rhinol. and Laryng., 78:6-20 1969
7. Jackson, O. L. d Jackson Jr., O. L. "Malignant tumor of nose, nasal and accessory sinuses". In: Id. - Disease of the nose, throat and ear, p. 72-81. Philadelphia. Saunders, 1946.
8. Leroux-Robert, J. - Mélanomes malins des muqueuses des voies a6ro-digestives supérieurs. I. etude générale, clinique et évolutive (à propos de vingt observations personnelles). Ann. d'Oto-Laryng., 87:13-24, 1970.
9. Walker J., U. A. & Snow Jr., J. B. - Management of melanoma of nose and paranasal sinuses .Arch. Oto-Laryng., 89:662-60, 1969.
* Trabalho realizado na Disciplina Otorrinolaringológica do Depto. de Oftalmo e O. R. L. da Faculdade de Medicina - U. F. R. G. S. - Serviço do Prof. Ivo A. Kuhi.
1 Instrutor de Ensino da Disciplina de O. R. L. da Faculdade de Medicina da UFRGS - Otorrinolaringologista do Hospital de Pronto Socorro de P. Alegre.
2 Médico-Residente da Disciplina de O. R. L. da Faculdade de Medicina - UFRGS.
3 Auxiliar de Ensino do Departamento de Patologia da Faculdade Católica de Medicina de Pôrto Alegre.