Versão Inglês

Ano:  1971  Vol. 37   Ed. 2  - Maio - Agosto - (31º)

Seção: -

Páginas: 201 a 205

 

Microlesões Labirinticas Experimentalmente Induzidas:

Autor(es): Orozimbo Alves Costa Filho
Flávio Sanches

Histopotologia e Análise Fisiopatológica

Introdução

Desde 1878 quando Kessel mobilizou o estribo em casos de otosclerose para a recuperação da audição, olologistas preocuparam-se em conceber técnicas cirúrgicas que permitam abordar o labirinto (cápsula ótica e labirinto membranoso) na tentativa de recuperação da função auditiva e na remoção daquilo que causa a disfunção do órgão ou o sintoma clínico do paciente (deficiência auditiva, tontura, zumbido).

Existem, historicamente, na literatura, várias operações propostas para o tratamento da hidropsia labiríntica, da otosclerose e de processos da região do meato acústico interno, sendo que, algumas delas são extremamente atuais. A descompressão ou abertura do saco endolinfático G. Portmann, House e Shambaugh a labirintectomia Day, Cawthorne, a descompressão repetida do sáculo Cody, a punção do sáculo Fick, o "shunt" ótico-periótico House, o congelamento de canal semicircular horizontal e promontório Wolfson/House, o emprêgo do ultra som no canal semi-circular para diminuir ou abolir a tontura Arslan, James, Wolfson etc., o uso da broca e motor na fenestração -do promontório do canal semi-circular e mesmo das janelas oval e redonda em casos de otosclerose, para melhorar a audição (1897 Passow, 1899 Floureus, 1910 Bárány, 1916 Holmgreen, Sordille, Lempert) e cirurgias do meato acústico interno House, Fish, etc. são operações que foram propostas ou estão sendo propostas para problemas otológicos diários encontrados na clínica.

O otologista sabe, entretanto, que tais intervenções causam danos As estruturas labirínticas extremamente sensíveis à vibração e a movimentos do líquido endolinfático. O objetivo desta pesquisa foi observar microscòpicamente as alterações do labirinto decorrentes de manuseio cirúrgico, quando precauções foram tomadas no sentido de expor o labirinto membranoso com mínimo trauma desejável. ,Q canal semi circular lateral foi utilizado por ser razoàvelmente distante da cóclea e por ser histórica e clinicamente importante (fenestração, fístulas, e estimulação calórica) assim como, por ser de mais fácil acesso no gato.

Método

Vinte gatos saudáveis foram utilizados na pesquisa. Todos os gatos foram examinados prèviamente e mostraram ter equiíbrio normal, marcha normal e ouvidos não infectados. Nembutal na dose de 0,4 cc. por quilo de pêso corporal, injetado intraperitonialmente, foi usado como, anestésico. Em condições assépticas e usado microscópio otológico Zeiss, uma "fenestra" foi cuidadosamente feita no canal semicircular lateral após exposição cirúrgica da região. Irrigação contínua com soro fisiológico ou solução Ringer e aspiração discreta foram usados durante o ato cirúrgico. Após a fenestração, a cobertura da janela obtida feita com músculo, gordura ou nervo facial, selando completamente o espaço perilinfático. Nistagmo espontàneo, a marcha e o equilíbrio foram observados durante o período pós operatório. Os testes calóricas foram realizados de acôrdo com o método engendrado por Fernandez. Quando a resposta era negativa, outro teste realizado com água a temperatura tão baixa quanto 12 °C. O tempo e as características do nistagmo induzido foram registrados. As provas calóricas foram realizadas entre 10 e 127 dias após a operação. Os ossos temporais foram removidos de todos os gatos após perfusão adequada com fixador através do coração e preparados para a secção (cortes), após impregnação na celoidina. O grau de excitabilidade do ouvido operado foi sempre comparado com o ouvido controle. Paresia do canal foi considerada quando a resposta pós calórica era diminuída em tempo e freqüência, com relação ao outro lado. A eletronistagmografia não foi usada neste estudo.

Achados

A compensação vestibular foi atingida em prazo de um mínimo de 6 dias, para um máximo de 25 dias. Dois gatos apresentaram respostas calóricas normais; dois apresentaram nistagmo horizonto-rotatório e dois outros uma resposta diminuída. Nove gatos não mostraram nenhuma resposta calórica nas orelhas não operadas. Cinco gatos não foram testados devido a dificuldades técnicas. Os dois gatos com resposta calórica normal apresentaram alterações histológicas na crista, mácula, século e utrículo, ruptura da membrana sacular e lesão do órgão de Corti (porções basais). Estes gatos foram testados 77 e S8 dias após a cirurgia, respectivamente. Os gatos com nistagmo horizonto-rotatório induzido mostraram mácula, utrículo, século e crista com edema neuroepitelial. Colapso da membrana do canal lateral e degeneração das células na proeminéncia espiral (porções basais) doram encontradas, Um dos gatos com paresia vestibular mostrou edema da crista do canal lateral, mácula sacular com edema moderado e rutura da membrana sacular. 0 outro gato com a mesma resposta calórica apresentou os mesmos achados, entretanto, ,a crista do canal lateral mostrou alterações neuro epiteliais. Os gatos com paralisia vestibular apresentaram uma variedade de lesões vestibulares e cocleares. Histopatolbgicamente, alguns dêles mostraram pouca diferença daqueles que apresentaram resposta calórica. A "fenestra" no canal lateral mostrou uma tendência para se fechar por tecido ósseo, parcial ou completamente, e outras vazes sendo completamente, e outras vêzes sendo completamente preenchida por tecido fibroso. Em um gato, transcorridos apenas 21 dias, foi possível ver a "fenestra" quase que completamente fechada por tecido ósseo. As fotos 1, 2, 3, 4, 5 e 6, mostrou alguns dos achados descritos.



FOTO I: Corte mostrando máculas do Báculo e utrículo com alterações neuroepiteliais, edema do tecido conjuntivo e colápso da membrana sacular. (gato, H. E.)
FOTO II: Corte revela edema do tecido conjuntivo abaixo da mácula do utrículo e discreto edema do neuro epitélio. (gato, H. E.)



FOTO III: Canal semi-circular fenestrado e invadido por tecido fibroso. (gato H. H. E.)
FOTO IV: Mácula do Báculo revela alterações do neuro epitélio. Há colápso parcial da membrana sacular. (gato, H. E.)



FOTO V : Fenestração na região ampular do canal semi-circular. Observam-se osteogénese na região da "fenestra", invasão de tecido fibroso e alterações do neuro epitélio da crista. (gato, H. E.)
FOTO VI: "Fenestra" totalmente ocluída por tecido ósseo recém formado. (gato, H. E.)



Discussão c Conclusão

Os achados histopatológicos neste estudo não são proporcionais aos resultados dos testes calóricos realizados, ou melhor, a resposta do nistagmo pós-calórico não foi proporcional ao grau de lesões histopatológicas. Isto já é um fato conhecido pelos otologistas que fazem testes vestibulares, excitando grosseiramente os canais semicirculares com água a diferentes temperaturas, e, que obtém respostas não proporcionais ao quadro clínico. A análise microscópica. evidencia de graus variáveis tanto nos canais semicirculares, cristas e máculas, quanto na cóclea.

São extremamente importantes na clínica as queixas de zumbido, disacusia (má discriminação vocal, principalmente), recrutamento e tôdas variações possíveis de tonturas obviamente, tais sintomas são extremamente difíceis, senão impossíveis de serem detectados em animais de laboratório. Pode-se, portanto, avaliar as dificuldades que se evidenciam na cirurgia otológica quando o labirinto é exposto e atacado de maneira convencional (motor-broca, alta rotação, aquecimento, aspiração, manipulação com micro-estiletes, etc.). Interessante no nosso estudo o fato do quadro histopatológico não ser proporcional aos achados na intiestigação labiríntica. Pode-se supor entretanto que toda vêz que o labirinto é agredido por uma broca ou microestiletes, as células neuro-sensoriais especificamente excitáveis à vibração e discretos movimentos do líquido endolinfático poderão apresentar lesões de graus variáveis com conseqüente manifestações sintomáticas. Apesar de ainda não atingirem o objetivo de interferência no labirinto membranoso com o mínimo trauma para as estruturas neurosensoriais, parece que, no momento, quando adequadamente empregados, o congelamento e a aplicação de ultra-som no canal semicircular são as técnicas menos traumatizantes para a cóclea, segundo trabalho experimental de Wolfson.

Evidentemente a diminuição ou ausência de resposta ã, prova calórica pode de-correr da massa fibrótica obstruindo o canal semi-circular e não sòmente às alterações estruturais da crista. O fechamento da "fenestra" por osteogênese local observada em alguns gatos lembra a possibilidade da obtenção de maus resultados na descompressão do VIII par craneano (alargamento cirúrgico do meato acústico interno) e na exposição do saco endolinfático.

Entretanto, deve-se levar em consideração que as conclusões tiradas da observação histopatológica dos traumas labirínticos experimentalmente obtidos em gatos não são totalmente aplicáveis ao homem. uma vez que a cápsula ótica e as dimensões do labirinto humano são diferentes das do gato.

Sumário

Lesões labirínticas experimentalmente provocadas após fenestração do canal semi-circular lateral em gatos resultaram em profundas alterações nos canais semi-cireulares, cristas, utriculo, século, e, principalmente nas regiões basais da cóclea. Oclusão da "fenestra" por tecido ósseo e invasão de tecido fibroso para dentro dos canais semi-circulares foram observadas em vários animais. Diminuição ou ausência da excitabilidade vestibular à prova calórica foram constatadas com freqüência. Os autôres analisam as técnicas cirúrgicas para o labirinto, concluindo que apesar das mesmas serem realizadas com cuidadosa manipulação, ainda assim, são extremamente traumatisantes para a cóclea e vestíbulo, sob o aspecto histopatológico.

Summary

Fenestration of the lateral semi-circular canal was perfomed in 20 cats. Caloric tests and perfusion with fixative through the heart for histological sections of the temporal bone were carried out after different lapses of time. Histopathological changes were observed in the semi-circular canals, cristae, maculae, saculae and utriculae. Rupture of the sacular membrane and damage to the organ of Corti (basal turns) were also seem in some animals. Partial or complete bone closure of the fenestrae were seen as well.

Bibliografia

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Shambaugh, G. E., Takahara, S. - A clinical and experimental study of the effeet of fenestration on the labyrinth contests. Acta Otol, Suppl, 123, 1955.
Wofson, R. J., Cutt, R. A., Ishigama, E. - Cryosurgery of the labyrint. The Laryng. 76:733, 1966.
Cutt, R. A. Ishigama, E., Meyers, E. N. Wofson, R. J. - Histology of the monkey labyrinth following experimental cryosurgery. Annals Otol. Rhin. Laryng. 77:275, 1968.
Sharabaugh. G. - Surgery of the ear; Chapters 19 and 20; 2nd Edition; W, B. Eaunders Co. - Philadelphia, 1967.

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